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BRIAN GRIFFIN
Diz que a forma como chega às ideias é-lhe desconhecida e que só conhece os retratados no momento de os fotografar. Usa sempre o tripé e trabalha com os sujeitos, manipulando-os até conseguir o que quer. Para Brian Griffin, um dos mais importantes fotógrafos da actualidade, a fotografia deve muito ao acaso e à sorte, reconhecendo na pintura muita da sua inspiração.
Por ocasião da sua vinda a Lisboa, para participar numa das conferência dos Encontros do Olhar, organizada pelo Instituto Português de Fotografia (IPF), a Artecapital teve a oportunidade de o entrevistar informalmente.
Por Liz Vahia
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LV: Veio a Lisboa convidado pelo IPF para falar do projecto Entre Margens. Quer explicar-nos em que consistiu a sua participação nesse projecto?
BG: No Entre Margens, que aconteceu no ano passado no Vale do Douro, eu fui um dos fotógrafos presentes convidados a participar nesse projecto. Eu fiz fotografias e compilei uma sessão em Powerpoint, através da qual posso expandir todas as fotos que tirei.
Vim cá para trabalhar no projecto durante 2 semanas. Trabalhámos numa velha casa que é propriedade do Museu do Douro, mas também usámos algumas salas do hotel onde ficámos, um hotel muito grande na cidade da Régua. O ambiente no meu trabalho não é assim tão importante, de facto, eu até gosto de estar em sÃtio nenhum, pode ser qualquer lado, porque quando se começa a pensar no ambiente, começamos a afastar-nos da essência da imagem que queremos fazer - o sujeito - que neste caso eram as pessoas do Vale do Douro. Eu gosto, preferentemente, de colocar as pessoas nas suas situações reais, uma parede, duas paredes, qualquer coisa minimal, e isso o hotel providenciava muito bem. É bom ter qualquer coisa por onde começar, como uma agulha e um fio, é bom ter um fio só para ajudar a encaminhar. Portanto, eu dei uma volta pelo Porto, nalgumas lojas de materiais artÃsticos, e gastei cerca de 50 euros em coisas que levei para o Vale do Douro para usar. Não me perguntem porquê, porque não tenho nenhuma ideia. Parte do meu trabalho não tem uma razão concreta que explique porque fiz aquilo, eu tiro fotografias como forma de descobrir o porquê, porque estou interessado em saber [risos]. “Porque é que ele faz estas coisas? Porque é que ele toma estas decisões? Quais são as razões por trás?†Muitas vezes não há uma racionalização para isso, talvez com o tempo eu perceba porquê. Eu trabalho em automático, eu respondo automaticamente a forças exteriores e estou interessado em saber porquê, e a única maneira de descobrir é não pensar muito no que vou fazer, é ir com a corrente. Neste projecto especÃfico acho que fiz isso. Voltei à Régua e comprei um grande saco de açúcar e um grande saco de sal e juntei-os aos outros adereços que já tinha. Não os usei em todas as fotografias, mas se calhar em 75% delas.
LV: Os adereços são um aspecto importante na sua fotografia. Há uma espécie de encontro performático entre o sujeito e os materiais. Essa relação é trabalhada entre si e o fotografado ou tem já uma imagem pré-definida que quer compor?
BG: O sujeito traz muito à fotografia, pelo menos 25%, pois não se consegue controlar totalmente a imagem. É preciso que venha o sujeito com as suas ideias. No processo de fotografar há um adereço, que dá o mote para se começar a trabalhar, mas o fotografar é uma situação muito Ãntima, é preciso gostar da experiência de estarmos juntos ou pelo menos achá-la interessante. O fotógrafo precisa de ser carismático e de certa forma manipular o sujeito. É um talento que se tem se se nasce com ele, depois é só desenvolvê-lo e torna-lo cada vez melhor. Tenta-se muitos truques, muitas brincadeiras com atitudes, com o tempo, piadas... Percebemos que é a única oportunidade para conseguirmos uma boa fotografia, por isso é-se impiedoso!
LV: E conhece as pessoas antes?
BG: Não. É mais difÃcil controlar o sujeito se ele te conhece. É melhor serem estranhos e controlar a situação. Se eles te conhecerem vão começar a criar resistência. Eu nunca fotografo os meus amigos. Não queres conhecer as pessoas, queres chegar lá e vê-las à frente e jogar o jogo.
LV: Começou a fotografar no inÃcio do anos 1970. Como é que era ser fotógrafo profissional naquela altura, comparado com a actualidade?
BG: Era maravilhoso. Era difÃcil começar, porque era uma coisa que muita gente queria fazer, e a única maneira de fazer caminho era ser diferente. Eu trabalhei muito para tentar ser diferente. Eu era um homem simples e como tanta gente queria ser fotógrafo. Mas era preciso ser diferente para se conseguir viver disso. Eu comecei num campo muito chato da fotografia, que era fotografar homens de negócios, mas transformou-se no melhor lugar para estar quando o ambiente mudou com o advento da Thatcher, pois tornou-se a parte mais importante da fotografia. Em segundo lugar, eu tenho formação em engenharia e quando se tratava de fotografia de publicidade, eu tinha uma boa cabeça matemática, eu podia tirar fotografias muito complexas, com exposições múltiplas, construÃa as minhas próprias luzes, etc. Por isso, pagavam-me muito dinheiro para tirar fotografias para as campanhas publicitárias. Isto actualmente já não serve de muito, até porque já não é preciso esse tipo de fotografia. Mas na altura sim, e éramos só uns poucos em Inglaterra. Nós éramos mestres e antes do computador eram precisas pessoas como nós, pois conseguiam fazer magia com as câmaras. Ganhei muito dinheiro e com isso consegui publicar os meus próprios livros.
LV: E o lado artÃstico da fotografia?
BG: Isto é puramente a minha opinião, mas a “digitalização†da fotografia permitiu tirar fotografias e recolher informação correcta o suficiente para “lermos†a fotografia. Conseguimos entender sobre que é a fotografia porque o computador, que é a câmara, se encarregou disso. É só apontar a câmara. E isso facilitou muito a escolha de ser fotógrafo. Há muitas fotografias e ideias nas fotografias, mas isso não quer dizer que sejam boas fotografias. Também acho que os curadores actualmente não têm padrões tão elevados na sua selecção das fotografias. A maioria dos fotógrafos são terrÃveis. Mas isto é só a minha opinião. Era tão difÃcil há 30 ou 40 anos ser tecnicamente bom, actualmente parece muito fácil. Isto ajudou toda a gente a ser bom fotógrafo da famÃlia, mas....
Os jovens agora vão para a escola e saem de lá a querer logo um livro e uma exposição. Nós nunca pensámos assim, havia uma série de anos antes da primeira exposição e de um livro.
LV: Costuma trabalhar com assistentes vindos de escolas. Uma das suas crÃticas aos actuais estudantes de fotografia passa então pela capacidade técnica que adquirem.
BG: Primeiro, não sabem como iluminar. Muito pouca gente percebe como iluminar e por isso os estudantes saem das escolas com poucos conhecimentos de iluminação. A maior parte das pessoas usa a luz disponÃvel, ou seja, a luz natural. Não se vê muita gente actualmente a usar luz artificial. O saber usar a luz está a desaparecer.
LV: Na sua diversa carreia, que vai desde a fotografia comercial e de moda até à arte contemporânea, o retrato é um campo constante no seu trabalho. Foi algo que surgiu naturalmente e se foi consolidando, ou foi uma coisa que procurou como imagem de marca?
BG: Eu fui forçado pelas circunstâncias a entrar nesse campo. Se começamos a fazer muito bem uma coisa, qualquer que seja (pode ser fotografar gelados) vamos tendo cada vez mais disso. Cada vez mais e mais da mesma área da fotografia. Mas eu queria ser fotógrafo de moda, como todos os rapazes dos anos 1970, porque isso era glamoroso.
É preciso criar o seu próprio mundo fotográfico. Trabalhar arduamente e ser obsessivo, verdadeiramente dedicado, só assim se pode desenvolver uma nova forma de ver e uma vida de sucesso na fotografia.