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CATARINA DIAS
LIZ VAHIA
28/01/2025
Catarina Dias nasceu em Londres, em 1979. Vive e trabalha em Lisboa. Após concluir o Curso Avançado na Ar.Co Lisboa em 2002, concluiu o Mestrado em Artes Plásticas pela Byam Shaw School of Arts, Londres, em 2003. Em 2011, foi nomeada para o Prémio EDP Novos Artistas.
Das suas exposições individuais, destacam-se: Inverted on Us (MAAT - Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia), Through Wet Air (Pavilhão Branco, Galerias Municipais de Lisboa, 2024), We Know You Don’t See Us (Project Space, Encounter e Galeria Jahn und Jahn, Lisboa, 2023), Mamute (Galeria Vera Cortês, Lisboa, 2019), This is Heat (Happening no espaço Old School, #42, Lisboa, 2016).
Das várias exposições colectivas em que participou, destacam-se: Contravisões, A Fotografia na Coleção António Cachola (Elvas, 2023), Come Here There’s Something I Want To Show You (com Corita Kent, UPPERCUT, Lisboa, 2019),10000 anos depois de Vénus e Marte (Galeria Municipal do Porto, 2017), The Colour of an Eclipse (com Pedro A. H. Paixão, Ar Sólido, Lisboa, 2016), entre outras.
Tem vindo a colaborar regularmente, desde 2012, com a dupla Sofia Dias & Victor Roriz em diversos projectos cenográficos, entre os quais: Ruído (2024), Partícula (2023), Arremesso IX (2021), Sons (Mentirosos) Misteriosos (2020), O que não acontece (2018), Satélites (2015).
O seu trabalho é representado pela Galeria Jahn und Jahn.
Por Liz Vahia
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LV: Está patente neste momento no MAAT a tua exposição “Inverted on Us”. Nela podemos ver a continuação de uma exploração da junção entre a imagem como matéria e superfície e a palavra como forma e linguagem. Visualmente, há uma espécie de contaminação entre aparência e legibilidade, e uma questão permanente que se poderá colocar é: “o que vemos realmente?”. Há uma qualidade corpórea do invisível que sobressai aqui?
CD: Existe uma série de contradições em cada imagem e são essas contradições que a permitem subsistir no tempo. A meu ver, a imagem e o tempo são inseparáveis.
Cada imagem carrega em si uma impossibilidade, tal como a linguagem. A linguagem subsiste enquanto houver nela subjectividade e ambivalência. É isso que a mantém viva. A imagem, ao mesmo tempo que nos revela algo, é também aquilo que nos cega. E ela vive desta própria contradição. É no momento dessa transição ou limiar visual, digamos, que podemos e conseguimos ver melhor. É nesse momento que tudo vem à superfície... Isto faz-me lembrar uma frase de um poema da Emily Dickinson (1263): “The Truth must dazzle gradually. Or every man be blind —“
LV: As palavras e o texto estão muito presentes na tua obra. No entanto, têm uma posição instável, por exemplo, “ler” não quer dizer que fiquemos a “perceber” algo, antes parece acrescentar camadas em vez de criar uma sensação de elucidação. As palavras e as imagens são coisas densas e acho que o uso de tecidos em algumas das tuas obras (como a cortina) torna visível esse aspecto. Concordas?
CD: Talvez isso dependa da imaginação de cada pessoa. Isto é, a imaginação enquanto actividade de criar uma imagem mental. O mesmo acontece no acto de ler. Criam-se imagens mentais (um cinema da mente), e o grau de subjetivação ou ambivalência vai depender dessa relação com o universo imagético de cada um.
As ‘cortinas’ (elementos que têm um longo historial cinematográfico), são uma parte do meu trabalho onde exploro ideias de ritmo e de corte da imagem. No caso da cortina da exposição Through Wet Air, o seu duplo... E sim, aprecio a ideia de chegar a uma certa densidade de matéria e à abertura da possibilidade de uma determinada estranheza ao nível da percepção.
LV: Precisamente nesta exposição há uma obra que parece “verter-se” na sala, ou projectar-se a partir do chão, e nos coloca numa perspectiva estranha como espectadores. Mas essa sensação de estranheza espacial é já sentida nas obras onde letras distorcidas e texto se sobrepõem. Como se dá a escolha de um texto no teu processo de criação?
CD: Aquilo que tinha a aparência de uma projecção que se estendia do chão à parede tinha um duplo, um desenho que se encontra num outro lugar físico.
O texto surge no próprio fazer do trabalho. Da mesma forma que tenho um arquivo de imagens, tenho um arquivo de palavras, frases que vou acumulando. À medida que vou trabalhando em pequenos fragmentos de imagens, vão ativando-se certas palavras ou frases. Vão ganhando presença.
LV: Nas tuas obras vemos uma junção de materiais e técnicas, entre a impressão gráfica e a intervenção plástica. Existe uma ideia de arquivo a partir de onde recolhes visualmente esses materiais? Procuras uma nova revelação para imagens pré-existentes?
CD: A relação com as imagens é muito profunda. É curioso, pois ainda hoje falava com a minha irmã sobre isto. Este universo que vamos acumulando, no meu caso, o de imagens, vamos acumulando desde a infância. Criamos e transformamos, potenciamos uma dada intensidade a um corpo aberto onde todos esses elementos fazem parte.
A revelação de que falas talvez aconteça no acto de ver coisas nas coisas.
LV: Participaste numa das Millennium Art Talks da feira Drawing Room, a convite da Cristina Robalo. Como respondes à proposta que ela lançou, de que “vê” desenho no teu trabalho? Onde é que crês que podemos encontrar esse desenho? Há um desenho como prática ou há um desenho como forma de pensamento, de organização visual e espacial de ideias?
CD: A conversa com a Cristina foi muito interessante. Penso que existem ambas as coisas. O desenho é uma prática que nos leva a ver para lá do aparente. É um exercício contínuo, que convoca muitas percepções diferentes. Depois existe o lado físico desse exercício, que é sempre uma oportunidade para uma coisa se atualizar, para acontecer.
LV: Neste momento estás a desenvolver algum projecto ou tema que nos queiras comentar? Onde é que proximamente vamos ver o teu trabalho?
CD: Estou a trabalhar para a minha próxima exposição indivivual For Every Last Thing, que inaugura a 22 de Fevereiro no Rialto6. Pela proximidade temporal da exposição Through Wet Air e Inverted on Us, estou a trabalhar de uma forma ligeiramente diferente, mais ‘improvisada’ do que aquela em que costumo trabalhar. Vou convocar vários elementos temporais diferentes e espero que seja uma experiência tão estranha como as outras.
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