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@MIAMIARTWEEK - O FUTURO AGENDADO NO ÉDEN DA ARTE CONTEMPORÂNEASÉRGIO PARREIRA2018-12-20
Em Dezembro de 2001, a Art Basel tinha tudo programado para inaugurar pela primeira vez em Miami, mas como consequência dos trágicos eventos em Nova Iorque a 11 de Setembro do mesmo ano viu-se forçada a adiar por um ano aquela que é hoje a maior feira de arte a acontecer nos Estados Unidos. Dezassete anos passados, é quase impossível, e seria extremamente exaustivo, enunciar todos os números que descrevem hoje esta semana, mas apenas para se ter uma breve ideia, a acontecer simultaneamente apenas em 2018 com a Art Basel Miami Beach, houve pelo menos mais 17 feiras de arte (que eu tenha conhecimento): Art Miami, CONTEXT Art Show, Aqua Art Miami, Design Miami, Scope Art Fair, Untitled Art Fair, PULSE Art Show, NADA, Red Dot Miami, Spectrum Art Fair, SuperFine! Miami Beach, FREE!, PINTA Crossing Cultures, Urban Art Fair, Faena Festival, Satelite Art Show, e Art Africa Miami. Paralelamente às denominadas feiras, há ainda que destacar os Museus locais que antes da abertura oficial da Art Basel, inauguram as suas melhores exposições do ano: Pérez Art Museum Miami, ICA Institute of Contemporary Art Miami, MOCA Museum of Contemporary Art North Miami, The Bass Miami Beach, Frost Art Museum - Florida International University, NSU Art Museum Fort Lauderdale, Museum of Art and Design, Wolfsonian – Florida International University. Há ainda paragens obrigatórias a adicionar a todas estas, como são as coleções privadas Rubell Family Collection, The Margulies Collection at the Warehouse, a De La Cruz Collection, e ainda o The Moore Building que tem estado anualmente a apresentar um projeto corealizado pela Gagosian e a Jeffrey Deitch Gallery.
The Moore Building: Larry Gagosian and Jeffrey Deitch, Pop Minimalism Minimalism Pop.
Apesar de pessoalmente conseguir identificar inúmeros pontos negativos no que respeita à eficácia desta quantidade um pouco inflacionada de eventos que acontecem num curto período de 7 dias, o saldo que no final se transporta desta equação terá necessariamente que ser positivo, por inúmeras e indiscutíveis razões. Em termos de mercado, o que inicialmente foi projetado e visionado pela Art Basel, acabou por se confirmar. Naturalmente que adaptações e gestão de danos colaterais a este crescimento foram sendo feitas ao longo do percurso, assim como se foi ajustando o grau de investimento e nível de compromisso por parte das entidades governamentais locais. Neste momento, é seguro dizer que o Governo do estado de Miami, está em modo cruzeiro no que respeita a ratificação de qualquer investimento que possa beneficiar e ajudar ao crescimento da Art Basel Miami Beach em particular, e de todos os restantes eventos satélite. O que num estágio inicial se apresentou como um projeto pontual no antigo Centro de Congressos de Miami Beach e que por alguns anos foi sendo denominado como Art Basel Miami Beach, tem hoje uma nova designação com hashtag oficial de Miami Art Week @miamiartweek. A primeira semana de dezembro em Miami deixou de ser um exclusivo da Art Basel com um foco estritamente comercial para se transformar numa paragem obrigatória para qualquer apreciador de arte contemporânea. A razão para esta constatação é na verdade bastante simples: tudo o que provavelmente se destaca e está a produzir/criar no âmbito do contexto contemporâneo a nível mundial, com foco nas Américas, estará de certa maneira, categoricamente representado num dos eventos a acontecer durante estes dias neste Estado Norte Americano. Passou-se o ponto de não retorno, e para os mais céticos (nos quais eu me incluía), já não há nada que se possa argumentar. Miami é indiscutivelmente, e muito seguramente no decorrer dos próximos dez anos, o local para visitar e estar representado no que respeita ao mercado de arte contemporânea nos Estados Unidos. O que acabo de referir, faz com que se despolete uma maratona de agentes, desde artistas, produtores, organizadores, promotores, entre muitos outros, à conquista de um lugar neste ambicionado espaço comercial em crescimento. Começa também a ser cada vez mais significativo e relevante, por esta mesma razão, entender onde não estar, assim como apreender com mais clareza os objetivos dessa presença ou representação.
Art Basel Miami Conventions Center.
Num período de quase duas décadas em Miami, a Art Basel comunicou a sua relevância, demonstrou localmente porque é insubstituível enquanto gerador de dinâmicas neste mercado, retirando legitimamente os benefícios dessa excelência. Enquanto muitos dos eventos se apressam a crescer numa tentativa de acomodar a inflacionada procura, a Art Basel tem-se focado na otimização dos recursos, na consolidação das parcerias, assim como no reposicionamento do projeto em Miami. Como exemplo disto, colocou em standby algumas iniciativas que até 2017 tinham sido amplamente populares, como é o caso do Public Sector no Collins Park, numa estratégia de preservação da qualidade e da sua intocável exclusividade. Este ano, o centro de congressos onde a Art Basel se tem vindo a apresentar desde que debutou em Miami, reabriu na sua totalidade após atravessar um período de uma renovação absolutamente extraordinária, feita em muito à medida da Art Basel que assinou recentemente um contrato de exclusividade para a exploração deste espaço com o Governo de Miami. Em 2019 irá reabrir um parque público adjacente ao centro de congressos e muito provavelmente o regresso do Public Sector. Há igualmente outras feiras que já são instituições com privilégios (não equiparados à Art Basel, mas de semelhante importância), como é o caso da Art Miami composta por Art Miami, CONTEXT Art Fair, e Aqua, cujos locais de apresentação têm também contratos assinados de exploração para o decorrer da próxima década. A Untitled, SCOPE, e a PULSE, são excelentes exemplos de conquista do seu local neste mercado, explorando as três, em locais distintos de Miami Beach, privilegiadas localizações no areal de South e North Beach.
PULSE Art Show
Aqua Art Miami
Independentemente dos projetos conceptuais e programáticos destas feiras que acabo de referir, todas elas podem ser consideradas uma aposta segura. A par delas temos ainda projetos como é o caso da PINTA - Crossing Cultures que estabeleceu uma parceria com a MANA Wynwood, ou a NADA - New Art Dealers que tem mudado pontualmente de local ao longo dos anos. Ambos os projetos são igualmente sólidos e no caso da PINTA de elevadíssima qualidade. MANA Wynwood encontra-se precisamente num bairro (Wynwood) que nos últimos dois anos tem sofrido uma evolução absolutamente excecional. Um bairro que até muito recentemente se caracterizava pela criatividade artística associada exclusivamente à Street Art, hoje é seguramente o bairro mais trendy (na moda) de Miami, onde o investimento é estimulado através de um programa governamental local Wynwood Business Improvement District. Durante a Miami Art Week, Wynwood assemelhava-se a um recinto de um Festival de Verão num ambiente urbano com delimitações impostas por artérias de circulação que são muitas vezes parcialmente interditas ao trânsito por largos períodos diários. MANA Wynwood apresenta precisamente um dos maiores espaços multifacetados para realização de eventos culturais disponíveis em Miami. Wynwood, só por si, apresenta-se hoje como uma “marca” exclusiva, com website próprio, hashtags, contas no Instagram, Twitter, e outras redes socias. À semelhança de Wynwood, há várias zonas hoje em Miami, que estranhamente ou estrategicamente, se ostentam publicamente como uma espécie de entidade interativa, que apesar de fazer parte de um Governo mais abrangente, publicitam-se como entidades autónomas de decisão, com regras e leis especificas de desenvolvimento numa estratégia de progresso estudado. O Design District que é particularmente icónico em Miami e caracterizado pelo comércio de luxo; desde moda, design, a arte, instituiu acerca de quinze anos esta lógica de zoneamento estratégico ao criar uma associação de empresários que hoje domina e gere esta área. É no Design District que se encontra o ICA Institut of Contemporary Art of Miami, De La Cruz Collection, ou o The Moore Building, que ao estarem inseridos neste projeto zonal com marca independente são associados a uma oferta muito específica, exclusiva, que compete em diversas categorias com outras zonas de Miami. Aparte das estruturas provisórias ou dos projetos inseridos nestes zoneamentos em “construção” (under construction) e permanente evolução, os Museus estão de certa forma a oferecer tudo aquilo que os eventos com um caráter eminentemente comercial e temporário não conseguem, mesmo por esse não ser o seu principal objetivo. Como exemplo disto é o caso do Pérez Art Museum Miami com pelo menos duas extraordinárias exposições, Christo and Jeanne-Claude: Surrounded Islands, Biscayne Bay, Greater Miami, Florida, 1980–83 | Uma exposição Documental, e ainda Ebony G. Patterson “. . . while the dew is still on the roses . . .”. O ICA Institute of Contemporary Art Miami, apresenta uma retrospetiva da Judy Chicago “A Reckoning” e ainda Larry Bell “Time Machines”. No MOCA Museum of Contemporary Art North Miami (que fica consideravelmente fora do circuito de tudo o resto) com uma extraordinária exposição sobre o coletivo AFRICOBRA com o título “Messages To The People”. Por fim, o The Bass em Miami Beach apresenta algumas exposições com um caráter e abordagem talvez mais “popular”, como é o caso dos The Haas Brothers: Ferngully, ainda Paola Pivi; Art With A View ou Odalis Valdivieso; Walgreens Windows.
Judy Chicago no ICA - Institute of Contemporary Art Miami.
Larry Bell, Time Machines, no ICA - Institute of Contemporary Art Miami.
Muito mais haveria a referir, mas há que essencialmente deter do atual momento em Miami que é indiscutivelmente aqui que a circunstância expositiva contemporânea acontece durante o mês de Dezembro a nível mundial. No que respeita aos Estados Unidos, e apesar de cada momento e cidade deste mercado ter caraterísticas muito especificas, Miami irá sempre pautar e beneficiar de uma série de circunstâncias adicionais com as quais as outras capitais no continente nunca poderão competir; as extraordinárias condições meteorológicas associadas às magnificências de um paraíso tropical como são as praias infindáveis e vegetação exótica. A completar os fatores naturais, não podemos descartar o que será talvez o mais óbvio, a predisposição local dos seus íncolas permanentes ou mesmo provisórios à estimulação e exaltação do luxo, categoria na qual a arte se insere cada vez mais se considerarmos os valores a que se comercializa; apesar da oferta em Miami ser bastante democrática a este nível. Em suma, o futuro do mercado da arte contemporânea em Miami não só está garantido como está assegurado, e agendado! Resta saber se os agentes decisores locais serão capazes de gerir e impor limites à desfiguração da aposta inicial, preservando a qualidade dos conteúdos, nunca esquecendo ou obliterando, localmente, da categoria de objetos de luxo, as diferenças basilares que separam a arte de tudo o resto, apesar de partilharem um poderoso filtro e decisivo denominador: a exclusividade imensamente determinada pelo preço.
Sérgio Parreira
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