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OPINIÃO


UM MÊS ACORDADO – EXPOSIÇÃO DE ALEXANDRE ESTRELA ©Galeria Zé dos Bois


Van Allen Belt ©Luis do Rosario


Um mês acordado ©Luis do Rosario


Universal Score ©Luis do Rosario


Poster da exposição por Ana Baliza, fotografia


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JOÃO SILVÉRIO

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VIENA, 22 a 26 de Março de 2006


'O QUE CALQUEI?' SOBRE A EXPOSIÇÃO UM MÊS ACORDADO DE ALEXANDRE ESTRELA



MADALENA FOLGADO

2022-02-25




 

 

Escrever tem vindo a constituir para mim uma oportunidade de encontro, de compreender um pouco mais sobre, mas principalmente de me posicionar sob, algo que desconheço. Há precisamente um mês ficou acordado com a ARTECAPITAL que escreveria sobre a exposição Um mês acordado, de Alexandre Estrela. Esta é uma aproximação que sinto como oportuna, e não tanto uma opinião; escreve-se a partir de um kairós e não tanto um chronos. Neste sentido, e por uma aproximação ser, vou fazer referência a alguns acontecimentos pessoais, que me aproximaram um pouco mais desta exposição. No passado dia 17, tive a oportunidade de ouvir o Alexandre Estrela falar presencialmente pela segunda vez. Agora, no contexto de uma visita guiada a Um mês acordado, com lugar na Galeria Zé dos Bois, com curadoria de Gerard Faggionato e Natxo Checa, e que esteve patente precisamente durante um mês, de 21 de Janeiro a 21 de Fevereiro de 2022.

Em ambas as vezes que ouvi o Alexandre Estrela falar presencialmente, deu a conhecer, e creio de maneira muito generosa, o modo como as suas instalações de vídeo surgiram; o modo como nos acontecimentos mais prosaicos e periféricos se instala uma tal lente – nós mesmos –, que simula essa causalidade maior [1] que sempre nos escapará – felizmente, para nosso descanso, e noites bem dormidas. Como mencionou na visita, a dada altura, alguns de nós passamos a crer que o sono pode ser descartável, o efeito de uma conspiração que nos impede de ficar extraordinariamente lúcidos e por exemplo descobrir padrões na música, ou criar os mais variados inventos. Diria que a criança que nos habita, ou a pulsão de criar, resiste ao sono para poder, enquanto o mundo dorme, “inventar um [outro] mundo da qual ela é o rei, o tirano do desejo do Tudo” uma vez que “O criador é uma criança invadida pelo desejo do tudo de que se deve fazer o luto” [2] – Ao, finalmente, dormirmos, enfrentamos essa outra pequena morte enquanto morte do eu, esse processo de rendição que é também o sono. É que cair no sono, pode um ser cair em si; ou em si, na nota musical. Ou pode ser ainda que nos erodamos numa queda infinita, como numa outra instalação vídeo de Alexandre Estrela, numa outra exposição [3].

Marie-José Mondzain diz-nos que “Quem quer tudo, quer reinar. Ora a imagem não é um reino. Qualquer arte é uma arte da imagem, quer essas imagens sejam da ordem visual ou não” [4]. Estou em crer que os movimentos serendipitosos que o Alexandre Estrela desencadeia, são obra das ninfas (mas já lá chegamos). Ainda segundo a filósofa “A criação só é possível se produzir a abolição dos reinos. Renunciar ao duplo gozo sucessivamente pelo prometido pelo Tudo e pelo Nada é o que constrói o advento da imagem” [5]. As projeções do Alexandre Estrela são armadilhas para ninfas, a saber, ninfa significa simultaneamente “fonte de água” e noiva, i.e., “jovem preparada para as núpcias”; numa síntese dos dois significados Apolo, deus da música, poesia, profecia, tiro ao arco, medicina, vida pastoril e…sol referia-se às ninfas como “águas mentais”; no mito, ele próprio toma a ninfa Telfusa [6].

As ninfas são as espectrais imagens artísticas, de natureza profética, não computáveis, o casamento é portanto de outra ordem de visível. Na origem do termo psiquiátrico ninfomania, está precisamente a ideia, segundo as investigações de Paracelso, o médico renascentista, que estas belas mulheres espectrais precisariam de copular com humanos e com eles terem filhos, para receberem uma alma, e tornarem-se então humanas [7], o mesmo que dizer materializarem-se. Roberto Calasso diz-nos que elas são “a matéria mental fremente, oscilante, brilhante de que são feitos os simulacros, os eídola. […] De cada vez que se divisa a Ninfa, vibra a matéria divina que se plasma nas epifanias e se introduz na mente, potência que antecede e sustem a palavra. A partir do momento em que essa potência se manifesta, a forma segue-a e adapta-se, articula-se segundo esse fluxo." [8]

Reformulando: As projeções do Alexandre Estrela são armadilhas para ninfas colocadas exatamente no limite entre o computável e o incomputável, precisamente na “superabundância do possível”. Ai mesmo, onde o autor do texto da folha de sala situa os “privados do conforto do sono, os loucos, os que estão num longo e cansado estado de vigília, [que] no seu devaneio, conhecem, recordam ou reconhecem os padrões infinitos, as imagens cintilantes, as figuras fumegantes que brilham na noite, repetindo-se, flutuando e morrendo” [9]. Não me refiro aos insones que, a altas horas da madrugada, por servidão voluntária, contribuem para a repetição desses outros padrões, talvez não tão luminosos, mas utilitariamente (militarmente) capturados pelos algoritmos das redes sociais. Ser de graça, não é Ser nem a graça ela mesmo (grace). Eles ou elas, e os seus discursos, confundem-se com os invasivos ‘ads’ que alimentam. Precisamos de desconforto: o dos insones, e o das instalações do Alexandre Estrela. Também  Daniel Faria, o poeta do verso do título, ou Rainer Maria Rilke, aos quais farei referencia em breve, conheceram esse desconforto. Sinto-os por isso mais próximos do Alexandre Estrela, do que desses lugares tornados tacitamente comuns, onde por vezes ficam reféns, via posts de citações. É em parte essa a pro-vocação, do título. O Alexandre Estrela disse-nos na visita que gostava de fazer posters, o poster azul que aqui publico, desenhado por Ana Baliza, é uma fotografia do que levei para casa, disponível a quem visitasse a exposição.

Certo é que o mundo está encantado [10], no texto da folha de sala é mencionado esse riso cúmplice bergonsiano para com os insones, o artista, e as repetições. Também eu no decurso da escrita deste ensaio me ri, entre muitas outras coisas, do surgimento do tema das ninfas, cujo desenvolvimento ficará para outro momento. Ri ainda, e por relação a uma das obras Universal Score, no qual a imagem “cintila a duas velocidades” [11], de como em tempos – insones – a minha mente tentava fazer coincidir o movimento oscilante da sombra dos ramos de uma árvore, que finalmente vim a descobrir qual era, porque atravessava um enfiamento muito improvável até chegar ao quarto onde trabalho, com uma música eletrónica que o algoritmo do YouTube me predestinava naquele instante. A sombra dos ramos deste álamo – do género científico populus, vim mais tarde a saber – dançava ao som de Populous, um projeto de um músico italiano, que o algoritmo me apresentava naquele instante, não particularmente do meu agrado. Despidos pelo Inverno, num destes dias em que escrevo, os ramos dançavam apresentando-se como delicados vasos sanguíneos, já não em três, mas em quatro orifícios das persianas (a outra velocidade). Fotografei com o telemóvel: desenham quatro A’s…tamanha a eficiência energética: “A questão da criação torna-se assim, inseparável do seu destino, fazer alguma coisa é fazer o luto do tudo para recorrer à superabundância do possível” [12].   

O que o Alexandre Estrela faz é então, e prosseguindo na superabundância do possível o seguinte: “se eu me concentrar num fragmento de tempo / não é hoje, nem amanhã / mas se eu me concentrar num fragmento de tempo, / agora, / esse fragmento revelará todo tempo”. [13] Cito Maria Gabriel Llansol, e o Livro das Comunidades. A sua obra é um portal para o lugar-comum, mas não esse, o das banalidades. A primeira vez que me cruzei com este livro ri-me cumplicemente quando li as notas de rodapé. Nesta obra, assim como em outras, a escritora dá-nos a ver anacronismos enquanto “temporalidades heterogéneas a trabalhar em consonância” [14], constelações, que se abrem na aceitação do que está disponível agora; no disparo da intuição. A intuição tem qualquer coisa, a meu ver, de um testemunhar de um desdobramento, revelando posteriormente como uma causalidade maior se ri de nós, na manipulação da nossa atenção – a atenção é precisa e preciosa, a mais valiosa mercadoria. A escritora faz-nos nessas mesmas notas de rodapé saber que descobriu a origem de termos, de coincidências não-programadas em geral, depois do disparo desse “agora”, razão pela qual dei eu também o meu exemplo, o da projeção no meu quarto. Maria Gabriela Llansol cria assim no legente espaço para a aparição, para o tal “advento da imagem” em-cada-um-de-nós, despossessando o lugar-comum [15].

As ninfas, de acordo com a reflexão de Calasso trazem com elas a luz, mas também a tentação do conhecimento por posse; a sombra do poder [16]. Para que não restem dúvidas, as ninfas não são objetivamente mulheres, note-se o exemplo da ninfa dargeriana, referido por Agamben [17]. O perigo é a violência dessa tomada de posse pelos algoritmos que, afinal, somos nós. Quando o ego – ou o desejo do Tudo, aliado à mania, e à necessidade de aparecer – nos torna ninfomaníacos: Na tentativa de ter uma alma, vendemo-la ao diabo, a saber, nós mesmos. Para que possamos perceber o que é uma coincidência não-programada, o Alexandre Estrela mostra-nos como se programa uma coincidência [18], aquilo ao qual os algoritmos respondem, sabendo que a nossa mente está desenhada para encontrar sentido. Referiu na visita que procurou encontrar uma maneira de fazer com que nossa perceção fizesse um pequeno esforço ativo, para que toda a atmosfera insone por ele criada fizesse sentido. E, que na realidade não faz. Fomos portanto convidados a ser mais conscientes desta nossa habilidade, a de nos sincronizarmos e criar sentido, e perceber o quão a nossa atenção é desviada e vendida ao desbarato. E, ainda, que enquanto a aproximação não é a sorte grande, we better fake it until e make it. 

Como referiu, nas instalações-vídeo, os batimentos de imagem estão quase subtilmente sincronizados com o som, constituem uma espécie de stacattos de som e de imagem, criando portanto interrupções. Giorgio Agamben, referindo-se às ninfas, fala-nos precisamente dessas pausas carregadas de tensão, de tempo, fazendo referência à “phantasmata”, um estilo presente no Tratado da Arte da Dança e Coreografia, escrito no século XV, por Domenico da Piacenza, no qual este ensina:

 

I say that whoever wants to learn this art, needs to dance through phantasmata; note that phantasmata are a kind of corporeal swiftness that is controlled by the understanding of the measure…This necessitates that at each tempo you appear as if you had seen Medusa’s head, after having performed the movement, you should appear entirely made of stone in that instant and in the next you should put wings like a falcon moved by hunger, according to the above rule, that is to say, employing measure, memory, manner with measure of ground and air. [19]

 

Suspendamos desta citação o aspeto corpóreo para daqui a pouco, com Daniel Faria. Quando os stacattos de som e imagem, aqui em relação com a phantasmata, são suspensos alternadamente – como aliás os ecrãs se encontram, i.e., suspensos por cabos –, referentes a duas das três projeções de vídeo, Um mês acordado de 2018 e Universal Score de 2019, apercebemo-nos de uma espécie de espessura pétrea dos ecrãs. Como referiu Alexandre Estrela, as imagens projetadas querem ser esculturas, precisam de uma certa complementaridade, ser embebidas na História da Arte, sem nunca o chegar a ser. Os ecrãs aludem talvez por isso à escrita cuneiforme, e às ninfas, na medida em que, uma vez mais como referi, precisam elas mesmas de uma complementaridade para ganhar alma; ou, simplesmente, de camadas de informação geológica; i. e., serem saturadas de tempo.

Retomando Llansol, e a concentração ou a atenção, e deste modo, a maneira como Alexandre Estrela 'arrisca' Um mês acordado, de 2018, numa série de instantes, em tempo real, i.e., a criação de um filme experimental – a instalação ela mesma. Segundo o que o próprio relatou, já a altas horas da madrugada, e extremamente cansados, o artista convida o engenheiro com quem estava naquele momento a trabalhar, a aprender como se fazia um filme experimental, a partir da projeção de uma imagem estática num acrílico rotativo. Ao deparar-se com o que via, o engenheiro diz-lhe que o que vê o lembra do que via quando alucinou, por estar um mês acordado. Eis que inicia a gravação de voz do então depoente e a sua, e em loop. Nada mais do que ouvimos na exposição, a par de qualquer coisa como uns sons drone, i.e., zumbidos, e/ou sirenes, todos eles intensamente audíveis, mas como se capturados muito perifericamente, o que de facto nos remete para a desconcertante perceção insone do mundo. Ainda segundo o artista e a propósito da espessura dos ecrãs, a partir das imagens próximas ao que se poderia ver em modo de alucinação, Alexandre Estrela decide torna-las ainda mais concretas; como se a alucinação evoluísse para um encontro de terceiro grau, criando então um relevo em sua função no ecrã.

A exposição começa com Van Allen Belt, de 2019, o que pode em modo insone sugerir, pela homofonia, o nome da extinta banda de rock. Este título refere-se antes a uma teoria conspiracionista, de que existe à volta da Terra uma camada de irradiação enorme, que impede a matéria viva de sair e entrar da nossa atmosfera. O que vemos filmado é o nascer do sol e ocaso em Timor, interessou-lhe criar uma imagem global de energia, o que pressupôs projetar as imagens de ambos os momentos em diálogo, i.e., polarizando-se. Como mencionou, em calmaria e excitação, resultando num efeito flitter, uma vez mais, segundo o artista, um clássico do cinema experimental. O ecrã torna-se então uma camada espessa e impeditiva para dar lugar a uma projeção; e, uma projeção é uma imagem com informação. O ecrã está perfurado, os seus quatro furos atravessam a barreira, podemos vê-los projetados na parede atrás do ecrã, segundo Alexandre Estrela: A matéria não sai…mas as imagens saem da nossa realidade. Como as ninfas, digo eu. 

Desta primeira sala, passamos para a seguinte com Um mês acordado e Universal score, que se repetem, respetivamente, duas e uma vez, nas demais salas. Mas não sabemos ainda o que sucede; é que por um lado cada projeção constitui em si mesma um apelo a sincronizarmos a informação áudio e visual, o que como referi, não acontece intencionalmente por um triz. Por outro, cada projeção está de facto sincronizada com a sua(s) gémea(s) nas demais salas, dando a ver o relevo dos ecrãs, quando suspensas. Diria, estimulando também uma certa paranoia; um efeito de gaslighting, segundo o artista, como se as projeções nos fossem seguindo e se tornassem uma máquina que se vai equilibrando e desequilibrando, numa única imagem global, participada pela nossa tentativa de sincronização. Alexandre Estrela falou-nos ainda sobre como criou o ecrã de Universal Score: Encontrou um manual de gravura antigo, e criou um desenho no interior do retângulo, na própria placa de impressão, placa essa a partir da qual foi feita uma réplica, o ecrã desta projeção de vídeo. Nesta projeção, como refere, a pauta das pautas, procurou uma espécie de universalismo da música contemporânea, sugerido pelas inúmeras e sucessivas possibilidades de inflexões decorrentes das tentativas de sincronização entre som e imagem, uma vez mais, abrindo espaço para a aparição da imagem, nas suas palavras, para a criação das muitas pautas subjetivas.

Na minha prática meditativa, procuro sempre um som drone ao redor para me concentrar; a não haver melhor, o som de um simples ar condicionado resulta, enquanto a comunicação extraterrestre possível. Como também, de um modo geral, recordo como no meu tempo de 'directas' este tipo de som abria uma espécie de portal-canal de concentração, que persistia, mesmo quando, por exemplo, o zumbido do frigorífico que o escavava parava. Alexandre Estrela fez referência ao seu interesse por música drone, de como foi à procura de música deste tipo, para fazer com que passasse por um acrílico em rotação, e por conseguinte, desse batimento surgisse uma espécie de flutuação. Creio que todos procuramos (mesmo os que não sabem) essa tal “melodia de fundo” que Rainer Maria Rilke nos fala, que nos demanda uma escuta ativa e uma boa dose de solitude (ainda que em Um mês acordado não haja de todo uma melodia): “Aquele que captasse toda a melodia, seria em simultâneo o mais solitário e o mais inserido na comunidade. Isto porque ouviria o que ninguém ouve e porque só ele compreende, na sua plenitude, o que os outros, por muito que se esforcem, só distinguem de uma forma obscura e incompleta”. [20] Será talvez este o espírito de certos insones, e de suas criações noturnas. Por vezes, a melodia dá lugar ao seu contrário, para que possamos, por oposição, testemunhar renovadamente o continuum.

No texto da folha de sala, Marco Bene faz referência à projeção de vídeo de Alexandre Estrela do seguinte modo: “Como uma pele fina, a imagem cobre o ecrã e os seus contornos”. Refere também que Um mês acordado alude às imagens de cores fluorescentes que vemos quando pressionamos as pálpebras; os fosfenos, que são fenómenos entópticos. Mais corporeamente ainda, recordo-me de um insight que tive a propósito de um poema de Daniel Faria, imediatamente antes do poeta e eu cairmos no sono, no qual  pergunta: “O que calquei?”. Naquele instante, percebi que as pétalas de algumas flores, como as rosas, têm a mesma textura das nossas pálpebras, no gesto de delicadamente esfregar os olhos com sono antes de dormir. As consequências deste insight operaram a um nível mais profundo, do inconsciente, que não cabe aqui desenvolver. Antes de visitar a exposição, ainda que a visita guiada estivesse marcada cedo, às 18h30, havia dormido muito pouco, estava cheia de sono. Por volta da hora registada no screenshot, consultei o site da ZDB, para rever a hora e preparar-me para o que ia ver. Eis que, entre eventos, me deparo com a imagem de um dos membros do projeto musical Bandua, a fazer o mesmo gesto. Uma coisa é certa, os ecrãs do Alexandre Estrela são bem distintos dos ecrãs dos nossos smartphones, não têm a perigosa polidez, e por conseguinte, a falta de resistência que Byung-Chul Han refere, mas também não têm a suavidade das pétalas de rosa, nem tampouco avistamos ninfas…O que esta exposição tem, é com certeza a dose certa de desconforto para que nos mantenhamos acordados.

"Foram pétalas / Ou olhos de deusas / O que calquei? // Não / Não digam // Eu sei / Que foram sonhos". [21]

Agora sim, boa noite. 

 

Madalena Folgado

É mestre em arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Artes da Universidade Lusíada de Lisboa e investigadora do Centro de Investigação em Território, Arquitetura e Design; e do Laboratório de Investigação em Design e Artes, entre outras coisas. 

 

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 Notas

[1] Situo a noção de causalidade em Timothy Morton, “What If Art Were a Kind of Magic?” in Art Review, 10 December 2015,  https://artreview.com/november-2015-feature-timothy-morton-charisma-causality/ acedido virtualmente a 24 de Fevereiro 2022. 
[2] Marie-José Mondzain, "Nada Tudo Qualquer Coisa. Ou a arte das imagens como poder de transformação", in AAVV, A República Por Vir, org. Rodrigo Silva e Leonor Nazaré, 2010, p. 114.
[3] Instalação vídeo Third Reason, de 2021, na exposição com o mesmo nome, com curadoria de Natxo Checa, que esteve patente na galeria Rialto6, de 15 de Setembro de 2021 a 14 de Janeiro de 2022. 
[4] Marie-José Mondzain, op. cit., p.114
[5Ibid. p.112.
[6] Roberto Calasso, "Águas Mentais" in Roberto Calasso, A Literatura e os Deuses, 2003, p. 34. 
[7] Giorgio Agamben, Nymphs, London, New York, Calcutta, Seagull Books, p.45.
[8] Roberto Calasso, op. cit., p.35.
[9] Marco Bene, in Um mês acordado, (texto da folha de sala da exposição).
[10] Cf. Erika Fisher-Lichte, Estética do Performativo, Lisboa, Orfeu Negro. Refiro-me à ideia de "reencantamento do mundo", que perpassa esta obra, na qual um novo ilumisnismo tem um papel preponderante, não no sentido de anular o mistério, antes, de celebrar o espanto, que emerge das mais recentes descobertas científicas. 
[11] Marco Bene, op.cit..
[12] Marie-José Mondzain, op. cit., p.107.
[13] Maria Gabriel Llansol, O Livro das Comunidades, Porto, Afrontamento, 1977, p. 76.
[14] Georges Didi-Huberman, Diante do tempo: História de arte e o anacronismo das imagens. Lisboa, Orfeu Negro, 2017, p.156.  
[15] Cf. Silvina Rodrigues Lopes, Teoria da Des-possessão, Lisboa, Averno.
[16] Roberto Calasso, op. cit., p.33.
[17] Giorgio Agamben, op cit., pp. 16,17, 18. O pensador dá como exemplo o extraoridinário processo de montagem do artista, assim considerado postumamente, Henry Darger. 
[18] A expressão "coincidência programada" foi encontrada por Marco Bene no texto da folha de sala. 
[19] Giorgio Agamben, op cit, pp. 7, 8.
[20] Rainer Maria Rilke, Notas sobre a melodia das coisas, Sl, Licorne, 2014, p. 46.
[21] Daniel Faria, Poesia, Lisboa, Assírio e Alvim, 2015, p. 437.