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EXPOSIÇÕES ATUAIS


Taysir Batniji, Pères, 2006.


M’barek Bouhchichi, Imdyazen (les poètes) #3, 2018.


Song Dong, Facing the Wall, 1999.


Thu Van Tran, The Red Rubber,#2, 2017.


Khalil Rabah, Untitled, All is Well, 2017.


Katia Kameli, Bledi, un scénario possible, 2006.


Otobong Nkanga, The Weight of Scars, 2015.


Jems Robert Koko Bi, Au-delà des chaises #2, 2017.


Meschac Gaba, Socrate, 2010 - 2011.


Barthélémy Toguo, Urban requiem, 2015 (detalhe) © Cortesia Galerie Lelong & Co. e Bandjoun Station © Adagp, Paris, 2020

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ARQUIVO:


COLECTIVA

GLOBAL(E) RESISTANCE




CENTRE POMPIDOU
Place Georges Pompidou
75191 Paris

29 JUL - 04 JAN 2021


 


Em maio de 2009, o Centro Pompidou descobriu a existência das mulheres, apercebeu-se que havia obras de artistas mulheres nas suas reservas e dedicou-lhes uma exposição. Onze anos e meio mais tarde, o Centro Pompidou acaba de descobrir a existência do Sul (dos Suis) e dos seus artistas, e consagra uma exposição às suas obras exumadas das suas reservas; já não era sem tempo. A diferença é que, desta vez, há um tema, e não uma simples recensão de artistas provenientes daquele mundo (enquanto que, como muitas vezes, não havia realmente um tema na exposição sobre artistas mulheres, para além do seu género): aqui, então, a resistência, a do Sul contra o Norte. Daí este título, infelizmente vacilante, nem verdadeiramente francês (e o acento?), nem verdadeiramente inglês, "Global(e) Resistance".

O que é a resistência do Sul e como se expressa ela? Se excluirmos alguns artistas sobre cujo trabalho nos interrogamos o que faz lá (o vídeo da norte-americana LaToya Ruby Frazier, uma artista em todo o caso muito interessante, ou o "filósofo em residência" Paul Preciado), navegamos, pelo curso da exposição entre resistência subtil, discreta, alusiva e resistência mais assertiva, mais política, com obras mais ativistas, legíveis mais facilmente de acordo com uma grelha política, por vezes os artistas eles mesmos envolvidos na luta. Mas estes dois eixos não se opõem, formam um contínuo, uma gradação, e alguns artistas jogam em ambos os registos: assim o palestiniano de Gaza Taysir Batniji, cuja série Les Pères, mais subtil, afirmando a identidade, ancorada no território, é apresentada aqui, em vez dos anúncios imobiliários de GH0809 ou das torres de vigia de Watchtowers, obras mais diretamente críticas. Deixemos imediatamente de lado o discurso convencionado de que uma arte ao serviço de uma causa não será mais arte: trata-se de um discurso europeu, branco e burguês, que visa formatar a resistência na arte, e que dificilmente se aplica ao sul do Trópico de Cancer (nem na emergente URSS, nem no maio de 1968, nem ...). Aqui, pelo contrário, as dimensões artísticas e políticas são inseparáveis. O ensaio de Christine Macel no catálogo coloca muito bem algumas destas questões: a ética pode ser suficiente para a arte? A recuperação pela instituição (museológica ou privada) anula a resistência? E felizmente não há respostas unívocas.

As obras de resistência discreta são frequentemente muito poéticas, por exemplo as treze varas apoiadas contra uma parede sobre as quais estão gravados versos do poeta M'barek Ben Zida em escrita amazigh (uma cultura oprimida pela cultura árabe, um alfabeto há muito proibido, sinal de resistência dentro do próprio Sul): Imdyazen (les poètes) é uma instalação do marroquino M'barek Bouhchichi, varas que os contadores de histórias utilizam na praça pública (utilizavam, elas tornaram-se raras) para entoarem a sua dicção. Resistência cultural, resistência poética, subtileza visual.

 

M’barek Bouhchichi, Imdyazen (les poètes) #3, 2018.

 

Poética também, a grande instalação do artista chinês Song Dong, uma meditação de frente para a parede, uma resistência passiva, uma ausência do mundo: resistir, é por vezes a recusa em falar, abstrair-se. Não fazer nada é toda uma arte, e também podemos resistir assim.

A meio caminho, talvez, a instalação de Thu Van Tran (de quem sigo o trabalho há muito tempo) que aqui regressa à exploração colonial da borracha no Vietnam, o seu país de origem, pela Michelin entre outros: moldes brancos ou vermelhos de troncos de árvore da borracha colocados sobre caixas em madeira, um fresco à base de borracha. Se o discurso da resistência contra a dominação colonial e a pilhagem de recursos é aqui muito claro, a expressão não é militante, mas alusiva.

Neste percurso de um polo ao outro, surge em seguida a escultura do palestiniano Khalil Rabah representando um velho homem esmagado sob o peso do mundo (na verdade, é inspirado por uma pintura muito famosa na Palestina, Jamal al Mahamel, o transportador da montanha, de Sliman Mansour, ou é Jerusalém que pesa sobre os seus ombros; esta pintura é também famosa porque a sua primeira versão, que Kadhafi possuía, foi destruída pelas bombas americanas em 1986), mas ele não transporta nada, em todo o caso, nada visível. É contra uma dominação invisível, porque feita de não ditos, aceitações hipócritas, tolerâncias culpáveis, que os palestinianos devem também resistir, nós sussurramos Rabah: a cumplicidade ocidental dando aval ao apartheid e ao colonialismo. Sumud, a resiliência, é o que evoca esta estátua com humor.

 

Coco Fuso & Guillermo Gomez-Peña, The Couple in the Cage: Gutinaui Odyssey, 1992-93.

 

E é, de facto, o humor, a ironia que está na base da maior parte das obras de resistência mais explícitas. A mais antiga aqui, e uma das mais potentes, é o vídeo da cubana de Nova Iorque Coco Fusco e do então seu companheiro, o mexicano Guillermo Gomez-Peña, que, em 1992-1993, se disfarçaram de indígenas e se fecharam numa gaiola exposta ao público em diversas cidades (Madrid, Londres, Washington DC, Irvine CA, Sydney, Chicago, NYC e Minneapolis), recriação contemporânea de zoos humanos (filmado pela  salvadorenha Paula Heredia). Denominaram-se Ameríndios vindos de uma ilha do Golfo do México, Guatinau, que teriam escapado à colonização, e performaram tarefas típicas da sua cultura, costurando bonecas vudu, andando para cima e para baixo, bebendo Coca-Cola, vendo TV, ... Os mediadores explicam a sua cultura aos visitantes, encorajam-nos a tirar uma selfie polaroide em frente à gaiola (a maioria dos visitantes não percebeu o logro) e a cuidar dos dois índios (alimentando-os e levando-os para a casa de banho por uma trela, por exemplo). Há quem se sinta ofendido com este espetáculo, especialmente muitos etnólogos, que obviamente se sentem visados (especialmente porque as exposições foram acompanhadas por todo um aparelho crítico, registos falsos da Enciclopédia Britannica, artefactos falsos, ...) mas Coco Fusco cita um visitante do Smithsonian, um velho Pueblo, afirmando que este espectáculo era muito mais real do que qualquer coisa que poderíamos ter dito sobre os Ameríndios num museu. Tal performance seria impossível hoje, face à "cancel culture", e no entanto é uma das mais fortes afirmações do que é a dominação cultural. E eu escrevi este texto um dia depois do Dia de Colombo, rebatizado Dia dos Povos Indígenas.

Por fim, um outro desvio irónico é aquele que o colombiano Ivan Argote (que, há doze anos, grafitou o Mondrian, a duas salas de distância) faz às estátuas de colonos espanhóis, como o "descobridor" da Amazónia e outros conquistadores, vestindo-os com ponchos tradicionais ou, melhor, delimitando-os atrás de espelhos que mais não fazem que refletir o ambiente, e assim anulam a estátua, negando a sua própria existência visual, mantendo apenas a base e a placa de identificação. Um ato de resistência de absoluta simplicidade, que é um excelente destaque desta exposição.



MARC LENOT