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ÂNGELA FERREIRAHard Rain Show![]() MUSEU COLEÇÃO BERARDO Praça do Império 1499-003 Lisboa 11 MAR - 11 MAI 2008 ![]() ![]() Entre Junho e Novembro de 2007, “Maison Tropicale”, representou Portugal na 52ª edição da Bienal Internacional de Arte de Veneza, com comissariado de Jürgen Bock. Agora, integrada em “Hard Rain Show” (a exposição que o Museu Colecção Berardo apresenta até 11 de Maio), também o público de Lisboa pode conhecer a instalação de Ângela Ferreira com que o Museo d’Arte Moderna e Contemporanea de Bolzano irá inaugurar o seu novo edifício (a 24 de Maio); a aquisição do trabalho da artista portuguesa pelo museu italiano aconteceu ainda em 2007, durante o decorrer da Bienal. “Hard Rain Show” complementa a instalação “Maison Tropicale” com a apresentação inédita de um documentário de Manthia Diawara (Mali) sobre o processo de construção da obra. O documentário, com o mesmo título da instalação, permite um olhar particularmente interessante e revelador do trabalho de campo desenvolvido pela artista e, nomeadamente, da sua relação com a dimensão humana e subjectiva dos vários intervenientes locais no processo de estabelecimento de pressupostos conceptuais que fundamentariam “Maison Tropicale”; trata-se de uma peça escultórica com um comprimento de dez metros e que a disposição no espaço, porque acciona uma passagem, implica o espectador numa relação física directa com as casas pré-fabricadas de Jean Prouvé, cuja evocação cartográfica (ou rasto) se prolonga ainda para as duas séries fotográficas (“Brazzavile” e “Niamey”) que a acompanham. Mas esta exposição inclui ainda um conjunto de trabalhos seleccionados, de 1991-2 (“Sites and Services”), de 1994 (“Emigração”) e de 1999 (“Casa Maputo”), para além de um novo trabalho, concebido especificamente para “Hard Rain Show” (“For Mozambique (Model No.1 of Screen-Tribune-Kiosk celebrating a post-independence Utopia”). O processo de trabalho criativo que Ângela Ferreira tem desenvolvido ao longo dos anos denota uma atenção particular para as lógicas de constituição de estratégias de reflexão sobre o contexto social, a partir de um posicionamento crítico que a artista criteriosamente estabelece, investindo para tal a sua própria experiência de vida e sensibilidade informada, nomeadamente, sobre as perspectivas e discursos que tipificam as experiências e influências colonialistas e pós-colonialistas e o Apartheid em África. Em “Hard Rain Show”, Moçambique, África do Sul, Níger e Congo são os países referenciados cujas estruturas identitárias locais se submetem, não raras vezes, a processos de erosão cultural e política cuja raiz e fundamento lhes são exteriores. “Maison Tropicale” evoca as casas pré-fabricadas de um pós-guerra mas, simultaneamente, abre uma possibilidade de olhar distanciado e metafórico sobre um apagar da memória (as casas são retiradas e os testemunhos pessoais junto aos indícios de uma casa “que já não está” são contraditórios, insuficientes e, sempre, um exercício de perda e desterritorialização social e política). Também os movimentos colonizadores se deslocam livremente, deixando à sua passagem o rasto do que, transformando o contexto local, é sempre um elemento estranho que impõe e inscreve a sua presença mas não se fixa e não se integra. Tal pode ser o veredicto que o contentor de “Maison Tropicale” transporta; um projecto político só possível em trânsito, porque é no formato (objectual e artístico) agora proposto que uma possibilidade de apaziguamento histórico se realiza. A casa em contentor é um puzzle em reconfiguração simbólica permanente e, como tal, uma condição de libertação em potência para conflitos não resolvidos. “Hard Rain Show” exercita um segundo olhar e uma forma de mediação entre contrastes sociais resultantes de tantas estratégias em que o estético e o político se movimentam em tempos, lógicas e direcções distintas. A compreensão deste método de intervenção estético-etnográfica parece ser a melhor forma de conhecer os códigos e ferramentas de trabalho da artista. Os objectos produzidos e que, em exposição, veiculam uma inquestionável condição artística, são tanto mais eficazes porque desdobram o seu específico tempo, estatuto e existência: São o que são num momento presente, mas trazem consigo uma porta aberta para um regressar a um outro contexto. Somos nós agora, visitantes, que numa inevitável e assumida condição de distanciamento, perscrutamos os trabalhos de Ângela Ferreira, descobrindo-lhes essas propostas de reconciliação em acto - em “acto artístico” porque, pelo menos por aí, é ainda a nossa responsabilidade de operacionalizar um juízo que irá decidir a qualidade da nossa experiência estética, pessoal, mas ainda assim (porque o regressar a um contexto nos coloca perante a possibilidade de o poder transformar), política. ![]()
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