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A FORMA IDEAL
STEVE WATSON
Quando o designer RON GILAD se mudou de Tel Aviv para Nova York em 2001, sentiu-se como um extraterrestre; não conseguia encontrar bem as palavras em inglês para expressar a visualidade-trocadilho dos seus pensamentos. Felizmente, os objetos que ele cria falam a sua própria língua - um idioma que atravessa a " linha gorda e deliciosa entre o abstrato e o funcional", como a sua biografia profissional explica.
Onze anos depois, Gilad ainda se sente como um extraterrestre em Nova York, apanhado não tanto entre o hebraico e o inglês, ou entre a linguagem verbal e a visual, como entre o mundo da arte e o mundo do design. Ainda assim, teve a sorte de ser reconhecido por ambos, e o seu trabalho encontrou o seu caminho para as coleções do Museu de Arte Moderna e do Museu Metropolitano de Arte de Nova York, e ganhou uma pequena, informal exposição, em 2006, no Cooper-Hewitt, National Design Museum da cidade. Apesar da muito desacreditada descida da arte em "mero" bom design, ainda há alguns locais preciosos que significativamente acomodam tanto a arte como o design. Assim, não é de surpreender que, embora o seu trabalho tenha aparecido com algum grau de frequência em lojas, só em 2012 sai este que é o primeiro artigo sobre Gilad numa revista americana de arte.
Gilad não tem um "look" autoral. Em cada projeto ele reinventa a roda, por assim dizer (mas tenha cuidado com o que deseja). Talvez o seu projecto mais conhecido, produzido sob a sua antiga marca, Designfenzider, é o candeeiro pendente “Dear Ingo” (2003), sendo exemplar do que é a sua abordagem, que é a de interrogar a própria essência do objeto funcional sob investigação, e em seguida, derrubar e esclarecer alguns dos seus aspectos fundamentais e previamente despercebidos - ou das nossas expectativas para ele. O que é um candelabro? Gilad perguntou. É uma luminária feita de muitas lâmpadas individuais que pende do tecto. Com a luz Ingo (uma homenagem ao designer industrial alemão Ingo Maurer), que oscila em fios como uma aranha, ele literaliza essa realização simples: Este acessório é nada mais do que um anel de aço ao qual o designer afixou cerca de dezasseis candeeiros basculantes do tipo que adornam cada secretária de dormitório na América. Voilà, um lustre ajustável. Outro sucesso inicial foram os seus vasos “Run Over By Car” (2001), cada um deles um objeto único produzido em massa. Gilad pegou em cilindros de metal fabricados industrialmente, cortou uma fenda em cada um perto do topo e, em seguida, colocou-os no caminho de um automóvel; o objeto único esmagado que resultou foi então pintado; a fenda, depois de ter sido rasgada num orifício maior, seria agora a abertura do vaso.
Com o tempo, o repensar de Gilad do objeto levaria a uma maior abstração, e deslocou-se livremente das formas mais fluidas, irregulares ou derivadas do acaso, para formas contundentemente geométricas. Consideremos uma das duas obras na coleção do Met. “Plataform + border = Fruit Bowl” (Part 1) (2000) liga oito pontos com doze linhas de bronze em torno de uma laje quadrada autónoma de madeira de faia para sugerir um poliedro rectangular dentro do qual se pode armazenar frutas - um rígido hiperbólico, mesmo contraditório, refazer da tigela. Os seus mais recentes Wallpiercings, de 2010 (na colecção do MoMA e produzidos pela empresa de luzes Flos), dotam-se da tecnologia LED para elegantemente transcender o problema mundano dos apliques. Estes painéis montados verticalmente filtram a dura luminescência do LED através de tubos de alumínio que são expressivamente entrelaçados, sugerindo uma escultura de luz abastracta, de beleza rara e etérea mais do que uma solução prática de iluminação.
Por vezes, Gilad parece ter-se afastado inteiramente da função, em direcção à linha, ao símbolo, ou até mesmo à forma platónica. Um projecto recente, “20 Houses for 20 Friends” (2009), praticamente assenta na sua inutilidade. As “20 Casas” – desenhos de linha essencialmente esquemáticos em três dimensões destas formas arquitectónicas fundamentais – foram aumentados e exibidos como arte pública (sob o título “The Neighborhood”) na Universidade de Milão e no Parque Gorky em Moscovo em 2011. “Eu não sou um verdadeiro designer”, gaba-se. “Eu não me preocupo em criar produtos ou resolver problemas funcionais.” Em meados de Abril de 2012, durante a Feira de Mobiliário de Milão, Gilad teve uma mostra individual na Dilmos Gallery, com peças em exposição em cinco outros locais. A exposição, intitulada “The Line, the Arch, the Circle & the Square” (“os elementos básicos com os quais o nosso mundo é construído”, nota o designer), é o autêntico Ron Gilad: só a formas básicas – mas, claro, processadas através do seu rigorosamente analítico e incansavelmente lúdico cérebro. Esta exposição pode ser pensada como um “bloco de desenho em três dimensões” (termo do designer) no qual Gilad isola, escrutina e reconfigura esses elementos rudimentares, refazendo-os.
O seu “Birth of a Chair” (2009), põe o quadrado numa sequência de permutações a três dimensões, mostrando como uma cadeira evolui. O alinhamento destes 20 objectos de prata pintados de preto (o maior dos quais tem apenas alguns centímetros) resulta num trabalho colectivo que tem cerca de 1 metro e parece animado, como uma progressão de Eadweard Muybridge. Em várias peças novas, uma linha transforma-se num arco. O arco totalmente formado é criado em mármore ou vidro – ou como uma peça de bagagem. Ostensivamente, esta peça é a mais funcional. Até nos podemos sentar no seu “Glass Tube Bench” (2012), mesmo sem conforto, podendo chegar a deslizar.
Nascido de uma mente lúdica não reprimida, o caderno de desenhos de Gilad joga com essas formas platónicas, imaginando como elas se sonham a si próprias.
[versão portuguesa do original inglês]
Steve Watson
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Este artigo foi originalmente publicado na revista Artforum.