Samira Abassy, Matrimony, mixed media, 14 x 10 cm, 2010


Arahmaiani, Don’t Want to Be Part of your Legend, vídeo, 12’, 2004


Marc Bijl, Burning Peace, instalation (metal, gasoline), variable dim., 2005


Cecília Costa, Os Deuses Usam Lingerie, Cabelo, dim. variáveis, 2004


Agathe de Bailliencourt, Non-échangeable 1, tinta e acrílico sobre papel , 2008


Nezaket Ekici, Blind, vídeo, 2007. Photo: Andreas Dammertz


Matthias Herrmann, The Cum Pieces, Fotografia, dim. variáveis’, 1994-5


Gregg Lefevre, Casal, Tinta de Arquivo sobre Papel de Arquivo, 61 x 94cm, 2006


Zac Ové, A land so far, instalação vídeo, 2009


K P Reji, Door Shoping, Óleo sobre tela, 213 x152 cm, 2009


Isabel Ribeiro, Embed, óleo sobre tela, 2010


Jinoos Taghizadeh, Goodnight, vídeo, 2009

Exposições anteriores:

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Tough Love - uma série de promessas




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De Heróis está o Inferno cheio (Piso 1) / If I Can't Dance, I Don't Want to be Part of your Revolution (Piso 3)




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Colectivo [Kameraphoto] (Piso 1) | VOYAGER (Piso 3)




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Tough Love - uma série de promessas


Samira Abbassy, Arahmaiani, Marc Bijl, Cecília Costa, Agathe de Bailliencourt, Nezaket Ekici, Mathias Herrmann, Gregg Lefevre, Zak Ové, K P Rej, Isabel Ribeiro e Jinoos Taghizadeh


 


Curadoria Shaheen Merali


Curadora Assistente Noor Veiga


 


A noção de linhagem intelectual no campo cultural é muitas vezes usada para definir o paradigma e os princípios de conhecimento aceitável – estes concordantes princípios e ideias estão firmados como valores aceitáveis, tornando-se a referência central dos tempos da sua formação; uma forma de dirigir interesses correlacionados. Em muitos pontos, os princípios de linhagem intelectual são semelhantes à propriedade intelectual, ambos actuando primacialmente como um mecanismo de vigilância e tendo uma intenção e um processo que possibilitam o engrandecimento da reputação (do seu produtor/inventor e da ideia/conhecimento). Na produção de conhecimento, a noção de intelectual torna-se uma propriedade olhada pela sua criatividade e medida pela sua capacidade de atrair o olhar a valores preservados pela «alta» (significado) cultura sistematizada – vagarosa mas fascinantemente amalgamada com uma série de outros valores propagados. As óbvias ramificações deste olhar são uma forma de confirmar – o que é intelectual e o que se torna propriedade – um conjunto de ideias que podem ser vistas como um dos meios que a sociedade tem de organizar a sua identidade – escolhendo o que se deve aceitar e recordar e, na mesma acção abrupta, evidenciando o que não deve ser recordado.


Este sentido do olhar é, naturalmente, guiado e protegido por super estruturas intelectuais, incluindo academias, instituições, organismos governamentais e think-tanks – grupos muitas vezes auto-regulados e baseados em ideais de estima «colectiva» ou de energias civilizacionais – a forja destas histórias e a decisão de construir podem ser interpretadas como criando narrativas e valores nacionais. Quando se procura entender a rubrica de «Belas Artes», emerge um conjunto de valores semelhante a um quadro de crenças sobre o amor. É um sistema ilógico de pensamento e de percepção que tem gradualmente alcançado um rationale que pode ser lido e desempenhado a partir de todas as implícitas leituras possíveis. A relação entre arte e amor tem sido uma emaranhada e misteriosa implosão que mitiga e alude através de uma série de observações que vêm «num olhar».


O conjunto proposto de trabalhos dentro do campo de Tough Love irá explorar o uso da arte em fornecer complementos exteriores para a noção de amor – uma jornada pessoal efémera composta por outras emoções mais provocatórias, incluindo o ódio, o desejo, a inveja e o destino. Dirigindo-se a este campo emocional do comportamento humano, esta pequena mas pensada exposição e respectivas actividades performativas terão uma curadoria que vai permitir uma explanação artística do que sentimos dentro da esfera emocional. Uma universalidade cheia de objectivos expressivos, cruzando o pessoal e o societário, e procurando construir espaços e formas de lugares e de traços do próprio.


Os artistas seleccionados transportam para a exposição uma poética polémica do sofrimento, da dor e da alegria e esquecem o que sustenta e o que é material, nunca respondendo ao que cada um sente e que é tão importante como a própria vida.


Shaheen Merali


 


SHAHEEN MERALI ENTREVISTADO POR NOOR VEIGA


NV: Tough Love – uma série de promessas é a tua primeira exposição como curador em Portugal. Este projecto é uma iniciativa de Victor Pinto da Fonseca, o galerista que referiu,em 2006, «a importância de atrair a periferia»1, de dar visibilidade às comunidades negras e asiáticas como forma de alterar o panorama artístico em Portugal. A próxima década vai ser muito importante no domínio do multiculturalismo. A exposição Tough Love insere-se neste desafio? Recordo-me que, no início, propus que desenvolvesses uma proposta asiática para o espaço. Quais eram as tuas ambições em relação ao próprio desenvolvimento deste projecto? Porquê uma dimensão global em vez de uma dimensão continental?


SM: Parece que fomos todos, a um determinado momento, enquadrados pelas nossas periferias. Classe, gosto, sexualidade, idade, ocupação profissional, (in)capacidade, até mesmo em relação a significantes visuais como tatuagens – o espectro de condições e significantes – é hoje múltiplo. Contudo, no meio desta variedade e multiplicidade permanecem muitas situações que podemos classificar como desiguais e às quais falta dar resposta e prestar atenção. Às portas e nas fronteiras da cultura permanecem forças conservadoras a que esta última não é imune. As últimas décadas têm sido importantes relativamente a todas as liberdades civis existentes e operativas, no sentido de se conseguir que as mesmas fossem reconhecidas, compreendidas e “normalizadas”. Isto é o verdadeiro multiculturalismo em acção, quando um católico e um sique são vistos como pertencendo a uma crença religiosa e não a uma raça ou a uma tradição histórica, ou quando, como já muitos afirmaram, “a cor da tua pele não é mais importante do que a cor dos teus olhos”.


Ao desenvolver uma exposição que fosse, não apenas continental, mas global, quis sublinhar o facto de que a comunidade artística não se encontra dividida, que ela não tem fronteiras e que ela é, do ponto de vista geográfico, múltipla, que o mundo começa a ser pensado como um objecto de análise em si mesmo, e que não se limita a ser encarado na perspectiva do lugar onde uma pessoa nasce.


Actualmente o mundo aparenta ser um local que dominamos – este domínio, porém, merece uma análise mais profunda, já que se encontra num estado de colapso devido aos interesses egoístas das grandes corporações. Dar uma perspectiva mais geral das coisas é tão importante como fornecer uma micro-análise detalhada do nosso próprio bairro. A minha ambição em relação ao projecto Tough Love é examinar pertenças, que tenham sido perseguidas por problemas, pela ambição e pela necessidade de serem escutadas. Um conjunto de observações artísticas que associem posições individuais e reflictam uma negociação dos artistas em relação à sua posição no mundo; um mundo em constante ebulição e num estado de desagregação e reagrupamento gradual, mantido a um custo que talvez seja demasiado caro.


Do amor que desvanece e do amor como uma necessidade, do amor perdido e traído. Da disponibilidade do amor e das suas condições – das condições que o tornaram tão duro. Não me refiro apenas ao amor entre um homem e uma mulher ou entre duas pessoas, mas ao amor que existe entre nós todos e que é parte de nós – que dá corpo à nossa identidade, ao nosso país, às nossas crenças, às nossas expectativas, ao nosso desejo e ao conjunto de promessas que nos acompanham desde que nascemos até ao momento em que morremos.


NV: Quanto ao relacionamento com os artistas, qual foi, em termos conceptuais, a sua abordagem à proposta curatorial?


SM: O objectivo foi seleccionar obras que fossem representativas do conceito por detrás desta exposição, o que aconteceu num contexto de recursos limitados. A isso se fica a dever a ausência de instalações de grande escala ou de trabalhos históricos, e por isso também a inclusão de uma séries de apontamentos mais íntimos e delicados. Muitos das obras inserem-se num quadro de trabalho realizado com a objectiva e estão directamente relacionados com a captura do mundo e da imagem em movimento através da fotografia ou do filme.


As obras têm uma proveniência geográfica variada, desde Trinidade até à Indonésia, muitas têm origem na Europa e são muito diferentes entre si, existindo uma intencionalidade por detrás desta diversidade.


Os artistas foram muito generosos e por vezes mesmo completamente determinados na realização desta exposição, que foi ensombrada pela falta de apoios financeiros das autoridades portuguesas e de patrocinadores, e de certa forma esta determinação transformou-se numa resistência. Uma resistência para não parar o processo de curadoria e fazer esta exposição – experiência que contribuiu para que a mesma fosse definida pelas circunstâncias e condicionamentos.


As obras tiveram de seguir pelo Japão, a partir do Irão, em direcção à Alemanha para chegarem a Portugal ou, em certos casos, tiveram que ser transportadas em mão, de modo a garantir a sua chegada ao destino.


Um conjunto estimulante de desafios que promoveu uma abertura e uma flexibilidade na materialização da ambição de apresentar ao público uma exposição internacional.


NV: Relativamente à tua biografia, que se estende por três continentes e que eu poderia resumir da seguinte forma: nasceste e cresceste na Tanzânia. Ainda criança foste viver para Londres, onde te licenciaste e onde, depois de expores o teu trabalho, deste aulas na Central Saint Martins School of Art and Design, antes de te mudares para Berlim, em 2003, onde foste responsável pela programação e exibição de filmes na House of World Cultures durante cinco anos. Em Berlim as grandes exposições de que foste curador e que atraíram milhares de pessoas incluíram temáticas, como uma reavaliação da beleza (About Beauty, 2005), a relação entre modernidade e escravatura (The Black Atlantic, 2007). Desde então foste co-curador da Bienal de Gwangju em 2006 e, mais recentemente, como curador independente, trabalhaste, entre outros locais, em Bombaim, Pequim, Madrid e Nova Iorque. Crês que as pessoas compreendem a tua visão e a tua forma de apresentar uma exposição? No teu trabalho como curador estabeleces pontes como uma forma de iniciar diálogos entre várias partes do mundo, entre sensibilidades, mesmo entre crenças religiosas e linguagens?


SM: A compreensão do que quer que seja depende do grau de abertura das pessoas e também do que é oferecido ao público. Recordo-me das campanhas da United Colors of Benetton, dos anúncios publicitários dos finais dos anos oitenta e inícios dos noventa. Houve uma grande reacção ao que na altura foi visto como uma falta de gosto, “palha” hiper-realista, um enquadramento inadequado das imagens, uma justaposição de elementos que, a partir da rua, tornavam a vida desagradável, hipócrita e simplesmente horrível. Muito do que então foi dito era verdade e muito permanece ainda em aberto para discussão, mas o facto é que, através de uma marca comerc i a l , foi iniciado um diálogo entre transeuntes/consumidores sobre a sua relação com um conjunto de outros espaços sociais, religiosos e políticos mais alargados. Foi para todos nós uma forma de reconhecer a existência da globalidade e expôs as fronteiras entre o constante nós e eles – quer se tratasse de homens das tribos Masai ou de uma pessoa infectada com HIV/Sida. Nós fomos eles nessa altura e seremos eles amanhã – nada permanece imutável.


A mudança está por todo o lado, ela abunda e talvez seja difícil, mas vamos lá tentar encarar alguns destes factos na sua proximidade e não apenas como se os víssemos na National Geographic ou num panfleto de hospital… No entanto, impõe-se sermos cuidadosos ao encetar um diálogo – não se trata de uma feira de atracções que passa pela nossa cidade uma vez por ano – trata-se da realidade que necessita de ser acarinhada, debatida, de forma adequada e contínua. É por esta razão que é um acto de amor, mas de um amor duro. Tudo sofre, mas o que é que nós estamos a fazer em relação a este sofrimento?


NV: O facto de trabalhares com arte leva-te a crer que a arte possui uma capacidade inata de comunicar? Da minha própria pesquisa sobre “o mundo da arte não ocidental” resulta a conclusão de que existe um forte envolvimento da arte na sociedade, que ela se auto-remete constantemente para tudo aquilo que acontece em seu redor e que é isso que acaba por reflectir. Muitas vezes a arte produzida enuncia questões relacionadas com a política, com as condições sociais das pessoas, com o papel das mulheres na sociedade e com o regime patriarcal, com o passado histórico e com a degradação do meio ambiente. No Ocidente isto não parece ser tão comum. Por que é que achas que é assim? Por que é que a arte pós-moderna é semelhante na forma mas diversa no seu conteúdo?


SM: Uma questão interessante – que se baseia ainda numa polaridade: existe hoje uma multiplicidade e uma sedimentação no mundo da arte – nalguns locais tudo está bem, sete inaugurações de exposições em sete dias numa determinada cidade ou o lançamento de quarenta livros num fim-de-semana; mas quais são as características destes acontecimentos?


Devemos ser cuidadosos relativamente ao nível de produção, aos conteúdos e sua distribuição (para quem e porquê). Na Ásia, concretamente na Índia e na China, existe muito material disponível, mas não no país inteiro, tal como acontece nos EUA ou mesmo na Alemanha. Em certas cidades dos EUA ou da Alemanha, os livros da editora Taschen ou a revista Frieze são completamente desconhecidos. Tendemos a nivelar o mundo de acordo com a sua geografia – o Ocidente e o resto. Isto deixou de ser possível – estamos hoje em constante movimento. Encontreidisponíveis,em Yogyakarta, trabalhos em vídeo, quase desconhecidos, do Chris Cunningham, e filmes da vanguarda japonesa do início dos anos oitenta em Guangzou, na China. Distribuídos por redes de pirataria virtual que copiam e despejam o que está disponível e possa ser vendido num mundo mercantil que satisfaz as suas necessidades a partir de todos os lugares e de todas as culturas.


O mundo actual das tecnologias da comunicação estabelece uma comunhão, permite a participação e talvez esteja mesmo a desenvolver-se uma linguagem da participação. As temáticas entre os espaços do Oriente e do Ocidente parecem estar mais permeadas de generosidade, não ao nível formal das colecções dos museus ou em termos das referências da história da arte, mas seguramente em termos das possibilidades curatoriais em bienais, feiras de arte e nalgumas colecções. O nosso relacionamento com o arquivo global, estrutura tecnológica globalizada, veio permitir o que o mundo conservador da arte tem negado.


NV: Sobre Portugal: Tendo em conta que trabalhaste com uma equipa portuguesa ao longo deste último ano, qual a tua opinião sobre a nossa realidade em termos de curadoria do internacional?


SM: Parece estar a viver a sua infância, o que me parece importante. Não é um projecto terminado de que as pessoas se começam a desligar por considerarem que atingiram o objectivo e por isso estão já a transitar para o próximo ponto da lista nas suas agendas. Nunca, nunca é tarde demais para nada – a possibilidade de mudança depende do coração, da mente e do intelecto para observar a situação e proceder às mudanças que são necessárias. Responder é melhor do que ficar de braços cruzados.


NV: Pareces estar bem informado sobre o mundo da arte em Portugal, os seus artistas e muito empenhado em aprender ainda mais sobre essa realidade. O que pensas em relação ao panorama actual da contemporaneidade portuguesa?


SM: Acho que Portugal tem um potencial incrível, adoro a cidade de Lisboa, e cheguei mesmo a ponderar vir viver para este maravilhoso ambiente arcaico. Lisboa tocou-me, sem me dar conta, apaixonei-me por esta cidade e pela sua envolvência. Por vezes parece parte de um mundo que se apercebe das possibilidades e não das impossibilidades. Admiro as possibilidades e aqueles que buscam o possível e estou farto de arrivistas que, como pulgas, sobem para cima do próximo por motivos egoístas e imorais. Portugal está numa posição excepcional na Europa como possível capital cultural, tem uma população jovem, muito ligada à terra, ao mar e à tradição, à espera da passagem de testemunho das forças conservadoras que se extinguem. E não se trata de uma espera em vão, trata-se de uma possibilidade real.


11 de Agosto de 2010 1-Victor Pinto da Fonseca, visita de estudo com Roger Meintjes ao edifício Transboavista, em 6 de Fevereiro de 2006.


SHAHEEN MERALI INTERVIEWED BY NOOR VEIGA Translated by Afonso Cavaleiro


NV: Tough Love - a series of promises is the first show curated by you in Portugal. The gallery has been an initiative of Victor Pinto da Fonseca, the only gallerist in Portugal who, in 2006, referred to «the importance of attracting from the periphery»1; the black and Asian communities have to be exhibited for the panorama to change. The next decade will be very important one in the domain of multiculturalism. Is Tough Love part of this challenge? I remember in the beginning when I requested that you should develop a proposal from Asia for the space. How and what were your ambitions to develop Tough Love? Why the global dimension instead of the continental dimension?


SM: It seems at some point we have all become framed by our peripheries. Class, taste, sexualities, age, employment, (dis) ability even to the visual signifiers of tattoo or not, the range of states and signifiers are multiple now. But within this multitude and manifold, their remains much that can described as unequal, unresolved and policed. Culture is not exempt from conservative forces that maintain a strong hold on its boundaries and gates. The last few decades have been important for all existing and functioning civil liberties, for them to be recognised, resources, understood and to be ‘normalised’. This is true working multiculturalism where a Catholic and a Sikh are seen as part of belief not race or history, where as many have said ‘the colour of your skin is n more significant then the colour of your eyes’. In developing a global rather then a continental exhibition – I wanted to re-instate the fact that the artistic community is unhinged, unbounded and geographically mixed, that the world is being reflected upon as a subject matter not only ones birthplace.


The world it seems is our domain now- and it is a domain worth examining, as it is also in a state of collapse by corporate and selfish interest. To present a wider picture, is as important as to provide the miniscule detailed analysis of one’s own neighbourhood. The ambition for Tough Love is to examine that belongs but has also been dogged by problems, by ambition and by its need to be heard. A set of artistic observation that bring together individuated positions and negotiations of the artists place in the world; a world constantly in turmoil and gradually disintegrating and re-forming, sustained and maintained at a cost – maybe too high a cost. Of Love dying and love as a necessity, of love lost and love crossed. Of love’s availability and its conditions and the conditions that have made it so tough. Here I do not refer to Love just between a man and a woman or two people but between all and us that constitutes us- our identity, our country, our belief, our expectations, our desire, and our set of full promises from birth to death.


NV: In terms of the relationships to the artists, how was the curatorial concept addressed by the artists?


SM: The works were selected to reflect as much as possible with limited resources for this exhibition. So there is a lack of large-scale installations or historical works but a more intimate, delicate set of notations. Many of the works are lens-based and relate directly at capturing the world through the camera or moving image. The works are geographically spread out, from Trinidad to Indonesia, many from Europe and all very different to each other, deliberately so. The artists have been very generous and at times absolutely resilient in making this exhibition, which has been fraught with a lack of funding from the Portuguese authorities and sponsors, but somehow this resilience developed into a resistance. A resistance to stop the process of curating and making this exhibition – an experience that has allowed it to be defined by its conditions. Works have had to be re-routed out of Iran via Japan to arrive in Germany and finally to Portugal or some things hand carried out of a country to ensure its arrival. An interesting set of challenges, that advocates that one has to be flexible and open, to ensure that the ambition of Internationalism is developed, and offered to the public.


NV: In terms of your biography, which spans three continents – which I might summarise as the following: you were born and grew up in Tanzania, then moved to London at an early age, where after graduation, you exhibited widely and finally taught at Central Saint Martins School of Art and Design, before moving to Berlin in 2003 to be responsible for the exhibition and film programme for the House of World Cultures for five years. In Berlin, the large survey shows you curated attracted thousands of people to subjects including an International re-evaluation of Beauty (About Beauty, 2005) to the relationship between modernity and slavery (The Black Atlantic, 2007). Henceforth, you have co-curated the Gwangju Biennale in 2006 and more recently as a free lance curator have worked in Mumbai, Beijing, Madrid, New York to name a few. Do you think people understand adequately your reading and exhibition making? As a curator you seem to be building bridges, to initiate dialogues between several parts of the world, between sensibilities, even religious beliefs and languages?


SM: The understanding of anything is dependent on how open people are and also what we distribute for the public. I remember the United Benetton Campaign / adverts of the late eighties and early nineties. There was so much reaction to that which was seen as tasteless, higher realistic fodder, inadequate framing of images, juxtaposition that made life on the streets uneasy, hypocritical and just plain awful. Much that was said was true and much still remains open for discussion, but the fact that it opened dialogue for the pedestrian, for the consumer and their relationship through a brand to a larger set of social and political, even religious spaces, was for all of us – a coming to terms with a globality. It exposed the borders between the constant us and them – whether it was Masai tribesmen or a person infected with HIV/Aids. We were them now and we are them tomorrow – nothing remains the same.


Change is all around, all abound and its Tough but hey lets try to start to look at some of these facts in proximity not only on National geography magazines or hospital leaflets. But, one has to be cautious here, in opening up a debate, it is not a fairground that comes around once a year to your neighbourhood – it is reality that needs nourishing, understanding, debating, enduring and adequately responding – that is why it is an act of love, but a tough one. Everything hurts, but what are we doing about this hurt?


NV: In working with art, do you believe art possesses this inane capacity to communicate? In my own research on “non-western art world’, art is much engaged in the society, it refers constantly to what happens around and reflects it. Many times, the art produced debates issues related to politics, the social condition of people, to women’s role and patriarchy in society, the historical past or the degradation of the environment. In the West, it seems, this is not so common. Why do you think this is the case? Why is post-modern art similar in its form and different in its content?


SM: An interesting question – which is still based on a polarity – of two – we now have a multiplicity and a sedimentation in the artworld – where some places all is fine, seven openings on seven days in one city or forty books launched in one weekend, but what are the qualities of these events. We should be careful in terms of the level of production, the contents, its distribution, (to whom and why). In Asia, specifically India and China, so much material is available, as is the case in the USA or even Germany, but not all over the country, in certain cities in the USA or Germany, Taschen books or Frieze magazine would be absolutely an unknown entity. We tend to flatten the world according to its geography - the west and the rest. It is no longer possible to do that – we are now in an absolute flux. I found the most obscure video works by Chris Cunningham in Yogyakarta, readily available and films by Japanese avant-garde filmmakers from the early eighties in Guangzou in China. Distributed by a viral piracy that copies and spews what is available and what can be sold- it’s a commercial world that meets its demands from all spaces and all cultures.


The world of current technology, communications creates a commonality, it allows participation and maybe even a language of participation is developing. Subject matters between the realms of the east and the west itself has become more infused, more generous not formally so in museum collections or in terms of art historical / reference but definitely in terms of the curated possibilities of biennales, artfairs and in some collections. Our relationship to the global archive, globalised technological infrastructure has allowed where conservative art world ahs denied.


NV: On Portugal: Taking into account that you have worked with a Portuguese team throughout this last year, what do you think about the Portuguese reality in terms of curating the international?


SM: It seems to be in its infancy, which I think is important, it is not a finished project, where people start to brush it off, as another thing which they have achieved and are now moving onto the next agenda on its list. Its never, never too late for anything – the possibility of change is dependent on the heart, the mind and the intellect to observe the situation and make adequate changes, to respond is better then to sit on ones hands. You seem to be well informed of the Portuguese artworld, its artists and are very keen to learn more. What do you feel about the current situation of the Portuguese contemporaneity? I feel that Portugal has an incredible potential, I love the city of Lisbon, had even contemplated moving to this beautiful archaic environment. Lisbon hasmoved me, unknowingly I had fallen in love with it and its surrounding. It is low but somehow feels part of a world coming to terms with the possibilities not impossibilities. I am an admirer of the possibilities and seekers of the possible and am tired of fast trackers that like fleas rise and skip onto the next for selfish and immoral reasons. Portugal is in a prime position in Europe as a possible culture capital, a youthful population, closely tied to the land, the sea and to tradition, waiting to inherit from the dying conservative forces – it is not a waiting in vain ether – it is a real possibility.


11th August 2010 1 Victor Pinto da Fonseca, study trip with Roger Meintjes to Transboavista building, 6th February 2006.


TOUGH LOVE, UMA SÉRIE DE PROMESSAS


Shaheen Merali Traduzido por Patrícia Trindade


De que forma valorizamos a arte? E de que forma valorizamos o amor? A condição existente, na qual todos os aspectos da cultura são mediados num Ocidente alargado, baseia-se numa linhagem intelectual, que, mesmo no novo milénio, permanece definida por um sentido de si mesma (contra o resto). A recente campanha de ocupação de forças nacionais no Médio Oriente e na Ásia central constitui o seu maior testemunho. Esta linhagem intelectual do Ocidente, tanto herdada como consentida com base num conjunto de princípios que actuam como uma territorialização paradigmática do que é tido como aceitável e consistente, mantém a sua ideia de conhecimento verdadeiro e do que está dentro ou fora dos seus limites. Este conhecimento, este sentimento de pertença, emergiu de experiências, princípios e ideias dentro de uma protegida visão eurocêntrica do mundo, de uma globalização sustentada. Ora, estes princípios e ideias persistem imersos na cultura e na sociedade como valores específicos e são referências para a validação deste sistema de valores, em termos de potencial para a formalização da produção cultural no processo de fazer história. A consequência adversa para quaisquer estruturas, posições e formações intelectuais que surjam fora do parâmetro eurocêntrico é uma gestão descurada e uma rejeição do seu “mérito”, por favorecer, através da sua crítica, a desconstrução deste domínio protegido e da sua arrogância hierárquica, mesmo estando a trabalhar dentro do domínio europeu.


A consequência deste conjunto de medidas austeras de gestão para a cultura é a continuidade de uma organização europeia conservadora, propiciando uma constante dissolução e fuga de algumas das suas manifestações contemporâneas. Em muitos sentidos é interessante comparar os princípios da linhagem intelectual com a propriedade intelectual. Essencialmente, a última actua como um mecanismo de defesa. Do mesmo modo, ambas possuem tanto uma intenção como um processo que facilita o acréscimo da reputação (do produtor/ inventor da ideia/ conhecimento). Na criação de tal conhecimento, a noção de intelectual é convertida em propriedade, tida pela sua inventividade e avaliada pela sua capacidade de reflectir um conjunto de “altos” valores – incrivelmente, esta aproximação permite a fusão de novos conhecimentos numa biblioteca ou um conjunto de outras prezadas concretizações europeias, subjectividades reconhecidas, ideias, tratados e textos. As ramificações óbvias de tal regulação vêm do facto de esta estar sujeita a um processo de validação e de actuar como espaço de idoneidade – daquilo que é aceitável dentro do domínio intelectual e de como pode entrar sistematicamente num acordo combinado depois da sua validação. Um conjunto sistemático de possíveis sítios e locais de (re)colecção, que incluem museus, arquivos estatais e bibliotecas, permite que estas ideias sejam mantidas e continuem no domínio público. No caso dos rejeitados – muito é deixado às forças policiais que promovem a decadência e a marginalização, instigando o preconceito, o racismo, o patriarcado e a normalização sexual – incluem-se todos os processos que ditam a ausência de diversidade do ser.


Este acordo pode ser visto como um dos meios pelos quais as sociedades organizam as suas identidades conservadoras – um processo sistemático de inclusão e exclusão. Ao escolher o que aceitar e lembrar está-se, na mesma acção, a sublinhar o que esquecer. O seu sentido desenvolve-se na relação com o que fica de fora, com o que é rejeitado. A consideração/desconsideração cultural (dependente do seu lugar) é orientada e protegida pelas estruturas intelectuais que incluem órgãos académicos, instituições formais e informais, quase-O.N.G.s, governo/mentalidades e think-tanks; grupos que são maioritariamente autoregulados e baseados em ideais de “colectivo” emergiram do desejo de civilizar o ‘outro’. Forjar estas futuras histórias através da validação dos órgãos decisores é tido como facilitador do processo de criação de narrativas nacionais e de valores históricos protegidos para possibilitar a instalação de valores societários.


O que é importante nas Belas-Artes? Ao procurar entender a denominação ‘Belas-Artes’ é possível observar outras questões, existências e crenças, incluindo a própria noção de Belas-Artes, que pode ser comparada ao que acreditamos ser a noção de ‘Amor’. Ambas permanecem um produto de uma aprendizagem e pensamento, que, paradoxalmente, pode ser entendido como ilógico e inteiramente baseado em percepções vagas. Ambos os aspectos parecem gradualmente adquirir uma aparência legítima, que pode surgir de uma variedade de possíveis nuances nas leituras e nos sentimentos. A relação entre arte e amor continua entrelaçada, uma ligação misteriosa e implosiva, que mitiga e alude, através de um conjunto de observações que podem ser determinadas por uma aproximação, a um olhar; um olhar assente numa chegada, onde tudo passa a fazer sentido. As obras seleccionadas para Tough Love, subintitulada Uma Série de Promessas, ajudam a explorar a forma como a arte e os artistas pensam, facultando uma série de interjeições para a noção de amor. Dramaticamente, a arte e o amor assentam numa exclamação ou numa promessa, especialmente a que se deixa levar pela sua profanidade, pelos seus efeitos térreos, que se ofuscam pelas codificadas humilhações pessoais. A ligação entre a arte e o amor é uma viagem efémera, pessoalmente conclusiva ou não, que é saciada, na maioria das vezes, por uma série de provocantes emoções, incluindo o ódio, o desejo, o ciúme, a inveja e o sentimento de miséria. Muitas vezes é na sua ligação romantizada – uma miragem da realidade – que nos encontramos reflectidos erroneamente. Nesta exposição, o amor é entendido como um estado básico, através do qual meditamos e passamos o nosso tempo de vida. Como pertencemos, numa procura de formalizar a unificação que nos prova e nos une nesta longa viagem, muitas vezes abrupta e compreensivelmente malograda.


A mostra, Tough Love, Uma Série de Promessas, é definida por um conjunto de explorações de artistas que envolve a análise do amor por uma nação, por um país e pelas suas tradições, pela vida como parte da morte, pela terra e pelos seus méritos ideológicos, pelas ideias e pela razão para a inteligência. Pode encontrar-se nos trabalhos destes artistas a negociação levada a cabo com realidades intrigantes. Ao abordar uma área tão emotiva do comportamento humano, esta pequena, embora estudada, exposição e respectiva publicação foram comissariadas de modo a permitir que estas notas artísticas complementassem a nossa tormenta diária, a nossa condição física e emocional que “sentimos” dentro da nossa fisionomia. O amor, ao que parece, é algo universal, repleto de objectivos expressivos enquanto ziguezagueia entre o pessoal e o societário, numa tentativa de abrir espaços e formas a partir de lugares e impressões egocêntricas. Esta exposição foi comissariada em três secções, que incluem: o Amor Cego (Blinded Love), A Dor Inesquecível (The Unforgettable Pain) e Amor/Memória (Love/Memory). Os artistas seleccionados trazem para a exposição uma poética polémica da mágoa, dor, alegria e negligência, que conserva e delimita, mas nunca responde ao que parece ser tão importante como a vida em si.


O Amor Cego (Blinded Love) Samira Abbassy, Cecília Costa, K. P. Reji e Jinoos Taghizadeh Os artistas deste núcleo lidam com a condição que faz de todos nós doidos e poetas – a total capacidade que o amor tem de nos cegar, de fazer com que os nossos sentidos e sensibilidade fiquem de parte, permitindo que a sensualidade surja enquanto nos apaixonamos. A completa brutalidade do poder do amor e o seu potencial para o abuso nas nossas mutáveis emoções é exposta nestes trabalhos. A cegueira, a sua intensidade que nos força a desejar o isolamento dos sentidos e a procurar respostas sentidas num outro lugar são uma força presente em todos os amantes e em todas as relações. Samira Abbassy é uma artista residente em Nova Iorque, criando severos trabalhos sobre os efeitos da guerra no Médio Oriente no nosso globo, que agora revolve em torno de um sol, afectado e saturado pelo medo e pela obscuridade.


Nos últimos meses tem vindo a criar o que chama de ‘objectos escultura’, uma mescla do estudo do figurativo, concretizado para sugerir uma emoção. Estas formas em miniatura, estáticas e cheias de vida, num movimento histérico e num choro implosivo, representando uma certa teimosia pela dor e remorso, debatem-se, em muitos casos, com questões de género e estão incapacitadas, não por drogas ou álcool, mas pela pura dor do amor. As lutas interiores encontram-se na forma como estes corpos animados se esforçam por sugerir um utrapassar da sua situação, um ultrapassar que subentende a dor ou a resignação com uma separação e um olhar em frente. Cecília Costa vive em Lisboa, onde as suas obras em hibernação se têm afirmado desde há muito. É tanto trabalho como afirmação; um modus operandi muito pessoal que explora o mito de Penélope, mito que, tal como em outros artistas presentes na exposição, é contestado e recontextualizado para que o seu lugar no nosso imaginário permaneça, de forma a potencialmente resolver questões de género. Costa usa o seu mais sensual elemento corpóreo, o cabelo, a fim de descrever e criar uma peça de roupa interior que cubra a sua dignidade, a zona púbica. Ao tornar o natural no artificial, permite uma reutilização e reformulação da informação e do lugar.


O seu trabalho sugere sensualidades e um desejo de falar sobre tabus, o escondido, a marca do seu género. O trabalho, o tecer e a espera remetem para a questão do papel da mulher na sociedade, onde o ensino permanece mais ou menos desigual, hierárquico, sem garantias e injusto. Costa informa-nos que tais mitologias e ilustrações do conhecimento permanecem como parte da nossa realidade enquanto nos regemos entre género e tempo. K. P. Reji é um pintor de Vadodara, na Índia, representado na exposição com três telas. Cada uma mostra um casal rodeado de um estranho ambiente de casas demolidas e de um conjunto de possíveis entradas e saídas. É neste ambiente primário e reservado que o casal se tenta abrir, através de um turbilhão de emoções naïf, de forma a resolver os seus sentimentos, revendo a sua coragem para amar. É através do uso de um silêncio Chiriciano, de uma combinação do vivo, do vivente e do palco, que uma vívida tensão se desenvolve, permitindo que as figuras parciais e os animais comecem a simbolizar um mundo de possibilidades, de jubilações e o atraso de uma possível solidão. Estes são trabalhos particulares que podem facilmente ser reduzidos à sua inocência, mas é precisamente na sua capacidade de representar um conjunto de relações urbanas que estas pinturas, para um público ocidental, podem permitir um deambular pelo quotidiano de outro continente, pelas suas ambições vitais e pelo seu conjunto de valores. Jinoos Taghizadeh é uma artista multimédia, que vive e trabalha em Teerão, no Irão. É muitas vezes controversa na sua forma de afirmação, contendo imagens explícitas que tornam claro o seu desagrado em relação ao actual estado do seu querido país. Taghizadeh permanece uma voz importante dentro do Irão. Advoga a mudança examinando as estranhas coincidências na sua história do final do século XX que levaram ao recente estado cul-de-sac. O Irão continua a ser perseguido pelo Ocidente e, em resultado, fechou-se nos domínios político e social, cerceado pelas sanções e pressionado pelas guerras vizinhas no Iraque, Paquistão e Afeganistão. O trabalho de vídeo de Taghizadeh constitui uma forte metáfora onde são cantadas uma série de músicas de embalar uma criança que dorme. Cantadas por uma forte voz materna, as músicas são codificadas pelas suas letras. Estas cantigas excepcionais contêm letras de três diferentes ideologias em guerra que frequentemente afastam a população do Irão e a mantêm vigiada por dentro. A natureza doce das melodias é apenas uma forma de subverter a mente da criança para que possa adormecer; no entanto, mais uma ideologia prossegue na sua esfera política de vigilância e ódio.


A Dor Inesquecível (The Unforgettable Pain) Marc Bijl, Mathias Herrmann e Isabel Ribeiro


No fundo, Marc Bijl argumenta que a Paz está a queimar-se e que na sua chama não encontramos qualquer tipo de conforto, como na que usamos para nos aquecer ou para cozinhar. Tudo o que faz é deixar para trás as marcas da sua morte. Bijl vive em Berlim, mas é originário dos Países Baixos e tem usado o espaço público e a sinalética para consumo público e incluído posters e símbolos como o da paz para criar uma forma rápida de comunicar o que sente. É a forma que tem de lidar com a falta de soluções num mundo em desagregação. É tempo de ir além do egoísmo, que está sempre pronto a surgir, e de entender que estamos a sangrar. A nossa determinação pela democracia, pela paz ou por um fim para o sofrimento permanece uma mera esperança, não tão evidente ou fundada como se poderia pensar. Mathias Herrmann vive em Viena, Áustria, onde tem sido um membro activo da comunidade artística, incitando a mudança e a esperança na unificação da comunidade no sentido de encorajar uma visão própria do mundo no seu trabalho e publicações. As suas criações são frequentemente consideradas perturbadoras. Na sua natureza explícita, o uso do seu próprio corpo e das suas possibilidades tem sido eficaz no seio de membros mais abertos da comunidade que aceitam a diferença sexual e diferentes modos de vida, ao contrário dos que apoiam as dissimuladas leis da heterossexualidade e das realidades homogeneizadas. Ao utilizar a abstracção, obrigatória mesmo que passível de ser considerada uma forma de fazer arte algo inocente, com as suas noções romantizadas de libertação de temáticas e da figuração, Herrmann confunde o seu espaço e as suas qualidades inerentes para nos oferecer um conjunto único de trabalhos: fotografias que expõem a sua fluidez sexual e os fluidos que fazem uma imagem. A sua capacidade inventiva encontrou êxito nestas peças Cum (ejaculatórias). Isabel Ribeiro vive e trabalha na cidade nortenha do Porto, em Portugal. A série Embed presente na exposição é resultado de uma preocupação recorrente da artista sobre os dilemas e a longevidade da comunidade. As suas inquietações baseiam-se nas transformações do espaço e nas forças da mudança – especialmente em Portugal – que criam um efeito fantasmagórico na cultura e nos lugares. Ribeiro tem estado envolvida com alguns espaços em particular e com movimentos a partir dos quais observa os conflitos gerados pelo deslocamento cultural e o desaparecimento de grupos que se desagregam devido à falta de acção coactiva e de amor. O movimento punk, na sua luta energética contra a depressão provocada pela sociedade na sua juventude. A experiência de desemprego é uma dessas situações. No punk, Ribeiro encontrou força, vozes interessadas e uma demonstração de anarquia em relação às forças conservadoras. Este movimento ficou sitiado pelos interesses comerciais que dividiram o seu amor e robustez, subvertendo, finalmente, a ideologia e a razão para promover a mudança, transformando o grupo numa mera corrente de trapos de alta-costura. Ribeiro usa o espaço para descrever a solidão de lutas passada, inquietações que rapidamente se tornaram história em vez de promover a mudança a longo prazo. Acima de tudo, nestes espaços recônditos, Ribeiro evidencia o palimpsesto das nossas cidades, construídas e reconstruídas numa geração até ao seu desaparecimento.


Amor/Memória (Love/Memory) Arahmaiani, Agathe de Bailliencourt, Nezaket Ekici, Gregg LeFevre e Zak Ové


Arahmaiani vive e trabalha em Yogyakarta, Java, de onde, por sua vontade, as forças da mudança se apropriam do seu trabalho. Figura de destaque no seio artístico indonésio, Arahmaiani tem apresentado os seus sentimentos e observações em muitos locais internacionais. É nesta crença que muito é argumentado; as suas considerações sobre o poder, o amor pelo poder e a destruição do poder são apenas algumas das suas reflexões. Explorando questões de género e violência, Arahmaiani consegue um conjunto letal e provocante de soluções: ao trabalhar sobre a agressividade do patriarcado, surge com meditações desiguais baseadas em textos históricos e histórias mitológicas. No trabalho de Arahmaiani nada permanece sagrado, tudo deveria ter sido reexaminado de modo a perceber-se os caminhos do legado. Como artista, pode ser considerada desconstrutivista pela reescrita feminista dos papéis e pela forma como acolhe um futuro baseado na igualdade. Agathe de Bailliencourt vive e trabalha em Berlim, no seio da florescente comunidade artística que se multiplica na nova capital das artes. Bailliencourt conserva um carácter ímpar e sofisticado, cujo trabalho é um exemplo sólido e magnífico da sua capacidade de criar sentido, num impulso directo, por aspirar a comunicar partindo do interior. Cria instalações, mas é na prática diária de escrever efectivamente do interior que as pinturas e desenhos reclamam um poder libertador, uma manifestação de possibilidades que deambulam entre a leitura e a paisagem, e é nesse sentido que é Bailliencourt. Os desenhos e pinturas contêm frequentemente letras da sua escritora favorita, que oferecem uma camada adicional às poderosas anotações, sentimentos e amor, à urgência de falar, de ser ouvida e de lembrar o amor todos os dias. Nezaket Ekici é uma artista ligada à performance que vive em Berlim. Em alguns aspectos pode entender-se os seus extensivos trabalhos como uma persistência em explorar a dor e a memória do amor. Por vezes, as suas performances possuem uma qualidade desgastante e exaustiva, que esgota o público emocionalmente, arrastado através de uma viagem longa visando perceber o papel da dor na vida. Esgotada, Ekici (de origem turca), permite, através dos seus actos performativos, uma exploração rudimentar do papel da mulher, no pico da etnicidade e numa época em que o amor pela humanidade está depressivamente ausente. O espaço da mulher na sua firmeza é organizado no seu trabalho Blind, como uma estrangulação, como paredes que travam o progresso do mundo para metade da sua população. Gregg LeFevre vive e trabalha em Nova Iorque, cidade que usa com uma qualidade amargurada, advogando a felicidade comercial, mas estranhamente subordinada à sua continuada falência. As suas fotografias de celebridades consumidas e quebradas, de celebrações de um mundo são e solitário tornam-se comida para o vento e a ira dos nova-iorquinos. Fotografa publicidade, campanhas com custos exorbitantes de grandes empresas, que, em poucos minutos, se tornam símbolos desgastados de um capitalismo morto, envergonhado pela sua própria incapacidade de comunicar o gosto, o desejo ou até o seu sentido de produto. A impressionante edição das imagens de LeFevre, na sua deslocação temática dentro do urbano, é uma qualidade que enfatiza o corte como técnica, como uma falha na visão; uma falta de cuidado e a provável certeza de como o amor pela beleza, o corpo e a necessidade de consumo são usadas como adereços para vender um estilo de vida, um par de calças ou uma nova fragrância. Zak Ové vive e trabalha em Londres, mas grande parte da sua obra refere-se à sua terra ancestral, Trinidad. Realizador de sucesso e escultor, trabalha sobre o carnaval de Trinidad no sentido de aprofundar o seu e o nosso entendimento do desejo pelas tradições africanas e pela sua sobrevivência no contexto pós-escravatura das Caraíbas. A sua instalação de vídeo, A land so far, é uma percussão pulsante, incrivelmente densa na forma como as imagens se inundam, com ritmos assombrosos e intensos. Incessante e prolongada, a instalação reproduz o chamamento de espíritos ancestrais, de memórias perdidas ou em perda, de crenças e de um futuro até agora não ouvido e tocado. O facto de ter rodado, editado e fundido este filme, de forma a constituir um entendimento poético do amor encontrado e do amor perdido uma vez por ano no carnaval dos espíritos, é uma prova das suas intenções.


TOUGH LOVE - A SERIES OF PROMISES


Shaheen Merali Translated by Patrícia Trindade How do we value art? How do we value love? The existing condition, by which all aspects of culture are mediated in the broader west, is based on an intellectual lineage, which remains defined by a sense of itself (against the rest) even in the new millennium. The recent entourage of occupying national forces in the middle-east and central Asia forms its greatest testimony. This intellectual lineage of the western is both inherited and agreed upon as a set of principles which act as a paradigmatic territorialisation of that which is deemed as acceptable and cohesively maintains its idea of true knowledge and what belongs within and without. This knowledge, this sense of belonging, has emerged according to experiences, principles and ideas within a guarded Eurocentric view of worldliness, a maintained globality. Furthermore, these principles and ideas remain embedded in culture and in society as specific values; in terms of the potential for cultural production to be formalised in the historicising process, in which they are referred for validation. The unfortunate consequence for any forms, positions and intellectual formations that emerge outside of this Eurocentric parameter, is a neglectful mismanagement and exclusion of their ‘worth’, even if they are working within the European realm or assist, through their criticality in deconstructing this guarded domain and its hierarchical arrogance. The consequence of this set of stringent management rules for the culture is continuity and maintenance of a conservative European nomenclature in the constant dissolution and absconding of some its contemporary manifestation. In many ways it is interesting to compare the principles of intellectual lineage to intellectual property. Primarily, the former acts as a guarding mechanism. Equally, both have an intention as well as a process that enables the enhancement of the reputation (of its producer/inventor as well of the idea/knowledge). In the production of such knowledge, the notion of the intellectual is converted into property, regarded for its inventiveness and measured by its ability to reflect the aggregate of “high” values –fascinatingly this estimation allows a fusion of new knowledge into a library or cast of other esteemed European objectifications, recognised subjectivities, ideas, treatises and texts. The obvious ramifications of such regulation is that it undertakes a process of validation and acts as a place of endorsement – of what is acceptable within the intellectual and how it can enter systematically into a coordinated arrangement after its validation. A systematic set of possible venues and places of (re) collection which include the museum, the state archives, the library, make it possible for these ideas to be sustained and in the public realm. In the rejected’s case – much of this is left to the policing forces that promote decay and outsiderism by instigating prejudice, racism, patriarchy and sexual normalization – all processes that dictate the absence of diversity of the living. This arrangement can be viewed as one of the ways societies organises its conservative identity - a systematic process of inclusion and exclusion. In choosing what to accept and what to remember, in the same swooping action, what to forget is accented. A sense of itself develops in relation to that hich remains outside, rejected. A cultural regard/disregard (depending on ones place within) is guided and guarded by intellectual formations which include academic bodies, formal and informal institutions, quangos, govern/mentalities and think-tanks; groups, which are often self-regulated and based on ideals of “collective” esteem, have risen from the desire to civilise ‘others’. The forging of these future histories through the validation of decision-making bodies is viewed as allowing the process to form national narratives and historical values, deemed to be guarded to assist in installing societal values. What is important in the Fine arts? In trying to understand the rubric of ‘Fine Arts’ one can look at other existential questions and beliefs, including the very idea of the Fine arts, which can be comparable to what we believe in the idea of ‘Love’. Both remain a product of a systematic learning and thinking, which paradoxically, can be deemed to be illogical and wholly based on vague perceptions. Both aspects seem to gradually attain a veneer of rationale, which can be enacted upon from a variety of possible nuanced readings and feelings. The relationship between art and love has been one which remains entangled, a mysterious implosive one, that mitigates and alludes, through a set of observations that one can term as coming to it as a regard; a regard based on an arrival, a falling into place. The selected works in Tough Love, subtitled A Series of Promises, helps to explore the way art and artists think, providing a unique form of visual expletives for the notion of love. Dramatically, art and love are based on an exclamation or oath, especially one that is often mired in its own profanity, its earthy results, which are obfuscated by coded personal humiliations. The entwining of art and love, is an ephemeral journey, of personal coming to terms or not, that is satiated by a gamut of often provocative emotions including hate, desire, jealousy, envy and the feeling of doom. More often, it is in its romanticised account, a true mirage of reality, that one usually finds oneself wrongly reflected. In this exhibition, love is understood as a basic state through which we meditate on this earth and our time on it. How we belong, in a search to formalise a unification that proves and unites us in this enduring journey; often a terse and understandably unloving one. The exhibition, Tough Love, A Series of Promises is defined by a series of explorations by artists that involve examining the love of a nation, of one’s country and its traditions, of life as part of death, of land and its ideological merits, of ideas and the reason for intellect. These artists negotiated intriguing realities which are found in their works. In addressing such an emotional field of human behaviour this small yet studied exhibition and publication is curated to allow these artistic notations to compliment our daily grind, our physical and emotional terms that we “feel” within the physiognomy. Love it seems is an universality that is full of expressive goals as it criss-crosses the personal and the societal in trying to form spaces and shapes from places and traces of the self-engrossed. The exhibition is curated in three sections, which include, Blinded Love, The Unforgettable Pain and Love/Memory. The selected artists bring to the exhibition a poetic polemic of hurt, pain, joy and neglect that will sustain and contain but never answer that which feels to be as important as life itself.


Blinded Love Samira Abbassy, Cecília Costa, K P Reji and Jinoos Taghizadeh


The artists in this section deal with the condition that makes fools and poets of us all – the sheer ability of love to blind us, wherein our sense and sensibility falls aside, allowing a sensuousness to rise, as we literally fall in love. The sheer brutality of love’s power and the potential for its abuse in our mutable emotions, are exposed in these works. The blindness, its sheer intensity that forces us to seek solace from our senses and seek heartily for answers elsewhere, is a force that beckons all lovers and all relationships. Samira Abbassy is an artist, based in New York from where she has been working producing stringent works about the effects of the war in the middle-east on our globe, which now revolves around the sun, affected and saturated with fear and gloom. In the recent months, she has been creating what she calls ‘sculpture objects’ a mixture of the study of the figurative but objectified to suggest a emotion. These static miniature forms are full of life, in hysterical motion, their imploding cries depicting a stubbornness that has been afflicted with pain, remorse and gendered often – all incapacitated but not by drugs or alcohol but by the sheer pain of love. The struggles are found within the ways that these animated bodies struggle to suggest trying to overcome their situation, an overcoming that means hurt or a coming to terms with separation and moving on. Cecília Costa is based in Lisbon, from where and for a long period of time her hibernating work has emerged. It is as much a work as a statement; a very personal making that explores the myth of Penelope, a myth that like other artists in the exhibition, is ready to contest and find a new context for its lingering place in our imaginary and its potency in our resolving of gendered roles. Costa, uses the most sensuous bodily element, her hair, to describe and create a undergarment that covers her dignity, the pubic zone. In recasting the natural into the seemingly unnatural, she allows a re-use and reformation of information and place. Her work suggests sensualities as well as a desire to speak about the unspoken, the hidden, the mark of her gender. The work, a weaving and a waiting, is about the role of women in society, where the societal teaching remains more or less unequal, unwarranted hierarchical and unjust. Costa informs us all that such mythologies and such illustrations of knowledge remain part of our realities as we mediate between genders and time. K P Reji is a painter based in Vadodara, India and is presented in the exhibition by three canvases. Each canvas shows a couple surrounded by a strange environment of broken houses and a set of possible entrances and exits. It is in this secretive, primal environment that the couple try

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