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CERAMISTAS E ILUSTRADORES: UMA RESIDÊNCIA EM VIANA DO ALENTEJO
CARLA CARBONE
2021/08/22
Quatro ilustradores e uma família de ceramistas reuniram-se, entre 4 e 9 de julho, em Viana do Alentejo, numa Residência de Artistas, com o objetivo de criar peças inovadoras de olaria.
Os ilustradores que colaboraram nesta residência foram Bruno Reis Santos, Mariana A Miserável, José Torres, Mariana Malhão, e os ceramistas, o casal Feliciano e Rosa Mira Agostinho.
A Residência em Viana do Alentejo foi organizada pela “Vicara”, marca de Design portuguesa, e pela “Passa Ao Futuro”, associação sem fins lucrativos, que tem desenvolvido um trabalho intensivo em torno da valorização e preservação do património cultural material e imaterial do artesanato português.
© Vicara / Passa ao Futuro.
O projeto de olaria alia, nesta união de artistas, o antigo, a tradição popular da cerâmica típica alentejana com a cultura urbana e contemporânea, própria da expressão artística destes ilustradores. O resultado é uma expressão totalmente nova. Confirmando, além do aspeto positivo da conservação da cultura local, que o design só pode beneficiar criativamente por meio do contacto estabelecido entre o passado e o presente, entre diferentes culturas, e que por isso, é nesse confronto que nascem novas perspetivas e novas soluções para os problemas sociais, económicos e ambientais das comunidades. O designer quer-se, cada vez mais, como agente de fortalecimento social, ao serviço das pessoas, concentrado na resolução de problemas concretos, do dia a dia.
A visão modernista, iniciada no princípio do século XX, defendia o novo acima de todas as coisas e repudiava a tradição. Esta visão, que resultou redutora mais tarde, veio a provocar na prática do design uma décalage relativamente aos problemas reais das pessoas e da sociedade. O design, e a produção de objetos, andavam de costas viradas para a vida.
Não se tratava somente de “objetos de desejo”, usando o título do livro de Adrian Forty, mas de objetos mediadores, mais humanos, que pudessem transformar uma sociedade, de modo a que a mesma pudesse manter a sua identidade, a sua sustentabilidade. Essa ajuda direta das pessoas passaria pela possibilidade de, através da produção artesanal de objetos, gerar ou preservar emprego a artesãos.
Feliciano Branco Agostinho na sua olaria. © Vicara / Passa ao Futuro.
Feliciano Branco Agostinho, oleiro como o seu pai, abriu em 1982 uma oficina com 14 empregados. Hoje mantém a Olaria Mira Agostinho, mas apenas com duas pessoas. Feliciano Agostinho, como manda a tradição, molda o barro na roda, e a sua mulher cobre a superfície com a pintura.
Ao contrário do que é habitual, desta vez são os ilustradores, e não Feliciano, quem desenha a decoração para as peças de cerâmica. O resultado é uma explosão de criatividade e de alegria.
As peças que desenvolveram foram feitas com uma boa dose de humor, como é característica destes ilustradores. Recuperaram tipologias de objetos como os tradicionais alguidares, os pratos de parede, os potes antropomórficos, entre outros.
A iniciativa da residência contempla ainda a promoção de workshops de olaria para um público infantojuvenil, além de conversas, abertas à comunidade, com os artistas envolvidos. A mostra física dos resultados da residência em Viana do Alentejo terá lugar em dezembro, na Galeria Senhora Presidenta.
Carla Carbone
Estudou Desenho no Ar.co e Design de Equipamento na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Completou o Mestrado em Ensino das Artes Visuais. Escreve sobre Design desde 1999, primeiro no Semanário O Independente, depois em edições como o Anuário de Design, revista arq.a, DIF, Parq. Algumas participações em edições como a FRAME, Diário Digital, Wrongwrong, e na coleção de designers portugueses, editada pelo jornal Público. Colaborou com ilustrações para o Fanzine Flanzine e revista Gerador.