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EXPOSIÇÕES ATUAIS


Miguel Soares, “Time Zones”, 2003. Animação 3D transferida para DVD, cor, som, 5'28". Música: “Time Zones” (1987) de Negativland


Miguel Soares, “SpaceJunk beta 1.0”, 2001. Animação 3D transferida para DVD, cor, som, 4'42''


Miguel Soares, “Archibunk3r Associates”, 2000. Animação 3D transferida para DVD, cor, som, 7'12". Design de som: Ari de Carvalho. Música: “Ebb” (1999) de Sack & Blumm


Miguel Soares, “Place in Time”, 2005. Animação 3D transferida para DVD, cor, som, 11'30''

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ARQUIVO:


MIGUEL SOARES

Vídeos e Animações 3D 1999-2005




CULTURGEST
Edifício Sede da Caixa Geral de Depósitos, Rua Arco do Cego
1000-300 Lisboa

18 OUT - 04 JAN 2009



“Vídeos e Animações 3D” é o título da nova exposição individual de Miguel Soares (Braga, 1970), mas também a primeira exposição alargada que uma instituição nacional dedica ao seu trabalho. Sob a curadoria de Miguel Wandschneider, a Culturgest apresenta até 4 de Janeiro uma selecção de oito obras do artista, correspondente ao período 1999-2005, e que incluí dois vídeos e seis animações 3D.

Atento aos efeitos sociais de um mundo que se globaliza vertiginosamente, bem como às alterações profundas que se fazem sentir no campo tecnológico e da informação com a introdução do digital, Miguel Soares procurou, desde os seus primeiros trabalhos, reactivar uma perspectiva crítica que respondesse à nova configuração do poder global e às suas tentativas de regular a vida quotidiana. E, se durante a década de 1990, a sua produção ficou marcada pelo uso da fotografia, escultura e instalação, foi na transição para o novo século, que o artista abriu o seu trabalho às possibilidades dos novos media, nomeadamente o vídeo e o computador que, para além de expandirem certas operações introduzidas pelos media analógicos, como o copiar-colar, o adicionar ou o multiplicar de signos, potenciam diferentes modos de percepção humana.

Ora é em torno desta segunda fase do trabalho de Miguel Soares, que a referida exposição se organiza incidindo principalmente nas animações 3D, que, aliás, correspondem à singularidade máxima da sua obra. No entanto, dois vídeos antecipam as animações, “Untitled (Two)” (1999) e “Expecting to Fly” (1999-2001). Ambos registam situações insólitas ocorridas durante a madrugada e, enquanto um diz respeito a um acidente de automóvel chamando a atenção dos transeuntes e de um senhor que fazia jogging, o outro reporta uma discussão entre pessoas seguida de agressões. A música que o artista lhes junta vai produzindo outras narrativas dentro daquelas a que visualmente assistimos. No entanto, e apesar destas irrupções indexativas do real ganharem vários sentidos com a banda sonora, parecem apenas resultar num contraponto formal, já que não se articulam com as animações digitais, trazendo outro discurso.

Dois corredores dão, entretanto, continuidade à exposição, sendo que no primeiro encontramos os trabalhos “Y2K” (1999), “GT” (2001) e “Time Zones” (2003), e no segundo “Place in Time” (2005), “Archinbunk3r Associates” (2000) e “SpaceJunk beta 1.0” (2001). Nesta sequência não cronológica de narrativas ficcionais é então possível identificar um percurso que parte de trabalhos onde a alusão a referências históricas ou culturais é mais recorrente, para chegar a animações onde convergem utopias e hipotéticos futuros de um mundo dominado pela técnica ou a entrar numa fase pós-apocalíptica. Para desenvolver as animações 3D, que aqui se encontram exemplarmente instaladas em salas individuais, o artista recorreu a computadores pessoais, convertendo softwares informáticos de construção de paisagens e de animação de figuras, em ferramentas de trabalho. Neste sentido, estamos perante um processo de produção de imagens que resulta de um sistema relacional numérico combinatório, mas por oposição, e cujo sentido se constitui numa infinita cadeia entre signos.

Mas de que modo Miguel Soares, ao usar o digital e uma linguagem de entretenimento ligada ao jogos de computador, consegue gerar diferença sem reiterar os modelos que as formas de poder atribuem a estes media? Esta parece-me ser a reflexão mais interessante que habita algumas das suas animações e que esta exposição igualmente procura levantar, conduzindo-nos a situações completamente inesperadas e que interrompem o decurso temporal de causa-efeito daquelas. Tal é o caso de “Time Zones” que, ao construir uma extraordinária e complexa narrativa visual para “Escape from Noise”, uma música dos Negativland, cruza diferentes problemáticas como a transformação da comunicação em espectáculo, o uso dos computadores como meio de vigilância e controlo político ou o conflito da guerra fria, num ambiente de talk-show televisivo, onde a estabilidade do directo é perturbada pelo ruído de um telefonema do ouvinte-participante.

“Place in Time” é outro dos trabalhos que importa a este propósito referir. Trata-se da história de um vale que narra 24 épocas distintas (desde os primórdios da vida no planeta à transformação da paisagem em cubos) organizadas em três longas sequências de imagens, perfazendo um total de 11’30’’ de duração, numa estrutura que se aproxima da linguagem cinematográfica. Contudo, a linearidade temporal é aqui posta em causa, dado que assistimos a uma crescente sobreposição de tempos que retornam e se adensam, à medida que uma barata vai reaparecendo e resistindo a todas as ameaças, sejam elas bélicas ou ambientais, de forma espectral. O insecto ocupa então nesta animação o lugar do outro, do ser-qualquer que, ao escapar continuamente dos diferentes processos de totalização do mundo, vai inscrevendo uma subjectividade.

Mas se nestes casos, a convergência de uma multiplicidade de signos visuais e sonoros devolvem a estas ficções animadas um sentido crítico, o mesmo parece não acontecer com “Archinbunk3r Associates”, que se perde apenas numa apresentação de projectos de tecnologia avançada, sem que a música de Sack & Blumm, apesar de conferir uma certa melancolia ao trabalho, consiga inverter a fetichização da técnica que aquele portfolio parece apenas promover.

À saída da exposição é possível ainda assistirmos à projecção de um excerto de “Your Mission is a Failure” (1996), o primeiro trabalho de Miguel Soares baseado em jogos de computador. O vídeo consiste numa compilação de diferentes performances de jogos de guerra gravadas em tempo real, mas que desencadeiam uma série de acções estranhas à lógica desses mesmos jogos, desafiando continuamente os limites dos seus objectivos, à medida que trazem novas possibilidades e realidades à experiência.

“Vídeos e Animações 3D” devolve-nos assim um olhar atento sobre a obra de Miguel Soares, a qual se inscreve num domínio ainda pouco explorado pela produção artística nacional, o da cultura tecnológica, mas que o artista tem sabido desenvolver de forma continuada e crítica.




Sofia Nunes