Objet Perdu
28 JANEIRO - 13 MARÇO Artistas: Anabela Santos, António Contador, Carlos Sousa, Hugues Decointet (fr), Julião Sarmento, Pedro Penilo e Simeon Nelson (uk)
Curadoria: Mario Caeiro
Objet Perdu. A arte que é contemporânea suspeita da relevância dourada que a indústria lhe oferece. Prefere o caminho da imaginação (Marcuse), resistindo à mercantilização da sua processualidade e aferindo o seu valor enquanto estratégia cognitiva. Ela irrompe com um sentido de auto-poiesis que a projecta para a escuridão do futuro. Ela é o território da autosuficiência do dispositivo. SacrifÃcio e perda, esta é a arte que se perde para (não) se encontrar. Na PLATAFORMA REVOLVER, a arte é um campo de encontros, uma linguagem em aberto, uma ideia em construção. A dimensão Ãntima do espaço – uma casa, para todos os efeitos – convidou a uma concepção da exposição radicada na ideia de objecto, da obra de arte – contemporânea, sim –, porém ancorada numa tradição de troca, mágica, implÃcita num circuito simbólico em que conhecimento, poder, posse, partilha, dádiva, compra, comentário, decorrem num ambiente relativamente restrito, familiar, na proximidade de objectos particulares.
Objet Perdu é uma exposição que labora a partir daquela premissa, mas tomando-a como um território contingente, em que um par de referências e hipóteses, deixadas em suspenso – como num aforismo, ou num poema –, colocam cada obra em diálogo não apenas com as outras, com o espaço e a sua identidade, mas ainda com um argumentário acerca da contemporaneidade da arte.
O que parece evidente – embora esta seja uma opinião claramente capaz de suscitar o debate – é que todas as obras têm em comum uma abordagem da arte como possibilidade de superação de âmbitos, modalidades, categorias e linguagens estéticas, num registo particularmente crÃtico e de certa forma distanciado das grandes narrativas, tanto culturais como ideológicas.
Objet perdu. Ao encontro do infinito da arte Objet trouvé. No jargão artÃstico, a expressão evoca uma solução imprevista que culmina uma demanda plástica. É uma súbita manifestação formal da serendipidade de um processo mais ou menos inconsciente. Tal como o achado, ou trouvaille, que define o momento em que matéria e discurso, artista e público encontram um ponto de cesura que inscreve uma situação nova no fluxo quotidiano. Na sua imediaticidade, o termo não deixa porém de pressupor a possibilidade de a arte ser um processo de achamento. E aà é um argumento, ou até um programa, acerca de como a arte surge, se configura e se institui. Ou seja, até que ponto nos basta ficarmo-nos pelos encontros da arte tal como definidos pela icónica imagem do objet trouvé? Será que uma revisão do conceito aponta uma possibilidade de superação do próprio estatuto da arte na contemporaneidade?
Desde a deriva conceptual que o que mais importa na arte não são os objectos que o imaginário da história vai consagrando, sob a forma de espectros retinianos, mas sim a sua artisticidade, uma qualidade de artefacto e de produção artÃsticos que exige a compreensão simultânea da complexidade da sua contingência e processualidade. Os objectos de arte interessam como formas discursivas – o discurso é ‘fala intencional’ – que reconfiguram, através de signos, proposições, a matéria humana e social que é o seu referente inevitável. Parece-me aliás que a missão da arte, o seu desÃgnio cultural e civilizacional, aparece cada vez mais como uma ideologia de encontro com o mundo que a este se impõe como simultaneidade de impulso vital, labor e instituição, e em que a obra não é coincidente com o objecto.
Na arte, a articulação conceito/objecto, de acordo com determinadas configurações que os artistas propõem, realiza o sortilégio de expandir o carácter confinado que tendemos a associar à representação, à objectificação. Entre a ansiedade mÃstica da criação e o controlo estético do encontro (o dispositivo), a arte é a aparição de um acontecimento cuja operacionalidade é medida pela capacidade de atingir o estatuto de cognição. Importa portanto que a arte assuma o seu carácter de linguagem e surja como ferramenta e como ofÃcio de encontro com o mundo, dispositivo que afirma a sua própria legitimidade.
Objet perdu. Ao reunir este conjunto de artistas e obras num projecto de exposição, tive a intenção de objectivar o que atrás sugiro ser a essência da própria arte contemporânea. Para estabelecer uma situação dialógica, de fruição discursiva entre pares, importava que essa situação, esse acontecimento, sedimentasse, se possÃvel, aspectos de um conceito crÃtico dessa mesma arte contemporânea. A convenção tem inúmeras vantagens sobre a radicalidade, se quisermos, por exemplo, explorar o humor sugerido pelo tÃtulo.
Com efeito, a ideologia dominante na contemporaneidade confere ao objecto um sentido que passa por atribuir à arte um papel especÃfico no/como mercado, na/como indústria cultural, na/como comunicação. Era expectável que a ponte a estabelecer entre as intenções da curadoria e o concreto de uma visita à Plataforma, passasse por apresentar um conjunto de objectos. E que a ideologia da arte se mantivesse imaculada na sua idealidade histórica. Esta era a premissa – a iconoclastia não funciona à s quintas-feiras. Mas não deixa de fazer parte da experiência da contemporaneidade o exigir-se à fruição cultural que o espectador seja convidado a elaborar, a partir do seu próprio entendimento das obras, um argumentário – roubo esta palavra ao Pedro Penilo –, o argumentário crÃtico e construtivo de que as obras se tornam a manifestação. Esse é um âmbito determinante na curadoria contemporânea, o cerne da sua função educacional e formativa.
Assim, quando se me impôs colocar as obras (necessárias para que houvesse exposição) num argumentário persuasivo (necessário para que houvesse comunicação), era minha intenção valorizar nos objectos a expor não a sua inscrição num continuum histórico – o de uma qualquer genealogia estética, nomeadamente face ao objet trouvé –, mas captar, na sincronia, o seu ethos de laboração mimética.
Cabe aqui, nesta aproximação à ideia de contemporaneidade, citar o pensamento de Giorgio Agamben. Em «What is the Contemporary?» [What is an apparatus?, Stanford, 2009], Agamben recorre à imagem do céu estrelado para definir como contemporâneo [aqui o artista] aquele que não se deixa encandear pelos pontos luminosos, mas concentra a sua atenção no escuro do firmamento. Consciente, de acordo com a AstrofÃsica, de que nesse negrume há tantas ou mais luzes, que apenas não são visÃveis porque se afastam mais rapidamente do que a velocidade da luz que emitem, tal artista tem por referente algo que sabe existir mas que por alguma razão os do seu tempo são incapazes de conceber, ou que preferem ignorar: To perceive, in the darkness of the present, this light that strives to reach us but cannot – this is what it means to be contemporary […] to be contemporary is a question of courage, because it means being able not only to firmly fix your gaze on the darkness of the epoch, but also to perceive in this darkness a light that, while directed toward us, infinitely distances itself from us.
A produção cultural e artÃstica surge então portanto como acção mais ou menos relevante na medida em que relativiza os valores do seu tempo e nesse tempo inscreve uma ansiedade única e particular, apontada ao vazio. Segundo Nietzsche [e Barthes], o sentido cultural da relevância, quando olha com ansiedade crÃtica o negro no céu, implica a imediata constatação da irrelevância da proposição do seu saber, uma vez que opera de acordo com valores que a sociedade do seu tempo não é capaz de vislumbrar. Acerca daqueles que são genuinamente contemporâneos, afirma Agamben: They are thus in this sense irrelevant [innatuale]. But precisely because of this condition, precisely through this disconnection and this anachronism, they are more capable than others of perceiving and grasping their own time. Em concreto, e seguindo a lógica de Agamben, o artista tem de desconfiar do reconhecimento para se manter não relevante, mas precisamente irrelevante. Só assim persiste uma voz do futuro e do que vem.
Somos portanto criadores contemporâneos na exacta medida em que soubermos ser ao mesmo tempo, e de acordo com diferentes contextos e situações, relevantes e irrelevantes. É a atenção à emergência desta consciência especÃfica do anacronismo que nos permite traçar de forma dinâmica um percurso e nos define a posição, sempre relativa, perante o nosso tempo. Este excurso sugere que procuro persuadir o leitor acerca da irrelevância de alguns artistas e das suas peças e em particular das que faço conviver numa exposição com o tÃtulo programático de Objet Perdu. De facto, esta minha liberdade poética é uma operação retórica, mais do que filosófica, precisamente porque estabelece uma premissa conversacional – mais convivial que dialéctica – para a própria actividade artÃstica e curatorial. Digo retórica ainda, porque inscrição social, persuasiva, no domÃnio público. Ao explicitar uma metáfora operativa, a mostra supõe uma pretensão aforÃstica que dessacraliza a aura dos objectos de arte e os aborda antes do mais pela evidência dos seus mecanismos cognitivos. A expressão objet perdu encadeia assim a filiação dada-surrealista, o contexto institucional da proposta e o humor do desencontro com a contemporaneidade, no anacronismo de um trocadilho.
Daà que a obra que escolhi de Julião Sarmento, surja hoje, no a posteriori da minha anamnese, como um ‘achado’, um momento epifânico. Ela personifica o carácter da condição artÃstica como contemporaneidade.
Peça variável – 5 intervenientes [1976; Alternativa Zero, 1977] ostenta já o traço caracterÃstico da encenação do corpo que determinará o cerne da obra futura de Julião. Ela é uma aproximação ao tema do desejo e da sua encenação que caracterizará as suas intervenções de afirmação e maturidade. Se o punctum da obra de Sarmento será essa perspectivação pessoal e fetichista do desejo, a sua longa carreira tem sido uma constante explicitação desse referente em obras que, ao mesmo tempo que nunca deixaram de apontar a um negrume existencial, têm revelando uma simplicidade quase pedagógica dos elementos gráficos, escultóricos, audiovisuais. No contexto da minha abordagem do infinito da arte, a peça é porém particularmente interessante porque é o artista a inscrever a sua identidade através da visão que os outros têm dele. Nela, a multiplicidade dos olhares aprofunda a dimensão performativa de um auto-retrato
caleidoscópico. Enquanto auto-retrato conceptual – autopoiético –, revela uma instrumentalidade do próprio campo da arte, com um sentido que o tempo confirmaria. Peça… é um postulado que alia o exercÃcio existencial a uma estratégia cognitiva de achamento de uma função para a arte.
Nas páginas do catálogo da exposição-programa de Ernesto de Sousa, esta era uma das intervenções que de forma mais eficaz se apropriava de um tempo coevo para o reconfigurar na instrumentalidade artÃstica. Perante a actual deriva contextual e relacional da Arte Contemporânea, esse sentido já histórico da peça – a sua contemporaneidade – parece-me por demais evidente.
Ainda que o despojamento formal de Julião Sarmento aparente nada ter a ver com a dimensão ornamental de um trabalho que literalmente enche o olho, não é assim tão diversa a investigação de Simeon Nelson. Uma peça como Cryptosphere (Mapping Paradise) [2008] é, tal como a de Sarmento, uma reacção retórica ao constructo social. Ela parte de um desafio de atenção a um fenómeno do foro da História – a monumental colecção de mapas da Royal Geographical Society – para, enquanto exercÃcio de design, relativizar um poderoso património cultural que é uma súmula gráfica da representação do mundo. A criação de Cryptosphere decorreu no âmbito de uma inédita residência artÃstica com a duração de quinze meses naquela instituição, incluindo longo debate com os investigadores da RGS e membros do Institutte of British Geographers. O resultado é a compactação irónica das múltiplas mutações nas perspectivas filosóficas e culturais subjacentes à cartografia ocidental, ao longo de um perÃodo de mais de um milénio! Comentando, entre inúmeros outros problemas da representação geográfica do espaço, o absurdo da localização fÃsica de lugares mÃticos – o El Dorado, Utopia, o Inferno –, a peça é em certa medida um anti-objecto que é tão bela quanto inútil – é o artista que o diz – sum of all withheld and hidden information in a given system.
Sustentada pelo exercÃcio do ornamental, do modular, da cientificidade da harmonia, Cryptosphere descarta na sua retórica kairótica todos os elementos supérfluos para contrapor à s veleidades da ciência cartográfica uma modalidade crÃptica do desenho e da própria tradição escultórica. Ao projectar a hipótese de uma validade do ornamento e da própria arte no território exclusivo da cultura cientÃfica, interdisciplinariedades que a alta cultura actual hesita em integrar, Nelson, afinal como Sarmento, também ele dá o seu tiro no escuro cognitivo.
Esta qualidade epistemológica – cujo alcance é a posteridade que confirma –, é menos evidente no regime de laboriosa maturação que caracteriza os dois artistas mais jovens nesta mostra, Anabela Santos e Carlos Sousa. Isso poderá dever-se à manifesta discrição com que ambos empreendem os seus projectos, em consciência de que o seu encontro com a sua própria obra pode ainda não estar completamente consumado. Mas quero crer que isso se deve antes do mais ao facto de que muito cedo interiorizaram uma convicção acerca dos respectivos processos de produção. Aparentemente, a opção por uma paleta de operações extremamente reduzida não contribui para a diversidade plástica; mas se o que procuram é o encontro sempre renovado com a sua techne, que em ambos os casos decorre como acto mágico, performativo, total, inscrito com perseverança nos respectivos quotidianos, essa redução formal é simultaneamente um aprofundar do alcance de uma convicção estética que não abdica da eventualidade de uma metafÃsica do artifÃcio.
Por outro lado, parece evidente que, para os artistas da geração de Carlos e Anabela, a histórica perda da tradicional qualidade objectual da arte – base da operação iconoclasta duchampiana – não chega a implicar um trauma (um facto psicológico que subsiste em traços subtilmente elegÃacos no trabalho tanto de Sarmento como de Nelson). Na materialidade da acção daqueles dois jovens artistas deve procurar-se portanto, antes do mais, o despojamento autoral. Na consciência da irrelevância do seu gesto, esta é uma oposição que torna tanto um como o outro dos mais anónimos intervenientes no mercado; e as suas obras resÃduos – mais do que restos, mas menos do que objectos.
Nestes termos, talvez os discos de António Contador os jornais de Pedro Penilo surjam mais enfáticos a comentar o perdu da metáfora curatorial.
As memórias afectivas da Praia da Rocha são despojos de um real definitivamente perdido, cuja dimensão polÃtica é exponenciada pela atenção poética ao referente humano. Na intimidade do espaço de exposição, funcionam como exercÃcios sociológicos, cujo objecto de investigação é um real definido como palco de tensões sócio-culturais. Estabelecendo uma continuidade evidente com a arte pública, estas intervenções de câmara reflectem a consciência de como no mundo há constantemente algo que se perde (os objectos da nossa nostalgia) e algo que se encontra (a obra de arte como inscrição emancipada). Aqui a consciência inscreve-se como mecanismo de comunicação, no território eminentemente mental – e abstracto – da linguagem polÃtica. Contador expõe com maior regularidade há pouco tempo, e talvez por isso me ocorram estas palavras de Alberto Carneiro, ainda na AZ: Deita-te no silêncio do teu dia e pensa que a vida é mais importante que toda a arte-para-burguês-fruir e terás então a tua própria arte, uma arte para a tua acção.
Em suma, se em Praia da Rocha a musicalidade do espÃrito nos leva ao encontro do objecto perdido da paisagem turÃstica algarvia, destruÃda pela voragem urbanÃstica, ela impõe-se sobretudo como composição contrapontÃstica – um hit? –, em que a concatenação de escritas e vozes de diferentes tempos sugere a importância micro-polÃtica da memória.
Também Pedro Penilo propõe uma reflexão crÃtica acerca da alienação. anunciação, afeganistão é um manifesto gráfico que denuncia a neutralidade dos media, apresentados como maquinação de uma distância dramática que se interpõe entre o real como entendimento do mundo e o mesmo mundo reduzido a um jogo de obscuridades e manipulação. Apresentando-se como a reinvenção quotidiana do ciclo dos signos e dos sÃmbolos, a peça pressupõe a fé do artista na cadeia de comunicação, ainda que a consciência da justeza da luta não o impeça de permanecer no território de irrelevância que a arte lhe assegura.
O carácter artesanal da instalação confirma uma posição que projecta o activismo na outridade do ofÃcio artÃstico e já não na busca ilusória das vitórias meramente mediáticas que o tardo-capitalismo cinicamente concede. Em Penilo, mas também em Contador, a diferença constrói-se num distanciamento face ao mainstream e à sua ideologia. Mas o que distingue o seu trabalho, voz activa na distribuição do sensÃvel, é um pathos do afecto.
Finalmente, regresso a Agamben para comentar a instalação de Hugues Decointet. O que pode interessar na arte contemporânea contemporânea é a sua capacidade de citar o que no passado e no distante tem condições para encontrar voz e forma num discurso autocrÃtico. O que importa é a arte recriar constantemente genealogias, olhos postos no infinito do seu referente. No seu exigente programa de desconstrução da linguagem audiovisual, de que Screen Paintings é um momento feliz, Decointet problematiza em termos arqueológicos os contornos da imagem. Numa era de acumulação exponencial de capital tecnológico e simbólico, face ao excesso de imagens da indústria visual, o seu é aqui um achamento da própria pintura – mas também da literatura, do cinema e da instalação. Por isso o reencontro com um gesto arcaico – o pintar – na paradoxal impureza de um dispositivo imersivo que acumula meios.
Nada surpreendentemente, também nesta peça a serendipidade fez das suas. Apercebi-me, já depois de seleccionada – aliás já durante a revisão deste texto… –, que os versos de Baudelaire que surgem nos écrans são de um premonitório poema que anunciava, 25 anos antes da sua invenção, o cinema! Confirmava-se, in extremis, o sentido desta obra na exposição. Ela representa o território da luz. Numa mostra que é no essencial, e propositadamente, de objectos inanimados, ela é um cabinet apontado à intemporalidade sedutora do movimento.
Mário Caeiro, Docente na Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha
Objet Perdu. The art which is truly contemporary is suspicious of the glittering aura that the industry assigns it. Preferring the path of imagination (Marcuse), this art resists the commodification of its processuality and finds its value in cognition. A sense of auto-poesis projects it into the darkness
of the future. It is the territory of the self-sufficiency of the device. Sacrifice and loss; this is the art that loses itself in order to find itself. Objet Perdu. Encountering art’s infinity Objet trouvé. In art vernacular this expression evokes unexpected solutions to an artist’s
search, a sudden serendipitous manifestation of a more or less unconscious process. Like
the trouvaille, which defines the moment in which matter and discourse, artist and public
meet in a stasis, inscribing a new situation in the flux of the everyday, the term also
presuposes the possibility of art being a process of achamento [stumbling upon]. It may
become an argument, eventually a programme, setting out how art emerges, configures
and institutes itself. But until what point shall we adhere to an art defined by the iconic
image of the objet trouvé? Is there a possibility that a reconsideration of the concept will
open up a path for the surpassing of what art is normally considered to be?
Since the conceptual derive, what matters most in art is not the objects that history keeps
consecrating, in the form of retinal spectres, but their artisticity, a quality of artifact and
artistic production that demands the simultaneous understanding of its contingency and
processuality. Art objects become interesting discursive forms (discourse being
‘intentional speech’) – when art objects by means of propositions reconfigure the human
and social. It seems to me that the mission of art, its cultural and civilizational aim, appears
more and more as an ideology of encounter with the world, imposing itself upon that
world simultaneously as vital impulse, labour and as an institution. In art then, the
“work †does not coincide with the “object â€.
In art, the articulation of concept/object, according to certain configurations realizes the
sortilege of expanding the confined character we tend to associate with representation and
objectification. Between the mystical anxiety of creation and aesthetic control (the device),
art is the continuous apparition of an event whose instrumentality is measured by the
capacity to attain the status of cognition. Art shall assume its character of language and
appear as tool and craft of encounter with the world, a device which affirms its own
legitimacy.
Objet perdu. In gathering this set of artists and their works in an exhibition, I intended to
objectify what I previously suggested was the essence of contemporary art. In order to
establish a dialogical situation, a discursive fruition among peers, it was important that this
event precipitated, if possible a self-reflexive attitude to the very concept of Contemporary
Art. In this context, convention is to be preferred to radicality for several reasons. One
being an opportunity to explore the humour suggested by the title and resist the dominant
ideology of contemporaneity, one that confers attributes of a specific role as in ‘the
market’, or the ‘cultural industry’ or as ‘communication’.
It was expected that the bridge between the intentions of the curatorship, the objects in the
exhibition and the ideology of art would be kept immaculate in its historical ideal. This
was the premise – iconoclasm doesn’t work on Thursdays [in Lisbon, openings are on
Thursday]. But it is still part of the experience of contemporaneity, to demand from
cultural consumption, that the spectator is invited to elaborate, to develop his/her own
understanding, refining the critical and constructive toolkit manifest in the work. This is a
determinant framework of contemporary curatorship, the core of its educational and
formative function. So, when it was time to assemble the works in a persuasive
arrangement, my intention was to first attribute value to the objects not by means of their
prescribed role in a historical continuum – such of any aesthetical genealogy, namely of
the objet trouvé – but to capture, in synchrony, its ethos of production.
In this approximation of the idea of Contemporaneity, I quote Giorgio Agamben. In
What is the Contemporary?, he uses the image of the starry sky to define as contemporary
[here, the artist] those who aren’t blinded by the luminous points, but focus their attention
toward the darkness of the firmament.
Aware, according to astrophysics, that in this darkness there are just as many lights and
more, which aren’t visible just because they drift away faster than the light they emit, such
an artist’s referent is something which for him is there but for others remains impossible
to conceive and is therefore ignored: To perceive, in the darkness of the present, this light
that strives to reach us but cannot – this is what it means to be contemporary […] to be
contemporary is a question of courage, because it means being able not only to firmly fix
your gaze on the darkness of the epoch, but also to perceive in this darkness a light that,
while directed toward us, infinitely distances itself from us.
Cultural and artistic production appears thus as a more or less relevant action in relation
to the values of its time and inscribes in its time a unique and particular sensitivity, pointed
to the void.
According to Nietzsche (and Barthes), the cultural sense of relevance, when looking with
critical anxiety toward the sky, implies the immediate assessment of the irrelevance of the
proposition of its knowledge, since it operates in accordance to values which the society of
its own time aren’t capable of foreseeing.
About those who are genuine contemporaries, says Agamben: They are thus in this sense
irrelevant [inattuale]. But precisely because of this condition, precisely through this
disconnection and this anachronism, they are more capable than others of perceiving and
grasping their own time. Following the logic of Agamben, the artist must be suspicious of
recognition in order to keep himself precisely irrelevant. Only then does he speak with a
voice of the future and of what is to come.
We are thus contemporary creators in that we manage to be at the same time relevant and
irrelevant. It is the attention to the emergence of this specific awareness of anachronism
that allows us to trace a dynamic path and define our relative position in our time. This
diversion suggests that I am persuading the reader of the irrelevancy of some artists and
their pieces and in particular of those which I put in dialogue in an exhibition with the
programmatic title Objet Perdu.
In fact, this poetic recreation is a rhetorical operation, more than a philosophical one. By
establishing this conversational premise for the artistic and curatorial practice, it becomes
more of a convivial rather than a dialectical conversation. I say rhetorical since it is a
persuasive inscription of the social in the public discourse. Making explicit an operative
metaphor, Objet Perdu presupposes an aphoristic intention that desanctifies the aura of
the objets d’art and approaches them with a quest for evidence of their cognitive
mechanisms. The expression objet perdu links the Dada-Surrealistic filiation with the
institutional frame of the proposal and the humour of the non-encounter with
contemporaneity, in an anachronism.
This is why the seminal work in this exhibition is by Julião Sarmento. It is the a posteriori
of my anamnesis, as a trouvaille, an epiphanic moment. It personifies the character of
artistic condition in contemporaneity. Peça variável – 5 intervenientes [1976] presents the
characteristic trait of the mise en scène that was to shape the future work of Sarmento –
the elaboration of the theme of desire, that characterizes his more evolved and mature
interventions. If the punctum of Sarmento’s work is this personal and fetishist perspective
on desire, his long career has been a constant exploration and elucidation of this referent
in works which, while keep pointing to an existential penumbra that continues to display
an almost pedagogical simplicity of graphical, sculptural and audiovisual elements. In the
context of my approach to the infinity of art, this Peça variável – 5 intervenientes is
interesting because the artist derives his identity through the vision others have of him. In
it, the multiplicity of views deepen the performative dimension of a kaleidoscopic selfportrait.
As a conceptual – and autopoetic – self-portrait, the work reveals an instrumentality toward art, with a sense time would confirm. Peça... is a postulate which
allies the existential exercise and a cognitive strategy of stumbling upon a function for art.
In 1977, in Alternativa Zero, the statement-show by Ernesto de Sousa, this was one of the
interventions which appropriated a coeval time in order to reconfigure artistic
instrumentality. In the face of today’s contextual and relational shift in contemporary art,
the historical sense of the piece – it’s contemporaneity – seems evident enough.
Though Julião Sarmento’s formal economy does not seems to be related to the
ornamental dimension of a work which literally fills the eye, it is not so different to
Simeon Nelson’s praxis. Cryptosphere [2008-2010], like Sarmento’s, is a rhetorical
reaction to the social constructo. It departs from an examination of an historical asset –
the monumental collection of early modern maps of the Royal Geographical Society as a
design exercise – to comment on a logocentric cultural heritage which constitutes the
graphical sum of world representation. The production of Cryptosphere resulted from an
artistic residency lasting fifteen months in the RGS and involving extensive debate and
discourse with RGS resident scholars. The result is the ironic compaction of philosophical
and cultural mutations inherent in Western cartography during a period of more than a
thousand years. It is a commentary on problems of the representation of space, for
instance the absurd localization of mythical places – El Dorado, Eden, Utopia and Hell.
The piece is to a certain extent an anti-object, the sum of all withheld and hidden
information in a given system.
By operating in the domain of the ornamental, the modular and a scientific beauty,
Cryptosphere rejects in its kairotic5 rhetorics any superfluous elements, in order to
counterpose the vanity of cartography with a cryptic modality of drawing and the
conventions of Western sculpture. Arguing for the validity of ornament (filtered out by
minimalism) and the entitlements of art in the exclusive territory of science, it engages
withand empowers an interdisciplinarity which high culture hesitates to accept. Nelson’s
cognition, just as Sarmento’s, is a shot into the darkness…
This epistemological quality – the scope of which belongs to posterity to confirm – is less
evident in the regime of crafted maturation which characterizes the two younger artists in
this show, Anabela Santos and Carlos Sousa. This may come from the manifest discretion
with which both carry out their projects, knowing their encounter with their oeuvre is
possibly yet to be completely consumated. But I want to believe that this is mainly related
to the fact that very early they internalised a certainty concerning their respective
production processes. Apparently, the option for an extremely reduced palette of
operations should not contribute to plastic diversity; but as what they seek is the quotidien
encounter with their techne, an act of magical, performative, total nature (Gesamtnatur),
then this formal reduction is at the same time a deepening of the range of an aesthetic
conviction which doesn’t discard the possibility of a metaphysics of the artifice.
On the other hand, it seems clear that, for the artists of Carlos and Anabela’s generation,
the historical loss of the traditional object quality of art – base of the Duchampian
iconoclasm – does not imply a trauma – a psychological trace which tints Nelson’s and
Sarmento’s work with a subtle elegiac taste. In the materiality of those two young artists,
one finds an authorial humility. Conscious of the irrelevancy of their gesture, this is an
opposition that turns them into some of the most anonymous intervenients in the market;
and their work’s residues become more than debris, but less than object.
In these terms maybe the 45rpm singles of António Contador and the newspapers of
Pedro Penilo may appear more emphatically as comments upon the perdu of the
curatorial metaphor.
The affective memories of Praia da Rocha [Algarve, Portugal] are debris of a lost reality.
Its political dimension is thus highlighted by the poetic attention to the human referent. In
the intimacy of the exhibition space, the works are sociological exercises, whose subject is
socio-economic tensions. Establishing a continuum with public art, these chamber scaled
interventions reflect the conscience that in the world always something is lost (the objects
of our nostalgia) and something is found (art as emancipated inscription). Here,
conscience is registered as a communication device, in the mental – and abstract –
territory of political language.
If in Praia da Rocha the musicality of the spirit takes you to encounter the lost object of
the Algarve touristic landscape, destroyed by urbanistic violence, the work puts forward a
contrapuntal composition – a hit? – in which the concatenation of writings and voices
from different times suggests the relevance of a micro-politics of memory.
Also Pedro Penilo proposes a critical reflection on alienation. Anunciação, Afeganistão is
a graphical manifesto that denounces the neutrality of the media, presented as
machinations of a dramatic distance interposed between the real (as the understanding of
the world) and this same world reduced to a game of obscurities and manipulation. The
work is the everyday reinvention of the cycle of signs and symbols, depicting the faith of
the artist in the communication chain, though the awareness that the righteousness of the
fight does not stop him remaining in the irrelevance that is assigned to him by art.
The artisanal character of the installation confirms a position which projects activism in
the otherness of the artistic craft and not anymore in the illusory media victories that latecapitalism
cynically concedes. For Penilo, as for Contador, the difference is constructed
by a distance from the mainstream and its ideology. However what particularly
distinguishes their work is a sensitive voice in that aspect of the sensible (Rancière) which
is a pathos of affection.
In conclusion I return to Agamben with a comment on Hugues Decointet’s installation
and the interest in a contemporary art which is contemporary in its capacity to critically
quote the past, near and distant. There is an importance and a value in work capable of
reconstructing genealogies, eyes fixed in the infinite of the referent. In his demanding
deconstruction of audiovisual language, of which Screen Paintings is a good example,
Decointet problematizes the countours of image in archeological terms. In a time of
exponential accumulation of images in visual industry, his work is an occasion for
stumbling upon painting, literature, cinema and installation. His ‘painting’ is a vehicle for
paradoxical impurety, a contraption of means within a device.
Not surprisingly, serendipity played a role in this piece. I noticed, already during the
revision of this essay, that the verses of Baudelaire which appear in the screen are from a
prescient poem that announced cinema, twenty five years before its invention! It
confirmed then, in extremis, the role of this work in the exhibition. In an exhibiton
comprised essentially of inanimate objects, this cabinet points to the seductive
intemporality of movement.
Mário Caeiro
Lisbon, January 28th, 2010.
A Plataforma Revólver é uma associação privada, independente e não comercial, para a promoção da arte contemporânea.
A Plataforma Revólver construiu um espaço activo para o público de Lisboa, plataforma de novas ideias acerca da arte contemporânea; Produz exposições temporárias, oferecendo a possibilidade aos artistas plásticos para poderem apresentar e discutir os seus trabalhos, colmatando, deste modo, um dos problemas fundamentais com que se debatem os novos criadores: a dificuldade em encontrar um lugar a partir do qual se façam conhecer, expressando-se e, simultâneamente, receber o contacto com o público – vital para que os seus projectos evoluam - submetendo-se ao seu olhar, olhar esse que poderá ser absolutamente crÃtico ou complacente. Apesar do foco ser a arte que os mais jovens actualmente fazem, o programa da Plataforma Revólver também inclui artistas bem-conhecidos, estabelecidos.
A Plataforma Revólver apoia e estimula a criação de arte contemporânea, em concordancia com o caracter da pratica artistica nos dias de hoje, integrando as exposições varios meios e metodos de produção. A composição das exposições é ditada, por um lado, por um comissariado exterior à direcção do espaço, por outro, pela preocupação com a arte contemporânea e onde a arte assume um papel no desenvolvimento da cultura cÃvica e do pluralismo. Dizer que a obra de arte faz parte da cultura é uma coisa um pouco escolar e artificial. A obra de arte faz parte do real e é destino, realização, salvação e vida.
(Sophia de Mello Breyner)