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EXPOSIÇÕES ATUAIS


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Fondation Cartier pour l’art contemporain


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Fondation Cartier pour l’art contemporain


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Marc Domage


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Fondation Cartier pour l’art contemporain


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Cyril Marcilhacy


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Marc Domage


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Marc Domage


Vista da exposição Olga de Amaral, Fondation Cartier pour l’art contemporain, 2024-2025. © Olga de Amaral / Cortesia Lisson Gallery. Foto: Marc Domage

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ARQUIVO:


OLGA DE AMARAL

OLGA DE AMARAL




FONDATION CARTIER POUR L’ART CONTEMPORAIN
261, Boulevard Raspail
75014 Paris

12 OUT - 16 MAR 2025


 


Olga de Amaral foi a primeira exposição que apontei no roteiro da minha primeira viagem a Paris, ainda sem saber que era a última que o icónico edifício de Jean Nouvel iria albergar: a Fundação Cartier para a Arte Contemporânea despede-se, depois de 30 anos e no âmbito do seu 40º aniversário, do Boulevard Raspail para se mudar para as novas instalações na Praça do Palais Royal, em finais de 2025. Com curadoria de Marie Perennès e design expositivo da arquiteta Lina Ghotmeh, a exposição de despedida dispensa títulos sugestivos para aquela que é a maior retrospectiva do trabalho da artista colombiana na Europa.

Assim que se entra no edifício, está-se perante o dilema já anunciado pela transparência da fachada de vidro: na sala à esquerda, caem grandes e autênticos muros; à direita, elevam-se finíssimas nuvens de cor. Na hesitação, tomei a terceira via: desci a escada em frente para o segundo piso da exposição, sem qualquer antevisão do que poderia encontrar.

Optei bem. Este piso coloca-nos a par da riqueza laboral que é a obra de Olga de Amaral (n. 1932) ao longo de uma carreira de 70 anos (ainda ativa). Dito assim, parece exaustivo; Não o é, e é aqui que a restrospetiva resulta na perfeição: sem ser demasiado informativa e numerosa em obras, foca os principais pontos de uma prática que, sendo extremamente coerente, é de índole experimental, deixando espaço ao observador para vaguear (física e mentalmente) na espiral em que as obras estão organizadas. Estão presentes trabalhos das séries Lienzo Ceremoniales, Nudos, Stratas, Montañas, Fragmentos, Alquimias, Cestas lunares, Umbras - entre outros igualmente dignos de serem nomeados -, culminando em Estelas, obra seminal no percurso de uma artista que é figura de proa da Fiber Art.

Natural de um continente com uma riquíssima tradição e património têxteis, é curioso que Amaral tenha descoberto a tecelagem como expressão artística longe de casa, mais especificamente, no Michigan. Depois de iniciar os seus estudos em arquitetura em Bogotá, Olga partiu para os EUA, em 1954, devido ao instável clima político que crescia na Colômbia. Inscreveu-se na Cranbrook Academy of Arts, uma escola com uma filosofia pedagógica bauhausiana, onde conhece o trabalho de Anni Albers (1899-1994) e estuda as correntes do modernismo europeu sob a orientação da artista finlandesa Marianne Strengell (1909-1998). Apenas permanece lá um ano e meio, o suficiente para ganhar a coragem e o entusiasmo de voltar à sua terra natal para se estabelecer como artista.

Amaral irá assim conjugar a sua aprendizagem formal modernista com o conhecimento do património vernacular da américa latina, integrando técnicas de artesanato e tecelagem indígenas e locais, e uma base limitada de materiais - o algodão, o linho, a lã e a crina de cavalo. No início de carreira, Olga explora o tear e a trama da grelha em peças com entrelaçados intrincados, robustamente texturados e protuberantes, que desejam a tridimensionalidade e se reclamam como organismos vivos autónomos. As suas peças soltam-se da parede e modelam o espaço, suspensas, com uma escala não raras vezes monumental.

À medida que percorremos a exposição, percebemos que Amaral vai refinando o desenho e a matéria da tapeçaria, concentrando-se mais no plano e em como as superfícies, as texturas e os acabamentos transformam o espaço que contêm ou ocupam. O seu vocabulário transforma-se em pequenas unidades retangulares e/ou faixas que, interligadas, criam uma superfície atenta aos mais subtis relevos, rebaixos, dobras, sobreposições, vazios, orientações. A descoberta da pintura como uma forma de expandir as propriedades das fibras é aqui crucial, uma vez que permitiu alterar-lhes a cor, a textura e o peso com total liberdade. Segundo a artista, através da aplicação de finas camadas de gesso, papel japonês, tinta e folha metálica de ouro ou prata, “as peças deixaram de estar restritas aos procedimentos do têxtil, e as ideias enriqueceram pela simultaneidade de diferentes processos”. A exposição leva-nos assim, deliciosamente, nesta descoberta: no decifrar dos materiais, das camadas, dos gestos, do percurso das linhas, dos efeitos lumínicos, das imagens que sugere. O efeito é sempre o de um espanto mudo, e sedutor.

Se conseguirmos despregar os olhos das obras e lermos o livrete que nos guia e situa, percebemos que a pesquisa formal de Amaral está refletida nos títulos das obras: se as primeiras são nomeadas de acordo com o seu método de construção ou constituintes - por exemplo, Entrelazado en naranja y gris “multicolor” (1969) ou Lineas en lino (1968) -, eles passam gradualmente a evocar elementos do meio envolvente ou lugares específicos - Muro en rojos (1982) ou Paisaje de calicanto y rocas (1981). As obras passam de ser auto-referenciais para serem traduções visuais de uma cartografia territorial inspirada na paisagem colombiana, sem deixar de ser um mapeamento espiritual de “sonhos, sentimentos, sensações, emoções, paisagens, ou meditações” com os quais o ser humano, em qualquer parte do mundo, se identifica. A cor tem aqui um papel insubstituível uma vez que é uma linguagem comum a todas as culturas, capaz de oferecer ao espetador diferentes memórias e significados.

A relação com a natureza-mãe está no centro das suas preocupações artísticas e, quando não a representa “figurativamente”, Amaral opta por uma representação metafórica dos elementos naturais. Esta perceptível simbiose é o mote para as duas salas expositivas que ladeiam a entrada. Ver as obras à luz natural e envoltas pelos jardins da fundação - em oposição ao que acontece no piso inferior, onde cintilam numa sala escura -, realça as suas diferenças estruturais e materiais na cumplicidade de se imiscuírem na envolvente. Os grandes muros estão suspensos sobre rochas, de forma a convocar o terreno acidentado das montanhas, os vales e os rios da América do Sul, lugares onde Olga chegou a fotografar as suas tapeçarias numa tentativa de porosidade entre corpo, alma e Terra. Já as Brumas criam uma atmosfera etérea e flutuante, como representações do ar e da água. Uma chuva de fios de algodão pintados cria a ilusão de sólidos evanescentes - astros cadentes, fugazes - em padrões que lembram os da civilização Inca.

É notória a dimensão espiritual que atravessa todo o trabalho de Amaral. Olga sente uma grande afinidade com a cultura, as crenças e a manufatura das civilizações pré-colombianas e das tribos que ainda hoje prevalecem. Profundamente interligado com a habilidade manual na sua capacidade de experimentação e invenção, Olga deseja atingir um estado de puro silêncio e concentração em perfeito equilíbrio com a manufactura, num tipo de inteligência que - antes de ser artificial - é ancestral.

Para uma artista já com 92 anos, Estelas acaba por ser a série que toca (inevitavelmente) o tema da morte da forma mais evidente e sublime. Avaliando um percurso que se iniciou com obras volumosas e encorpadas, as Estelas são estruturas finíssimas, eretas e de contorno irregular, como volumes espremidos, espalmados. As duas faces que as compõem - uma dourada (eternidade) e outra negra (efemeridade) - revelam motivos geométricos em baixo-relevo que parecem conter uma qualquer profecia do universo. Das mais de 70 que constituem a série, o conjunto de 13 que é apresentado simula um lugar sagrado que convida à contemplação e reflexão. A pedra é, para Olga, o símbolo do mistério do mundo, contentor de todas as respostas, elo entre a terra e o céu.

O único senão da exposição é não se poder tocar nas obras e ter a experiência tátil que decerto as completam. (Era recorrente o barulho do alarme quando se trespassava aquela terrível linha invisível que impede a aproximação). As suas obras convidam a sentir a luz nos dedos, no corpo, e um desejo infantil de atravessar ou de nos cobrirmos com aqueles mantos ou véus, jorra em nós: na intenção de provocar-lhes o movimento e, assim, a efemeridade. Olga de Amaral captura a simplicidade poética e injustificável do mundo. A experiência é toda ela refrescante pois nada é intelectualizado ou deseja sê-lo. Somos livres, exatamente como Olga quer que o seu pensamento seja quando cria.

 

 

Cláudia Handem
(n. 1992, Murtosa) Licenciada e mestre em Arquitetura pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, e licenciada em Artes Plásticas - Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Articula a atividade laboral na área da arquitetura e design de interiores, com a prática artística no campo do desenho e da pintura. Escreve, de forma independente, sobre exposições de arte.



CLÃUDIA HANDEM