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Francisco Tropa, Scenario, 2011. © Pedro Tropa.


Francisco Tropa, Scenario, 2011. © Pedro Tropa.


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Francisco Tropa, Scenario, 2011. © Pedro Tropa.


Francisco Tropa, Scenario, 2011. © Pedro Tropa.


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SCENARIO DE FRANCISCO TROPA
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PATRÍCIA ROSAS

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Scenario
Francisco Tropa
Pavilhão de Portugal
54.ª Exposição Internacional de Arte – La Biennale di Venezia
4 de Junho a 27 de Novembro de 2011




A um mês do encerramento da 54.ª Exposição Internacional de Arte – La Biennale di Venezia, o Pavilhão de Portugal deste ano está representado pelo artista Francisco Tropa (n. 1968), que já tinha participado na Bienal de Veneza de 2003, quando foi convidado pelo curador da Bienal, Francesco Bonami, para integrar a exposição “Dreams and Conflicts”. Este ano a sua participação, naturalmente, já com um conhecimento a priori das especificidades da cidade italiana e das próprias características da Bienal, oferece, na sua obra intitulada Scenario, uma importante relação com ambas.
Os pavilhões dos países espalhados pela cidade – este ano com um record de 89 pavilhões nacionais – surgem como evento paralelo da Bienal e do tema Illuminations (Iluminações) – definido pela comissária-geral da Bienal, a suíça Bice Curiger.
Cada país selecciona o seu comissário que por sua vez escolhe o artista que o vai representar; a DGArtes nomeou o curador Sérgio Mah (n. 1970), comissário-geral da Bienal Lisboa Photo em 2003 e 2005, e director artístico da PhotoEspaña entre 2008 e 2010, actualmente lecciona na FBA, na FCSH e no Ar.Co, em Lisboa.


Chegados à belíssima cidade de Canaletto, encontramos facilmente o pavilhão português (que já nas três últimas edições da Bienal apresentou obras de Helena Almeida [2005], Ângela Ferreira [2007] e da dupla João Maria Gusmão e Pedro Paiva [2009]). Situado na margem do Grande Canal, o Fondaco Marcello, espaço histórico, antigo armazém e depósito de gôndolas, construído no final do século XVI, acolhe uma instalação concebida por Francisco Tropa especificamente para este local, em que a imagem em movimento, a imagem estática e a escultura convivem extraordinariamente num mesmo espaço.


Quando entramos em Scenario, são vários os temas suscitados, e são diversas as perspectivas propostas pelas imagens projectadas: desde a relação entre a figuração e a abstracção, a imagem fixa ou em movimento, ou a relação entre a cópia e o original. Mas também como refere Sérgio Mah, no catálogo da exposição, «Scenario distingue-se pela profusão de materiais, processos, técnicas e referências históricas e culturais (do artesanal e popular ao erudito e científico)».


O espaço cénico montado por Francisco Tropa, numa cidade em que o teatro e a ópera têm particular destaque, sobretudo se pensarmos no histórico e tão especial Teatro La Fenice, permite ao público sentir-se como parte integrante da obra. Isto porque, em Scenario não há uma narrativa; e isso só acontece quando o espectador entra no espaço, porque foi claramente para ele que Francisco Tropa concebeu este trabalho. O “observador-experimentador” acentua a performatividade da obra, está “em palco” o tempo todo que permanece no espaço expositivo.


Neste sentido, o título da obra foi criteriosamente pensado. A etimologia da palavra “scenario” remonta ao termo grego skené o qual significava «a parte do palco onde representavam os actores», por oposição a thymele, onde actuava o coro. É do termo grego que deriva a palavra latina scena, mantendo o mesmo significado, e é a partir desta que deriva, por sua vez, scenarius. Na Commedia dell’Arte italiana, o scenario surgiu como uma espécie de ensaio de entrada e saída dos actores, que garantia a liberdade criativa e de improviso dos intérpretes.
Na ópera ou no ballet, o scenario serve para indicar como devem ser adaptados os aspectos das personagens, do enredo ou do palco, para depois ser desenvolvida num libretto ou argumento.


Scenario é constituído por sete dispositivos de projecção que seguem o princípio de funcionamento das lanternas mágicas. O dispositivo é igual em todas as projecções e composto por um pedestal onde está a máquina, uma lente circular e uma caixa de latão, e cada dispositivo é acompanhado por um objecto que cria uma imagem projectada. As imagens são projectadas em ecrãs de estuque sobre painéis de madeira.
Há imagens projectadas que contêm movimento: a imagem da ampulheta, da folha seca, ou as gotas de água que caem de uma taça de vidro, de uma garrafa e de um fio de seda. A lâmpada incandescente e a mosca morta projectam imagens paradas e figurativas. Em frente aos ecrãs-cenários que projectam estas imagens estáticas encontramos troncos de árvores, tábuas de madeira, cavaletes, encostados no ecrã. É a própria sombra dos vários objectos espalhados pelo espaço que constroem a imagem do tempo, um tempo marcado pela sombra. Os troncos, as tábuas e os cavaletes são sombras no ecrã, tal como o nosso corpo, ou seja, a nossa sombra também é projectada nos ecrãs.


Possivelmente, a grande relação de Scenario com o tema Illuminations surja deste conflito entre luz e sombra, pensado desde sempre pelos artistas. Esta obra é resultado desse conflito, e uma das qualidades estéticas mais importantes da imagem em movimento e da imagem estática é o contraste entre o claro e o escuro. A intensidade da luz demonstrada no ambiente, a iluminação do objecto, ou a distinção do fundo são alguns dos exemplos da construção deste contraste.


Portanto, o dispositivo de projecção está fixo. O movimento só acontece quando os objectos se movem. Mas algumas imagens estão estáticas, num tempo aparentemente inalterável, num tempo que, afinal, acaba por ser um espaço pictórico. Esta questão relembra os primórdios do cinema: a câmara estava fixa, revelando uma imobilidade que correspondia ao ponto de vista do espectador. Ou seja, a câmara estava fixa diante do objecto do filme. Era, portanto, designada a época do “palco-tela” de Georges Méliès. Esta denominação está obviamente relacionada com a influência do teatro. Os actores representavam para uma câmara fixa, como se estivessem numa peça teatral. Só mais tarde foi dada importância à filmagem em perspectiva e os primeiros filmes procuravam mostrar os movimentos dos objectos no ecrã, tal e qual como ocorriam na vida real.


Francisco Tropa não pretende regular o tempo, como o cinema passou a fazer: através da câmara, o tempo pode ser acelerado, invertido, prolongado. Em Scenario, o artista estilhaça o tempo, porque nele percepcionamos a criação, experimentamo-la, num tempo que filtrou todo o processo de criação da obra e de experiência num só momento.
A origem da obra está à nossa frente: quando vemos o próprio referente da imagem projectado, ou seja, deparamo-nos com o objecto e a projecção frente a frente, sem esconder a origem da imagem projectada no ecrã.


Para além da construção de um espaço imaginário e enigmático, onde a própria criação nos é revelada, onde o processo de construção de uma imagem nos é demonstrado, desde a sua origem ao resultado final, Scenario é novamente o estilhaçar do tempo: a ampulheta e as gotas de água (clepsidras) que caem medem o tempo; uma folha seca representa o tempo que passa; já uma mosca morta comprova o tempo da morte; mas o filamento incandescente de uma lâmpada destaca o tempo de vida.
Em suma, Scenario, acima de tudo, abarca os dois grandes temas da arte do século XX e XXI: o espaço e o tempo.


Com efeito, não é somente o tema da Luz, longe disso, que a Bienal de Veneza de 2011 nos apresenta. Relembrando o vencedor do Leão de Ouro para melhor artista da Bienal, o californiano Christian Marclay com o fabuloso The Clock (2010), exibe uma obra sobre o tempo, a duração e o cinema, constituída por centenas de fragmentos de filmes, criando 24 horas de filme, sincronizando o local e as horas do sítio onde se está, com o próprio filme.
Contradizendo-se a si mesma, com o enorme número de obras e de artistas que apresenta, a memória da 54.ª Bienal de Veneza, ficará fortemente marcada por obras que procuram reflectir sobre o tempo que não se tem e sobre o tempo que é necessário para Ver.

A oportunidade, a não perder, de ver Scenario em Lisboa vai acontecer de 15 de Fevereiro a 15 de Abril de 2012, no Museu Berardo.



Patrícia Rosas