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© Miguel Mendes
Helena Osório
Escritora, jornalista cultural e investigadora colaboradora do i2ADS / FBAUP
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Qual a última boa exposição que viu?
"Yayoi Kusama: 1945 - Hoje", que visitei a convite do meu neto de cinco anos e que pode ser vista até 29 de setembro. Aproveitamos para ver também em Serralves as restantes exposições patentes, recomendando "Pré/Pós - Declinações visuais do 25 de Abril", até 20 de outubro, e "C.A.S.A. Coleção Álvaro Siza, Arquivo", que se prolonga até setembro, com obras de vultos da arte portuguesa que ilustraram os meus livros, os quais visam educar na arte pela arte. Como sejam Álvaro Siza, Armando Alves, Eduardo Nery, Emília Nadal, Graça Martins, Gracinda Candeias, José de Guimarães, José Rodrigues, Paula Rego, e outros que entrevistei ao longo da carreira como Alberto Carneiro, Ângelo de Sousa, Fernando Calhau, Julião Sarmento, Rui Chafes, Silvestre Pestana, entre tantos que me levaram num voo pela sua vida sensível, artística e histórica, e me encheram a alma tornando maior.
Yayoi Kusama: 1945 - Hoje, Serralves. © Fernando Guerra
Que livro está a ler?
“Poemas sobre a busca incessante do amor” de José Barreto, o taxista poeta do Porto (Gugol Livreiros, 2023).
Que música está no topo da sua playlist actual?
A música de sempre.
Em Luanda (1974-1975), existia um jardim perto de casa onde passeávamos no cessar fogo. Dispunha de uma organização muito nipónica e pelos caminhos contorcidos íamos escutando música. Desde criança (melancólica como refugiada de guerra) e ao longo da vida, venho a cantarolar "Concierto de Aranjuez" composto por Joaquín Rodrigo, que se tornou a música da vida mesmo quando desconhecia o nome e autoria da obra. Um dos nomes do meu primeiro neto honra este grande compositor e pianista espanhol. Em 2012, regressei a Luanda, procurei o dito jardim e responderam-me que se desconhecem jardins na capital angolana.
Depois, veio Maria Callas, com a minha formação clássica em Bel Canto na desaparecida Escola de Música do Porto, sito rua João de Deus, entre outros intérpretes e compositores. A influência de uma tia-avó muito culta que acompanhava a concertos e a prática em coros, mormente no Coro Polifónico da Lapa dirigido pelo maestro Filipe Veríssimo, mestre capela e organista titular da Igreja de Nossa Senhora da Lapa no Porto, levou-me a escolhas simultaneamente sacras e profanas, como a "Ave Maria" de Bach / Gounod ou de Schubert / Liszt ou óperas como a Madame Butterfly ou Tosca de Puccini, entre tantas.
Já a obra "Nocturnes" de Frédéric Chopin e a música composta por Michael Nyman para o filme "Piano" (1993) da neozelandesa Jane Campion remetem a vivências numa fase muito boa da juventude em que vivi em plena Rua Augusta de Lisboa, e a uma grande paixão.
Também o fado, especialmente de Amália, me tem interessado, a par e passo com a poesia, tendo ensaiado (e quase gravado) algumas canções com os músicos Victor Castro (guitarra portuguesa) e Bruno Rodrigues (contrabaixo). Algo interiorizado na infância, pois os avós cantavam em casa temas de muitos poetas / fadistas.
Um filme que gostaria de rever…
“Esposas e concubinas” (1991) de Zhang Yimou.
O que deve mudar?
O olhar ao mundo (planeta) com vista a uma maior preocupação e cuidado; e o olhar ao outro de aceitação / inclusão (como homem-irmão não obstante a etnia, posição, orientação, crença).
O que deve ficar na mesma?
A nossa herança patrimonial e identitária, que ao invés está a ser destruída face a interesses financeiros e de poder, por parte de alguns “interesseiros” (em Portugal, no caso) que anulam a vontade da fatia significativa de cidadãos preocupados em preservar o legado artístico-arquitectónico, tanto em zonas urbanas como rurais, muitas já completamente descaracterizadas. E sem esquecer a violação da Língua Mater na política de ‘sabichões’.
Qual foi a primeira obra de arte que teve importância real para si?
“Gioconda” de Leonardo da Vinci, por me compararem nomeadas vezes com a modelo enigmática (Lisa del Giocondo), o que despertou em mim mais curiosidade pela dimensão da obra.
Qual a próxima viagem a fazer?
“Expresso do Oriente: de Paris a Istambul”, a viagem de sonho que devia ter feito há muitos anos e recusei então embarcar.
O que imagina que poderia fazer se não fizesse o que faz?
Ser cantora lírica ou até mesmo fadista (se a voz não falhar).
Se receber um amigo de fora por um dia, que programa faria com ele?
Levava-o em digressão por caminhos e encruzilhadas do Douro Vinhateiro até à terra de meus avós, desde Lamego a Celorico da Beira / Linhares da Beira, para sentir a interioridade e grandeza do cerne português.
Imaginando que organiza um jantar para 4 convidados, quem estaria na sua lista para convidar? Pode considerar contemporâneos ou já desaparecidos.
Convidaria para um jantar-tertúlia as quatro pintoras vivas das seis (Armanda Passos, Emília Nadal, Graça Martins, Graça Morais, Gracinda Candeias, Paula Rego) que ilustraram o meu primeiro livro publicado “Dos 8 aos 80. histórias pintadas” (Editorial Novembro, 2008). Armanda Passos e Paula Rego participariam em memória (e sempre). Em especial, Armanda com quem mais privei e me deslumbrou não só pela obra mas pela inteligência, espírito crítico, transparência, grandeza de ser, generosidade, sensibilidade / mecenato por causas como a defesa dos animais.
Quais os seus projetos para o futuro?
Instalar-me no campo, viver da terra, beber da natureza, e continuar a escrever não obstante o género literário e sobre temas relacionados com o jornalismo cultural (como até à data).
Libertar a alma!