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ARTES PERFORMATIVAS


LOURENÇO CRESPO

MIGUEL PINTO

2020-12-20



 

 

A 17 de Junho de 2016, o Jornal Público anunciava como motivo da sua edição do Ipsílon, o título: “O futuro da música portuguesa passa por aqui”. Na capa figuravam caras como as de Filipe Sambado (cujo primeiro álbum teria recentemente saído), Vaiapraia (que não tinha ainda editado o primeiro álbum) ou Primeira Dama, mas no centro estava Lourenço Crespo, cujo primeiro disco, intitulado Nove Canções, teria sido lançado há cerca de 2 meses.

Na altura, celebrava-se o nascimento da recém-formada Xita Records, surgida no seio das editoras de música independente formadas naquela década em Lisboa: a Spring Toast Records, a Gentle Records, mas principalmente, a Cafetra Records.

Surgida no início da década passada, a Cafetra terá sido um dos exemplos mais claros da efervescência juvenil em Lisboa, no que respeita à escrita de canções: nela surgiram bandas como Pega Monstro, caracterizadas por um punk-rock sujo e desobstinado, e escritores de canções como Éme ou Lourenço Crespo. Ao anúncio desta nova década, o coletivo parece ter inaugurado uma séria dobra: Lourenço é capaz de ter anunciado à editora o seu primeiro grande passo de maturidade.

 

 

E, com isto, não nos referimos ao lugar comum do coming of age ou do fim da adolescência. O disco soa-nos mais a primeiro casamento, a alguém que já vive acompanhado e independente em algum bairro dessa Lisboa, e que decidiu, espontaneamente, lançar um disco, como poderia ter feito qualquer outra coisa. A beleza destas canções, produzidas com a ajuda de B Fachada, vêm dessa direta e aparente simplicidade, como Lourenço já nos habituara no seu primeiro disco, mas aqui com uma calma que parece controlar as melodias a seu bel prazer: o saxofone de Pedro Sousa em “Avalanche”, o teclado de “Pêlo pelo” ou as vozes de Sallim e Lourenço em “Amor não te vou largar” levam as canções aos braços, embalando o bebé que “Fetra!” parece anunciar.

A escrita continua imaculada no seu desembaraço habitual (“Sofre a toda a hora/custa tanto existir com alma de cota” canta em Avalanche), e o som revela-se no pormenor das opções estéticas: há a marcante e já habitual sensibilidade analógica da produção, mas os arranjos são mais palpáveis, a instrumentação é dinâmica na restrição da sua paleta, e os tons e narrativas alteram-se faixa por faixa sem nunca fugirem à habitual, e também nossa, realidade, compondo o caos organizado que faz deste um disco homónimo.

Tudo aqui já soa a adulto, afinal já passaram 4 anos desde Nove Canções: o som está focado, assente e, de certa forma, acomodado. Resulta uma prova do que a Cafetra nos poderá trazer nos próximos anos, não estando ainda presa à eterna adolescência da década passada, mas traçando agora uma segunda fase da vida dos seus protagonistas, acompanhando a nossa própria, de tempos a tempos. E nós aqui estamos para os ouvir.

 

>> Lourenço Crespo no Bandcamp

 




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