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O ESTADO DA ARTE


Vista da exposição da desigualdade constante dos dias de leonor*, de Leonor Antunes; CAM. @ Pedro Pina


Vista da exposição da desigualdade constante dos dias de leonor*, de Leonor Antunes; CAM. @ Pedro Pina


Vista da exposição da desigualdade constante dos dias de leonor*, de Leonor Antunes; CAM. @ Pedro Pina


Vista da exposição da desigualdade constante dos dias de leonor*, de Leonor Antunes; CAM. @ Nick Ash


Ana Hatherly, «da desigualdade constante dos dias de Leonor», 1972. CAM – Centro de Arte Moderna Gulbenkian, inv. 04DP2004. © Ana Hatherly / Foto: Bruno Lopes


Montagem da exposição da desigualdade constante dos dias de leonor*, de Leonor Antunes; CAM. @ Pedro Pina


Montagem da exposição da desigualdade constante dos dias de leonor*, de Leonor Antunes; CAM. @ Pedro Pina

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da desigualdade constante dos dias de leonor*
de Leonor Antunes

21 set 2024 – 17 fev 2025
Centro de Arte Moderna Gulbenkian

 


A reabertura do Centro de Arte Moderna foi batida por um vento de perplexidades que na verdade não chegaram a avolumar-se numa intempérie de críticas pesadas. Tudo acabou por dissipar-se numa brisa morna de suspeitas. Ora sobre a genuína bondade de certas decisões institucionais, como a de ter na direcção o nome de Benjamin Weil, curador de artes dos media, e que já deu provas de que é capaz do melhor (ter programado para esta reabertura, no âmbito da iniciativa «Temporada Japonesa», a corajosa exposição «M5A5» de Go Watanabe, mas cujo mês e meio de exibição no Espaço Projecto foi ultrajantemente curto), como também é capaz do pior: a curadoria do projecto desairoso que é a «H Box», concebido pelo arquitecto franco-português Didier Fiúza Faustino, e onde são exibidas peças videográficas entre o escolares e o esquecíveis. Ora pairaram ainda as suspeitas sobre o acerto de decisões museográficas temerárias, como a de alojar a Colecção do CAM na Galeria Subterrânea [Piso C1], tendo ao fundo uma sala de 100 m2 com o que está designado como espaço das «Reservas Visitáveis», e onde podem ver-se, penduradas em gradil de armazém, as peças mais emblemáticas do lote de arte moderna da colecção, o que provocou un tout petit scandal de saison.

Porém, onde o sucesso da operação “novo CAM” nada garante que esteja assegurado é na exacta recuperação do edifício, com a junção grandisonante da peça arquitectónica de nome Engawa, desenhada pelo arquitecto japonês Kengo Kuma, a que já aqui apontámos a escala desorbitada, o uso incerto, a fotogenia demagógica, e a qual Edwin Heathcote, no Financial Times de dia 6 de Novembro acusou de sofrer de «a problem of inflation», não resolvendo esta ‘simples’ cobertura adossada a uma parede branca qualquer problema manifesto, tornando-se somente num pavilhão vistoso mas raté. Todavia, o que porventura terá gerado desconforto menos atenuável foi ter-se dedicado o espaço da Nave-hangar do edifício original do CAM, desenhado pelo arquitecto britânico Leslie Martin, e que apesar do aspecto datado resistiu indemne à renovação de Kuma, à exposição única, intitulada «da desigualdade constante dos dias de leonor*» da autoria de um só nome, o da artista Leonor Antunes. Desconforto injustificado.

A exposição «da desigualdade constante…» tem fácil descrição física e material: trata-se de um conjunto de peças verticais (trinta e oito), em materiais correntes [madeira, couro, alumínio, corda de algodão e de cânhamo, fio de nylon, latão, baquelite], suspensas na estrutura em vigas inclinadas do hangar do CAM, distribuídas numa métrica aparentemente regular, e que apresentam a proporção de pilares delgados que nunca atingem o plano horizontal do pavimento. Se necessário for traduzir o aspecto desta exposição numa imagem naturalista, para visualização mais franca, trata-se de uma série de estalactites que transformam a nave do CAM num recinto cavernoso, uma grotta, cuja nobilíssima categoria estética que melhor a honra é o muito excelso e controverso, e ainda mais difícil de dominar, grotesco. Não o grotesco gráfico-social de um William Hogarth, mas o grotesco cenográfico de um Piranesi; não o grotesco lúdico de um Alexander Calder, mas o grotesco sofisticado de uma Marisa Merz.

De todas as categorias estéticas, se descontarmos o trágico, o grotesco será seguramente a que está dada às desvalorizações mais desinformadas. Isto na igual medida em que o trágico está dado aos mais inalcançáveis merecimentos. E o mais inesperado será talvez o modo como se tocam. O toque grotesco do trabalho de Leonor Antunes supera, em subtilezas várias, a carranca do maior paladino do trágico da arte contemporânea em Portugal, Rui Chafes. E há momentos nesta «da desigualdade constante…» nos quais poderá pensar-se que o imaginário de Antunes é comum ao de Chafes. Sobretudo naqueles artefactos que transportam um lastro torturante. Mas não passará isso de uma afinidade equívoca. O trabalho de Leonor Antunes tem uma filigrana burlesca requintada e de um encantamento que o faz viajar para latitudes onde a obra de Chafes representará apenas exotismo mórbido. Antunes resuma de um enigmático jardim persa em Isfahan. Chafes é um virtuoso do punishment museum for torment design am Kölln. E estas cauções geográficas são do foro do anedotário, e cingem-se a colocar os autores em órbitas visualistas identificáveis, não são proveniências etnográficas.

A exposição «da desigualdade constante…» é um recinto de conhecimento e de reconhecimento, e não um simples hall de contemplação. É a partir daqui, que o que foi atrás dito como tendo descrição fácil se muda em território de uma percepção exigente. E daí, numa descrição difícil, de onde lhe vem todo o magnetismo. A figura maior que a Antunes foi dada compor é a do labirinto, num contexto e numa atmosfera em que, por via do racionalismo árido do hangar de Leslie Martin, um típico open-space museológico pós-Beaubourg, tal pareceria uma impossibilidade, pois que se trata de labirinto que logo à entrada, mas muito enganadoramente, parece mostrar os seus meandros e revelar o seu caminho. Os fios de Ariadne estão todos à mostra. Por isto, há que dizer que quem realizou a grande reconversão do edifício do CAM não foi Kengo Kuma, mas a exposição astuta de Leonor Antunes. E será uma pena não podermos vir a observar o trabalho que a passagem do tempo viria, materialmente, a fazer a estas peças neste lugar, e cujas formas insólitas transportam para o mundo finíssimo das máquinas celibatárias de Duchamp [v. a extraordinária peça «voilette» (2024)], ou para os cadavres exquis de Picabia, mas já sem aquela ganga Dada e surrealista que faria delas um espectáculo de variedades. E a glória mais insuspeitada desta «da desigualdade constante…» é transformar a muito anódina nave ‘fero-modernista’ do CAM, numa região demarcada do mais apurado site-specific, volte-face que só aos mais audazes é dado experimentar. As peças de Leonor Antunes, que o linguajar impiedoso dos detractores já traduziu como ‘pingentes’, ‘penduricalhos’, ‘berloques’, vêm banhadas por atmosferas heteróclitas mas parecem todas verter uma crítica de fundo ao universo bonançoso da disciplina que mais marcou a ideia de progresso novecentista, o design. Neste sentido, é reconfortante observar como Antunes recua para territórios que o design fez cair em desgraça, e trabalha sobre um imaginário em que o léxico, que apesar de ter estado sempre associado à noção de bem-estar por todo o século XX, surge hoje como uma língua morta. Falamos da mobília, da carpete, do cortinado, do papel de parede, do macramé, do baquelite, do encaixe em latão, da caixilharia em alumínio, da luminária fluorescente, do almofadado em couro. As peças de nome «a toiture couronnant le tout» (2024), «Franca #5» (2018) e «Franca #3» (2018) contêm uma dimensão por um lado tão sofrida e por outro tão paródica, mas sempre num hieratismo tão abandonado, que fazem pensar se esta exposição não será afinal a recriação daquele sótão onde foram apodrecer todas as genuínas peças middle-century, e que antes foram de aparato nos moderníssimos cine-teatros, nos lobbies janotíssimos do hotéis da cadeia Sh., nos diners da estação R. Termini, nos andares-modelo da Upper Madison, e que hoje a indústria do vintage imita sequiosamente. E a peça que melhor devolve este air-du-temps é exactamente aquela, Ana #4 (2024) que retroverte em malha de couro um desenho a tinta da china da artista Ana Hatherly com o título que Leonor Antunes pediu emprestado para esta exposição, precisamente, «da desigualdade constante dos dias de leonor» (1972). Quem a vê, a esta peça, logo dirá, este é o esqueleto que restou daquela cortina dourada glamourosíssima, às ondas plissadas, e que a cada sessão subia com efervescência à frente do écran na última sala de cinema de charme, lá pelo fim do Sunset Boulevard.

 

 

 


João Borges da Cunha
Doutorado em Estudos de Cultura, Universidade Católica Portuguesa. Arquitecto, Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa. Professor no Departamento de Arquitectura da ECATI [Escola de Comunicação], Universidade Lusófona. Investigador nos centros ARQ.Id e CECC. Publicou ensaio, teatro e ficção.