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OPINIÃO


Fotografia: Joaquim Norte de Sousa


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© Philippe Migeat - Centre Pompidou

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CHRISTIAN BOLTANSKI NO FÓRUM DO FUTURO



CONSTANÇA BABO

2018-11-17




 

Apesar de se dirigir para o amanhã, para o progresso, o Fórum do Futuro deste ano teve, como ponto de partida, o ontem, o anterior, a Antiguidade Grega. Centrando-se particularmente no conceito de Ágora, espaço público de opinião, troca e encontro social, político e cultural, o programa de 2018 procurou recriar tal dinâmica, visando a atualidade. Para tal, deu-se a abordagem e a discussão, aos mais variados níveis, das múltiplas esferas de conhecimento e de ação que constituem o mundo de hoje. Foi assim que o ciclo de conferências, vídeos e performances, organizado pela Câmara Municipal do Porto, em semelhança aos anos anteriores, incidiu sobre diversas problemáticas das artes à cultura, sociologia, política e ciência, áreas que dialogam entre si, relacionando-se e completando-se. Este projeto foi concretizado através da participação de mais de cinquenta convidados de dezassete nacionalidades que, apesar de constituírem um painel muito diversificado, convergiram num mesmo objetivo, o de desenvolver um pensamento sobre o presente, reconhecendo-o, até certo ponto, enquanto reflexo do passado e projetando-se no futuro.

Christian Boltanski (1944, Paris), antes de subir ao palco, na quinta-feira dia 8 de novembro, reconheceu "Estou num fórum do futuro e vou falar do passado". O momento decorreu no Auditório do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, com introdução e moderação de Ricardo Nicolau, curador sénior dessa mesma instituição, com atividade particularmente revelante na cena artística da cidade. Tal como este último referiu na abertura da sessão, "ser contemporâneo é estar ligeiramente desfasado da atualidade".

Quanto ao artista francês, refira-se que é altamente ativo no seu tempo a partir de uma aproximação que nutre com o passado, patente em toda a sua obra, esta que se revela enquanto história, memória e tempo, em relação com determinados espaços e/ou acontecimentos. O conceito que intitulou a sessão de Boltanski, Transmissão, foi, precisamente, o ponto de partida da sua conferência. O grande criador contemporâneo identificou essa noção como fundamental e exercida através de duas formas distintas, sendo a primeira correspondente ao hegemónico mundo ocidental, determinada pela Igreja, lugar onde predomina o culto dos objetos. A outra forma de transmissão, que mais lhe agrada, surge através do significado, do simbólico, do invisível. O artista esclarece que, tal como nos templos do Japão ou nas máscaras das tribos africanas, a relação e a dinâmica espiritual estabelecidas não estão contidas na matéria desses elementos, mas sim, na sua significação. E, numa mesma lógica, refere que tanto na vida como na arte e no universo, o mais importante é o saber, o conhecimento.

Pode, a partir daí, compreender-se quando Christian Boltanski esclarece que não utiliza as identidades das vítimas do Holocausto, nem procura identificar ou individualizar os donos daqueles rostos que, em fotografias a preto e branco, incorpora nas suas construções artísticas. Trata-se, sim, de evocar o que aqueles sujeitos representam e a determinada ocorrência, sociedade, época a que pertenceram, no fundo, convoca a sua memória histórica. Escolhe, pois, vários anónimos que possam retratar o maior número de pessoas possível, assim criando uma obra aberta e ampla que não se fecha sobre si mesma. Também na construção de um corpo de trabalho plural, o artista procura que cada exposição seja única e, quando expõe as mesmas obras está a reutilizá-las, tornando-as susceptíveis de novas interpretações, específicas, únicas e relativas a cada um. Explica que é como se se tratasse da mise-en-scéne de uma peça de teatro onde o mesmo texto resulta em espetáculos distintos. Essa prática artística é-lhe, por sinal, particularmente estimada, compreendendo-a enquanto uma arte do tempo, tal como, por exemplo, a literatura, ambas distintas das artes do espaço (escultura, instalação, arquitetura, etc.). O tempo revela-se, assim, determinante no instante da experiência estética e na decorrente recepção do espectador, o mesmo que ele considera ter a capacidade de determinar toda a obra.

Quando perguntam a Christian Boltanski qual a sua forma de encarar o futuro responde que "somos todos substituíveis e substituídos. As pessoas mudam mas tudo continua". Porém, no que diz respeito à obra deste artista, essa será, certamente, eterna e demasiado singular para qualquer mimésis. Não obstante, é verdade que surgirão, sempre, novas criações, artistas e personalidades. É por esse devir que se aguarda, daqui até ao ano seguinte, com o próximo Fórum do Futuro.

 

 

Constança Babo