Links

PERSPETIVA ATUAL


Vista da exposição Luigi Ghirri, Obra Aberta, Museu CCB. © Rodrigo Cardoso


Vista da exposição Luigi Ghirri, Obra Aberta, Museu CCB. © Rodrigo Cardoso


Vista da exposição Luigi Ghirri, Obra Aberta, Museu CCB. © Rodrigo Cardoso


Vista da exposição Luigi Ghirri, Obra Aberta, Museu CCB. © Rodrigo Cardoso


Luigi Ghirri, Bologna, 1985 © Eredi di Luigi Ghirri


Luigi Ghirri, Masone, Casa Benati, 1985 © Eredi di Luigi Ghirri


Vista da exposição Luigi Ghirri, Obra Aberta, Museu CCB. © Rodrigo Cardoso


Luigi Ghirri, Marina di Ravenna, 1986 © Eredi di Luigi Ghirri


Luigi Ghirri, Verso Lagosanto, 1989 © Eredi di Luigi Ghirri

Outros artigos:

2024-03-04


PEDRO CABRAL SANTO


2024-01-27


NUNO LOURENÇO


2023-12-24


MAFALDA TEIXEIRA


2023-11-21


MARC LENOT


2023-10-16


MARC LENOT


2023-09-10


INÊS FERREIRA-NORMAN


2023-08-09


DENISE MATTAR


2023-07-05


CONSTANÇA BABO


2023-06-05


MIGUEL PINTO


2023-03-22


VERONICA CORDEIRO


2023-02-20


SALOMÉ CASTRO


2023-01-12


SARA MAGNO


2022-12-04


PAULA PINTO


2022-11-03


MARC LENOT


2022-09-30


PAULA PINTO


2022-08-31


JOÃO BORGES DA CUNHA


2022-07-31


MADALENA FOLGADO


2022-06-30


INÊS FERREIRA-NORMAN


2022-05-31


MADALENA FOLGADO


2022-04-30


JOANA MENDONÇA


2022-03-27


JEANNE MERCIER


2022-02-26


PEDRO CABRAL SANTO


2022-01-30


PEDRO CABRAL SANTO


2021-12-29


PEDRO CABRAL SANTO


2021-11-22


MANUELA HARGREAVES


2021-10-28


CARLA CARBONE


2021-09-27


PEDRO CABRAL SANTO


2021-08-11


RITA ANUAR


2021-07-04


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-05-30


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-04-28


CONSTANÇA BABO


2021-03-17


VICTOR PINTO DA FONSECA


2021-02-08


MARC LENOT


2021-01-01


MANUELA HARGREAVES


2020-12-01


CARLA CARBONE


2020-10-21


BRUNO MARQUES


2020-09-16


FÁTIMA LOPES CARDOSO


2020-08-14


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-07-21


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-25


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-09


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-05-21


MANUELA HARGREAVES


2020-05-01


MANUELA HARGREAVES


2020-04-04


SUSANA GRAÇA E CARLOS PIMENTA


2020-03-02


PEDRO PORTUGAL


2020-01-21


NUNO LOURENÇO


2019-12-11


VICTOR PINTO DA FONSECA


2019-11-09


SÉRGIO PARREIRA


2019-10-09


LUÍS RAPOSO


2019-09-03


SÉRGIO PARREIRA


2019-07-30


JULIA FLAMINGO


2019-06-22


INÊS FERREIRA-NORMAN


2019-05-09


INÊS M. FERREIRA-NORMAN


2019-04-03


DONNY CORREIA


2019-02-15


JOANA CONSIGLIERI


2018-12-22


LAURA CASTRO


2018-11-22


NICOLÁS NARVÁEZ ALQUINTA


2018-10-13


MIRIAN TAVARES


2018-09-11


JULIA FLAMINGO


2018-07-25


RUI MATOSO


2018-06-25


MARIA DE FÁTIMA LAMBERT


2018-05-25


MARIA VLACHOU


2018-04-18


BRUNO CARACOL


2018-03-08


VICTOR PINTO DA FONSECA


2018-01-26


ANA BALONA DE OLIVEIRA


2017-12-18


CONSTANÇA BABO


2017-11-12


HELENA OSÓRIO


2017-10-09


PAULA PINTO


2017-09-05


PAULA PINTO


2017-07-26


NATÁLIA VILARINHO


2017-07-17


ANA RITO


2017-07-11


PEDRO POUSADA


2017-06-30


PEDRO POUSADA


2017-05-31


CONSTANÇA BABO


2017-04-26


MARC LENOT


2017-03-28


ALEXANDRA BALONA


2017-02-10


CONSTANÇA BABO


2017-01-06


CONSTANÇA BABO


2016-12-13


CONSTANÇA BABO


2016-11-08


ADRIANO MIXINGE


2016-10-20


ALBERTO MORENO


2016-10-07


ALBERTO MORENO


2016-08-29


NATÁLIA VILARINHO


2016-06-28


VICTOR PINTO DA FONSECA


2016-05-25


DIOGO DA CRUZ


2016-04-16


NAMALIMBA COELHO


2016-03-17


FILIPE AFONSO


2016-02-15


ANA BARROSO


2016-01-08


TAL R EM CONVERSA COM FABRICE HERGOTT


2015-11-28


MARTA RODRIGUES


2015-10-17


ANA BARROSO


2015-09-17


ALBERTO MORENO


2015-07-21


JOANA BRAGA, JOANA PESTANA E INÊS VEIGA


2015-06-20


PATRÍCIA PRIOR


2015-05-19


JOÃO CARLOS DE ALMEIDA E SILVA


2015-04-13


Natália Vilarinho


2015-03-17


Liz Vahia


2015-02-09


Lara Torres


2015-01-07


JOSÉ RAPOSO


2014-12-09


Sara Castelo Branco


2014-11-11


Natália Vilarinho


2014-10-07


Clara Gomes


2014-08-21


Paula Pinto


2014-07-15


Juliana de Moraes Monteiro


2014-06-13


Catarina Cabral


2014-05-14


Alexandra Balona


2014-04-17


Ana Barroso


2014-03-18


Filipa Coimbra


2014-01-30


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2013-12-09


SOFIA NUNES


2013-10-18


ISADORA H. PITELLA


2013-09-24


SANDRA VIEIRA JÜRGENS


2013-08-12


ISADORA H. PITELLA


2013-06-27


SOFIA NUNES


2013-06-04


MARIA JOÃO GUERREIRO


2013-05-13


ROSANA SANCIN


2013-04-02


MILENA FÉRNANDEZ


2013-03-12


FERNANDO BRUNO


2013-02-09


ARTECAPITAL


2013-01-02


ZARA SOARES


2012-12-10


ISABEL NOGUEIRA


2012-11-05


ANA SENA


2012-10-08


ZARA SOARES


2012-09-21


ZARA SOARES


2012-09-10


JOÃO LAIA


2012-08-31


ARTECAPITAL


2012-08-24


ARTECAPITAL


2012-08-06


JOÃO LAIA


2012-07-16


ROSANA SANCIN


2012-06-25


VIRGINIA TORRENTE


2012-06-14


A ART BASEL


2012-06-05


dOCUMENTA (13)


2012-04-26


PATRÍCIA ROSAS


2012-03-18


SABRINA MOURA


2012-02-02


ROSANA SANCIN


2012-01-02


PATRÍCIA TRINDADE


2011-11-02


PATRÍCIA ROSAS


2011-10-18


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-09-23


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-07-28


PATRÍCIA ROSAS


2011-06-21


SÍLVIA GUERRA


2011-05-02


CARLOS ALCOBIA


2011-04-13


SÓNIA BORGES


2011-03-21


ARTECAPITAL


2011-03-16


ARTECAPITAL


2011-02-18


MANUEL BORJA-VILLEL


2011-02-01


ARTECAPITAL


2011-01-12


ATLAS - COMO LEVAR O MUNDO ÀS COSTAS?


2010-12-21


BRUNO LEITÃO


2010-11-29


SÍLVIA GUERRA


2010-10-26


SÍLVIA GUERRA


2010-09-30


ANDRÉ NOGUEIRA


2010-09-22


EL CULTURAL


2010-07-28


ROSANA SANCIN


2010-06-20


ART 41 BASEL


2010-05-11


ROSANA SANCIN


2010-04-15


FABIO CYPRIANO - Folha de S.Paulo


2010-03-19


ALEXANDRA BELEZA MOREIRA


2010-03-01


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-02-17


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-01-26


SUSANA MOUZINHO


2009-12-16


ROSANA SANCIN


2009-11-10


PEDRO NEVES MARQUES


2009-10-20


SÍLVIA GUERRA


2009-10-05


PEDRO NEVES MARQUES


2009-09-21


MARTA MESTRE


2009-09-13


LUÍSA SANTOS


2009-08-22


TERESA CASTRO


2009-07-24


PEDRO DOS REIS


2009-06-15


SÍLVIA GUERRA


2009-06-11


SANDRA LOURENÇO


2009-06-10


SÍLVIA GUERRA


2009-05-28


LUÍSA SANTOS


2009-05-04


SÍLVIA GUERRA


2009-04-13


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2009-03-23


PEDRO DOS REIS


2009-03-03


EMANUEL CAMEIRA


2009-02-13


SÍLVIA GUERRA


2009-01-26


ANA CARDOSO


2009-01-13


ISABEL NOGUEIRA


2008-12-16


MARTA LANÇA


2008-11-25


SÍLVIA GUERRA


2008-11-08


PEDRO DOS REIS


2008-11-01


ANA CARDOSO


2008-10-27


SÍLVIA GUERRA


2008-10-18


SÍLVIA GUERRA


2008-09-30


ARTECAPITAL


2008-09-15


ARTECAPITAL


2008-08-31


ARTECAPITAL


2008-08-11


INÊS MOREIRA


2008-07-25


ANA CARDOSO


2008-07-07


SANDRA LOURENÇO


2008-06-25


IVO MESQUITA


2008-06-09


SÍLVIA GUERRA


2008-06-05


SÍLVIA GUERRA


2008-05-14


FILIPA RAMOS


2008-05-04


PEDRO DOS REIS


2008-04-09


ANA CARDOSO


2008-04-03


ANA CARDOSO


2008-03-12


NUNO LOURENÇO


2008-02-25


ANA CARDOSO


2008-02-12


MIGUEL CAISSOTTI


2008-02-04


DANIELA LABRA


2008-01-07


SÍLVIA GUERRA


2007-12-17


ANA CARDOSO


2007-12-02


NUNO LOURENÇO


2007-11-18


ANA CARDOSO


2007-11-17


SÍLVIA GUERRA


2007-11-14


LÍGIA AFONSO


2007-11-08


SÍLVIA GUERRA


2007-11-02


AIDA CASTRO


2007-10-25


SÍLVIA GUERRA


2007-10-20


SÍLVIA GUERRA


2007-10-01


TERESA CASTRO


2007-09-20


LÍGIA AFONSO


2007-08-30


JOANA BÉRTHOLO


2007-08-21


LÍGIA AFONSO


2007-08-06


CRISTINA CAMPOS


2007-07-15


JOANA LUCAS


2007-07-02


ANTÓNIO PRETO


2007-06-21


ANA CARDOSO


2007-06-12


TERESA CASTRO


2007-06-06


ALICE GEIRINHAS / ISABEL RIBEIRO


2007-05-22


ANA CARDOSO


2007-05-12


AIDA CASTRO


2007-04-24


SÍLVIA GUERRA


2007-04-13


ANA CARDOSO


2007-03-26


INÊS MOREIRA


2007-03-07


ANA CARDOSO


2007-03-01


FILIPA RAMOS


2007-02-21


SANDRA VIEIRA JURGENS


2007-01-28


TERESA CASTRO


2007-01-16


SÍLVIA GUERRA


2006-12-15


CRISTINA CAMPOS


2006-12-07


ANA CARDOSO


2006-12-04


SÍLVIA GUERRA


2006-11-28


SÍLVIA GUERRA


2006-11-13


ARTECAPITAL


2006-11-07


ANA CARDOSO


2006-10-30


SÍLVIA GUERRA


2006-10-29


SÍLVIA GUERRA


2006-10-27


SÍLVIA GUERRA


2006-10-11


ANA CARDOSO


2006-09-25


TERESA CASTRO


2006-09-03


ANTÓNIO PRETO


2006-08-17


JOSÉ BÁRTOLO


2006-07-24


ANTÓNIO PRETO


2006-07-06


MIGUEL CAISSOTTI


2006-06-14


ALICE GEIRINHAS


2006-06-07


JOSÉ ROSEIRA


2006-05-24


INÊS MOREIRA


2006-05-10


AIDA E. DE CASTRO


2006-04-05


SANDRA VIEIRA JURGENS



GEÓMETRA “PER LAVORO



JOÃO BORGES DA CUNHA

2023-04-28




 

 

De um modo que ainda agora não deixa de causar perplexidade, continuam as ser colocadas, hoje, à obra de fotografia, e aos autores, questões de acesso à esfera da arte que, apesar da maneira como ela condicionou as expressões estéticas no último século, insistem em oferecer-lhe um estatuto pouco emancipado. A mais persitente de todas, quando não a mais exaspereante – isto se descontarmos o extensíssimo debate sobre a técnica e as teses sobre o respectivo valor de culto, de exposição e de reprodução (cf. Walter Benjamin) –, parece ser de ordem genológica. Isto é, a vexata quaestio sobre a genética da obra e o género daquilo que ela representa. Em termos a que é dificil extrarir o tom caricatural, algo como: «fotografia de quê»? Indagação que, de resto, ninguém achará destituída de sentido, sendo até, quem sabe, nobilitante se dirigida a Diane Arbus, Francesca Woodman, Candida Höfer, Hilla Becher, Helena Almeida, Nan Goldin ou Cindy Sherman. O que, estranhamente, já não poderá ser replicado, sob pena de um módico de ridículo, à pintura de Gehrard Richter. A fúria temática a que a fotografia-obra-de-arte foi e continua a ser submetida, redundou numa constelação aflitiva de géneros e subgéneros com que os agentes artísticos convivem bem e que promovem, e se assemelha à querela entre a paisagística e a retratística na pintura barroca. Veja-se esse ultra-mundo, com seu prócere papal de nome H. C-Bresson, que é a street photography.

A supina generalidade do que até aqui se disse recebe uma refutação finíssima perante o trabalho de Luigi Ghirri (1943–1992), do qual uma pequena selecção pode ser vista na exposição Obra Aberta. E é antes de mais por isso que a estas obras de fotografia nunca é fácil escusarem-se à categoria, não pouco arriscada, de descobertas, de curiosidades, de raridades, de bizarrias. Precisamente porque dizer com acerto aquilo que re-tratam esbarra na impossibilidade irredutível de indicar-lhes “coisa exacta”. E não se refere isto a qualquer pecha formal, ou formalista. As fotografias de Ghuirri são severamente figurativas, indexicais, realistas, hiper-realistas, trans-realistas. Há é um mundo tão heteróclito de coisas, de artefactos, de lugares, de recintos, parafernália e marginália, de gente e de não-tanta-gente, que nos é trazido a ver de forma tão indómita, que cair-se-ia, a cada peça, numa desconchavada atomização temática. Em Ghirri, cada fotografia inaugura o seu próprio género, sem que isto seja necessariamente virtuoso. Poderá daqui alimentar-se a ideia inopinada de uma tanta impaciência do olhar, de uma leveza de critério, ou de um diletantismo, o que é rematadamente enviesado e injusto. Ghirri ficciona. O certo é que o autor, ele mesmo, reconhece em textos ensaísticos que produziu a incapacidade de encontrar um termo, um fim, um limite para o que se lhe era dado fotografar. Na verdade, perseguia-o a glosa do pensamento de Mallarmé, que dizia do mundo estar feito para acabar dentro de um livro, e assim de igual forma que «hoje, tudo existe para acabar numa fotografia». Esta a razão para Ghirri ter encontrado nas expressões “obra aberta”, “infinito e universo” divisas maiores da sua oficina, bem como o conceito fertilíssimo de um “atlas-album-de-família” de toda uma geração-região.

A retórica da Obra Aberta passou por estações várias, e foi incendiada nos anos 60 do século XX pelo livro, com o mesmo título, de Umberto Eco. Na altura, esgrimia-se o argumento de que as novas vanguardas estavam a compor obras que tinham um grau tão permissivo de abertura, e de possibilidade, à participação do observador/ espectador/ fruidor que a obra não se consumava sem essa intervenção, o que inaugurou as estéticas participativas, imersivas e intera-activas. Todavia, e apesar de todas as vigilâncias a que a noção foi sujeita, ela não deixou de entrar na vulgata do discurso sobre a arte. Porém, declinada com os sentidos ora de obra-inacabada, ora de obra a-ser-percebida. É deste último sentido que se reclama a experiência de ver a obra de Ghirri, e que a torna também numa experiência maior. O truísmo de que toda a obra só o é perante a percepção de quem a vê, ganha em Ghirri desafios insuspeitados. Sobretudo porque no corpo daquilo que são cenários visivelmente mundanos, Ghirri compõe uma dramaturgia de elementos que catapultam o espectador para experiências superlativas. Diz-se destas fotografias que são a paisagem de uma certa Itália, com o que nelas há de vestígios locais e de acontecimentos próprios, isto como tentando inscrevê-las no pitoresco de um dado tempo e lugar (Paesaggio Italiano). Acontece ser esta caracterização abaixo de uma nota de etiqueta. As fotografias que se vêem nesta exposição, e que contêm uma dignidade material que solicita a presença (um bravo! à curadoria) são o veículo de uma dimensão transcendental que as coloca na tradição da pintura metafísica de um De Chirico. Mas sem artefícios simbólicos que de alguma forma prometessem leituras herméticas, ou acessos extáticos. A fotografia de Ghirri é de raiz popular. E grangeia a adesão das massas à conta de idiossincrasias culturais: as cores em carne viva, o ponto-de-vista virtiginoso, o episódio inquietante. Mas é também uma obra exigente e superlativamente culta. Assim se vê em alinhamentos, enquadramentos e atmosferas enigmáticos, muitos deles com o toque de um cosmopolitismo refinado (de alguém que lia a Time-Life), e acerca dos quais o desconhecimento do que é a trindade, o pathos, uma myse-en-abîme ou o trompe l’oeil, fará perigar a obra em toda a sua abertura.

Luigi Ghirri foi durante tempo assinalável da sua vida um geometra per lavoro no norte de Itália. Um geometra, no contexto cultural italiano, é um profissional que executa levantamentos e medições de edifícios, de propriedades e de terrenos. Um topógrafo. A fotografia foi-lhe, inicialmente, um instrumento de trabalho. A geometria, a arquitectura (colaborou com Aldo Rossi), os monumentos, os acidentes geográficos foram-lhe matéria artística. A exposição Obra Aberta, com a sua disposição em deambulatório “cultual” (fotografia-ícone lado-a-alado), parece esquecer esse vaso comunicante. E não lhe faz jus. Inegavelmente obrigatória, tem o seu quê de oportunidade perdida.

 

 

 

João Borges da Cunha
Doutorado em Estudos de Cultura, Universidade Católica Portuguesa. Arquitecto, Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa. Professor no Departamento de Arquitectura da ECATI [Escola de Comunicação], Universidade Lusófona. Investigador nos centros ARQ.Id e CECC. Publicou ensaio, teatro e ficção.

 

 

 

:::

 

 


[No âmbito da 16ª Festa do Cinema Italiano, foi exibido o documentário «Infinito: L'universo di Luigi Ghirri» de Matteo Parisini (2022) sobre a obra e a actividade de Ghirri, e que foi exibido em paralelo com esta exposição ]