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CAROLYN CHRISTOV-BAKARGIEV
Este mĂȘs publicamos uma entrevista a Carolyn Christov-Bakargiev, directora artĂstica da prĂłxima Documenta de Kassel. Conduzida por Greg Benzow, a conversa foi publicada originalmente em Deutsche Welle.
Na entrevista Ă Deutsche Welle, ela afirma nĂŁo acreditar que a arte possa educar o pĂșblico. A directora da Documenta 13 diz que rejeita ver os visitantes de uma exposição como meros nĂșmeros a serem contabilizados nas estatĂsticas sobre as grandes mostras e nĂŁo vĂȘ o circuito de arte como uma forma de âeducarâ o pĂșblico. Muito pelo contrĂĄrio, para a directora da prĂłxima Documenta, os visitantes tĂȘm muito mais informação e conhecimento que a vĂŁ filosofia dos curadores supĂ”e.
Vivendo entre Roma, Turim e Nova Iorque, Christov-Bakargiev, Ă© a curadora principal do Castello di Rivoli, o museu de arte contemporĂąnea de Turim, alĂ©m de ter sido responsĂĄvel pela 16ÂȘ Bienal de Sydney, na AustrĂĄlia. Filha de bĂșlgaros que emigraram para os Estados Unidos e mĂŁe de dois filhos, Ă© graduada em Letras e Filosofia pela Universidade de Pisa e autora de um volume sobre a arte povera, movimento artĂstico que nasceu nos anos 1960 na ItĂĄlia.
P: A Alemanha vai ter uma Documenta completamente diferente das do passado?
R: Ă uma pergunta interessante para começar. Possivelmente vamos apresentar pontos de vista â no plural â diferentes, no sentido de formas de experimentar a arte e a cultura. SerĂĄ uma grande honra trabalhar na prĂłxima Documenta.
P: VocĂȘ parece ter se dedicado no decorrer dos Ășltimos anos Ă justaposição de diferentes correntes de vanguarda na histĂłria da arte. Isso vai se reflectir na prĂłxima Documenta?
R: Talvez. Ainda estou iniciando a jornada. A minha peculiaridade não é simplesmente justapor, mas sim criar uma relação dinùmica entre arte, cultura, o pensamento de hoje e o que houve de mais radical no passado. Vejo tudo o que existe no mundo como contemporùneo. Um artista, mesmo que use somente o mais novo software digital ou o que quer que seja, não pode ter seu pensamento subdividido em categorias como passado, presente, este ano, aquele ano.
Do ponto de vista filosófico, se algo existe no mundo, este algo pertence ao hoje. Na minha opinião, tudo é contemporùneo. Ou seja, trata-se mais de abrir [o horizonte] do que de justapor ou fechar a partir de um conceito do que seja passado. Interesso-me pelo passado porque estou interessada no presente. Trata-se de explorar o pensamento de alguém sobre o presente, em momentos diferentes. Ou seja, o que era o presente para alguém vivendo nos anos 1920 e o que isso significa para nós.
P: VocĂȘ mencionou uma abertura. Vamos ver em Kassel a inclusĂŁo do pĂșblico como vimos em Sydney?
R: Acredito piamente que o pĂșblico seja o centro da experiĂȘncia artĂstica. E o espaço para esta experiĂȘncia tem que ser reimaginado. A experiĂȘncia Ă© Ășnica e singular. Mesmo se falamos de um pĂșblico com muitas e muitas pessoas, com histĂłricos distintos. O mais importante Ă© nĂŁo pensar no pĂșblico em termos de nĂșmeros, de estatĂsticas: quantas pessoas visitaram isso ou aquilo. E tambĂ©m nunca olhar para o pĂșblico a partir da ideia envelhecida de que a arte irĂĄ âeducarâ o pĂșblico, mas sim olhar para cada uma dessas pessoas do pĂșblico como portadoras de uma experiĂȘncia singular e considerar essa singularidade.
P: A Documenta de Kassel dĂĄ ao curador uma liberdade grande, mas no passado recente houve uma sĂ©rie de episĂłdios embaraçosos, com acusaçÔes de que a Ășltima Documenta teria sido elitista. A prĂłxima vai seguir os seus preceitos?
R: Obviamente nĂŁo posso comentar o que ocorreu no passado. Vi a Ășltima Documenta, obviamente fui a Kassel, embora estivesse completamente envolvida com a preparação para Sydney. Ou seja, nĂŁo estive alerta a respeito de todas essas reacçÔes e polĂ©micas ou sobre o que quer que tenha acontecido. De forma que nĂŁo posso comentar algo do passado.
O que posso dizer Ă© que a direcção artĂstica da Documenta constitui uma possibilidade maravilhosa que se se dar corpo Ă s nossas visĂ”es. Ă uma grande responsabilidade, pois a Documenta Ă©, historicamente, a mais renomada entre as exposiçÔes de arte contemporĂąnea, ou seja, dirigi-la Ă© uma tarefa que acarreta muita responsabilidade.
Ă claro que a Documenta Ă© entregue ao curador ou ao director artĂstico com base na confiança de que ele irĂĄ compreender a visĂŁo artĂstica que aqueles que o escolhem querem que seja compreendida. Eu nĂŁo usaria o termo elitista, mas acredito que a arte seja algo muito especial.
As pessoas querem arte, Ă© uma necessidade como comer. Ă um prazer, mas tambĂ©m uma necessidade de entender como o saber Ă© construĂdo e como a percepção pode transformar qualquer coisa numa experiĂȘncia significativa. NĂŁo Ă© nada analĂtico, mas simplesmente uma necessidade humana.
Em vĂĄrias partes do mundo, o pĂșblico tem muito mais conhecimento do que os especialistas imaginam. Muitos acreditam que se trate de uma massa de indivĂduos alienados como num shopping center, que precisam de ser educados. Eu, pessoalmente, acredito que hĂĄ muita gente com experiĂȘncias e visĂ”es sĂłlidas que procuram a arte. Respeito muito essas pessoas. E admiro essas pessoas que se colocam numa posição de vulnerabilidade, de um engajamento real que a obra de arte implica e precisa.
DisponĂvel em:
www.dw-world.de/dw/article/0,,3854457,00.html