Links

O ESTADO DA ARTE




Outros artigos:

2024-04-23


ÁLBUM DE FAMÍLIA – UMA RECORDAÇÃO DE MARIA DA GRAÇA CARMONA E COSTA
 

2024-03-09


CAMINHOS NATURAIS DA ARTIFICIALIZAÇÃO: CUIDAR A MANIPULAÇÃO E ESMIUÇAR HÍPER OBJETOS DA BIO ARTE
 

2024-01-31


CRAGG ERECTUS
 

2023-12-27


MAC/CCB: O MUSEU DAS NOSSAS VIDAS
 

2023-11-25


'PRATICAR AS MÃOS É PRATICAR AS IDEIAS', OU O QUE É ISTO DO DESENHO? (AINDA)
 

2023-10-13


FOMOS AO MUSEU REAL DE BELAS ARTES DE ANTUÉRPIA
 

2023-09-12


VOYEURISMO MUSEOLÓGICO: UMA VISITA AO DEPOT NO MUSEU BOIJMANS VAN BEUNINGEN, EM ROTERDÃO
 

2023-08-10


TEHCHING HSIEH: HOW DO I EXPLAIN LIFE AND CHANGE IT INTO ART?
 

2023-07-10


BIENAL DE FOTOGRAFIA DO PORTO: REABILITAR A EMPATIA COMO UMA TECNOLOGIA DO OUTRO
 

2023-06-03


ARCOLISBOA, UMA FEIRA DE ARTE CONTEMPORÂNEA EM PERSPETIVA
 

2023-05-02


SOBRE A FOTOGRAFIA: POIVERT E SMITH
 

2023-03-24


ARTE CONTEMPORÂNEA E INFÂNCIA
 

2023-02-16


QUAL É O CINEMA QUE MORRE COM GODARD?
 

2023-01-20


TECNOLOGIAS MILLENIALS E PÚBLICO CONTEMPORÂNEO. REFLEXÕES SOBRE A EXPOSIÇÃO 'OCUPAÇÃO XILOGRÁFICA' NO SESC BIRIGUI EM SÃO PAULO
 

2022-12-20


VENEZA E A CELEBRAÇÃO DO AMOR
 

2022-11-17


FALAR DE DESENHO: TÃO DEPRESSA SE COMEÇA, COMO ACABA, COMO VOLTA A COMEÇAR
 

2022-10-07


ARTISTA COMO MEDIADOR. PRÁTICAS HORIZONTAIS NA ARTE E EDUCAÇÃO NO BRASIL
 

2022-08-29


19 DE AGOSTO, DIA MUNDIAL DA FOTOGRAFIA
 

2022-07-31


A CULTURA NÃO ESTÁ FORA DA GUERRA, É UM CAMPO DE BATALHA
 

2022-06-30


ARTE DIGITAL E CIRCUITOS ONLINE
 

2022-05-29


MULHERES, VAMPIROS E OUTRAS CRIATURAS QUE REINAM
 

2022-04-29


EGÍDIO ÁLVARO (1937-2020). ‘LEMBRAR O FUTURO: ARQUIVO DE PERFORMANCES’
 

2022-03-27


PRATICA ARTÍSTICA TRANSDISCIPLINAR: A INVESTIGAÇÃO NAS ARTES
 

2022-02-26


OS HÁBITOS CULTURAIS… DAS ORGANIZAÇÕES CULTURAIS PORTUGUESAS
 

2022-01-27


ESPERANÇA SIGNIFICA MAIS DO QUE OPTIMISMO
 

2021-12-26


ESCOLA DE PROCRASTINAÇÃO, UM ESTUDO
 

2021-11-26


ARTE = CAPITAL
 

2021-10-30


MARLENE DUMAS ENTRE IMPRESSIONISTAS, ROMÂNTICOS E SUMÉRIOS
 

2021-09-25


'A QUE SOA O SISTEMA QUANDO LHE DAMOS OUVIDOS'
 

2021-08-16


MULHERES ARTISTAS: O PARADOXO PORTUGUÊS
 

2021-06-29


VIVER NUMA REALIDADE PÓS-HUMANA: CIÊNCIA, ARTE E ‘OUTRAMENTOS’
 

2021-05-24


FRESTAS, UMA TRIENAL PROJETADA EM COLETIVIDADE. ENTREVISTA COM DIANE LINA E BEATRIZ LEMOS
 

2021-04-23


30 ANOS DO KW
 

2021-03-06


A QUESTÃO INDÍGENA NA ARTE. UM CAMINHO A PERCORRER
 

2021-01-30


DUAS EXPOSIÇÕES NO PORTO E MUITOS ARQUIVOS SOBRE A CIDADE
 

2020-12-29


TEORIA DE UM BIG BANG CULTURAL PÓS-CONTEMPORÂNEO - PARTE II
 

2020-11-29


11ª BIENAL DE BERLIM
 

2020-10-27


CRITICAL ZONES - OBSERVATORIES FOR EARTHLY POLITICS
 

2020-09-29


NICOLE BRENEZ - CINEMA REVISITED
 

2020-08-26


MENSAGENS REVOLUCIONÁRIAS DE UM TEMPO PERDIDO
 

2020-07-16


LIÇÕES DE MARINA ABRAMOVIC
 

2020-06-10


FRAGMENTOS DO PARAÍSO
 

2020-05-11


TEORIA DE UM BIG BANG CULTURAL PÓS-CONTEMPORÂNEO
 

2020-04-24


QUE MUSEUS DEPOIS DA PANDEMIA?
 

2020-03-24


FUCKIN’ GLOBO 2020 NAS ZONAS DE DESCONFORTO
 

2020-02-21


ELECTRIC: UMA EXPOSIÇÃO DE REALIDADE VIRTUAL NO MUSEU DE SERRALVES
 

2020-01-07


SEMANA DE ARTE DE MIAMI VIA ART BASEL MIAMI BEACH: UMA EXPERIÊNCIA MAIS OU MENOS ESTÉTICA
 

2019-11-12


36º PANORAMA DA ARTE BRASILEIRA
 

2019-10-06


PARAÍSO PERDIDO
 

2019-08-22


VIVER E MORRER À LUZ DAS VELAS
 

2019-07-15


NO MODELO NEGRO, O OLHAR DO ARTISTA BRANCO
 

2019-04-16


MICHAEL BIBERSTEIN: A ARTE E A ETERNIDADE!
 

2019-03-14


JOSÉ MAÇÃS DE CARVALHO – O JOGO DO INDIZÍVEL
 

2019-02-08


A IDENTIDADE ENTRE SEXO E PODER
 

2018-12-20


@MIAMIARTWEEK - O FUTURO AGENDADO NO ÉDEN DA ARTE CONTEMPORÂNEA
 

2018-11-17


EDUCAÇÃO SENTIMENTAL. A COLEÇÃO PINTO DA FONSECA
 

2018-10-09


PARTILHAMOS DA CRÍTICA À CENSURA, MAS PARTILHAMOS DA FALTA DE APOIO ÀS ARTES?
 

2018-09-06


O VIGÉSIMO ANIVERSÁRIO DA BIENAL DE BERLIM
 

2018-07-29


VISÕES DE UMA ESPANHA EXPANDIDA
 

2018-06-24


O OLHO DO FOTÓGRAFO TAMBÉM SOFRE DE CONJUNTIVITE, (UMA CONVERSA EM TORNO DO PROJECTO SPECTRUM)
 

2018-05-22


SP-ARTE/2018 E A DIFÍCIL TAREFA DE ESCOLHER O QUE VER
 

2018-04-12


NO CORAÇÂO DESTA TERRA
 

2018-03-09


ÁLVARO LAPA: NO TEMPO TODO
 

2018-02-08


SFMOMA SAN FRANCISCO MUSEUM OF MODERN ART: NARRATIVA DA CONTEMPORANEIDADE
 

2017-12-20


OS ARQUIVOS DA CARNE: TINO SEHGAL CONSTRUCTED SITUATIONS
 

2017-11-14


DA NATUREZA COLABORATIVA DA DANÇA E DO SEU ENSINO
 

2017-10-14


ARTE PARA TEMPOS INSTÁVEIS
 

2017-09-03


INSTAGRAM: CRIAÇÃO E O DISCURSO VIRTUAL – “TO BE, OR NOT TO BE” – O CASO DE CINDY SHERMAN
 

2017-07-26


CONDO: UM NOVO CONCEITO CONCORRENTE À TRADICIONAL FEIRA DE ARTE?
 

2017-06-30


"LEARNING FROM CAPITALISM"
 

2017-06-06


110.5 UM, 110.5 DOIS, 110.5 MILHÕES DE DÓLARES,… VENDIDO!
 

2017-05-18


INVISUALIDADE DA PINTURA – PARTE 2: "UMA HISTÓRIA DA VISÃO E DA CEGUEIRA"
 

2017-04-26


INVISUALIDADE DA PINTURA – PARTE 1: «O REAL É SEMPRE AQUILO QUE NÃO ESPERÁVAMOS»
 

2017-03-29


ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE O CONCEITO CONTEMPORÂNEO DE FEIRA DE ARTE
 

2017-02-20


SOBRE AS TENDÊNCIAS DA ARTE ACTUAL EM ANGOLA: DA CRIAÇÃO AOS NOVOS CANAIS DE LEGITIMAÇÃO
 

2017-01-07


ARTLAND VERSUS DISNEYLAND
 

2016-12-15


VALORES DA ARTE CONTEMPORÂNEA: UMA CONVERSA COM JOSÉ CARLOS PEREIRA SOBRE A PUBLICAÇÃO DE O VALOR DA ARTE
 

2016-11-05


O VAZIO APOCALÍPTICO
 

2016-09-30


TELEPHONE WITHOUT A WIRE – PARTE 2
 

2016-08-25


TELEPHONE WITHOUT A WIRE – PARTE 1
 

2016-06-24


COLECCIONADORES NA ARCO LISBOA
 

2016-05-17


SONNABEND EM PORTUGAL
 

2016-04-18


COLECCIONADORES AMADORES E PROFISSIONAIS COLECCIONADORES (II)
 

2016-03-15


COLECCIONADORES AMADORES E PROFISSIONAIS COLECCIONADORES (I)
 

2016-02-11


FERNANDO AGUIAR: UM ARQUIVO POÉTICO
 

2016-01-06


JANEIRO 2016: SER COLECCIONADOR É…
 

2015-11-28


O FUTURO DOS MUSEUS VISTO DO OUTRO LADO DO ATLÂNTICO
 

2015-10-28


O FUTURO SEGUNDO CANDJA CANDJA
 

2015-09-17


PORQUE É QUE OS BLOCKBUSTERS DE MODA SÃO MAIS POPULARES QUE AS EXPOSIÇÕES DE ARTE, E O QUE É QUE PODEMOS DIZER SOBRE ISSO?
 

2015-08-18


OS DESAFIOS DO EFÉMERO: CONSERVAR A PERFORMANCE ART - PARTE 2
 

2015-07-29


OS DESAFIOS DO EFÉMERO: CONSERVAR A PERFORMANCE ART - PARTE 1
 

2015-06-06


O DESAFINADO RONDÒ ENWEZORIANO. “ALL THE WORLD´S FUTURES” - 56ª EXPOSIÇÃO INTERNACIONAL DE ARTE DE VENEZA
 

2015-05-13


A 56ª BIENAL DE VENEZA DE OKWUI ENWEZOR É SOMBRIA, TRISTE E FEIA
 

2015-04-08


A TUMULTUOSA FERTILIDADE DO HORIZONTE
 

2015-03-04


OS MUSEUS, A CRISE E COMO SAIR DELA
 

2015-02-09


GUIDO GUIDI: CARLO SCARPA. TÚMULO BRION
 

2015-01-13


IDEIAS CAPITAIS? OLHANDO EM FRENTE PARA A BIENAL DE VENEZA
 

2014-12-02


FUNDAÇÃO LOUIS VUITTON
 

2014-10-21


UM CONTEMPORÂNEO ENTRE-SERRAS
 

2014-09-22


OS NOSSOS SONHOS NÃO CABEM NAS VOSSAS URNAS: Quando a arte entra pela vida adentro - Parte II
 

2014-09-03


OS NOSSOS SONHOS NÃO CABEM NAS VOSSAS URNAS: Quando a arte entra pela vida adentro – Parte I
 

2014-07-16


ARTISTS' FILM BIENNIAL
 

2014-06-18


PARA UMA INGENUIDADE VOLUNTÁRIA: ERNESTO DE SOUSA E A ARTE POPULAR
 

2014-05-16


AI WEIWEI E A DESTRUIÇÃO DA ARTE
 

2014-04-17


QUAL É A UTILIDADE? MUSEUS ASSUMEM PRÁTICA SOCIAL
 

2014-03-13


A ECONOMIA DOS MUSEUS E DOS PARQUES TEMÁTICOS, NA AMÉRICA E NA “VELHA EUROPA”
 

2014-02-13


É LEGAL? ARTISTA FINALMENTE BATE FOTÓGRAFO
 

2014-01-06


CHOICES
 

2013-09-24


PAIXÃO, FICÇÃO E DINHEIRO SEGUNDO ALAIN BADIOU
 

2013-08-13


VENEZA OU A GEOPOLÍTICA DA ARTE
 

2013-07-10


O BOOM ATUAL DOS NEGÓCIOS DE ARTE NO BRASIL
 

2013-05-06


TRABALHAR EM ARTE
 

2013-03-11


A OBRA DE ARTE, O SISTEMA E OS SEUS DONOS: META-ANÁLISE EM TRÊS TEMPOS (III)
 

2013-02-12


A OBRA DE ARTE, O SISTEMA E OS SEUS DONOS: META-ANÁLISE EM TRÊS TEMPOS (II)
 

2013-01-07


A OBRA DE ARTE, O SISTEMA E OS SEUS DONOS. META-ANÁLISE EM TRÊS TEMPOS (I)
 

2012-11-12


ATENÇÃO: RISCO DE AMNÉSIA
 

2012-10-07


MANIFESTO PARA O DESIGN PORTUGUÊS
 

2012-06-12


MUSEUS, DESAFIOS E CRISE (II)


 

2012-05-16


MUSEUS, DESAFIOS E CRISE (I)
 

2012-02-06


A OBRA DE ARTE NA ERA DA SUA REPRODUTIBILIDADE DIGITAL (III - conclusão)
 

2012-01-04


A OBRA DE ARTE NA ERA DA SUA REPRODUTIBILIDADE DIGITAL (II)
 

2011-12-07


PARAR E PENSAR...NO MUNDO DA ARTE
 

2011-04-04


A OBRA DE ARTE NA ERA DA SUA REPRODUTIBILIDADE DIGITAL (I)
 

2010-10-29


O BURACO NEGRO
 

2010-04-13


MUSEUS PÚBLICOS, DOMÍNIO PRIVADO?
 

2010-03-11


MUSEUS – UMA ESTRATÉGIA, ENFIM
 

2009-11-11


UMA NOVA MINISTRA
 

2009-04-17


A SÍNDROME DOS COCHES
 

2009-02-17


O FOLHETIM DE VENEZA
 

2008-11-25


VANITAS
 

2008-09-15


GOSTO E OSTENTAÇÃO
 

2008-08-05


CRÍTICO EXCELENTÍSSIMO II – O DISCURSO NO PODER
 

2008-06-30


CRÍTICO EXCELENTÍSSIMO I
 

2008-05-21


ARTE DO ESTADO?
 

2008-04-17


A GULBENKIAN, “EM REMODELAÇÃO”
 

2008-03-24


O QUE FAZ CORRER SERRALVES?
 

2008-02-20


UM MINISTRO, ÓBICES E POSSIBILIDADES
 

2008-01-21


DEZ PONTOS SOBRE O MUSEU BERARDO
 

2007-12-17


O NEGÓCIO DO HERMITAGE
 

2007-11-15


ICONOLOGIA OFICIAL
 

2007-10-15


O CASO MNAA OU O SERVILISMO EXEMPLAR
 

A GULBENKIAN, “EM REMODELAÇÃO”

AUGUSTO M. SEABRA

2008-04-17




O discurso ora dominante tende a considerar o Estado como máquina burocrática bloqueante e o sector privado como garantia de dinamismo. Esse é afinal um estereótipo tão ideológico quanto aquela outra concepção, sinalizada à esquerda, que de modo não menos maniqueísta considerava as estruturas públicas como virtuosas e as privadas como perniciosos agentes de inconfessados interesses.

É um facto que a dependência directa do poder político e dos caprichos dos seus sucessivos dirigentes, o peso burocrático e as regras administrativas e contabilísticas da máquina do Estado são factores que continuam a condicionar fortemente as dinâmicas das estruturas culturais públicas em Portugal; é um dado acrescido às razões de fundo que aconselham a preferência, sempre que possível, por estruturas autónomas e até figuras jurídicas de direito privado (ainda que de interesse público), como fundações, mesmo que possam corresponder a parcerias público-privado. Também não deve ser esquecido, contudo, mas quase nunca é assinalado, que em estruturas privadas desse tipo sucede igualmente cristalizar-se um espírito institucional e um peso burocrático também bloqueantes. É isso que sucede com a Fundação Gulbenkian, aquela que durante tantos anos, durante a ditadura, foi afinal o “ministério da Cultura”.

Passadas as comemorações dos 50 anos de fundação, que em tantos aspectos se confundiram com um ritual de refundação, prestes a ocorrer o 25º aniversário da abertura do Centro de Arte Moderna, há que perguntar para onde vai a Gulbenkian, em que estado se encontra e quais as perspectivas. A questão ultrapassa em muito as políticas expositivas e de apoio e preservação das artes visuais, havendo dados mais genéricos que condicionam aquelas. Desde a presidência de Vítor Sá Machado houve uma reorientação estratégica da Gulbenkian, que veio a tomar corpo concreto na presente presidência de Rui Vilar, com vista a aproximar-se do modelo americano de fundação, certamente mais ágil, mas sobretudo de carácter mais supletivo, no sentido preferencial de apoio a iniciativas e dinâmicas exteriores, que não à intervenção directa nos campos artísticos.

Haverá sempre limites a esta aproximação, desde logo estatutários (não é despiciendo recordar que, pelas situações únicas que fizeram com que a Fundação deixada em testamento por Calouste Gulbenkian ficasse sediada em Portugal, ela foi instituída por decreto-lei) mas sobretudo de património, simbólico inclusive, no capital cultural acumulado. Todavia, também a abrupta declaração pública de extinção do Ballet Gulbenkian, em Julho de 2005, foi a confirmação de que os melhores dias passaram. Nessa ocasião, tive de recordar que já três anos antes, precisamente na sequência da eleição de Rui Vilar, e assim da consagração da continuidade da estratégia definida por Sá Machado, havia escrito que com aquela se tinha iniciado “a contagem decrescente para o fim do Serviço de Música [em que o Ballet se integrava] tal como o conhecemos”.

Se olhar para o presente Conselho de Administração, o dado concreto existente, a minha perspectiva para o futuro da Gulbenkian, com base em muito anos de conhecimento da “casa”, é ainda mais reservada para o possível horizonte pós-Vilar: as pressões no sentido de apoio privilegiado a programas educacionais e formativos em vez de iniciativas e estruturas próprias serão, estou em crer, cada vez mais fortes. De resto, as bases nesse sentido de desinvestimento estão criadas, com o Programa Criatividade e Criação Artística e o futuro outro programa de Educação pela Arte – e os respectivos responsáveis, António Pinto Ribeiro e Rui Vieira Nery, são justamente “responsáveis” suficientes para saber o que legitimam (e o que indirectamente deslegitimam).

Como um outro (super-)Ministério de Cultura que a Gulbenkian é (além de outras coisas, nomeadamente de interesses financeiros), os passos de mudança não se fazem sem evidentes contradições e muita, desesperante lentidão. Assim, por exemplo, várias das iniciativas mais interessantes da Plataforma 2 do Fórum “O Estado do Mundo”, no ano transacto, mostraram que o papel da Gulbenkian na apresentação de espectáculos internacionais – de contemporaneidade artística genérica – deveria ainda ser uma questão de actualidade, apesar da presença de companhias de bailado estrangeiras na programação regular ter cessado em 1994 e os Encontros Acarte em 2003. Assim se vêm arrastando questões como a passagem de testemunho na “fundação dentro da fundação”, ou seja, o Serviço de Música, e o futuro do Centro de Arte Moderna.

Quando se tenta uma abordagem da Gulbenkian, suponho que é de ter em conta ambas as questões, em vez de perspectivas exclusivamente sectoriais. E por isso permito-me supor também, mesmo que com perspectiva a prazo reservada, que dois anúncios recentes devem ambos ser considerados: a notícia da compra pela Gulbenkian da última parcela do Parque de Santa Gertrudes que lhe faltava e do consequente futuro alargamento do CAM e o anúncio público de um concurso internacional para apresentação de candidaturas ao cargo de director do Serviço de Música.

Tendo em conta este horizonte de acontecimentos, verifiquem-se no concreto as exposições patentes na Fundação. No Museu, certamente por interesses também estratégicos, mas de todo coerentes com aquele, está “A Educação do Príncipe – Obra-Primas da Colecção do Museu Aga Khan”. Na Sede, há “O gosto ‘à grega’ – Nascimento do neoclassicismo em França, 1750-1755”, exposição que deveria justificar mais interesse, não se desse o caso de também se saber que os discursos mediáticos privilegiam o suposto “novo” ou o “acontecimento” – e, todavia, a exposição, “menor” que seja, assinala um momento da maior importância na invenção do “gosto”, da estética, e de um olhar retrospectivo. No CAM, há a interessante proposta de um artista português emergente, Pedro Cabral Santo, mas o fundamental do espaço está ocupado durante mais de seis meses (seis!) pela primeira, espampanante e substancialmente mal-lograda incursão no novo e prolífero campo da arte cinemática, “Ida e Volta: Ficção e Realidade”. Deste enunciado factual não é difícil de concluir, sem mesmo estar a rememorar os últimos anos, que é fundamentalmente a letargia do Centro de Arte Moderna que está em causa. Mas, ainda assim, voltaria ao edifício da Sede para recordar que no piso inferior a galeria está vedada com a indicação “em remodelação”, óh quanto apropriada à situação da Gulbenkian nos campos expositivos!

Muito do fundamental contributo da Fundação ao longo dos anos tem sido de outro teor, com apoios individuais, nomeadamente a nível de bolsas. Cabe essa vocação também ao Serviço de Belas-Artes, mas não se esgotando este nessas, seria desejável, primeira questão, que a sua vocação e a do CAM fossem claramente definidas. E depois, segunda questão, há propriamente a do CAM. Tem este estado cerceado em anos recentes. Ocorre para mais a situação ambígua de ser dirigido por um artista, Jorge Molder. Ora, por princípio, e até tanto mais porque muito o aprecio como personalidade artística, este é o tipo de situação que creio perniciosa. A todos os títulos a clarificação impõe-se mas, antes do mais, e em vez de simplesmente anunciar uma ampliação, cabe à administração da Gulbenkian esclarecer o que entende ser o Centro, como vai valorizar o seu património e como o vai reforçar enquanto espaço expositivo. Daí que, com o precedente ora criado no Serviço de Música, e que é inteiramente justificado pelo nível de excelência internacional da programação daquele, haja reforçadas razões para secundar o entendimento publicamente expresso por Raquel Henriques da Silva: “Gostaria que o CAM fosse dirigido por alguém que ganhasse um concurso internacional rigorosamente aberto, alguém que possa marcar, que tenha um plano e que seja escolhido em função desse plano através de concurso, pela primeira vez, e contra a tradição da Gulbenkian” (PÚBLICO de 23/12/07). Ou seja, cientes de que o problema não é em si mesmo apenas de director, mas de uma tradição da Gulbenkian que, no que tem de pior, de letargia burocrática, se faz sentir há anos na asfixia de uma valência tão capital como o Centro de Arte Moderna.


Augusto M. Seabra