Links

PERSPETIVA ATUAL


Figura 1 (ver legenda no final do artigo)


Figura 2 (ver legenda no final do artigo)


Figura 3 (ver legenda no final do artigo)


Figura 4 (ver legenda no final do artigo)


Figura 5 (ver legenda no final do artigo)


Figura 6 (ver legenda no final do artigo)


Figura 7 (ver legenda no final do artigo)


Figura 8 (ver legenda no final do artigo)


Figura 9 (ver legenda no final do artigo)


BOTELHO, Manuel - Jorge Pinheiro, 10–07–2015. Wikimedia Commons.

Outros artigos:

2024-11-22


INÊS FERREIRA-NORMAN


2024-10-21


AISHWARYA KUMAR


2024-08-17


CATARINA REAL


2024-07-14


MAFALDA TEIXEIRA


2024-05-30


CONSTANÇA BABO


2024-04-13


FÁTIMA LOPES CARDOSO


2024-03-04


PEDRO CABRAL SANTO


2024-01-27


NUNO LOURENÇO


2023-12-24


MAFALDA TEIXEIRA


2023-11-21


MARC LENOT


2023-10-16


MARC LENOT


2023-09-10


INÊS FERREIRA-NORMAN


2023-08-09


DENISE MATTAR


2023-07-05


CONSTANÇA BABO


2023-06-05


MIGUEL PINTO


2023-04-28


JOÃO BORGES DA CUNHA


2023-03-22


VERONICA CORDEIRO


2023-02-20


SALOMÉ CASTRO


2023-01-12


SARA MAGNO


2022-12-04


PAULA PINTO


2022-11-03


MARC LENOT


2022-09-30


PAULA PINTO


2022-08-31


JOÃO BORGES DA CUNHA


2022-07-31


MADALENA FOLGADO


2022-06-30


INÊS FERREIRA-NORMAN


2022-05-31


MADALENA FOLGADO


2022-04-30


JOANA MENDONÇA


2022-03-27


JEANNE MERCIER


2022-02-26


PEDRO CABRAL SANTO


2022-01-30


PEDRO CABRAL SANTO


2021-12-29


PEDRO CABRAL SANTO


2021-11-22


MANUELA HARGREAVES


2021-10-28


CARLA CARBONE


2021-09-27


PEDRO CABRAL SANTO


2021-08-11


RITA ANUAR


2021-07-04


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-05-30


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-04-28


CONSTANÇA BABO


2021-03-17


VICTOR PINTO DA FONSECA


2021-02-08


MARC LENOT


2021-01-01


MANUELA HARGREAVES


2020-12-01


CARLA CARBONE


2020-10-21


BRUNO MARQUES


2020-09-16


FÁTIMA LOPES CARDOSO


2020-08-14


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-07-21


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-25


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-09


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-05-21


MANUELA HARGREAVES


2020-05-01


MANUELA HARGREAVES


2020-04-04


SUSANA GRAÇA E CARLOS PIMENTA


2020-03-02


PEDRO PORTUGAL


2020-01-21


NUNO LOURENÇO


2019-12-11


VICTOR PINTO DA FONSECA


2019-11-09


SÉRGIO PARREIRA


2019-10-09


LUÍS RAPOSO


2019-09-03


SÉRGIO PARREIRA


2019-07-30


JULIA FLAMINGO


2019-06-22


INÊS FERREIRA-NORMAN


2019-05-09


INÊS M. FERREIRA-NORMAN


2019-04-03


DONNY CORREIA


2019-02-15


JOANA CONSIGLIERI


2018-12-22


LAURA CASTRO


2018-11-22


NICOLÁS NARVÁEZ ALQUINTA


2018-10-13


MIRIAN TAVARES


2018-09-11


JULIA FLAMINGO


2018-07-25


RUI MATOSO


2018-06-25


MARIA DE FÁTIMA LAMBERT


2018-05-25


MARIA VLACHOU


2018-04-18


BRUNO CARACOL


2018-03-08


VICTOR PINTO DA FONSECA


2018-01-26


ANA BALONA DE OLIVEIRA


2017-12-18


CONSTANÇA BABO


2017-11-12


HELENA OSÓRIO


2017-10-09


PAULA PINTO


2017-09-05


PAULA PINTO


2017-07-26


NATÁLIA VILARINHO


2017-07-17


ANA RITO


2017-07-11


PEDRO POUSADA


2017-06-30


PEDRO POUSADA


2017-05-31


CONSTANÇA BABO


2017-04-26


MARC LENOT


2017-03-28


ALEXANDRA BALONA


2017-02-10


CONSTANÇA BABO


2017-01-06


CONSTANÇA BABO


2016-12-13


CONSTANÇA BABO


2016-11-08


ADRIANO MIXINGE


2016-10-20


ALBERTO MORENO


2016-10-07


ALBERTO MORENO


2016-08-29


NATÁLIA VILARINHO


2016-06-28


VICTOR PINTO DA FONSECA


2016-05-25


DIOGO DA CRUZ


2016-04-16


NAMALIMBA COELHO


2016-03-17


FILIPE AFONSO


2016-02-15


ANA BARROSO


2016-01-08


TAL R EM CONVERSA COM FABRICE HERGOTT


2015-11-28


MARTA RODRIGUES


2015-10-17


ANA BARROSO


2015-09-17


ALBERTO MORENO


2015-07-21


JOANA BRAGA, JOANA PESTANA E INÊS VEIGA


2015-06-20


PATRÍCIA PRIOR


2015-05-19


JOÃO CARLOS DE ALMEIDA E SILVA


2015-04-13


NatĂĄlia Vilarinho


2015-03-17


Liz Vahia


2015-02-09


Lara Torres


2015-01-07


JOSÉ RAPOSO


2014-12-09


Sara Castelo Branco


2014-11-11


NatĂĄlia Vilarinho


2014-10-07


Clara Gomes


2014-08-21


Paula Pinto


2014-07-15


Juliana de Moraes Monteiro


2014-06-13


Catarina Cabral


2014-05-14


Alexandra Balona


2014-04-17


Ana Barroso


2014-03-18


Filipa Coimbra


2014-01-30


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2013-12-09


SOFIA NUNES


2013-10-18


ISADORA H. PITELLA


2013-09-24


SANDRA VIEIRA JÜRGENS


2013-08-12


ISADORA H. PITELLA


2013-06-27


SOFIA NUNES


2013-06-04


MARIA JOÃO GUERREIRO


2013-05-13


ROSANA SANCIN


2013-04-02


MILENA FÉRNANDEZ


2013-03-12


FERNANDO BRUNO


2013-02-09


ARTECAPITAL


2013-01-02


ZARA SOARES


2012-12-10


ISABEL NOGUEIRA


2012-11-05


ANA SENA


2012-10-08


ZARA SOARES


2012-09-21


ZARA SOARES


2012-09-10


JOÃO LAIA


2012-08-31


ARTECAPITAL


2012-08-24


ARTECAPITAL


2012-08-06


JOÃO LAIA


2012-07-16


ROSANA SANCIN


2012-06-25


VIRGINIA TORRENTE


2012-06-14


A ART BASEL


2012-06-05


dOCUMENTA (13)


2012-04-26


PATRÍCIA ROSAS


2012-03-18


SABRINA MOURA


2012-02-02


ROSANA SANCIN


2012-01-02


PATRÍCIA TRINDADE


2011-11-02


PATRÍCIA ROSAS


2011-10-18


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-09-23


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-07-28


PATRÍCIA ROSAS


2011-06-21


SÍLVIA GUERRA


2011-05-02


CARLOS ALCOBIA


2011-04-13


SÓNIA BORGES


2011-03-21


ARTECAPITAL


2011-03-16


ARTECAPITAL


2011-02-18


MANUEL BORJA-VILLEL


2011-02-01


ARTECAPITAL


2011-01-12


ATLAS - COMO LEVAR O MUNDO ÀS COSTAS?


2010-12-21


BRUNO LEITÃO


2010-11-29


SÍLVIA GUERRA


2010-10-26


SÍLVIA GUERRA


2010-09-30


ANDRÉ NOGUEIRA


2010-09-22


EL CULTURAL


2010-07-28


ROSANA SANCIN


2010-06-20


ART 41 BASEL


2010-05-11


ROSANA SANCIN


2010-04-15


FABIO CYPRIANO - Folha de S.Paulo


2010-03-19


ALEXANDRA BELEZA MOREIRA


2010-03-01


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-02-17


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-01-26


SUSANA MOUZINHO


2009-12-16


ROSANA SANCIN


2009-11-10


PEDRO NEVES MARQUES


2009-10-20


SÍLVIA GUERRA


2009-10-05


PEDRO NEVES MARQUES


2009-09-21


MARTA MESTRE


2009-09-13


LUÍSA SANTOS


2009-08-22


TERESA CASTRO


2009-07-24


PEDRO DOS REIS


2009-06-15


SÍLVIA GUERRA


2009-06-11


SANDRA LOURENÇO


2009-06-10


SÍLVIA GUERRA


2009-05-28


LUÍSA SANTOS


2009-05-04


SÍLVIA GUERRA


2009-04-13


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2009-03-23


PEDRO DOS REIS


2009-03-03


EMANUEL CAMEIRA


2009-02-13


SÍLVIA GUERRA


2009-01-26


ANA CARDOSO


2009-01-13


ISABEL NOGUEIRA


2008-12-16


MARTA LANÇA


2008-11-25


SÍLVIA GUERRA


2008-11-08


PEDRO DOS REIS


2008-11-01


ANA CARDOSO


2008-10-27


SÍLVIA GUERRA


2008-10-18


SÍLVIA GUERRA


2008-09-30


ARTECAPITAL


2008-09-15


ARTECAPITAL


2008-08-31


ARTECAPITAL


2008-08-11


INÊS MOREIRA


2008-07-25


ANA CARDOSO


2008-07-07


SANDRA LOURENÇO


2008-06-25


IVO MESQUITA


2008-06-09


SÍLVIA GUERRA


2008-06-05


SÍLVIA GUERRA


2008-05-14


FILIPA RAMOS


2008-05-04


PEDRO DOS REIS


2008-04-09


ANA CARDOSO


2008-04-03


ANA CARDOSO


2008-03-12


NUNO LOURENÇO


2008-02-25


ANA CARDOSO


2008-02-12


MIGUEL CAISSOTTI


2008-02-04


DANIELA LABRA


2008-01-07


SÍLVIA GUERRA


2007-12-17


ANA CARDOSO


2007-12-02


NUNO LOURENÇO


2007-11-18


ANA CARDOSO


2007-11-17


SÍLVIA GUERRA


2007-11-14


LÍGIA AFONSO


2007-11-08


SÍLVIA GUERRA


2007-11-02


AIDA CASTRO


2007-10-25


SÍLVIA GUERRA


2007-10-20


SÍLVIA GUERRA


2007-10-01


TERESA CASTRO


2007-09-20


LÍGIA AFONSO


2007-08-30


JOANA BÉRTHOLO


2007-08-21


LÍGIA AFONSO


2007-08-06


CRISTINA CAMPOS


2007-07-15


JOANA LUCAS


2007-07-02


ANTÓNIO PRETO


2007-06-21


ANA CARDOSO


2007-06-12


TERESA CASTRO


2007-06-06


ALICE GEIRINHAS / ISABEL RIBEIRO


2007-05-22


ANA CARDOSO


2007-05-12


AIDA CASTRO


2007-04-24


SÍLVIA GUERRA


2007-04-13


ANA CARDOSO


2007-03-26


INÊS MOREIRA


2007-03-07


ANA CARDOSO


2007-03-01


FILIPA RAMOS


2007-02-21


SANDRA VIEIRA JURGENS


2007-01-28


TERESA CASTRO


2007-01-16


SÍLVIA GUERRA


2006-12-15


CRISTINA CAMPOS


2006-12-07


ANA CARDOSO


2006-12-04


SÍLVIA GUERRA


2006-11-28


SÍLVIA GUERRA


2006-11-13


ARTECAPITAL


2006-11-07


ANA CARDOSO


2006-10-30


SÍLVIA GUERRA


2006-10-29


SÍLVIA GUERRA


2006-10-27


SÍLVIA GUERRA


2006-10-11


ANA CARDOSO


2006-09-25


TERESA CASTRO


2006-09-03


ANTÓNIO PRETO


2006-08-17


JOSÉ BÁRTOLO


2006-07-24


ANTÓNIO PRETO


2006-07-06


MIGUEL CAISSOTTI


2006-06-14


ALICE GEIRINHAS


2006-06-07


JOSÉ ROSEIRA


2006-05-24


INÊS MOREIRA


2006-05-10


AIDA E. DE CASTRO


2006-04-05


SANDRA VIEIRA JURGENS



JORGE PINHEIRO - OBRA FIGURATIVA (1990-2010)



ISABEL TAVARES

2024-09-21




 

 

De tempos a tempos [1], Jorge Pinheiro regressa à pintura figurativa. A origem das imagens ou mais importante, o que elas originam no processo criativo do artista é para nós, uma das questões mais interessantes na obra do autor produzida entre 1990-2010. As personagens que habitam o discurso silencioso [2] de Jorge Pinheiro gritam na procura de interlocutores para se poderem revelar. É nas gavetas do atelier que se guardam e se revolvem em memórias, memoráveis e emergentes, críticas irónicas e mordazes mas sempre atuais em pintura (figura 1).

A obra figurativa de Jorge Pinheiro não faz uma rutura com o passado mas com a forma de pensar esse passado. Revolvendo-o, olhando para si próprio, o artista revive o que incorporou do mundo e dos seus contemporâneos, a matéria de que se servirá para reencontrar o mundo e reconstituir um tempo comum, fora do tempo – A Eternidade Agora [3] – uma amálgama existencial que deslizando ao longo dos anos desde um passado longínquo até aos dias de hoje se vê descoberta, desviada, transformada, metamorfoseada e circunstanciada em composição pictórica.

Recorrendo a modelos do Modelo, a nova figuração pictórica é a representação de imagens culturalmente produzidas em imagens obscuramente sonhadas no jogo da Composição e Representação (figuras 2 e 3). Os mitos e os valores simbólicos fazem-se representar na Pintura. São representações de representações, em nome das formas de poder da Composição e Representação: elementos fundamentais na História da Pintura.

As Figuras-Símbolo da Representação apropriadas da Pintura, Fotografia, Cinema ou Fotojornalismo são ícones sublimados, corrompidos ou arruinados na obra de Pinheiro. A obra coloca em causa a sua legitimidade e em simultâneo reitera-a, reflete o conceito de originalidade, na identidade da obra; identifica os autores primeiros e faz pensar na autoria dos segundos, evidenciando a posição do artista em relação à sociedade e ao seu ofício com passado histórico.

A imagem cultural prevalece no jogo da representação e do discurso estético porque o objeto de imitação não é um objeto, mas um ideal. A cópia rebelde impera como mola geradora de sentidos, de novos modelos que tende a expô-los desde a sua fundação.

O pintor é como o Poeta, um fingidor. Reinventa a vetusta tradição como outrora o fizeram os grandes mestres e é reinventado o legado que Jorge Pinheiro constrói e continua o Mito, num território permeável, onde a Pintura chama à Pintura, à Arte e aos valores humanísticos do Ocidente (figura 4).

Questionar a pintura figurativa de Jorge Pinheiro produzida entre 1990 e 2010 equivale a reequacionar a História e os valores estéticos e humanísticos da cultura ocidental. Falamos de um artista, cuja obra oscilou entre a figuração e a abstração com retornos sucessivos entre uma e outra. A pintura figurativa reiterada por focos e ecos referenciais designada de nova figuração remete para o suplemento em falta e para os conceitos de Obra, Género, Originalidade e Autoria e percorre a Estética, Filosofia, História e Cultura.

A complexidade da obra figurativa de Jorge Pinheiro depende de quem a vê e como a vê. Pinharanda situa a obra Homenagem ao Povo Alentejano (1980) [Pintura] (figura 5) como sendo a primeira das pinturas do autor a assumir a citação como fórmula pictórica.

Jorge Pinheiro, o Professor que aprofundou conhecimentos na semiótica da pintura, em 1979, regressa a Portugal e propõe aos seus alunos, para o ano letivo 1980-1981, um estudo da obra de arte, segundo o modelo estudado. Na carreira artística continua a trabalhar na abstração, mas sente esgotado o filão. A década de noventa marcaria a grande afirmação do autor no regresso à pintura de cavalete com temática diferenciada. “A sua pintura depois de ser incomodamente abstrata (até à primeira metade dos anos 70) tornou-se incomodamente figurativa.” [4] Por causa da temática, o mestre começa a ocupar um lugar isolado, no contexto da arte figurativa.

Por um processo de Anamnese [5] e usando as ferramentas do seu ofício, Jorge Pinheiro constrói a obra de arte, a que melhor expressa a sua língua, a de todos, apropria-se dela como instrumento de luta com o qual pode contar para agir e denunciar paradigmas e constrangimentos, mas também, para a salvar. Salva-se a luz de outrora, em narrativas de – Era uma vez uma princesa [6] – o pretérito imperfeito que devora o presente progressivamente, e constitui momentos de paragem que incidem sobre a obra, sobre a memória, sobre a cultura e sobre a combinação da nossa visão da história que é única em cada um de nós, criando figuras de espelho continuamente outras, autobiografias impessoais de alguém como nós.

O desejo do desenho [7] constitui-se como paixão. Em muitas exposições realizadas nos anos noventa Jorge Pinheiro impôs apenas uma pintura com os muitos desenhos e esboços preparatórios que lhe deram origem como Porquê? (março de 1991 a 2 de fevereiro de 1992) [Pintura] (figura 6) e onde é visível a composição sujeita a rigorosa malha geométrica ou perspetiva. Os muitos desenhos e estudos não podem ser vistos como inocente valor estético, eles marcam e afirmam um tipo de poder, expressão de uma civilização com valores ideológicos que remetem para a Escola, Academia e Universidade. Dar visibilidade ao desenho, em que é exímio, e não só ao objeto pictórico final, é promover a valorização do processo da obra e encontrar o lugar do desenho [8], igualando-o em estatuto ao da já consagrada pintura.

Com Pathos [9] Jorge Pinheiro desenha em profusão, tenta apoderar-se do Ser do traço, do Sentido figural, assenhorear-se e servir-se de modelos do Modelo até os tornar outros em pintura. Os procedimentos alegóricos neobarrocos com que introspectivamente [10] trata toda a nossa História da Arte e da Cultura são uma fórmula eficaz de produzir ecos e ressonâncias, com todo o património ocidental a remeter para uma grande Fábula e o pintor a ser um criador/construtor/continuador de mitos (figura 7).

Fábula, lenda, mito e religião perpassam na obra ambivalente e ambígua com outras formas de poder, ideais para se poder produzir os tão desejados comentários irónicos e mordazes. Estamos perante um autor manipulador de discursos simbólicos e representacionais com a Composição e a Representação a constituírem-se como modelos do Modelo, já que a tarefa do artista atual não consiste tanto em destruir o referente mas em subvertê-lo, encontrando novas soluções míticas narrativas.

O que se nos depara é um novo horizonte de expectativa da realidade da imagem, onde se deteta ainda, um misto de desejo do real e desejo de irreal ou mistificação, uma luta pela organização da narrativa icónica dentro do espaço da composição, ilusoriamente remetendo para algo que não é ela, para de novo remeter apenas para si própria. Nas grandes telas do séc. XX e, mais ainda, nas da primeira década do séc. XXI, o aspeto retrospetivo da imagem mais do que saudosista, é antológico, representa uma perspetiva seletiva e recapituladora. Cada figura vale não por aquilo que é mas por aquilo que representa (figura 8).

A história das imagens pode ser concebida como uma história do desejo e da vontade de poder e a memória essa será compreendida como material, como a pensou Nietzsche, um material plástico capaz de todas as metamorfoses.

A apropriação nas telas do séc. XXI pode vir de uma frame do cinema ou do seu prolongamento na televisão, de uma fotografia, um desenho, cartaz ou reprodução muitas vezes já constituída como reprodução de reprodução. A obra subversiva justifica-se por recusar o primado de um original sobre a cópia, de um Modelo sobre a Imagem. Glorifica-se o reino dos simulacros e dos reflexos.

Os mecanismos que o autor utiliza e o modo como é feita a revelação da imagem icónica provoca uma nova ocultação e o resultado que se obtém é uma intensificação do real e uma intensificação do olhar, um olhar sobre o olhar, imagem de imagens, operações de deslocamento da história, do referente do real, parte integrante de um discurso em que a reintegração do passado funciona como fator de re-avaliação do nosso horizonte de expectativa e, sendo um alargamento, é também, uma dissolução.

É um jogo milenar, aquele que subjaz o discurso pictórico que leva o traço a construir o ícone que se torna duplo do real e suporte metafórico do pensamento mítico. Como tantos autores já o disseram, nós igualmente, e até o próprio assumiu, a obra será pessoal, individual, psicanalista, histórica, documental, circunstanciada, incómoda, mas, a estrutura projetual e conceptual subjacente, alicerçada nessa longa Composição [11] e Representação, confere-lhe um papel determinante, orientando a trajetória do objeto plástico para o espectador contemplador. Essa a razão porque Jorge Pinheiro sempre que sente necessidade de dizer alguma coisa volta à pintura figurativa.

Apropriando-se das formas mais significativas do nosso património artístico e cultural, vamos encontrar na obra figurativa do autor, um pintor mais exposto estabelecendo ligações afetivas entre o objeto plástico e a pessoa que o pinta. E, na já longa carreira artística, a autorreferencialidade revela-se também, matéria pictórica que se abre como mais uma porta-memória onde se encontram outros porta-signos.

Numa época em que o real e o virtual se confundem, o artista estrutura a obra d’après nature em d’après culture e torna-a Realmente Real, [12] estabelecendo a montante os tão desejados referenciais e a jusante diferenciais. O artista procura no espectador um leitor modelado mais do que um simples contemplador para reinterpretação de mensagens. Ao centrar a obra no discurso, está também a centralizar a mensagem visual no sujeito que a vê e lê e sobretudo, a procura. O pintor produz, o espectador iniciado de cultura, reproduz.

A Composição enquanto disciplina é para o artista o objeto de desejo que garante o amor. Os símbolos mais significativos são os mais desejáveis. Inspirado pela verosimilhança do idêntico captura-se a adesão do amado, cujas respostas marcam a progressão da Ideia. O discurso sem histórias dentro… [13] que o autor nos quer fazer crer, confronta-nos precisamente com o seu contrário. O reconhecimento é o que fundamenta o signo e a linguagem pictórica surge em Jorge Pinheiro como forma de poder, como vontade de poder.

A obra O Banquete (2008/2009) [Pintura] (figura 9) produzida para assinalar o centenário da República é composta por ícones e signos/símbolos de valores míticos nacionais. O autor constrói personagens fictícias na representação para o espectador confrontá-las com personagens reais, pela caracterização. A composição em jeito de Última Ceia [Ícone] e o título funcionam como valores de estímulo para o espectador modelado. O símbolo icónico apropriado não é senão máscara, apenas a imagem está próxima, mas o seu fundo é ideológico. Ao centro, como um iman, encontramos uma vez mais a figura do Ditador, Salazar.

Nas muitas declarações que proferiu, vamos encontrar sempre um pintor com alma de professor, o Mestre admirado por várias gerações de estudantes e que lecionou na década de oitenta do séc. XX as Cadeiras de Pintura e Composição na FBAUL (então ESBAL). Da Cadeira de Composição à composição pictórica não há separação disciplinar.

As duas bolsas de estudo da Gulbenkian e as coisas (vistas) lá fora [14] proporcionaram-lhe a abertura de novos horizontes. Aproximando a obra do Mestre desta fase à de outros artistas nacionais e internacionais de renome apercebemo-nos que na diferença que os separa há sempre algo que os une. Todos partem da apropriação, todos produzem obras d’après. O resultado nunca é um somatório mas sim um produto exponencial.

Utiliza o desenho como forma de linguagem independente, desejando-o na sua incomensurável capacidade expressiva para fixar imagens, como coadjuvante da Composição, como outrora o fizeram os grandes mestres, servil e servindo de alicerce à representação figurativa. O estilo pictórico, tal como o fizera Poussin, é encontrado na pintura de cavalete que geralmente é destinada a um público intelectualmente mais restrito.

O sentido inatual da Figuração e da Composição veiculam a metalinguística encontrada na representação pictórica, tão ao gosto do autor e representativa da arte e do estatuto do artista quando se intitula – O da Metalinguagem. [15] Com humor, alguma perversidade e ironia, o Mestre incita à reaprendizagem enquanto se deixa seduzir pelos modelos. A sua obra expressa intencionalidade e é quando somos enquadrados nela que o nosso modo de interrogar a pintura é por sua vez interrogado.

O grito silencioso da revolta ou do constrangimento apazigua inconformidades do artista com responsabilidade social quando eclode em obra, em pintura que chama à Pintura, à visibilidade, ao Tempo, à verbalização. Interventivo na tela como na vida, procura fazer Sentido. Confrontar, julgar, comentar e denunciar em arte é existir, é extravasar em formas de liberdade.

O olhar do artista é um olhar de Sentido, faz-nos viajar pelo conhecido, em liberdade, num património pautado pela “inatualidade” das imagens. A obra, indizível na sua realidade, acontece na tela, mas evolui para além dela. Com a consciência de estar no mundo, o artista ao ouvir a vida lá fora a dar murros na porta, não permanece indiferente e produz. A sua pintura é a sua Porta-Voz, silente grita!

Em suma: a pintura de Jorge Pinheiro assume-se como lugar de descoberta. Descobrir no fundo de si mesma, o discurso pictórico e as forças exteriores que a atravessam; ou seja, as marcas da textualidade da imagem. Há que entender cada traço da textualidade não verbal como facto discursivo, como lugar da textualização do político e ideológico.

A réplica empática das citações, os modelos do Modelo, a reprodutibilidade das expressões artísticas e todo o discurso que chega até nós através de simulacros, perfila-se sempre perante um fundo de cultura reconhecido. O que o inspira? A vida lá fora a dar murros na porta. O homem, o artista e o cidadão coexistem e usam a pintura como forma de expressão e reflexão sobre o mundo.

A pintura de cavalete é sem dúvida, assumida pelo autor como forma determinante, para produzir uma exploração da arquitectura de mitos e os fragmentos históricos apropriados e metamorfoseados são o material de que se serve, para criar uma fábula que é levada a sério, durante duas décadas.

O pintor é como o Poeta, um fingidor. Reinventa a vetusta tradição como outrora fizeram os grandes mestres e é reinventando o legado que Jorge Pinheiro constrói e continua o Mito e possibilita ainda a toda uma geração que se reveja e questione sobre o modo de estar no mundo.

 

 

Isabel Tavares
(Lisboa, 1963) é licenciada e mestre em Pintura pela FBAUL, doutorada em Ciências da Arte e do Património pela FBAUL, investigadora do CIEBA e ilustradora da Editorial Caminho. Vive e trabalha em Almada, onde exerce funções docentes.

 

:::

 

Notas

[1] De Tempos a Tempos (2014) [Catálogo] e título da exposição de Jorge Pinheiro realizada na Cooperativa Árvore, em 2014.
[2] Discurso Silencioso (2021) [Livro] e título da exposição de Jorge Pinheiro realizada na Galeria Ala da Frente em Famalicão de 10 de abril a 31 de julho de 2021.
[3] A Eternidade Agora (1996) [Catálogo] e título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada na Cadeia da Relação do Porto, em 1996.
[4] PINHARANDA, João – Jorge Pinheiro : Pintura e Desenho. Público. (18 mar. 1994)
[5] Anamnese (1995) [Desenho (série)] e título dado por Jorge Pinheiro às exposições realizadas na Galeria Arte Periférica e Degrau Arte, em Lisboa e Porto respetivamente, em 1995.
[6] Era uma vez uma princesa (1996) [Pintura] e título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada na Galeria J. M. Gomes Alves, Guimarães, em 1996.
[7] O desejo do Desenho (1995) [Catálogo] e título da exposição coletiva (da qual JP fez parte) realizada na Casa da Cerca em Almada, em 1995.
[8] O lugar do desenho (2003) [Catálogo] e título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada na Fundação Júlio Resende em Gondomar, em 2003.
[9] Com Pathos é o título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada na Galeria Palmira Suso, em 2007.
[10] Introspectivamente é o título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada na Galeria Miguel Nabinho, em 2022.
[11] Essa longa Composição é o título dado por Laura Castro ao prefácio do catálogo da exposição de Jorge Pinheiro [De Tempos a Tempos], realizada na Cooperativa Árvore, Porto, em 2014. Também Jorge Pinheiro em entrevista dada a João Lima Pinharanda e Nuno Faria em 2002, afirmou: “E, na longa composição que é sempre a obra de alguém, os opostos são inevitáveis.”In FCG/CAMJAP – Jorge Pinheiro 1961-2001. Lisboa: FCG/CAMJAP (fev. 2002).
[12] Realmente Real é o título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada na Galeria Fernando Santos, em 2010.
[13] Discursos sem histórias dentro… é o título dado por Jorge Pinheiro à exposição realizada no Museu Teixeira Lopes, em 2009.
[14] E as coisas lá fora é o excerto do título da exposição de Jorge Pinheiro D’après Fibonacci e as coisas lá fora, realizada na Fundação de Serralves, em 2017.
[15] Excerto do título da obra El-Rei V (El-Rei olhando um quadro de Jorge Pinheiro – O da Metalinguagem) (1974) [Pintura].

 

:::

 

Legendas das imagens

Fig. 1 – Imagem manipulada de PINHEIRO, Jorge – O Jogo da Macaca III. (2004) Pintura : óleo s/tela, 140 x 220 cm (díptico). Ass./Dat. Coleção particular; A – CHAPLIN, Charlie – O garoto de Charlot. (frame) (1921) [Filme]; B – [s.a.] –[s.n.] O Garoto de Charlot (1921) Cinecartaz; C – CAPA, Robert – Morte de Soldado Miliciano. (1936) Prova fotográfica; D – GOYA – O 3 de Maio. (1814) Pintura : óleo s/tela, 268 x 347 cm. Madrid : Museu do Prado; E – CORBIS SYGMA – [s.n.] (1988) Prova fotográfica.

Fig. 2 – PINHEIRO, Jorge – Stabat Mater. (2006) Pintura : óleo s/ tela, 162 x 130 cm. Coleção Galeria Palmira Suso.

Fig. 3 – RODCHENKO, Aleksandr – O Couraçado Potemkin. (1925) Fotografia : prova fotográfica em gelatina de sais de prata.

Fig. 4 – Imagem manipulada de PINHEIRO, Jorge – O Sacrifício de Isaac. (2002) Pintura : óleo s/tela, 130 x 162 cm. Ass./Dat. Coleção particular; A – STODDART, Tom – [s.n.] (1987) Fotografia. Londres : IPG; B – RODCHENKO, Aleksandr – Lily Brick. (1924) Cartaz. Nova Iorque : Museu de Arte Moderna.

Fig. 5 – PINHEIRO, Jorge – Homenagem ao Povo Alentejano. (1980) Pintura : óleo s/tela 149,5 x 179,5 cm. Ass./Dat. Coleção particular

Fig. 6 – PINHEIRO, Jorge – Porquê?. (março de 1991 a 2 de fevereiro de 1992) Pintura : óleo s/tela 130 x 162 cm. Ass./Dat. Coleção Leontina George.

Fig. 7 – Imagem manipulada de Solus Ipse. (1993/1995) [Pintura] AEstela Funerária dita de Filino. (séc. II a.C.) Escultura (baixo-relevo) Atenas; B – BÖCKLIN, Arnold – A Ilha dos Mortos. (1880) Pintura [1ª versão]: óleo s/tela, 111 x 155 cm, Kunstmuseum, Basel; C - BÖCKLIN, Arnold – A Ilha dos Mortos. (1880) Pintura [2ª versão] óleo s/madeira, 74 x 122 cm, The Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque; D – BÖCKLIN, Arnold – A Ilha dos Mortos. (1883) Pintura : [3ª versão] óleo s/madeira, 80 x 150 cm, Alte Nationalgalerie, Berlim; E – BÖCKLIN, Arnold – A Ilha dos Mortos. (1886) Pintura : [5ª versão] óleo s/madeira, 80 x 150 cm, Museum der bildenden Künste, Leipzig; F – DALI, Salvador – The Real Picture of the Isle of the Dead by Arnold Böcklin at the Hour of Angelus. (1932) Pintura : óleo s/tela 77,5 x 64,5 cm, Von der Heydt Museum, Wuppertal, Alemanha.

Fig. 8 – Imagem manipulada de La Fable de La Fontaine. (2000) [Pintura]; A – DUCHAMP – Fontaine. (1964) Ready-made (réplica do original de 1917); B – QUARTON, Enguerrand de – Pietà. (c. 1455) Pintura : óleo s/ tela. 162 x 218 cm, Museu do Louvre; C – STERNBERG, Josef von – O Anjo Azul. (1930) [Filme (Frame)]; D – DIETRICH, Marlene – O Anjo Azul. (1930) [Cartaz].

Fig. 9 – PINHEIRO, Jorge – O Banquete. (2008/2009) Pintura : óleo s/ tela 1,95 x 2,68 m