Rita Gaspar Vieira, “Em brancoâ€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga


Dalila Gonçalves, “Laivoâ€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga


Miguel Ângelo Rocha, “Nome #1†e “Nome #2â€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga


Edgar Massul, “Wine Drawings #010 a #16â€, 2018 | Imagem: Mandy Fraga


Alunos da Universidade Lusófona durante visita guiada à exposição “(tempo) destempoâ€


Dalila Gonçalves| Imagem: Mandy Fraga


Catarina Mil-Homens, “Ãpice Lentoâ€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga


Catarina Mil-Homens, “Ãpice Lentoâ€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga


Rita Gaspar Vieira, “Um pedaço, do mesmo chãoâ€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga


André Banha, “Segurei-te o pôr-do-solâ€, 2008-2022 | Imagem: Mandy Fraga


Miguel Ângelo Rocha, “Nome #3â€, 2022 | Imagem: Mandy Fraga

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(tempo) destempo


 

 

André Banha, Catarina Mil-Homens, Dalila Gonçalves, Edgar Massul, Miguel Ângelo Rocha e Rita Gaspar Vieira.

 

Curadoria de Ricardo Escarduça

 

17 Novembro  -  31 Dezembro 2022

 
 

(tempo) destempo

 

«A história deve ter um começo, um meio e um fim, mas não necessariamente nessa ordem». Abatendo-se com estrondo sobre a narrativa cinematográfica, o aforismo revolucionador de Jean-Luc Godard pode relacionar-se, por aproximação, com a interrogação dos modos de usar a ideia de tempo, e da ideia de tempo ela-mesma, que rasgou uma fissura epistemológica no véu positivista da história da humanidade, e, em reciprocidade, da história da arte.

Suspendendo o recorte cronológico do tempo em fragmentos estáticos de contornos estanques, a edificação linear do tempo segundo uma ordem discursiva de sentido unidireccional, instalados pelo zeitgeist que salvaguarda os códigos epocais de validação e significação, surgem, a destempo, anjos-maus da história, acontecimentos fora do tempo que vêm perturbar o ideal que inscreve, e encerra, cada objecto, cada imagem, na cegueira da luz intrínseca à sua contemporaneidade. Diz-nos Georges Didi-Huberman: estar diante de uma imagem é estar diante do tempo; é abrir o seu leque, activar a fecundidade dos diferenciais de tempos que estão emaranhados nas profundidades de cada imagem, já que esta só é pensável através da dialética do anacronismo, das descontinuidades e sobrevivências que não só transporta como projecta além ou aquém da sua temporalidade. Pensar a história e o tempo através da imagem, através da arte, é romper o véu que firma um demasiado-no-presente ou demasiado-no-passado, e lançar as possibilidades de recomposição, movimentos de aproximações ao antes, um mais-do-que-o-passado, e de recuos do actual, um mais-do- que-o-presente. É des-cronologizar [1].

Não nos interessam as aspirações indesejáveis das narrativas pós-modernas a um suposto equilíbrio letárgico no fim do tempo e da história, o cúmulo universalista que, totalitariamente e paradoxalmente, amalgama o pluralismo, absorve a margem e neutraliza o potencial de mudança do conflito entre antagonismos. Não nos interessam os excessos subversivos das acelerações modernistas, a ideia de tempo e história necessariamente e exclusivamente enquanto salto radical, que cancela as anterioridades e as suas próprias contemporaneidades. Interessa-nos, sobretudo, a fissura dialética da des-cronologização, interessa-nos o destempo da fricção, colisão, intersecção de temporalidades antagónicas e anacrónicas.

Importa o potencial de sobredeterminação temporal activado pelas obras de Miguel Ângelo Rocha, Rita Gaspar Vieira, Dalila Gonçalves, Catarina Mil-Homens, Edgar Massul e André Banha, e pelos intervalos, ressonâncias, tangências e distâncias que o corpo encontra no espaço. Nos trabalhos reunidos em [tempo] destempo encontra-se uma abordagem formal que, nos materiais, processos e composições e nas preocupações e indexantes individuais, próprios a cada artista, torna sensível um olhar crítico comum sobre o pensamento do tempo e do presente: uma policronia constelar no interior de cada obra, uma montagem de temporalidades heterogéneas. Ocupam o espaço procurando o desacordo do fluxo do corpo entre obstáculos e proximidades, uma fenomenologia do tempo que acontece no descoser da ordem cronológica entre princípio e fim – o porvir que emerge de um caminho às arrecuas, um loop às avessas, por que não?

«Não existe presente, apenas um devir» [2] , o continuum de mudança perpétua que pode revolucionar os horizontes dos tempos. Este potencial de sobredeterminação procura perturbar a massa mole do presentismo esvaziado de legados pelo modernismo e de propósitos pelo pós-modernismo. O torpor do espectáculo, a apatia da incerteza, que confinam ao impasse de um aqui e agora que parece imóvel e eterno numa míriade de efemeridades Sísificas, e coloca o movimento entre um passado e um futuro e a experiência de um presente em crise, em conflito com a essência de algo vivo. Na verdade, estamos demasiado no presente. Perante este presentismo que nos amarra, importam as ausências e intermitências, as negatividades e invisibilidades nas noites dos tempos. [tempo] destempo está com o presente. Porém, não está no presente; é, antes, seu antagonismo, extemporaneidade discrónica do ser contemporâneo [3] . A sua contemporaneidade adere ao presente porque o estranha, porque persegue uma tensão. É sintoma de anacronismos num presente temperamental que tenta reconfigurações imagináveis do passado e do futuro. É necessário criar novas ficções, novas esperanças.

  

Notas:

[1] Estas ideias constam, de modo aprofundado, de Diante do tempo, história da arte e anacronismo das imagens, Georges Didi-Huberman (trad. Luís Lima), ed. Orfeu Negro (2017).

[2] Goethe citado em Apologia da história ou o ofício do historiador, Marc Bloch (trad. André Telles), ed. Jorge Zahar Editor Ltda (2002).

[3] Giorgio Agamben, «What is the contemporary?», em What is an apparatus?, and other essays, (trads.David Kishik e Stefan Pedatella), Stanford University Press (2009).

 

 Ricardo Escarduça

 Curador

 

 

 


 

 >> Folha de Sala

 

Biografias

 

André Banha, (1980) Santarém. Vive e trabalha em Coruche. Licenciado em Artes Plásticas, pela Escola Superior de Arte e Design (ESAD), Caldas da Rainha em 2006. Destacam-se as seguintes exposições individuais: Playwood, Galeria Bessa Pereira, Lisboa, 2013; (re)visito(me), VPF Cream Art Gallery, Lisboa, 2013; A casa das duas portas, Biblioteca da FCT/UNL, Campus de Caparica, 2010; desenho, escultura, Academia de Artes dos Açores, 2008; Segurei-te o Pôr-do-Sol, VPF Cream Art Gallery, Lisboa, 2008. E, as seguintes exposições colectivas: WAIT, CCB, Lisboa, 2019; Vicente, Museu de Lisboa – Palácio Pimenta (Pavilhão Preto), 2019; Desencaminharte’18, Ponte de Lima, 2018;Caixa – considerações sobre o lugar, Convento de Cristo, Tomar, 2015; 17º Ciclo de Exposições Carpe–Diem Arte e Pesquisa, Palácio Pombal, Lisboa, 2014; 5.ª Edição LandArt Cascais, Quinta do Pisão, Cascais, 2013

 
Catarina Mil-Homens, (1979) Portugal. Mil-Homens é uma artista plástica e investigadora com uma prática artística multidisciplinar que se estende aos médiuns de desenho, instalação e vídeo. A sua pesquisa foca-se nas questões inerentes ao paradigma mente /corpo face à consciência. Mil-Homens participou em diversas exposições, das quais se destacam: Sobre a Lâmina, exposição a solo na Galeria na UMA LULIK__ , 2019, Intermater, Arcade Project Space, Melbourne, 2017; Precinct, Margaret Laurence Gallery, Melbourne, 2016; Who is Mr Favisar?, Trocadelo Gallery, Melbourne, 2015; The Age of Divinity, Plataforma Revólver, Lisboa 2013; Summer Calling, Sala do Veado Museu Nacional de História Natural, Lisboa, 2013 e Nem Sempre é a Direito, exposição a solo na Galeria Módulo, Lisboa, 2013.

 

Dalila Gonçalves, (1982) Castelo de Paiva (Portugal). Vive e trabalha no Porto. É licenciada em Artes Plásticas-Pintura (FBAUP 2005) e Mestre em Ensino de Artes Visuais pela FBAUP e FPCEUP (Universidade do Porto 2009). Foi artista em residência no Programme KulturKontakt, Viena, Austria (2017); na Residência Inclusartiz (Rio de Janeiro 2014); na Residência Pivô- Arte e Pesquisa (São Paulo 2018) e Fundación Marso, (México DF 2020). Expõe regularmente em instituições e galerias em diferentes países da Europa, da América do Sul e EUA. Países onde está representada em colecções públicas e privadas.

 

Edgar Massul, vive e trabalha em Lisboa e no Porto. Estudou na Escola António Arroio / atelier livre, com Pedro Morais. Na S.N.B.A. com João Vieira. No Ar.Co com Graça Costa Cabral, Sérgio Taborda, Francisco Rocha, Rui Sanches, Rolney Barreto e Ângela Ferreira. Recentemente o seu trabalho tem sido mostrado em diversos espaços, dos quais se destacam: Arte em São Bento 2020, Lisboa; Galeria Diferença, Lisboa; Wadden Tide, Dinamarca; Parque da Devesa, Vila Nova de Famalicão; 289, Faro; Electricidade Estética, Caldas da Rainha, British Bar, Lisboa; Casa da Cerca, Almada; Armazém 22, Vila Nova de Gaia; Fundação D. Luís, Pisão Cascais; Anozero, Bienal de Coimbra; Giefarte/Fundação Carmona e Costa, Lisboa, Galeria Trem, Faro, Whitechapel Gallery, Londres.

 

Miguel Ângelo Rocha, (1964) Lisboa. Vive e trabalha em Nova Iorque e Lisboa. É formado em Pintura pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa (1992). Entre 1994 e 1996, fez o Master of Fine Arts, na School of Visual Arts de Nova Iorque. Em 2002, ingressa como assistente na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa. Expõe com regularidade desde 1991 e, desde 1994, reside em Nova Iorque e em Lisboa. Realizou várias exposições individuais e colectivas no Museu do Chiado, em Lisboa; na Galeria Laure Genillard, em Londres; na Frieda and Roy Furman Gallery, Walter Reade Theater at Lincoln Center, em Nova Iorque; no Círculo de Artes Plásticas de Coimbra; na Módulo – Centro Difusor de Arte, em Lisboa; no Hospital Júlio de Matos, em Lisboa; na Galeria Miguel Nabinho, em Lisboa, entre outras. 

 

Rita Gaspar Vieira, (1976) Leiria. Vive e trabalha entre Leiria e Lisboa. Operando no campo do desenho e da tridimensionalidade, a obra de Rita Gaspar Vieira tem vindo a problematizar relações entre a memória privada e a comum coletiva de lugares habitados, destacando a relação entre as práticas quotidianas e os procedimentos artísticos que essas práticas constituem no seu trabalho, ao considerar a diferença criativa alcançada face à espectativa com que estas ações são desempenhadas. Entre os seus projetos recentes destacam-se exposições coletivas como: O desenho como pensamento (curadoria Sara Antónia Matos), Centro de Artes de Águeda, Portugal; Constelações III – uma coreografia de gestos mínimos (curadoria Ana Rito e Hugo Barata) e o ProjectoMAP 2010_2020, Mapa ou exposição (curadoria Alda Galsterer e Verónica de Mello); ambas no Museu Berardo; O Desenho Incerto. Cinco Leituras do Espaço, no Colégio das Artes, da Universidade de Coimbra, (curadoria Sérgio Fazenda Rodrigues) e a exp. individual: Com a mão cheia de pó – Gal. Belo Galsterer, Lisboa (curadoria Ana Rito), todas em 2020 e o projeto Vento – Comemoração dos 18 anos da Revista Umbigo.

 

Ricardo Escarduça, (Lisboa, 1975). Iniciou o Doutoramento em Arte Contemporânea no Colégio das Artes da Universidade de Coimbra em Setembro de 22. É mestre em Estudos de Cultura, pela Universidade Católica, e engenheiro civil, pelo Instituto Superior Técnico. Trabalha de modo independente enquanto curador e autor de textos no âmbito das artes visuais. Colaborou com o Projecto Travessa da Ermida, nas vertentes de programação, produção e edição.

 

 

 

  

  

 

 


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