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Jorge Silva Melo em Vermeer et Spinoza, de Gilles Aillaud, enc. Jean Jourdheuil e Jean-François Peyret, Paris, 1984.

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JORGE SILVA MELO: EU NÃO QUERO VIVER SEM CRÍTICA. O QUE É QUE HAVEMOS DE FAZER?



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Os críticos julgam as obras e não
sabem que são julgados por elas.

Jean Cocteau

Não pode haver uma regra segundo a qual
alguém devesse ser coagido a reconhecer algo como belo, e contudo,
se então chamamos ao objecto, belo, cremos ter em nosso
favor uma voz universal e reivindicamos a adesão de qualquer um.

Kant





Texto sobre a conferência Não gosto de críticos, não gosto, de Jorge Silva Melo, na Culturgest, 26 de Setembro de 2011.


Numa apresentação não isenta do habitual tom humorístico com que Jorge Silva Melo nos brinda com as suas palavras, o dramaturgo, cineasta, encenador e crítico fez do Auditório da Culturgest um foco de reflexão acesa em torno de um tema que actualmente tem vindo a constituir uma problemática com alguma polémica no seio do meio artístico português: a Crítica de Arte.

O orador optou por uma abordagem originária da Crítica, recuando aos propósitos primordiais da mesma e analisando a sua evolução até ao presente, detectando por fim as lacunas de uma actual Crítica de Arte e ditando, finalmente, em tom de desabafo, o modo como, na perspectiva do artista, a Crítica deveria actuar.

“O crítico é o guardião de um saber que não quer ser abalado”, o que se revela “contraditório com a própria noção de crítica, porque não ser abalado é não ser criticado”, afirma o orador, numa alusão ao paradoxo de que a actual crítica em Portugal padece.


I. História da Crítica: a figura do “verificador”

Aquilo a que actualmente chamamos de Crítica de Arte surge originariamente quando um único financiador, tradicionalmente membro de uma realeza aristocrata, fazia uma determinada encomenda a um artista e, antes do pagamento final, o “verificador” se ia certificar se a obra correspondia ao caderno de encargos exigido pelo financiador. Falamos de um tempo em que existiam tratados rígidos que ditavam as proporções anatómicas, a perspectiva, enfim, uma série de ditames que deviam ser seguidos rigorosamente pelo artista na concepção das suas obras.

Como em qualquer ambiente dogmático e adverso à inovação criativa, aconteceu que “algumas obras-primas foram recusadas por estes verificadores”, e, certamente, muitos artistas de mérito ficaram por mencionar nos arquivos da História da Arte Universal. “Tudo isto acontecia porque existiam dogmas, havia tratados, havia ordem, e havia Deus, ou seja, havia uma ordem bem organizada das coisas e por isso era fácil verificar se este mundo correspondia a toda a hierarquia do poder que se pretendia celebrar.”

O advento da Modernidade assinala uma ruptura com a ordem vigente no domínio artístico, mediante uma diversificação e um aumento das fontes de financiamento de obras artísticas. A arte entra então num mercado mais difuso. “A ordem eterna desaparece, desaparece também o belo eterno.” Onde apenas uma voz se fazia ouvir, surge uma polifonia que se impõe, provocando importantes mutações no espaço artístico, instituindo novas tendências no que diz respeito às obras de arte e também à crítica das mesmas. “A burguesia ascendente vai triunfar no mercado porque o financiamento das artes se dissemina” e, consequentemente, “o gosto começa a ser contraditório”, o que despoleta as perpétuas questões quanto ao Belo e à obra de arte, enriquecendo e complexificando o exercício da Crítica de Arte.

Se até ao século XVII a crítica é “filha da certeza”, os tempos modernos caracterizam-se pela existência de múltiplos centros de poder, este não provem já exclusivamente de uma entidade divina, “o que significa que a crítica começa a ser filha, não da certeza ou do dogma, mas da dúvida, da polémica, da contradição, da conversa”, passando mesmo a estabelecer uma relação crítica relativamente à Igreja.” “É pela acção crítica filha da desconfiança, da dúvida, que a crítica, ou não aceitação do dogma, do paradigma, pode começar, e começou, felizmente.” É pois com a Modernidade e com o estilhaçamento da consciência precedente que se reúnem as condições basilares para o surgimento de uma Crítica mobilizadora que se espraia por todos os domínios da sociedade, contaminando também o da arte. Sem o desenvolvimento e enraizamento de um espírito crítico as Revoluções Liberais nunca teriam sido uma realidade no mundo ocidental.

Já no século XX, e de um modo mais acentuado, posteriormente à Segunda Guerra Mundial, o crítico vive o “desamparo de deus e dos paradigmas.” Se “deus está morto”, como Nietzsche o disse, então qualquer um o pode substituir e o surgimento de um pensamento antropocêntrico que esteve na base da construção da subjectividade racional e autónoma complexifica a Crítica, evidenciando o carácter subjectivo que lhe é intrínseco. “Esse desamparo, de 45 aos anos 70, foi jogado no didactismo, o crítico passou a ser uma espécie de senhor culto, interessado, apaixonado, que ensinava, não tanto o artista (…) ensinava o espectador, porque a noção de ensino dominou esses anos, sobretudo nas culturas francesa e inglesa.” Assim, a figura do crítico institucionaliza-se enquanto a de “um especialista que verificava o interesse da obra para o bem comum, o bem público, a beleza, e oferecia ao público aquilo que podia dizer por formação.” É neste momento que a crítica começa também a ser publicada enquanto género literário autónomo.


II. A Crítica de Teatro

O Teatro, arte por excelência do instante, vivida e irrepetível, relaciona-se com a Crítica de um modo peculiar. Pelo facto de ser “uma coisa mais viva na sua recepção do que os quadros que são comprados na galeria”, a crítica teatral é definitiva.

Para os actores, a representação fica exposta à crítica sem que um momento posterior, um novo olhar sobre ela a possa alterar. “Para nós, a crítica é definitiva e é a pedra tumular” ela “não pode ser eterna, mas para nós é.”

O actor, ao contrário do autor, não pode esperar que, décadas mais tarde, seja encontrado um baú onde estão arquivados os escritos que podem alterar o olhar do mundo sobre a sua obra. “Não podemos esperar pelo julgamento da História que não nos vai absolver, mas merecemos um olhar que nos fixe.” Daí que os artistas de teatro sejam mais vulneráveis à irresponsabilidade da crítica.


III. O Suicídio da Crítica

Vivemos um momento em que a Crítica, pela reunião de uma série de factores sociais, económicos e políticos, sofre um declínio. Assistimos, na generalidade, a uma crítica em que não é já “o pensamento que está em jogo, é apenas a sua função de informação e marketing.” A voz da crítica perde poder de um modo assustador e Jorge Silva Melo afirma mesmo que esta passa ter um estatuto de mera “irmã gémea do marketing.” O ensaio crítico, pela aridez de uma actividade pensante e de conflito de opiniões e enquanto ferramenta de marketing, é, não raras vezes, substituída pela notícia prévia, que mais não constitui que uma nota informativa e publicitária sobre determinado evento artístico.

A precariedade vivida pelos críticos tem vindo a revelar certas tendências no ramo profissional, tais como uma visão do exercício da crítica, jornalística ou não, como actividade de passagem para outras esferas do poder, como o jornalismo, o ensino ou mesmo para o quadro dos ministérios. Ou seja, a crítica é actualmente, salvo louváveis excepções, um meio para obter outros fins.

“A força económica sobre os suplementos culturais é grande”, sendo esta favorecida pela situação de instabilidade profissional vivida pelos críticos. A postura de aceitação e submissão face à situação vigente e às imposições económicas, a redução drástica dos espaços televisivos de discussão e debate, e uma invasão do marketing pela crítica são tudo tendências que culminam naquilo que Jorge Silva Melo apelidou de “suicídio” da crítica. “A crítica passou a existir como irresponsabilidade.”, acrescenta o orador.

“Não assistimos ao drama das ideias, mas sim à sua versão espectacular”, espectacularizada pelos órgãos de comunicação social, pois que somos ainda parte, e certamente de um modo mais intenso, na tal “Sociedade do Espectáculo” de que nos falava Guy Debord em 1967. A par da espectacularização que educa o espectador para a submissão, ergue-se uma estrutura consensual, que promove a unanimidade de opiniões e o branqueamento da discórdia e do conflito. Deste modo, a crítica é cada vez mais encarada como definitiva, inviolável e não dialogante.
Contra esta conjectura, afirma o dramaturgo: “Eu não gosto de nós, gosto de eu mais eu, gosto de discordar, e é isso que me faz ser humano.”


IV. “Discordar é o que me faz ser humano.”

“Não havendo dogmas, não havendo paradigmas, estamos desarmadamente sós perante a obra.” Encontrando-se o espectador nesta situação de desamparo, mas também de liberdade, podemos concluir que “a Crítica necessariamente nasce da obra, quem dita os paradigmas é a própria obra.” O juízo que origina a crítica parte de um diálogo que se estabelece com a obra, e que, como tal, é subjectivo e ímpar. A subjectividade de cada indivíduo determina um olhar particular, e não é também cada obra, na sua singularidade, “que determina o olhar sobre ela?” No entanto, a Crítica é injusta na medida em que admite um “resto”, tudo aquilo que ficou por ver pelo sujeito, porque o seu tempo não o permitiu. A totalidade da obra de arte não é absorvida pelo crítico e, como tal, a crítica pressupõe necessariamente um acto de injustiça relativo à obra. “A crítica é sempre cega ao seu tempo. Não pode ver tudo o que se passa no seu tempo, é impossível, há sempre coisas que escapam.”

Jorge Silva Melo encerra a sessão com um apelo, enumerando as qualidades que, para si, deveriam caracterizar a Crítica de Arte: “Eu gostava de ter uma crítica violenta, não quero uma crítica morna”,“queria uma crítica parcial, uma crítica fraterna. Os irmãos podem ser violentos e podem ser parciais, não deixam por isso de ser irmãos”, “uma crítica apaixonada, filha da obra, e não de outras coisas, sua antagonista e companheira.” “Eu quero uma crítica, tal como as artes, imperfeita, porque a crítica é imperfeita, e deve sê-lo, não deve aspirar à perfeição.”

“Eu não quero viver sem crítica. O que é que havemos de fazer?”



NOTA: Todas as citações não identificadas presentes no texto são da autoria de Jorge Silva Melo, no decorrer da Conferência Não gosto de críticos, não gosto, Culturgest, 26 de Setembro de 2011.



Maria Beatriz Marquilhas