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EXPOSIÇÕES ATUAIS


Carlos Nogueira, a Camões e a ti. Intervenção de rua em Vila Nova de Cerveira, 1980. 9 elementos. Fotografia p/b. 24 x 18 cm - (8x) 18 x 24 cm. Col. do artista


Carlos Nogueira, desenhos de construção com casa e céu, 2006. Ferro, vidro e instalação sonora. 270 x 300 x 9 cm, áudio: cd 50’ (loop). Col. do artista. Fotografia: João Carmo Simões


Carlos Nogueira, a noite e branco, sem data. 2 elementos. madeira, ferro, óleo e tinta de esmalte. 34,5 x 45,9 x 6 cm - 29,1 x 36 x 15 cm. Col. Cristina Guedes e José Paulo dos Santos


Carlos Nogueira, olhou para ele muito tempo. continuou então a desenhar, 1997. 2 elementos. ferro, madeira, tinta acrílica e grafite (2x) 30 x 37,4 x 19 cm. Col. do Artista


Carlos Nogueira, livro de viagens, 1985. Madeira, tela, cartão, tinta acrílica e plástico. 37,2 x 27,9 x 8,1 cm (livro fechado). Col. particular


Carlos Nogueira, a Camões e a ti. Intervenção no Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, 1981. Onze elementos fotografia p/b (2x) 24 x 18 cm - (9x) 18 x 24 cm. Col. Artista


Carlos Nogueira, a Camões e a ti. Intervenção no Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, 1981. Onze elementos fotografia p/b (2x) 24 x 18 cm - (9x) 18 x 24 cm. Col. Artista

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TIME STANDS STILL. FOTOGRAFIAS, 1980–2023


MAAT, Lisboa
PAULO ROBERTO

ARQUIVO:


CARLOS NOGUEIRA

O Lugar das Coisas




CAM - CENTRO DE ARTE MODERNA
Rua Dr. Nicolau de Bettencourt
1050-078 Lisboa

21 SET - 06 JAN 2013


Cheio de mérito, mas poeticamente, vive o homem sobre esta Terra.
Friedrich Hölderlin




Se o mundo é a obra de um qualquer criador desconhecido, a casa é certamente a obra do Homem. Carlos Nogueira faz desta asserção a origem da poesia: a arte de erguer (e habitar) lugares no mundo; coloca-nos perante o momento primordial em que à primeira pedra se junta a segunda. A antologia do artista atualmente em exposição no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian revela uma obra que concilia a concretude e rudez da materialidade com a incertitude das ideias vagas porque vastas.

A ode ao homem que, pela construção, satisfaz o seu desejo tectónico de possessão da terra ganha contornos, obra a obra, pedra a pedra. E é pela sobreposição de materiais e seu mútuo encrave que as obras de Nogueira adquirem corpo. Em Construção para lugar nenhum (2003), uma sucessão de pequenas ripas de madeira ergue as quatro paredes de uma casa de cujo interior apenas conhecemos a luz que dela emana, e o seu teto ausente que recorta o céu como um templo.

“Mais do que estruturas, o arquiteto desenha ausências, frestas solares, restos da noite. Quando ele crê que está fechando ele está entreabrindo. Onde se acredita haver parede prevalece um vão. Em tudo se desenha a eterna varanda onde olhamos a mentirosa paisagem exterior. Porque tudo se converte em interioridade, espaço ainda por desenhar, rosto sem outra moldura que não seja o nosso próprio olhar. (…) a casa não é onde o homem se fecha. É onde o Homem se abre para dentro.†[1] Desenhar a linha que separa o interior do exterior e constatar a fatal imprecisão dessa mesma linha é uma tendência que povoa o percurso artístico de Carlos Nogueira. Assim, a figura do díptico ganha um outro sentido: a ideia do duplicado é substituída pela oposição fora/dentro, terra/eu, visível/invisível. Casa aberta com pátio (2010) materializa o antagonismo interior/exterior de um modo mais manifesto: uma estrutura fechada em madeira por oposição a uma estrutura em ferro com as mesmas dimensões são colocadas lado a lado: se a primeira nos transmite a atmosfera de recolhimento própria da casa, a segunda assemelha-se a um esqueleto da mesma, um lugar onde “estar fora†dessa guarida que a casa nos oferece, para que o mundo irrompa mais violentamente.

Também através da sonoridade Carlos Nogueira instiga a possibilidade de representação do processo da construção. Desenho de construção com casa e céu (2006) compõe uma melodia quase impercetível que nos devolve a atmosfera do trabalho humano que se rebela contra os ditames da Natureza: ouvimos uma chuva que corre incessante e o ruído de uma constante atividade, como se também toda aquela água participasse no ato de construir.

As obras de Carlos Nogueira parecem espreitar o limiar da visibilidade; sabemos pois estar perante representações que ameaçam a queda no invisível. A representação do inefável exige a superação do que há de paradoxal em representar o irrepresentável. Em Desenhos de vento (1990), Carlos Nogueira cede ao fugaz e imprevisível, o indelével peso da matéria. O vento está “desenhado†em doze elementos em ferro, “formados†pela força da passagem do vento. O criador da obra deixa de ser o artista para ser agora o elemento em representação. Também em Desenho de passagem de vento (1990) é o vento enquanto invisível presença que parece ser convocado, numa estrutura em ferro cujo interior oco convida a passagem da massa de ar.

Também no que diz respeito à água, assistimos a uma ânsia de contrariar a sua volubilidade, de converter o seu estado líquido numa materialidade estática e sólida. Em Mar (fragmento) (1985) uma pequena forma triangular azulada e brilhante parece ter sido extraída do oceano e assim eternizada. Também em Permanência da água (1992), uma obra composta por dois elementos cuja solidez advém da mescla de diversos materiais, a água permanece; agora, no entanto, enquanto vínculo de ligação entre a pasta de gesso e o papel, sempre presente também na tinta; como que afirmando que a água se infiltra em todas as camadas, que ela está lá, onde não mais a vemos. A consagração da água é transversal à obra de Carlos Nogueira; o seu poder de transmutação é colocado em evidência, sendo que esta surge representada através da nuvem, do mar, ou enquanto presença encoberta nos materiais – um Dionísio de múltiplas faces cuja presença na paisagem mais não é que a condição primeira de existência da “casaâ€.

A subtileza das obras de Carlos Nogueira encontra-se no facto de cada uma delas constituir, per se, uma metáfora. “A edificação que não revela o esforço: essa é a marca primeira da beleza. Um poema necessita, como condição primeira, de ser escrito. O maior inimigo do poema, todavia, é ser demasiadamente escrito. (…) Carlos Nogueira escreve com a leveza de quem simplesmente diz, sussurra e instiga. Nele eu confirmo: os materiais da obra não são a pedra, o ferro, a tábua. São a luz, a sombra, a mão de quem sonhou.†[2] A terra, a água, e o ar oferecem-se como elementos primevos para uma sagração do mundo que a obra do artista, no seu todo, compõe. E no entanto, onde julgamos ver uma paisagem heterogénea, o objeto nunca deixou de ser apenas um e sempre o mesmo: esta nossa casa que, sempre poeticamente, habitamos.



NOTAS

[1] Mia Couto, “A Casa de Dentroâ€, in Carlos Nogueira, desenhos de construção com casa. e céu. Lisboa: Casa da Cerca, maio 2006, p. 72-76.

[2] Idem




Maria Beatriz Marquilhas