Links

PERSPETIVA ATUAL


Parque Terra Nostra, em Furnas. Fotografia Julia Flamingo.


Lagoa das Furnas, onde se come o cozido no vapor do vulcão. Fotografia: Julia Flamingo.


Arquipélago - Centro de Arte Contemporânea. Fotografia: Julia Flamingo.


Lagoa das Empadadas. Fotografia: Julia Flamingo.


Obra “Strata”, de Andreia Santana e abertura do festival. Fotografia: Sara Pinheiro.


Os diretores artísticos Sofia Botelho e Jesse James. Fotografia: Sara Pinheiro.


Piquenique na Lagoa de Furnas. Fotografia: Mariana Lopes.


Obra do coreano Lee Hun Chung no Pico do Refúgio. Fotografia: Filipa Couto.


Percurso temático promovido pelo projeto Talkie-Walkie. Fotografia: Filipa Couto.

C.Tavares & José Alberto Gomes. Fotografia: Mariana Lopes." data-lightbox="image-1">
“East Atlantic”, de Miguel C.Tavares & José Alberto Gomes. Fotografia: Mariana Lopes.


“In(sul)ar”, de Mónica de Miranda. Fotografia: Sara Pinheiro.


“Recetáculo”, de Rita GT. Fotografia: Mariana Lopes.


Colin Self durante performance no pavilhão. Fotografia: Mariana Lopes.


O pavilhão W&T. Fotografia: Sara Pinheiro.

Outros artigos:

2024-10-21


AISHWARYA KUMAR


2024-09-21


ISABEL TAVARES


2024-08-17


CATARINA REAL


2024-07-14


MAFALDA TEIXEIRA


2024-05-30


CONSTANÇA BABO


2024-04-13


FÁTIMA LOPES CARDOSO


2024-03-04


PEDRO CABRAL SANTO


2024-01-27


NUNO LOURENÇO


2023-12-24


MAFALDA TEIXEIRA


2023-11-21


MARC LENOT


2023-10-16


MARC LENOT


2023-09-10


INÊS FERREIRA-NORMAN


2023-08-09


DENISE MATTAR


2023-07-05


CONSTANÇA BABO


2023-06-05


MIGUEL PINTO


2023-04-28


JOÃO BORGES DA CUNHA


2023-03-22


VERONICA CORDEIRO


2023-02-20


SALOMÉ CASTRO


2023-01-12


SARA MAGNO


2022-12-04


PAULA PINTO


2022-11-03


MARC LENOT


2022-09-30


PAULA PINTO


2022-08-31


JOÃO BORGES DA CUNHA


2022-07-31


MADALENA FOLGADO


2022-06-30


INÊS FERREIRA-NORMAN


2022-05-31


MADALENA FOLGADO


2022-04-30


JOANA MENDONÇA


2022-03-27


JEANNE MERCIER


2022-02-26


PEDRO CABRAL SANTO


2022-01-30


PEDRO CABRAL SANTO


2021-12-29


PEDRO CABRAL SANTO


2021-11-22


MANUELA HARGREAVES


2021-10-28


CARLA CARBONE


2021-09-27


PEDRO CABRAL SANTO


2021-08-11


RITA ANUAR


2021-07-04


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-05-30


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-04-28


CONSTANÇA BABO


2021-03-17


VICTOR PINTO DA FONSECA


2021-02-08


MARC LENOT


2021-01-01


MANUELA HARGREAVES


2020-12-01


CARLA CARBONE


2020-10-21


BRUNO MARQUES


2020-09-16


FÁTIMA LOPES CARDOSO


2020-08-14


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-07-21


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-25


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-09


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-05-21


MANUELA HARGREAVES


2020-05-01


MANUELA HARGREAVES


2020-04-04


SUSANA GRAÇA E CARLOS PIMENTA


2020-03-02


PEDRO PORTUGAL


2020-01-21


NUNO LOURENÇO


2019-12-11


VICTOR PINTO DA FONSECA


2019-11-09


SÉRGIO PARREIRA


2019-10-09


LUÍS RAPOSO


2019-09-03


SÉRGIO PARREIRA


2019-06-22


INÊS FERREIRA-NORMAN


2019-05-09


INÊS M. FERREIRA-NORMAN


2019-04-03


DONNY CORREIA


2019-02-15


JOANA CONSIGLIERI


2018-12-22


LAURA CASTRO


2018-11-22


NICOLÁS NARVÁEZ ALQUINTA


2018-10-13


MIRIAN TAVARES


2018-09-11


JULIA FLAMINGO


2018-07-25


RUI MATOSO


2018-06-25


MARIA DE FÁTIMA LAMBERT


2018-05-25


MARIA VLACHOU


2018-04-18


BRUNO CARACOL


2018-03-08


VICTOR PINTO DA FONSECA


2018-01-26


ANA BALONA DE OLIVEIRA


2017-12-18


CONSTANÇA BABO


2017-11-12


HELENA OSÓRIO


2017-10-09


PAULA PINTO


2017-09-05


PAULA PINTO


2017-07-26


NATÁLIA VILARINHO


2017-07-17


ANA RITO


2017-07-11


PEDRO POUSADA


2017-06-30


PEDRO POUSADA


2017-05-31


CONSTANÇA BABO


2017-04-26


MARC LENOT


2017-03-28


ALEXANDRA BALONA


2017-02-10


CONSTANÇA BABO


2017-01-06


CONSTANÇA BABO


2016-12-13


CONSTANÇA BABO


2016-11-08


ADRIANO MIXINGE


2016-10-20


ALBERTO MORENO


2016-10-07


ALBERTO MORENO


2016-08-29


NATÁLIA VILARINHO


2016-06-28


VICTOR PINTO DA FONSECA


2016-05-25


DIOGO DA CRUZ


2016-04-16


NAMALIMBA COELHO


2016-03-17


FILIPE AFONSO


2016-02-15


ANA BARROSO


2016-01-08


TAL R EM CONVERSA COM FABRICE HERGOTT


2015-11-28


MARTA RODRIGUES


2015-10-17


ANA BARROSO


2015-09-17


ALBERTO MORENO


2015-07-21


JOANA BRAGA, JOANA PESTANA E INÊS VEIGA


2015-06-20


PATRÍCIA PRIOR


2015-05-19


JOÃO CARLOS DE ALMEIDA E SILVA


2015-04-13


Natália Vilarinho


2015-03-17


Liz Vahia


2015-02-09


Lara Torres


2015-01-07


JOSÉ RAPOSO


2014-12-09


Sara Castelo Branco


2014-11-11


Natália Vilarinho


2014-10-07


Clara Gomes


2014-08-21


Paula Pinto


2014-07-15


Juliana de Moraes Monteiro


2014-06-13


Catarina Cabral


2014-05-14


Alexandra Balona


2014-04-17


Ana Barroso


2014-03-18


Filipa Coimbra


2014-01-30


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2013-12-09


SOFIA NUNES


2013-10-18


ISADORA H. PITELLA


2013-09-24


SANDRA VIEIRA JÜRGENS


2013-08-12


ISADORA H. PITELLA


2013-06-27


SOFIA NUNES


2013-06-04


MARIA JOÃO GUERREIRO


2013-05-13


ROSANA SANCIN


2013-04-02


MILENA FÉRNANDEZ


2013-03-12


FERNANDO BRUNO


2013-02-09


ARTECAPITAL


2013-01-02


ZARA SOARES


2012-12-10


ISABEL NOGUEIRA


2012-11-05


ANA SENA


2012-10-08


ZARA SOARES


2012-09-21


ZARA SOARES


2012-09-10


JOÃO LAIA


2012-08-31


ARTECAPITAL


2012-08-24


ARTECAPITAL


2012-08-06


JOÃO LAIA


2012-07-16


ROSANA SANCIN


2012-06-25


VIRGINIA TORRENTE


2012-06-14


A ART BASEL


2012-06-05


dOCUMENTA (13)


2012-04-26


PATRÍCIA ROSAS


2012-03-18


SABRINA MOURA


2012-02-02


ROSANA SANCIN


2012-01-02


PATRÍCIA TRINDADE


2011-11-02


PATRÍCIA ROSAS


2011-10-18


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-09-23


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-07-28


PATRÍCIA ROSAS


2011-06-21


SÍLVIA GUERRA


2011-05-02


CARLOS ALCOBIA


2011-04-13


SÓNIA BORGES


2011-03-21


ARTECAPITAL


2011-03-16


ARTECAPITAL


2011-02-18


MANUEL BORJA-VILLEL


2011-02-01


ARTECAPITAL


2011-01-12


ATLAS - COMO LEVAR O MUNDO ÀS COSTAS?


2010-12-21


BRUNO LEITÃO


2010-11-29


SÍLVIA GUERRA


2010-10-26


SÍLVIA GUERRA


2010-09-30


ANDRÉ NOGUEIRA


2010-09-22


EL CULTURAL


2010-07-28


ROSANA SANCIN


2010-06-20


ART 41 BASEL


2010-05-11


ROSANA SANCIN


2010-04-15


FABIO CYPRIANO - Folha de S.Paulo


2010-03-19


ALEXANDRA BELEZA MOREIRA


2010-03-01


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-02-17


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-01-26


SUSANA MOUZINHO


2009-12-16


ROSANA SANCIN


2009-11-10


PEDRO NEVES MARQUES


2009-10-20


SÍLVIA GUERRA


2009-10-05


PEDRO NEVES MARQUES


2009-09-21


MARTA MESTRE


2009-09-13


LUÍSA SANTOS


2009-08-22


TERESA CASTRO


2009-07-24


PEDRO DOS REIS


2009-06-15


SÍLVIA GUERRA


2009-06-11


SANDRA LOURENÇO


2009-06-10


SÍLVIA GUERRA


2009-05-28


LUÍSA SANTOS


2009-05-04


SÍLVIA GUERRA


2009-04-13


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2009-03-23


PEDRO DOS REIS


2009-03-03


EMANUEL CAMEIRA


2009-02-13


SÍLVIA GUERRA


2009-01-26


ANA CARDOSO


2009-01-13


ISABEL NOGUEIRA


2008-12-16


MARTA LANÇA


2008-11-25


SÍLVIA GUERRA


2008-11-08


PEDRO DOS REIS


2008-11-01


ANA CARDOSO


2008-10-27


SÍLVIA GUERRA


2008-10-18


SÍLVIA GUERRA


2008-09-30


ARTECAPITAL


2008-09-15


ARTECAPITAL


2008-08-31


ARTECAPITAL


2008-08-11


INÊS MOREIRA


2008-07-25


ANA CARDOSO


2008-07-07


SANDRA LOURENÇO


2008-06-25


IVO MESQUITA


2008-06-09


SÍLVIA GUERRA


2008-06-05


SÍLVIA GUERRA


2008-05-14


FILIPA RAMOS


2008-05-04


PEDRO DOS REIS


2008-04-09


ANA CARDOSO


2008-04-03


ANA CARDOSO


2008-03-12


NUNO LOURENÇO


2008-02-25


ANA CARDOSO


2008-02-12


MIGUEL CAISSOTTI


2008-02-04


DANIELA LABRA


2008-01-07


SÍLVIA GUERRA


2007-12-17


ANA CARDOSO


2007-12-02


NUNO LOURENÇO


2007-11-18


ANA CARDOSO


2007-11-17


SÍLVIA GUERRA


2007-11-14


LÍGIA AFONSO


2007-11-08


SÍLVIA GUERRA


2007-11-02


AIDA CASTRO


2007-10-25


SÍLVIA GUERRA


2007-10-20


SÍLVIA GUERRA


2007-10-01


TERESA CASTRO


2007-09-20


LÍGIA AFONSO


2007-08-30


JOANA BÉRTHOLO


2007-08-21


LÍGIA AFONSO


2007-08-06


CRISTINA CAMPOS


2007-07-15


JOANA LUCAS


2007-07-02


ANTÓNIO PRETO


2007-06-21


ANA CARDOSO


2007-06-12


TERESA CASTRO


2007-06-06


ALICE GEIRINHAS / ISABEL RIBEIRO


2007-05-22


ANA CARDOSO


2007-05-12


AIDA CASTRO


2007-04-24


SÍLVIA GUERRA


2007-04-13


ANA CARDOSO


2007-03-26


INÊS MOREIRA


2007-03-07


ANA CARDOSO


2007-03-01


FILIPA RAMOS


2007-02-21


SANDRA VIEIRA JURGENS


2007-01-28


TERESA CASTRO


2007-01-16


SÍLVIA GUERRA


2006-12-15


CRISTINA CAMPOS


2006-12-07


ANA CARDOSO


2006-12-04


SÍLVIA GUERRA


2006-11-28


SÍLVIA GUERRA


2006-11-13


ARTECAPITAL


2006-11-07


ANA CARDOSO


2006-10-30


SÍLVIA GUERRA


2006-10-29


SÍLVIA GUERRA


2006-10-27


SÍLVIA GUERRA


2006-10-11


ANA CARDOSO


2006-09-25


TERESA CASTRO


2006-09-03


ANTÓNIO PRETO


2006-08-17


JOSÉ BÁRTOLO


2006-07-24


ANTÓNIO PRETO


2006-07-06


MIGUEL CAISSOTTI


2006-06-14


ALICE GEIRINHAS


2006-06-07


JOSÉ ROSEIRA


2006-05-24


INÊS MOREIRA


2006-05-10


AIDA E. DE CASTRO


2006-04-05


SANDRA VIEIRA JURGENS



DIÁRIO DE BORDO DOS AÇORES: A EXPEDIÇÃO PROPORCIONADA PELO WALK&TALK



JULIA FLAMINGO

2019-07-30




 

 

Poderia imaginar, porém não sabia que a minha ida para o Walk&Talk, em São Miguel, nos Açores, seria uma expedição artística. Sabendo de um festival de arte contemporânea numa ilha isolada, a minha ideia era que aquilo seria algo como uma viagem para descobrir obras de Land Art espalhadas por aí. Dois ou três dias foram necessários para que eu entendesse que não eram as obras finalizadas as grandes estrelas do festival. E sim, os artistas, os curadores, jornalistas como eu e profissionais da arte que viajaram para lá a fim de curtir o mesmo encantamento que o meu: explorar um local novo a partir da arte deliciando-se com cada encontro que ela poderia promover e as discussões que ela poderia pautar.

A 9ª edição do Walk&Talk aconteceu entre os dias 5 e 20 de julho - cinco dos quais eu pude vivenciar – e foi inaugurada com um evento no topo do Solmar, centro comercial em Ponta Delgada, no qual as artistas Andreia Santana, Mónica de Miranda e Diana Vidrascu expuseram obras feitas a partir da sua imersão no arquipélago dos Açores durante as residências no último ano. Entre bebidas de boas-vindas e uma equipa que logo se mostrou generosa, humana e horizontal, liderada por Jesse James e Sofia Carolina Botelho, as minhas primeiras horas entre desconhecidos do todo o mundo foram animadoras. Sobre a sua obra “Strata”, Andreia Santana contou que vinha se encontrando com alguns profissionais envolvidos na arqueologia subaquática. Nas suas mãos, a piscina desativada foi pintada de branco, para onde ela trouxe esculturas também brancas que remontavam à técnica de localizar, petrificar e retirar achados arqueológicos do solo.

A alguns metros dali o concerto de abertura no Teatro Micaelense, o principal da cidade, foi ao mesmo tempo intenso, por conta dos sons do sintetizador, e tranquilizante, dado a orquestra que tocava simultaneamente. As imagens gravadas por Miguel C. Tavares na ilha eram ressignificadas na trilha sonora comandada por Joana Gama e Luís Fernandes. A experiência para mim inédita de ouvir tipos de música aparentemente tão diferentes, e que ali se complementavam e harmonizavam, mostrou que o conceito de performance no Walk&Talk é super democrático e aberto. “At the still point of the turning world” me deu a sensação de estar dentro de um filme épico.

O curador Sérgio Fazenda Rodrigues, que já viveu durante 7 anos nos Açores, foi o responsável pela curadoria do circuito de exposições, constituído pelas obras apresentadas no Solmar, além de outras quatro espalhadas por Ponta Delgada e assinadas por Maria Trabulo, Gonçalo Preto, Miguel C.Tavares & José Alberto Gomes e Rita GT. Sempre delicado no seu discurso apesar de dominar totalmente a sua profissão e a região, Sérgio explicou durante um passeio de sábado não muito ensolarado que a curadoria de “Deambulação identitária” investigava a identidade dos locais na ilha, a partir dos trabalhos dos artistas e seus olhares estrangeiros.

A tal “identidade” é pautada por aspectos bem específicos dali: a ilha está passando por um processo de gentrificação e é destino de turistas do mundo todo (Nova Iorque e Toronto, por exemplo, têm voos diretos para Ponta Delgada). A paisagem é mesmo acachapante e muito diferente de tudo o que já viu: tem um verde vibrante e uma natureza exuberante, grande parte devido ao musgo endémico que serve como esponja da natureza e consegue absorver litros e mais litros de água. As hortênsias foram trazidas do Japão e estão espalhadas por toda a ilha numa quantidade tão absurda que chegam a formar muros e a acompanhar estradas de quilómetros de extensão. Por lá viveram ainda excêntricos como José do Canto, que durante o século XIX trouxe plantas do oriente e de outros países da Europa, resultando em parques suntuosos hoje abertos ao público, como o Jardim José do Canto. Por entre as florestas e pastos da ilha passeiam muitas vacas (há duas por cada pessoa, sendo que a população da ilha é de 150 mil habitantes), dando um ar de beleza suíça. Para além de tantas especificidades, há ainda o facto de a ilha de São Miguel estar em cima de vulcões adormecidos, porém ativos, o que faz com que as aldeias sejam dentro das crateras, as lagoas de água quente e a comida cozida diretamente no vapor do vulcão. Os seus habitantes vivem sempre o perigo: foram várias as vezes na história da ilha em que comunidades foram obrigadas a emigrar já que o seu pedaço de terra afundou.

 

 

A plantação da fábrica de chá Gorreana. Fotografia: Julia Flamingo.

 

 

Foi crucial que eu participasse do passeio promovido pela Talkie-Walkie - projeto das arquitetas Ana Vieira e Matilde Seabra, baseadas no Porto, e organizadoras de expedições pela ilha com profissionais locais – para que eu soubesse de informações como as citadas acima. Num dia chuvoso de muita neblina, eu estava entre as dez pessoas que aceitaram visitar locais com vistas panorâmicas sem poder vê-las (voltei num dia ensolarado), mas que tiveram informações privilegiadas compartilhadas pelo vulcanologista Rui Coutinho. “Imagine o que esta experiência não desperta num artista?”, disse-me Matilde Seabra, segurando pedras basálticas nas mãos. Eu estava pensando a mesma coisa em todo o percurso: naquele lugar mágico, tesouros estavam por todo o lado.

Em outro passeio, desta vez com o grupo repleto do Walk&Talk – cerca de cinquenta pessoas para o final de semana de abertura – fizemos um piquenique gigante na Lagoa de Furnas, muito bem organizado pela equipa. Depois de um banquete do cozido no vapor do vulcão (é uma mistura de carnes com vegetais deliciosos), pude conversar com artistas do mundo todo, enquanto descansávamos nas toalhas estendidas: alguns participantes do já citado circuito de exposições, outros do circuito de performances, alguns ainda planeavam as suas obras a serem produzidas no circuito ilha e, por fim, artistas que iniciavam as suas residências e que irão trabalhar em obras para serem apresentadas na próxima edição do festival. Conversando com alguns membros do coletivo londrino The Decorators, Carolina Caicedo e Mariana Pestana, entendi que o trabalho deles para o circuito ilha foi convidar sete artistas que abordassem o tema expedição: a taiwanesa Rain Wu, por exemplo, descobriu que, em 1811, a formação de uma nova ilha açoriana foi descoberta por um navegador inglês que pediu à rainha para poder batizá-la de Sabrina; quando ele voltou para fincar a sua bandeira a ilha não estava mais lá (a obra que ela desenvolveria nos próximos dias seria baseada em factos curiosos como esse). Entre essas e outras histórias, eu nem reparava no forte cheiro de enxofre que emanava dos buracos dos “restaurantes” administrados por locais que foram nas primeiras horas da manhã preparar o cozido.

Mesmo cansados, o destino da noite era sempre o pavilhão W&T. Era ponto de encontro de públicos de diferentes idades, que assistiam a DJs e performances como a do Colin Self, vestido de peruca e maquilhagem para uma apresentação de temática queer - abordagem provavelmente não muito comum para os velhotes locais, mas eles também dançavam animados. Numa noite dessas, conheci um casal de irmãos adolescentes vindos de Brasília, que moravam em Ponta Delgada há 3 anos. “Durante o ano, frequentamos três bares e vemos sempre as mesmas pessoas. Adoramos que esse festival traga tantas caras novas”, exclamaram. (Nas três noites seguintes eles “bateram cartão” no pavilhão). Outros jovens locais trabalharam voluntariamente no festival, num programa oferecido pelo Walk&Talk. “Nós fazemos tudo aqui: montamos a loja do festival, arrumamos o jantar, produzimos obras...é uma oportunidade única para conhecer e conversar com tantos artistas”, disseram os amigos António e Mitó, ambos de 18 anos, que também participavam das festas e jantares. Tudo resultado de uma direção artística cuja grande preocupação é aproximar o cenário internacional da arte dos jovens, levar o festival para outros cantos da ilha, trazer artistas para as escolas locais e incorporar jovens artistas açorianos ao festival.

Desde o ano passado, o Walk&Talk tem o apoio da DGArtes, o que sem dúvidas facilitou na organização. “Quando isso aconteceu, tivemos duas opções: a de aumentar a escala do festival e investir em mais obras ou a de melhorar as condições de trabalho de artistas e curadores. Nós escolhemos a segunda”, conta Sofia Botelho, diretora do evento. A escolha acertada é perceptível em cada mínimo detalhe.

Nos últimos 9 anos, a persistência de Jesse James, um dos fundadores do evento aos 22 anos de idade, foi crucial para que ganhasse cada vez mais fôlego: “A pergunta que queríamos responder ao criar o festival era: como fazer da periferia um centro? Queríamos abrir a ilha para o mundo e vice-versa. E fizemos!”. O reconhecimento do seu esforço vem estimulando também o crescimento do cenário de arte local, a exemplo do Arquipélago – Centro de Artes Contemporâneas, criado em 2015, e da Oficina Ateliê e Galeria, onde Leonor Pereira expõe e comercializa trabalhos sobre papel feitos por ela e outros artistas. “Por conta das linhas aéreas que agora chegam aqui, é cada vez mais fácil decidir-se por ficar na ilha. O lado de fora não é tão fora assim”, afirmou a artista. “Então as pessoas não vêm mais apenas para realizar projetos pontuais mas vivem e passam o ano aqui. E isso estimula a sensibilidade dos habitantes perante a arte, já que lidam com sua produção durante o ano todo”.

Comandado por Bernardo Brito e Abreu, o Pico do Refúgio é uma residência artística e hotel charmoso, na quinta que herdou da família e datada do início do século XVII. Marinheiro durante 20 anos, Bernardo é hoje um dos agitadores culturais da ilha e recebeu-nos com queijos, vinhos e uma morcela deliciosa para contar sobre a residência inaugurada em 2015, que já recebeu mais de vinte artistas. “Eu achava que sabia tudo sobre a minha ilha até que artistas vindos do mundo inteiro chegavam aqui e me mostravam olhares totalmente diferentes sobre ela”, conta. Caminhamos alguns metros até a obra do sul-coreano Lee Hun Chung que, durante uma residência artística no local, construiu como site-specific uma cadeira de barro gigante com vista para o horizonte. E esse horizonte infinito é também o futuro que vejo para o Walk&Talk – que venha a próxima edição junto à comemoração de uma década de existência!

 

 

 

 

Julia Flamingo
Nascida em São Paulo, Brasil, é formada em Jornalismo e História. Comanda o site Bigorna – um olhar generoso sobre a arte atual (bigorna.art.br). Colabora como repórter de artes visuais para veículos nacionais e estrangeiros. Trabalhou como repórter e crítica de arte da revista Veja São Paulo entre os anos de 2015 e 2017 e foi assessora de eventos como SP-Arte e Bienal de São Paulo.