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GEDI SIBONYSOFIA NUNES2011-05-17Gedi Sibony CULTURGEST 19 FEV-22 MAI 2011 Apesar de ter sido praticamente ignorada pela crÃtica portuguesa, cada vez mais definhada e com referenciais caseiros ou muito pouco actualizados, a exposição de Gedi Sibony, apresentada pela Culturgest, merece todavia a nossa particular atenção. Gedi Sibony é um jovem artista nova-iorquino de 38 anos em franca ascensão. Fez a sua primeira exposição individual na galeria CANADA, Nova Iorque (2004), seguida de outras individuais na Kunsthalle St. Gallen, no FRAC Champagne-Ardenne, Reims (ambas 2007), na galeria Greene Naftali, Nova Iorque (2008) que continua a representá-lo e no Contemporary Art Museum de St. Louis (2009), à s quais se junta agora a da Culturgest. Paralelamente tem integrado importantes colectivas, entre outras: Bienal de Whitney (2006, cur. Philippe Vergne e Chrissie Iles), Bienal de Berlim (2010, cur. Kathrin Rhomberg), Unmonumental, exposição de reabertura do New Museum, Nova Iorque (2007, cur. Richard Flood, Laura Hoptman, e Massimiliano Gioni) e Abstract Resistance, Walker Art Center, Minneapolis (2010, cur. Yasmil Raymond). À semelhança de muitos artistas da sua geração, Sibony não deixa que a sua obra se fixe a um medium especÃfico, recorrendo antes a várias técnicas que combinadas geram instalações ou mesmo situações dentro no espaço expositivo. Porém, no seu caso, este dado permite-lhe sobretudo pesquisar os interstÃcios entre a pintura e a escultura, com alusões à própria história da arte moderna, e pensar como a imagem se produz num objecto e como este, por sua vez, se resolve também numa imagem. Mas esta linha de forças, que o artista tão habilmente tece no seu trabalho, torna-se ainda mais produtiva e estimulante ao percebermos que não se esgota num esquema formal, para antes problematizar o próprio mundo. Perante o modo como hoje o consumo governa vertiginosamente a experiência e a equivale à substituição permanente de objectos, os trabalhos de Sibony resgatam do quotidiano os objectos esquecidos por essa mesma ordem, devolvendo-lhes novos sentidos e uma temporalidade desacelerada. De resto a sua produção artÃstica começou, como o próprio esclarece em diferentes entrevistas, no momento em que utilizou uma porta encontrada na rua como tampo de mesa de trabalho e transformou quatro chapas de mdf num banco. Anos mais tarde, tanto a mesa como o banco acabariam por ser integrados na sua primeira exposição, interpelando o próprio espaço de forma muito particular. Ora a exposição em apresentação na Culturgest, exemplarmente comissariada por Anthony Hubermann, procura pois insistir nestes três grandes eixos relacionáveis que estruturam a obra de Gedi Sibony, i.e, a produção de instalações que baralham as ordens do pictórico e do objectual, evocando a memória da história da arte; o encontro entre os seus trabalhos e o quotidiano, através da incorporação de objectos precários vindos muitas vezes directamente do seu atelier e ainda a estreita relação que aqueles estabelecem com a arquitectura do espaço expositivo. Mas a sua obra é igualmente atravessada por diferentes efeitos de teatralização que a configuram como situação, reclamando, assim, a cumplicidade do espectador. Para esta exposição o curador reuniu um conjunto alargado de instalações produzidas nos últimos anos e outras especificamente para a ocasião, distribuindo-as entre salas fechadas e um longo corredor de salas abertas. Na sua maioria, são constituÃdas por materiais indiferenciados (alcatifas industriais, embalagens de plástico, chapas de mdf, portas, contraplacados, tubos de metal, tecidos ou telas) e ligeiramente alterados pelo artista, através de cortes, revestimentos, estampagens, sobreposição ou acoplagem de elementos que criam um vocabulário próprio, como podemos testemunhar logo na primeira sala da exposição. A instalação aqui apresentada intitula-se The undecided world is made of worlds then there are the knew nothing dream, 2011 e é composta por duas placas assimétricas de mdf branco, uma série de oito telas estampadas e desengradadas e ainda uma escultura. Enquanto as placas de mdf, estão encostadas lado a lado, embaladas em plástico com adesivos e apoiadas numa prateleira pregada à parede, as telas estão presas directamente na parede. Mas quer os adesivos quer as telas denunciam um mesmo piscar de olho à pintura de Robert Ryman. Porém a evocação em jogo é irónica e desviante, já que Sibony interroga a superfÃcie através das suas possibilidades tridimensionais e decorativas. A escultura construÃda em contraplacado revestido com fotografias de vários trabalhos seus, acrescenta, por sua vez, ainda mais humor à instalação quando vista como memorial à obra do próprio artista e armário de brinquedos descontinuados da fisher-price accionados por motor não controlável. Em It’s origins justify its oranges, 2008, uma das peças mais conhecidas do artista, é antes uma instalação escultórica que provoca uma pintura. Na parede do fundo de uma sala à s escuras, está pendurada uma estrutura rectangular em forma de grade executada em madeira com dois elementos diagonais a atravessá-la. Quatro projectores de luz, cada um com um filtro de cor diferente (azul, verde, amarelo e vermelho) iluminam-na, preenchendo, assim, cromaticamente os espaços deixados em aberto pela forma da grade. O sentido teatral que aqui se gera é pois reforçado pela presença de uma cortina irregular que separa duas instalações mais adiante. Tanto a sua forma como a localização inesperadas dramatizam os objectos vizinhos, ao mesmo tempo que interferem nos movimentos e expectativas do espectador. De um lado da cortina, somos confrontados com I Stay Joined (separated) , 1991-2011, instalação constituÃda por uma porta de madeira encostada à parede em forma de monolÃtico e uma estrutura tubular em alumÃnio presa ao tecto. Se ambos os elementos parecem retraçar as caracterÃsticas arquitectónicas do espaço, a sua datação anula a sugestão de natureza site-specific. Em causa está pois um entendimento do contexto da obra como flutuação e liberto da ideia de presença a um espaço ideal. Do outro lado, a cortina revela-nos uma embalagem de plástico, colada à parede com adesivos, como se uma pintura estivesse aà por ausência. Porém somos conduzidos de imediato até outra peça que nos espreita da sala seguinte. Trata-se de Osbasak Seker, 2008, uma escultura em contraplacado constituÃda por várias superfÃcies com recortes geométricos e não regulares que, no seu conjunto, produzem um efeito de sobreposição de planos e volumes assim como um forte dinamismo perceptivo. A exposição termina com Gedy Sibony (with Diana Lyon) who attracts all that is named, 2010, uma instalação profundamente cénica e subjectiva, onde o artista opta por levar todos os elementos à parede. No canto superior esquerdo, temos um pano rasgado e caÃdo, ao centro um sofá suspenso sobre o qual repousam um pedaço de tecido recortado em forma de animal e uma tela estampada idêntica à s da primeira instalação a actuar como cobertor. Finalmente à direita, uma alcatifa preta, cujo formato de porta denuncia a saÃda daquele espaço para um outro espaço, uma zona escura e imprevisÃvel que fatalmente parece atrair o artista e organizar a sua relação com os objectos encontrados. Segundo o próprio curador, “reside aqui parte do milagre contido no seu trabalho: mãos sujas fazem coisas limpas, ou para citar Bruce Nauman, coisas simples revelam verdades mÃsticas.†Mas este é talvez o aspecto que impede Sibony de ir mais longe na crÃtica que dirige a uma civilização esquecida de experiência. Sofia Nunes |