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MAXXI ROMA
CONSTANÇA BABO
A arquitetura do MAXXI - Museu Nacional da Arte do Séc. XXI - é tão valiosa quanto as obras de arte que abriga. Ao visitá-lo, a experiência estética é impulsionada não só pelos objetos artísticos que nele se encontram expostos, como pelos espaços e suas ligações. O projeto é de Zaha Hadid, arquiteta anglo-iraquiana que, de entre os 273 participantes, foi a vencedora do concurso lançado, em 1998, pelo Ministério da Herança Cultural de Roma. Tal deveu-se, sem dúvida, à capacidade da arquiteta em conceber um edifício que, tendo como ponto de partida a antiga fábrica que ocupava o terreno, se apresenta de acordo com o que arte contemporânea é: uma inequívoca articulação entre o belo e o conceptual, o visual e o físico, numa singularidade de traços e formas que, em conjunto, convidam à vivência do espaço e à sua descoberta.
Contam-se 360 degraus ao longo de toda a estrutura labiríntica, na qual, percorrendo e apreendendo o espaço, se torna clara a complexidade da criação de Zaha Hadid. A particularidade de toda a estrutura é ainda impulsionada pela inserção de alguns outros elementos, tais como a obra de Anish Kapoor (img.3), no rés-do-chão, intitulada Widow e concebida em 2004 propositadamente para esta área. A interação deste objeto de grande dimensão com o espaço envolvente aumenta o impacto no espetador e, como é explicado no texto que apresenta a obra, provoca uma experiência visual, espacial e física, sendo isso mesmo, na verdade, o que ocorre por todo o museu.
O branco, o preto e o vermelho são as cores que ocupam a área central e de entrada no edifício, distribuindo-se pelo espaço em formas geométricas que se cruzam e articulam num design afirmativo e cativante. O metálico e o vidro também predominam na construção do museu, sendo que as zonas mais neutras e despojadas se encontram reservadas às exposições de arte, estas divididas entre uma coleção permanente e várias temporárias.
Perante tal dimensão e magnitude do edifício faz sentido que a temática que, permanentemente, ocupa a galeria 4, no primeiro andar, seja dedicada à Arquitetura e arte em diálogo. Explora-se aí a geometria em paralelo com a abstração, o volume vs. a síntese, a estratificação e a fragmentação, a medida em confronto com o corpo e a ideia do conjunto em relação à do detalhe. Discutem-se elementos que, apesar de aparentemente opostos, nem sempre se contrariam e, pelo contrário, suportam-se e complementam-se, juntos compondo as edificações que decoram o nosso mundo. A exposição mostra projetos, desde os esboços e maquetes a fotografias e vídeos dos espaços, entre os quais se encontram grandes construções, tais como a estrutura que albergou os Jogos Olímpicos de 1960, da autoria de Pier Luigi Nervi, o Novo Centro de Congressos de Roma, de 2016, de Massimiliano e Doriana Fuksas, ou, naturalmente, o próprio projeto do MAXXI. No total contam-se 30 trabalhos de arte e 21 projetos de arquitetura, ambos da autoria de grandes nomes do séc. XX da área do design e das artes. A leitura destas obras e o contacto com elas é, sem dúvida, dinamizado pelas superfícies que, suspensas no tecto na forma de complexas grelhas, em ligação com toda a área circundante, suscitam o envolvimento e ação do público, proporcionando uma experiência ativa.
Com efeito, a arquitetura engenhosa e arrojada de Hadid possibilitou uma visita muito singular a todas as exposições que se realizem no museu, como é o caso das atuais temporárias, uma de fotografia representativa de Itália e uma projeção imagética da artista paquistanesa Shahzia Sikander. Também na mostra do Prémio MAXXI 2016, na galeria 3, verifica-se um estratégico uso do edifício e uma forte interação com este através de obras site specifics, grandes instalações muito singulares que habitam o espaço e se alimentam dele, como se verifica claramente na obra de Riccardo Arena (img.5), que parece romper e nascer do chão. Composta, composta por vários elementos brancos e pretos, a peça parte do pensamento do cosmism, um movimento filosófico que, na Rússia do séc. XIX, teorizou a capacidade do homem dominar as forças naturais. Intitulada Orient 1, diverge esteticamente de uma outra, dourada, que se exibe apenas a uns metros de distância, da autoria do grupo de artistas Zapruder. Com o nome de Zeus Machine (img.6), o grande objeto é, na verdade, o espaço de projeção de um vídeo que procura refletir sobre a sociedade moderna através da conjugação do místico e da realidade política de diferentes tempos e espaços.
Paralelamente a estas obras altamente contemporâneas, através da No.2 de Mark Rothko e da Scratches on the Earth de Mohsen Vaziri Moghaddam, dá-se a primeira impressão do que será a grande exposição já anunciada para março de 2017. A grande coleção do Museu de Arte Contemporânea do Teerão será aqui exposta, o que constituirá um momento imperdível para contemplar e conhecer algumas das maiores criações artísticas já alguma vez realizadas. Contribuirá, também, para reforçar a importância do MAXXI que, desde 2010, se destaca por relacionar a arte mais atual com as grandes produções que compõem a história da arte.
Por se encontrar em Roma, avassaladora capital de arte conhecida como museu aberto, origem de enorme produção artística e raiz da história da arte, este edifício e projeto tão contemporâneos e igualmente inovadores, surgem como um imenso contraste com a carga histórica local e provocam um desafio ao pensamento cultural e artístico.
MAXXI apresenta-se, assim, como a primeira instituição nacional italiana dedicada à criatividade contemporânea. É gerido por uma Fundação, dirigida por Giovanna Melandri e criada, em 2009, pelo Ministério da Herança e Atividades Culturais de Roma. Hou Hanru é, desde 2013, o diretor artístico do museu, havendo uma subdivisão entre a secção do MAXXI Arquitetura, ao cargo de Margherita Guccione, e do MAXXI Arte, da responsabilidade de Bartolomeo Pietromarchi. Pode ainda referir-se uma extensa programação de atividades e eventos que variam desde conversas, conferências, workshops e performances, numa pluralidade e diversidade de atividades que promovem, precisamente, o desenvolvimento criativo da arte contemporânea. Esta programação é acompanhada de um paralelo e contínuo trabalho de nível estético, apoiado pelo centro de pesquisa e biblioteca que, simultaneamente, contribuem para a ligação com o público e possibilitam a oportunidade de pontuais participações deste.
Assim, vivendo em Roma ou apenas visitando a cidade, é importante descobrir este espaço de crescimento artístico, onde o visual e o conceptual se unem na criação de algo maior.
Constança Babo