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[esta é a segunda parte do artigo "Upload: Beuys' Mythology (Who's Afraid of Fat, Felt and Dead Hares?)", as restantes partes podem ser acedidas aqui: Parte 1, Parte 3]

 

 

 

Se os primeiros anos do pós-guerra foram de absoluta devastação para a Alemanha, para os aliados, e em particular para a esquerda americana, foram inicialmente um momento de grande euforia, mas que rapidamente se desvaneceu. A vitória dos aliados parecia então poder unir, contra o fascismo, a estratégia da Frente Popular e o espírito do New Deal, liberais e radicais, os Estados Unidos e a União Soviética: a construção de um «novo mundo» pareceu por instantes possível [1]. No entanto, no final da guerra, os Estados Unidos e a União Soviética podiam igualmente emergir como potências suficientemente fortes para dividir entre si o mundo, dando assim origem à realidade da guerra fria: nesse contexto, de acordo com a política de contenção de Truman, a América promovia o derrube de governos comunistas, enquanto simultaneamente apoiava ditaduras e colonialismos [2]. Isto era inaceitável para a esquerda radical, assim como para muitos liberais [3]. Por outro lado, internamente, os comunistas americanos passaram a ser olhados com desconfiança, e a constituir motivo de desunião entre a esquerda: o resultado foi um breve período marcado por intensa discussão ideológica, mas também por crescente pessimismo e divisão [4]. Simultaneamente, uma onda de greves sem precedentes varria a América[5]. A reação não tardou: em 1946, os republicanos vencem as eleições para o congresso, e os sindicatos são reprimidos [6]. Apesar de os democratas recuperarem o congresso em 1949, o ambiente político americano tinha virado duradouramente à direita.

A esquerda sofreu um grande golpe. No entanto, apesar de uma posição extremamente desfavorável, muitos dos debates e causas provenientes das décadas anteriores puderam ser prosseguidos e aprofundados. Durante a década de cinquenta, o movimento dos direitos civis conhece um grande desenvolvimento, traduzido não só no seu crescimento, como também em importantes vitórias, que culminarão na década de sessenta [7]. O movimento revelou-se muito influente, mostrando as potencialidades de uma organização descentralizada [8]. Por outro lado, tal como mostra Michael Denning em The Cultural Front, o legado cultural da Frente Popular revela-se persistente, formando a base não só do que se chama contracultura como de um certo sentido comunitário e de resistência entre os meios artísticos [9]. A evolução da situação política internacional também exerceu a sua influência, em particular a intensificação da luta contra o colonialismo, as experiências de autogestão na Jugoslávia, e os acontecimentos no bloco soviético, como a denúncia de Stalin por Khrushchev e a revolução húngara, em 1956. Um outro fator foi a influência da Escola de Frankfurt, que durante a guerra se tinha exilado na América. Por fim, no início da década de sessenta, a esquerda reorganiza-se: em 1962, o Port Huron Statement assinala a emergência da New Left [10].

Os artistas americanos, em particular aqueles que associamos ao expressionismo abstrato, não eram apolíticos, integrando-se totalmente no contexto cultural que definiu a Frente Popular: num percurso semelhante à generalidade dos intelectuais americanos, tinham-se distanciado da estética realista do estalinismo ao longo das décadas de trinta e quarenta, mas não viam a sua prática artística como desligada de preocupações políticas; pelo contrário, os debates das décadas de trinta e quarenta procuram uma nova articulação do político [11]. Esses debates não estavam longe daqueles que, num contexto semelhante, eram prosseguidos por Adorno ou Benjamin [12]. Mas, nos anos que se seguiram ao fim da guerra, como vimos, a situação política tinha-se alterado profundamente. Não só já não havia espaço para o otimismo progressista, como qualquer associação com a esquerda motivava, no mínimo, reações de censura [13]. Durante a guerra fria, a arte foi uma das ferramentas utilizadas pela América para afirmar a sua hegemonia [14] – uma arte regida por valores entendidos como distintivamente americanos, como a liberdade e o individualismo, o que se traduziu na institucionalização de um modernismo que corta explicitamente com a dimensão política presente nas expressões mais radicais do modernismo histórico, assim como com a orientação realista da arte soviética [15].

Nesse contexto, no qual as forças conservadoras viam tanto a arte moderna como o comunismo como ameaças, um grupo de sofisticados patronos [16], jovens agentes da CIA [17], e especialistas [18] compreendeu que era possível instrumentalizar politicamente a arte americana: tratava-se de – estratégia então usada com a esquerda em geral – converter o distanciamento em relação a Moscovo, a desunião e a desilusão política dos artistas, no mito de uma arte apolítica, promovida internacionalmente como paradigma da liberdade americana [19]. Mas, se do ponto de vista geoestratégico a ofensiva cultural é um sucesso, o corte com a dimensão política subversiva do modernismo apenas poderia ser provisório ou ilusório [20]. Na verdade, durante a década de cinquenta, a lógica política proveniente dos debates artísticos das décadas anteriores acabou por se aprofundar, fora dos centros institucionais. Um dos veículos desse aprofundamento foi a reativação de elementos do dadaísmo e do surrealismo, transmitida, através de Marcel Duchamp e John Cage, para jovens artistas como Jasper Johns, Robert Rauschenberg, Jim Dine, Claes Oldenburg e Allan Kaprow: a consequência foi a emergência, no final da década de cinquenta, de novas correntes artísticas, como a pop e o minimalismo, e de novas práticas, como o happening, que questionavam o estatuto do objeto artístico e as modalidades de envolvimento subjetivo, tanto do artista como do espetador [21]. Isto resultava, por um lado, da recusa, por parte dos jovens artistas, do discurso oficial da propaganda americana e, por outro, da influência exercida pelas novas movimentações sociais e culturais – os movimentos dos direitos civis e a contracultura – que, mais do que traduzirem-se em termos de fidelidade ideológica, produziam uma profunda reconfiguração da própria subjetividade [22].

Deste ponto de vista, podemos entender a dinâmica da arte americana do pós-guerra como o desenvolvimento – à margem do discurso oficial, que promovia uma imagem fortemente centrada numa subjetividade quase transcendental, animada por uma lógica teleológica – de uma imagem progressivamente descentrada. Imagem, nesse descentramento, simultaneamente sintonizada com o novo entendimento do envolvimento político que se disseminava já à escala mundial, e operando, no plano artístico, a reativação da dimensão política que o discurso oficial tentava neutralizar. Nas suas expressões mais radicais, esta atitude levava a que, contrariando novamente o discurso oficial, a arte prescindisse dos seus próprios limites, apelando à participação ativa do espetador, e fundindo-se com os novos modelos de ativismo, que obedeciam à mesma lógica de descentramento. É o caso, em particular, dos happenings de Allan Kaprow, Jim Dine e Claes Oldenburg [24], mas também de obras de Robert Rauschenberg como a série White Paintings (1951), ou Erased de Kooning Drawing (1953) [25]. Este descentramento, ou dispersão, da subjetividade, visa a libertação de um potencial de criatividade, correspondendo assim, de facto, ao prosseguimento, ou à reativação, de preocupações inerentes à própria arte moderna, que estavam presentes, como já vimos, a partir do início do século dezanove, com a emergência de um novo regime da imagem.

Na Europa, a situação era profundamente diferente, pois o nível de destruição sofrido tinha sido muito grande. No entanto, no caso dos aliados, viveram-se momentos de euforia e esperança muito semelhantes aos que foram vividos na América. O caso da França é particularmente importante, pois trata-se de um país cujas grandes tradições políticas e culturais, apesar dos traumas do colaboracionismo, podiam de alguma maneira emergir em grande parte intactas: em particular a resistência, que tinha lutado duramente durante a ocupação, podia surgir como um vencedor particularmente heroico, e portador de grande autoridade moral [26]. Tirando partido da situação, e de uma tradição artística mais forte que a americana, a arte francesa, que mantinha as sua ligação às vanguardas históricas, produziu, desde meados da década de quarenta, movimentos como o Letrismo, e depois o Situacionismo, ficando assim numa posição muito avançada na produção de novos regimes da imagem [27]. A situação alemã era profundamente diferente. Não só o país estava muito destruído, tendo sido derrotado e ocupado, como as suas elites culturais e intelectuais tinham sido eliminadas, e o acesso ao rico legado cultural das vanguardas da republica de Weimar vedado pelo trauma [28].

 

 

 

Pedro Cabral Santo
Estudou Pintura e Escultura nas Faculdades de Belas-Artes de Lisboa e Porto, especializando-se nas áreas expressivas afetas à instalação e à vídeo-instalação. Em paralelo, nos últimos 20 anos, tem vindo a desenvolver as atividades de artista plástico e comissário de exposições.

Nuno Esteves da Silva
Estudou Pintura, Museologia e Teoria da Arte na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa.
Tem desenvolvido, nos últimos 20 anos, atividades como artista plástico, comissário de exposições, na direção de espaços expositivos, na publicação de revistas de arte, e ainda na área da investigação na teoria da arte. Atualmente termina o doutoramento em Ciências da Arte, na Faculdade de Belas Artes de Lisboa.

 

 

 

:::

 

Notas

[1] Ver Isser Woloch, The Postwar Moment: Progressive Forces in Britain, France, and the United States after World War II (New Haven: Yale University Press, 2019).
[2] Ver Dennis Merrill, «The Truman Doctrine: Containing Communism and Modernity» (Presidential Studies Quarterly, 36: 1 (2006): pp. 27-37).
[3] Ver Perry Anderson, American Foreign Policy and Its Thinkers (London: Verso Books, 2015).
[4] Isser Woloch, The Postwar Moment: Progressive Forces in Britain, France, and the United States after World War II, pp. 354-372.
[5] Ver Art Preis, Labor's Giant Step: Twenty Years of the CIO (New York: Pathfinder, 1964), pp. 257-283.
[6] Ver Art Preis, Labor's Giant Step: Twenty Years of the CIO, pp. 287-300.
[7] Ver Christopher M. Richardson, e Ralph E. Luker, Historical Dictionary of the Civil Rights Movement (Lanham: Rowman & Littlefield, 2014), pp. 8-41.
[8] Ver Christopher W. Schmidt, The Sit-Ins: Protest and Legal Change in the Civil Rights Era (Chicago: The University of Chicago Press, 2018); e Francesca Polletta, «How Participatory Democracy Became White: Culture and Organizational Choice» (Mobilization: An International Quarterly, 10: 2 (2005): pp. 271-288).
[9] Ver Michael Denning, The Cultural Front: The Laboring of American Culture in the Twentieth Century (London: Verso Books, 1997).
[10] Ver Lisa McGirr, «Port Huron and the Origins of the International New Left» (in Richard Flacks, e Nelson Lichtenstein (eds.), The Port Huron Statement Sources and Legacies of the New Left’s Founding Manifesto. Philadelphia: University Of Pennsylvania Press, 2015, pp. 50-64). Sobre a influência da experiência jugoslava de autogestão, assim como da experiência alemã de co-determinação, ver Robert J. S. Ross, «The Democratic Process at Port Huron and After» (in Richard Flacks, e Nelson Lichtenstein (eds.), The Port Huron Statement Sources and Legacies of the New Left’s Founding Manifesto, pp. 127-139).
[11] Ver Serge Guilbaut, How New York Stole the Idea of Modern Art: Abstract Expressionism, Freedom and the Cold War (Chicago: The University of Chicago Press, 1983), pp. 18-41.
[12] Tomando como exemplo o caso de Clement Greenberg, ver Thierry De Duve, Clement Greenberg Between the Lines: Including a Debate with Clement Greenberg (Chicago: The University of Chicago Press, 2010), pp. 39-86.
[13] Ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters (New York: The New Press, 2013), pp. 38-47.
[14] Ver Sarah Miller Harris, The CIA and the Congress for Cultural Freedom in the Early Cold War: The Limits of Making Common Cause (London: Routledge, 2016), pp. 1-14.
[15] Ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters, pp. 212-234.
[16] Entre os quais Nelson Rockefeller e John Hay Whitney: ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters, pp. 216-219.
[17] Como Thomas W. Braden: ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters, pp. 216-219.
[18] Como Alfred H. Barr, ex-director do MOMA, e Porter A. McCray, director do serviço internacional do MOMA: ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters, pp. 223-226.
[19] Ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters, pp. 226-232.
[20] Ver Frances Stonor Saunders, The Cultural Cold War: The CIA and the World of Arts and Letters, pp. 233-234.
[21] Ver Gavin Butt, «America and its Discontents: Art and Politics 1945-1960» (in Amelia Jones (ed.), A Companion to Contemporary Art Since 1945. Malden: Blackwell, 2006, pp. 19-37). Sobre o papel de John Cage neste processo, ver Branden W. Joseph, Experimentations: John Cage in Music, Art, and Architecture (New York: Bloomsbury, 2016).
[22] Ver Gavin Butt, «America and its Discontents: Art and Politics 1945-1960», pp. 20-28.
[23] Ver Gavin Butt, «America and its Discontents: Art and Politics 1945-1960», pp. 28-32.
[24] Ver Gavin Butt, «America and its Discontents: Art and Politics 1945-1960», p. 31.
[25] Ver Gavin Butt, «America and its Discontents: Art and Politics 1945-1960», p. 28; e Branden W. Joseph, Random Order: Robert Rauschenberg and the Neo-Avant-Garde (Cambridge: The MIT Press, 2003), pp. 25-72.
[26] Ver Andrew Knapp (ed.), The Uncertain Foundation: France at the Liberation, 1944–1947 (Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2007).
[27] Ver Éric Brun, «L’Avant-garde Totale: La Forme d’Engagement de l’Internationale Situationniste» (Actes de la Recherche en Sciences Sociales, 176-177 (2009): pp. 32-51).