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Julia Flamingo
Jornalista de arte
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Qual a ultima boa exposição que viu?
O museu Thyssen-Bornemisza, em Madrid, foi uma das melhores coisas que vi esse ano. Que coleção! Além da parte do acervo permanente regada a Francis Bacon, Lucian Freud e Giacometti, fiquei horas na pequena exposição do indiano Amar Kanwar, que faz um ativismo social com vídeos poéticos e sensíveis, misturando relatos de repressão pelos quais passam moradores de pequenas comunidades agrícolas na Índia com suas tradições orais.
Francis Bacon, Retrato de George Dyer num espelho (1968).
Lucian Freud, Grande Interior. Paddington (1968)
Que livro está a ler?
Carrego na bolsa o livro “História do cerco de Lisboa”, de José Saramago. Fazia 10 anos que eu não lia um livro dele e, agora que acabo de me mudar para Portugal, faz todo o sentido retomar sua obra. Na minha mesa de cabeceira está “A Bela do Senhor”, de Albert Cohen. O livro é muito longo e pesado e, por isso, prefiro ler em casa. E, por último, “Fotografia – Modo de Usar”, que comprei na Cinemateca de Lisboa. Me ajuda muito na aproximação das obras de artistas portugueses.
Que música está no topo da sua playlist actual?
Caetano Veloso sempre esteve e continua!
Um filme que gostaria de rever…
Em São Paulo adorava a Mostra Internacional de Cinema que acontece todo mês de outubro e traz filmes do mundo inteiro. Assisto-os uma única vez e depois nunca mais consigo achá-los...Em 2017 me marcaram o islandês “A Sombra da Árvore”, o francês “Custódia” e o documentário colombiano “Quase lá”. Adoraria revê-los.
O que deve mudar?
Os extremismos ideológicos.
O que deve ficar na mesma?
Nada, tudo tem que mudar!
Qual foi a primeira obra de arte que teve importância real para si?
Adoro as histórias de artistas que tiveram epifanias ao entrar numa exposição e assim decidiram começar a produzir. Ou pessoas que se apaixonaram perdidamente pela arte depois de dar de cara com uma pintura. Eu não tenho esse episódio para contar, minha relação com a arte sempre foi muito natural e orgânica, já que desde uns 3 ou 4 anos de idade, minha mãe me levava ao museu. Cresci assim: durante a semana, enquanto poucas pessoas visitavam o museu, minha irmã e eu ficávamos em frente às obras modernas e contemporâneas com papéis e canetinhas, desenhando a partir do que víamos. Como a minha mãe já havia visitado a exposição, nós duas é quem ditávamos quanto tempo queríamos ficar lá. Não era uma obrigação, mas um passeio divertido. Mais do que uma única obra, o que teve importância real para mim foram essas experiências: elas me fizeram virar jornalista de arte e, minha irmã, uma artista!
Qual a próxima viagem a fazer?
Tenho passagens compradas para a Bienal de Veneza, em maio, e estou bem curiosa! O curador geral, Ralph Rugoff, está propondo algo que me interessa muito: uma bienal sem tema, que reúne obras cujas propostas são novas maneiras de enxergar a realidade a partir de diferentes experiências e abordagens. Acredito e gosto muito dessa ideia. Também estou bem curiosa para finalmente ver a obra de Bárbara Wagner & Benjamin de Burca, dupla de videoartistas que irão ocupar o Pavilhão do Brasil. Acompanho seu trabalho e tenho feito entrevistas e textos sobre sua obra – eles irão nos surpreender! Veneza é linda, mas fazer turismo lá não me agrada nem um pouco. Então curtir a cidade a partir da imersão na arte contemporânea é maravilhoso.
O que imagina que poderia fazer se não fizesse o que faz?
Adoraria ser escritora de romances. Vivo lendo entrevistas em que autores que admiro contam sobre seu processo de escrita e aquilo me dá prazer. Eu gostaria de ter a imaginação, o dom, o esmero e a entrega que eles têm para passar meses ou anos trabalhando num mesmo texto.
Se receber um amigo de fora por um dia, que programa faria com ele?
Andar na Ribeira entre Santos e Belém! Para mim, um dos passeios mais lindos de Lisboa, que passa em baixo da ponte 25 de Abril e ainda termina em visitas ao MAAT (hoje mesmo, num sábado ensolarado, este será o passeio que farei depois de responder a este questionário). No fim da tarde, uma imperial no LX Factory e depois jantar por ali.
Imaginando que organiza um jantar para 4 convidados, quem estaria na sua lista para convidar? Pode considerar contemporâneos ou já desaparecidos.
Gordon Matta-Clark seria meu primeiro convidado: eu iria disponibilizar não só a mesa de jantar, mas minha casa para ele fazer a intervenção que desejasse! Depois, recebia Hans Ulrich Obrist, quem eu tenho certeza que daria uma boa conversa com o Matta-Clark e para quem eu tenho milhares de perguntas a fazer. O terceiro convidado seria Maurizio Cattelan: ele iria pôr lenha na fogueira e chegar com muito bom humor para um bate-papo interminável regado a vinho. Por último, a Cindy Sherman: eu adoraria entender de onde ela tira tantos personagens diferentes e tentar ao máximo descobrir quem é Cindy Sherman original.
Quais os seus projetos para o futuro?
Sou fundadora do BIGORNA (bigorna.art.br), um site didático que explica de maneira simples sobre o cenário da arte contemporânea. Meus projetos para o futuro já nasceram quando eu trouxe a plataforma de São Paulo para Lisboa. Meu maior objetivo é aproximar qualquer pessoa dessa cena, dando ferramentas para que o interessado possa se apropriar das suas opiniões sobre a arte contemporânea. Trabalho nisso com afinco e energia e quero construir cada vez mais parcerias com instituições culturais e de ensino e outras iniciativas criativas, aumentando a capacidade do BIGORNA de produzir conhecimento e contribuir para o pensamento crítico. Simplificar a comunicação sobre arte contemporânea e levar mais pessoas a frequentarem os espaços culturais - é um projeto ambicioso que exige trabalho de formiguinha!
As visitas guiadas do Bigorna acontecem mensalmente por espaços culturais de Lisboa. Para acompanhar a programação e participar, aceda ao facebook Bigorna por Julia Flamingo ou ao Instagram @bigorna_art