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ENTRE A MEMÓRIA E O SEU APAGAMENTO: O GRANDE KILAPY DE ZÉZÉ GAMBOA E O LEGADO DO COLONIALISMO PORTUGUÊSKATY STEWART2018-10-16
No seu artigo pioneiro sobre a memória, “Les lieux de mémoire”, Pierre Nora afirma que “a memória é, sobretudo, arquivística. Confia inteiramente na materialidade do vestígio, na imediatez do registo, na visibilidade da imagem” (Nora, 1989, p. 13). A noção segundo a qual o arquivo tem uma importância essencial como o “meio de comunicação” moderno da memória, para citar Walter Benjamin (Benjamin, 2005, p. 576), oferece um ponto de partida interessante para considerar a redenção da memória no filme O Grande Kilapy (2012), a segunda longa metragem do cineasta angolano Zézé Gamboa. O filme transporta-nos aos últimos anos do colonialismo português em Angola, entre os finais da década de 1960 e 1975, e convida-nos a assistir a um testemunho, ainda que fictício, sobre a luta da libertação de Angola e a descolonização. Trata-se duma memória que ganha vida através do personagem de Joãozinho, um anti herói apolítico. Se a história oficial da relação colonial entre Portugal e Angola se encontra principalmente escrita nos arquivos portugueses, n’O Grande Kilapy ela é retrabalhada e reimaginada através da recuperação de memórias não oficiais e marginalizadas. Tal como este artigo demonstrará, isto é feito através da utilização de arquivos fílmicos e radiofónicos, bem como da construção duma forma narrativa em camadas, apoiada sobre o desempenho oral do narrador do filme, uma figura que testemunha oralmente sobre os acontecimentos históricos e que transmite a sua versão sobre os mesmos à tutela colectiva. Em segundo lugar, o próprio contexto de produção e de distribuição do filme fornece também algumas pistas para compreender a maneira como a memória coletiva se forma no espaço pós-colonial lusófono, realçando ainda a maneira como a própria película age como um registo e salientando a sua vulnerabilidade em termos de apagamento da memória. O artigo explorará os problemas enfrentados pelo realizador Gamboa durante a filmagem em Angola e a ausência de distribuição do filme para além do circuito dos festivais, de forma a mostrar como factores geográficos da memória e de poder agem sobre o filme enquanto produto cultural. Neste âmbito, é essencial levar em linha de conta questões de memória individual, coletiva e cultural em relação a materiais arquivados e arquiváveis, e também explorar o que Soraia Ansara chama de “políticas do esquecimento” (Ansara, 2012, p. 297) e o que ao Paul Ricoeur (2006, p. 452) se refere como “formas institucionais do esquecimento”. Demonstrando tal esquecimento político no caso d’O Grande Kilapy, este artigo argumentará que o filme também transmite memórias que não dependem da materialidade do arquivo para existir, tais como os desempenhos orais já mencionados, e que se dirigem tanto a públicos intra- como extradiegéticos. Tal como este artigo deixará claro, O Grande Kilapy é um filme constituído por muitas camadas e nuances. Há mudanças constantes de género, de estética e de estrutura. Os aspectos analisados limitar-se-ão ao espaço e ao tempo da estrutura narrativa e à forma como Gamboa utiliza nesse contexto os materiais de arquivo, assim como às questões de produção e de distribuição. Estes elementos constituem os mais marcantes para considerar a redenção da memória no contexto da matriz pós-colonial lusófona. Infelizmente, um só artigo não permite um estudo do filme em toda a sua complexidade: tanto a sua banda-sonora como a estética visual, por exemplo, merecem uma análise aprofundada. Esperamos desta forma que este artigo conduza a mais trabalhos sobre o filme.
A estrutura narrativa d’O Grande Kilapy A palavra ‘kilapy’ que dá título ao filme vem da língua Kimbundu e, tal como é explicado no começo, significa “golpe” ou “tramoia”. A primeira cena d’O Grande Kilapy desenrola-se num bar-esplanada num telhado de Lisboa. O narrador do filme, por enquanto um personagem anónimo e enigmático, começa a contar a história de Joãozinho, um estudante favorecido que estuda numa das Casas do Império em Lisboa, durante a década de 1960. Na realidade, e contra os objetivos do Estado Novo, estas casas universitárias funcionaram como campos de treino revolucionários, à medida que intelectuais oriundos das diferentes colónias portuguesas da África formavam alianças e inflamavam ideias. Entre os estudantes das Casas do Império encontravam-se os líderes das futuras lutas de libertação: Agostinho Neto, Eduardo Mondlane e Amílcar Cabral. No filme, Gamboa subverte esta história, uma vez que Joãozinho não tem nada de um líder revolucionário. Quando se envolve na luta da libertação, é sempre de forma relutante e quase acidental. Joãozinho é caracterizado como golpista e malandro. Tal como o narrador conta à sua audiência diegética, bem como aos espectadores do filme, “Ele era um verdadeiro artista do kilapy” (03:05). Esta abertura, apresenta-nos a primeira secção espaço temporal do filme, situando-nos na Lisboa contemporânea e introduzindo um flashback extenso. No seu estudo abrangente sobre os flashbacks no cinema, Maureen Turim nota que “a memória, nas suas dimensões psicanalíticas e filosóficas, é um dos conceitos inscritos nos flashbacks. A memória surge de forma explosiva, fortifica e protege ou repete e assombra” (Turim, 2013, p. 2). Os flashbacks em si mesmos não são necessariamente perturbadores para os espectadores: tal como Aline Sevenants e Géry d’Ydewalle (2011) demonstram, as sequências simples de flashback não exigem um esforço mental excessivo do espectador. O Grande Kilapy é relativamente sequencial, a história de Joãozinho ocupando a maior parte do filme, de maneira linear, as cenas no presente surgindo apenas no começo e no fim. Na realidade, pode até argumentar-se que estas cenas funcionam mais como flashforwards ou prolepses relativas à narrativa dominante. Tal estrutura não se afasta muito dos princípios semióticos do cinema clássico. Além disso, a paleta cromática e a luz do filme conferem-lhe uma qualidade visual estilizada, que o aproximam mais do melodrama de Hollywood e do film noir que do cinema de resistência. Contudo, ao aplicarmos a análise de Turim, percebemos como Gamboa explora estas convenções clássicas para criar narrativas alternativas dentro do filme. Segundo Turim, “a narração ou a lembrança do passado dentro dum filme pode ser autoconsciente, contraditória ou irónica. O projeto de algumas narrativas em flashback é o questionamento da reconstrução histórica” (Turim, 2013, p. 3). Em O Grande Kilapy, eu sugeriria que o projeto de recuperação de memórias do período colonial se encontra inscrito na estrutura narrativa do filme. É neste contexto que a utilização do flashback e da memória histórica por parte de Gamboa surge como algo de subversivo e politicamente empenhado. É também significativo que o relato audível da narrativa seja realizado por um narrador português branco, um retornado. Trata-se de um ato provocador que parece posicionar Joãozinho apenas como o objeto enunciado na narração e não como um agente ativo: o colonizador fala em nome do colonizado. No entanto, tal como Christian Metz (1974) e Stephen Heath (1981) realçam nos seus trabalhos pioneiros sobre teoria do filme, a linguagem visual do cinema prima sobre a auditiva e, em termos visuais, em O Grande Kilapy é Joãozinho quem domina. Além disso, Gamboa constrói um retrato complexo do personagem, o espectador nunca estando completamente certo sobre como se identificar. Muitas das ações de Joãozinho são imorais, tais como as suas traições amorosas e financeiras, culminando num golpe contra o Banco de Angola em que desvia fundos para financiar um modo de vida cada vez mais luxuoso para ele mesmo e seus amigos. No entanto, ele emerge também como um herói oposto à terrível Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE); ajuda o seu amigo Rui a escapar do serviço militar obrigatório; e revela-se generoso para com os que dele precisam em Luanda. Gamboa utiliza a composição e luz de forma eficaz para enfatizar esta descrição: os oficiais da PIDE encontram-se frequentemente envoltos pelas sombras, as suas caras iluminadas sinistramente, planos longos de salas e de movimentos aludindo à tortura. Numa cena, um policial da PIDE ordena que Joãozinho se dispa, em público. A montagem passa dum plano do oficial com o seu fato cinzento para um plano de Joãozinho a tirar as suas calças, antes que a câmara se mova de forma a incluir as duas figuras em oposição, momento em que o oficial dá uma pequena bofetada na bochecha de Joãozinho. A cena não precisa da narração extra-diegética: a indignidade e a desigualdade são comunicadas ao espectador.
A memória e o arquivo Se Joãozinho é um personagem ambivalente que resiste às tentativas de classificação, o filme ancora o seu projeto de redenção da memória e de reapropriação da história colonial em camadas cinematográficas que vão para além da narração, em particular através do uso de filmes e de gravações de arquivo. Neste momento, é necessário, primeiramente, clarificar o sentido da expressão ‘redenção da memória’ e, em seguida, precisar de que maneiras específicas Gamboa utiliza o material arquivístico para tal projeto no filme. Entre os prolíficos escritos de Walter Benjamin sobre a história e a memória, o autor escreve em ‘Teses sobre o conceito da história’, que “o passado contém um índice temporal pelo qual é conhecida a redenção” (Benjamin, 1968, p. 255). Podemos entender esta ideia de redenção como a recuperação e a reconfiguração do passado no presente como fazem, por exemplo, Uri Matatayaou (2008) e Tim Woods (2007). No seu livro sobre literatura africana, refletindo sobre os traumas históricos das lutas de libertação em África, Woods escreve: “A memória relembra não a vida perdida, mas a vida ainda não vivida. A este respeito, a história e a memória […] são os locais cruciais onde as identidades pós-coloniais e culturais são formadas e contestadas” (Woods, 2007, p. 3). A redenção da memória constitui então um projeto essencial no presente não só porque tem o poder de reconsiderar e de reescrever a história oficial, mas também por- que possui a capacidade de confirmar identidades previamente marginalizadas. Os aspetos espaço temporais do filme assumem então uma função importante. O conceito de tempo e sua representação cinematográfica é uma consideração-chave nas teorias do cinema africano [1], particularmente em contraste com o tempo linear ocidental. Alguns académicos enfatizam o tempo cíclico: Melissa Thackway, por exemplo, associa-o ao ritmo cíclico da vida comunitária (Thacway, 2003, p. 152) e Souleymane Bachir Diagne, entre outros, identifica uma estética da lentidão (Bachir Diagne, 1998, p. 7). Mais pertinente relativamente ao tratamento do tempo por Gamboa, contudo, é o que Thackway chama de “sedimentação narrativa” (Thackway, 2003, p. 78). N’O Grande Kilapy, diferentes memórias e narrativas da história são posicionadas em camadas, umas sobre as outras, complexificando uma estrutura cinematográfica que, à primeira vista, parece simples. Eu diria que, nas sequências que analisarei de seguida, o espaço tem precedência sob o tempo. Isto é importante porque o espaço geográfico e físico, e a sua manipulação, estão intimamente relacionados com a preservação ou com o apagamento da memória. Aminata Cisse Diaw sugere, no seu artigo sobre o tempo e o desenvolvimento na África subsaariana, que atos de desterritorialização, tais como o vandalismo dos monumentos oficiais, podem ser uma forma de desconstruir a memória oficial e nacional e o que a autora denomina “o imaginário colonial” (Cisse Diaw, 1998, p. 233). Através desta desterritorialização da memória oficial, as memórias extraoficiais podem ser redimidas e narrativas alternativas podem ser estabelecidas. O recurso a materiais de arquivo por parte Gamboa pode também ser entendido como um ato simbólico de desterritorialização. Os artefactos históricos são deslocados dos seus contextos originais e apresentados diferentemente, e, por isso, criam novas possibilidades para contar uma história alternativa. Por volta do meio do filme, Joãozinho é deportado de Portugal pela PIDE, e enviado de regresso à sua Angola natal. Aqui, Gamboa usa a transição geográfica a fim de criar uma ponte entre a narrativa diegética ficcional e o filme histórico dessa época. Este fragmento de arquivo mostra imagens aéreas de Luanda, seguida por cenas da rua, que se sucedem às cenas ficcionais. Assim, o passado histórico e a ficção narrativa confundem-se sem dificuldades. A viagem de regresso de Joãozinho conduz então o espectador numa viagem visual ao passado. Este processo provoca o começo da redenção deste passado tal como o concebe Matatayou (2008), isto é, como passado reconfigurado e renegociado no presente. Além disso, o espectador, agora em posição de ser testemunha do passado, é convidado a assumir um papel ativo na sua redenção. Nesta parte do filme, desenrolada em Angola, Gamboa emprega o material de arquivo de forma mais extensiva. O material que explorarei aqui não se encontra apenas imbricado na narrativa, tal como nas cenas evocadas; o mesmo é ativamente explorado. De forma significativa, um arquivo visual e cinematográfico é posto em contraste com uma gravação sonora do mesmo período histórico, narrando os mesmos eventos, durante a guerra colonial em Angola. O filme de arquivo é um filme de propaganda do Estado Novo, que pretende demonstrar a força e a capacidade das forças armadas portuguesas, enquanto a gravação é uma emissão radiofónica do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), um dos movimentos independentistas de Angola. Ao contrário das cenas anteriores em que é quase impossível distinguir o material de arquivo do resto do filme, aqui a narrativa é interrompida por um corte abrupto ao termo de uma cena em que Joãozinho está a trabalhar no banco - e em que o narrador começa a revelar os detalhes do kilapy, o golpe, que está a caminho - sendo aí introduzido o começo do filme de arquivo. A justaposição destas duas cenas e a rapidez da montagem fazem com que as palavras do narrador sobre o golpe ressonem como um eco na segunda cena. O narrador observa: “O golpe era muita simples. Havia dois livros de recibo, duas contas e dois destinos. O verdadeiro milagre da multiplicação dos pães” (53:15). O dualismo da realidade também parece pertinente para considerar o material de arquivo que segue, dado que se tratam de duas memórias divergentes da mesma história. O filme de arquivo mostra o treino de soldados portugueses aprendendo as competências necessárias para lutarem contra grupos insurgentes em Angola. No entanto, em vez do impacto imediato e persuasivo imaginados inicialmente, os espectadores d’O Grande Kilapy mantêm uma distância relativamente ao filme, elemento acentuado pelo facto do filme ser visto através dos olhos de Joãozinho. Depois de alguns segundos de imagens, vemos o Joãozinho assistir ao filme no cinema. Ao continuar completamente apático politicamente, preferindo olhar para a mulher sentada atrás dele em vez de reagir ao filme, Joãozinho funciona como uma espécie de veículo para provocar uma reação auto-consciente por parte do espectador. Este último pode assim considerar este pedaço da história oficial a partir duma nova perspectiva, em particular à luz das cenas anteriores, nas quais o recrutamento forçado de revolucionários angolanos para o Exército português evocado como ameaça e punição mina agora a legitimidade das revindicações do filme. Se esta cena reconsidera a memória, a cena seguinte rescreve-a, ao mostrar-nos o pai de Joãozinho a escutar o programa de rádio do MPLA. Por meio de um som crepitante, uma voz declara: “os nossos heróicos guerrilheiros combatem […] o Exército Português que defende a continuação do odiado colonialismo em Angola” (57:33). Ao proporcionar uma contra-história da guerra colonial portuguesa, a gravação enfraquece ainda mais a história oficial contada pelo filme de propaganda. A luta anti-subversiva, reivindicada pelo Estado Novo como um sucesso, é claramente um fracasso se um cidadão ordinário e prudente tem acesso a mensagens subversivas na sua própria casa. O impacto deste contra-testemunho é ainda maior devido ao facto do pai de Joãozinho ser aparentemente um “assimilado”, com um emprego respeitável no banco dirigido pelos portugueses. Ele escuta a emissão em segredo, escondendo este comportamento até da sua mulher. Assim, a disparidade entre a história oficial e a memória pessoal torna-se ainda mais evidente. Para além disso, o recurso a um programa de rádio para apresentar uma história alternativa possui o seu próprio poder subversivo. A subordinação do auditivo pelo visual no cinema encontra-se tão bem estabelecida que o recurso ao auditivo como ferramenta de subversão para interromper a coerência narrativa é frequentemente utilizado pelo contra-cinema, algo que Kaja Silverman (1988) discute em detalhe. Mas, como já mencionado, o elemento auditivo em O Grande Kilapy parece relativamente seguro, de acordo com a estrutura sugerida por Heath: “a contenção do som como espaço seguro da voz narrativa” (Heath, 1981, p. 120). Sendo assim, o recurso, neste ponto do filme, à gravação vinda do passado, num contraste direto e provocativo com o filme de arquivo, torna-se ainda mais forte. O filme – a imagem em movimento – parece quase congelar neste momento: o plano é escuro, quase sem nenhum detalhe ao fundo, e o pai do Joãozinho encontra-se sentado e imóvel, escutando atentamente. Por conseguinte, é a emissão auditiva que se encontra em primeiro plano, numa espécie de reversão da cena anterior, em que o filme de arquivo se via dominado e circunscrito pela narrativa. Em Dying Colonialism, Frantz Fanon escreve sobre a transformação da rádio durante a luta de libertação da Argélia, observando como este meio de comunicação dum instrumento de controle francês que transmitia a “verdade do opressor” (Fanon, 1965, p. 76), se transformou numa arma revolucionária. Fanon explica que o programa de rádio argelino “Voz da Argélia” não só apresentou aos ouvintes uma perspectiva alternativa, uma “verdade agida” (Fanon, 1965, p. 76) que se opunha à narrativa francesa dominan- te, mas que o simples ato de possuir um rádio e escutar a “Voz da Argélia” significavam que o ouvinte estava a participar na luta: Comprar um rádio, ajoelhar-se e encostar a cabeça contra o altifalante, não significava apenas querer acompanhar as notícias da formidável experiência que se desenrolava no país, mas ouvir as primeiras palavras da nação […] ter um rádio significava, realmente, ir à guerra. (Fanon, 1965, p. 93) Alguns paralelismos com esta situação argelina, e em particular com a descrição do ouvinte por Fanon, podem ser observados n’O Grande Kilapy. Na realidade, o pai de Joãozinho assume quase precisamente a posição que Fanon propõe, agachando-se per- to do rádio, com a orelha colada ao altifalante. Esta imagem admirável, assim como o risco associado à escuta dum programa subversivo que evocado nesta cena, transforma o prudente bancário num participante ativo na luta de libertação angolana. Tal como Fanon sugere em várias passagens da sua análise (Fanon, 1965, pp. 69- 98), e como deixa claro o uso do ‘nosso’ no programa de rádio n’O Grande Kilapy, ainda que escutar seja um ato individual, este gesto é simultaneamente coletivo, constituindo um exemplo do que Benedict Anderson, em Comunidades Imaginadas (Anderson, 2006) concebe como uma experiência imaginada e partilhada que reúne os membros de uma comunidade. Embora ao escutar o rádio na privacidade da sua própria casa não se possam ver outras pessoas fazendo a mesma coisa, a transmissão do programa tem uma função pública e a sociedade fala dele, assumindo este um aspecto social. No caso da rádio subversiva, é esta natureza coletiva que lhe confere o poder de uma arma revolucionária. No filme, Gamboa desenvolve ainda mais esta ideia: a audiência torna-se no coletivo imaginado para o personagem na écran – nós também escutamos o rádio. Em contraste com o material visual de arquivo utilizado na cena anterior, aqui o arquivo existe apenas na esfera auditiva, ainda que incorporado visualmente pelo filme. Assim, a gravação realiza o seu potencial como instrumento de libertação e de redenção da memória ao ser escutada tanto pelo personagem como pelo espectador.
As restrições sobre a memória e as políticas do lugar Se O Grande Kilapy é um filme que negocia entre o que Soraia Ansara chama de as “políticas de memória” e as “políticas do esquecimento” (Ansara, 2012, p. 297), como um artefacto memorial em si próprio, o filme não é imune a estas mesmas políticas. O cinema e a memória têm uma ligação íntima, uma relação “simbiótica” (Sinha & McSweeney, 2011, p. 2), e é difícil, se não impossível, separar o nosso desejo de preservar, arquivar e resgatar filmes do nosso desejo de preservar, arquivar e resgatar recordações [2]. O Grande Kilapy é um filme no qual a interação entre o cinema e a memória é particularmente visível, não só devido ao seu tema, mas também devido às políticas pós-coloniais contemporâneas vigentes no mundo lusófono e que moldam a narrativa do filme. Numa entrevista com Marta Lança sobre O Grande Kilapy em 2010, no BUALA, durante o período final da produção, Gamboa mencionou os seus planos para as cenas que ele tinha ainda de filmar, as quais eram as sequências do começo e do fim, com o narrador. O cineasta explicou: “vamos filmar em Luanda, na marginal, para fazer um contraponto da Luanda colonial com a Luanda de hoje […] o narrador está na Angola atual” (2010, parágrafo 29). Aqui, a transcrição contém uma nota, presumidamente adicionada mais tarde, “NOTA: isto não se chegou a fazer!” (2010, parágrafo 29). Como já mencionado, o narrador que vemos no filme finalizado encontra-se em Lisboa, não em Luanda, de forma que nalgum momento da rodagem algo não funcionou. Gamboa falou em várias ocasiões das dificuldades de filmar em Angola e, na realidade, as secções “históricas” d’O Grande Kilapy, localizadas em Angola, foram realizadas no Brasil. Contudo, nesta entrevista, os objetivos de Gamboa são claros: ao filmar as secções do princípio e do fim em Luanda, juntamente com vistas do litoral, o realizador teria criado uma ligação clara entre o filme de arquivo com as imagens aéreas de Luanda – a Luanda colonial – e a Luanda independente do presente. Isto teria não só colocado Luanda no centro da sua própria história, mas também localizado o poder de dar voz e a imagem às memórias silenciadas e às histórias apagadas nessa mesma cidade. No entanto, estas cenas tiveram de ser filmadas em Lisboa, relocalizando o ato de recordar no centro do antigo poder colonial. Dada a dinâmica pós-colonial entre Angola e Portugal, o transplante de memória de um local para o outro não é um processo neutro ou sem problemas. O espaço geográfico parece exercer forças poderosas sobre a memória cultural, podendo reconfigurar ou destruir memórias. Peter Burke (1989) insiste sobre este fenómeno em relação à perda da memória coletiva que pode acompanhar a destruição da terra nativa dum grupo particular. A memória sem território torna-se muito vulnerável e talvez possamos entender isso regressando aos escritos do Benjamin. “A memória”, argumenta Benjamin, “não é um instrumento para explorar o passado, mas um meio. É o meio daquilo que é experimentado, assim como a terra, é a forma em que cidades antigas estão enterradas” (Benjamin, 2005, p. 576). Ao fazer a ligação entre arqueologia e memória e ao postular que esta última é um meio e não um instrumento, Benjamin sugere um vínculo inalienável entre o lugar e a experiência, em que vários fac- tores espaciais podem afetar a recuperação e resgate de uma memória particular. Neste sentido, Stephen Legg propõe o seguinte: A memória […] muda de acordo com alterações no espaço físico e social, sejam elas transformações urbanas, revoluções sociais, reestruturações ecológicas ou, como Matsuda (1996) argumentou, as maneiras em que novas cartografias do espaço e do poder reestruturam as “cronopolíticas” dum período e dum lugar. (Legg, 2007, p. 457) O colonialismo é uma forma agressiva e brutal de “recartografar o espaço e o poder” (Legg, 2007, p. 457) e, evidentemente, cria uma estrutura político-espacial perniciosa e que continua a exercer um grau de influência nas relações pós-coloniais [3]. O facto de Lisboa ser o lugar da recordação em O Grande Kilapy é talvez ainda mais significativo uma vez que, para além dos documentos de arquivo expostos no filme, as memórias e os testemunhos do período colonial são amplamente reprimidos em Portugal. Isabel Moutinho, por exemplo, discute “a conspiração do silêncio que cerca a guerra colonial (Moutinho, 2008, p. 34). Este é um exemplo das “políticas do esquecimento” (Ansara, 2012) já mencionadas, subjacentes a muitos acontecimentos que resultam em traumas coletivos [4]. Como assinala Paul Ricoeur, uma política de amnistia equivale a uma “obrigação de esquecer” (Ricoeur, 2006, p. 456), havendo uma ligação entre a ideia da amnistia oficial e o fenómeno de amnésia associado à memória pessoal. A amnistia, explica Ricoeur, tem o poder de privar a memória coletiva de uma “reapropriação lúcida do passado” (Ricoeur, 2006, p. 456). Mais uma vez, tal como no desarraigar da memória do seu espaço geográfico, um esquecimento político, consciente e coletivo do passado seria fatal para a redenção da memória. O silêncio que atravessa a história colonial em Portugal corresponde ao ambiente ao qual Ricoeur se refere, ambiente no qual a história oficial depende tanto do esquecimento tático como da recordação. Em Angola, as estratégias da monumentalização empregadas pelo MPLA, o par- tido que governa o país desde a independência, funcionam também como uma forma de amnésia. John Schubert oferece uma leitura crítica da imagem do presidente José Eduardo dos Santos como um “arquiteto da paz” (Schubert, 2015, p. 2), assinalando a destruição deliberada de bairros e de mercados informais em Luanda, bem como a relocalização de residentes para áreas longe do centro da cidade - um projeto dirigido pelo governo. Pode ser argumentado que essas ações representam uma forma de territorialização, em contraste com a desterritorialização discutida anteriormente e, como tal, uma forma de controle da memória pública. De facto, como demonstra Schubert, em Angola, equipara-se frequentemente a reconciliação pós-guerra com a reconstrução física da infraestrutura do país, o que “oblitera os restos dum passado caótico e a confusão do tempo de guerra” (Schubert, 2015, p. 15) e apaga efetivamente as memórias que não se conformam à narrativa dominante. Devido ao forte controle pelo Estado dos meios de comunicação, das artes e, ironicamente, como indica Paula Cristina Roque, de ONGs (Roque, 2009, p. 142), o MPLA pode inscrever a sua versão oficial da história em quase todos os aspectos da nação. É talvez revelador que as duas longas-metragens de Gamboa, O Herói e O Grande Kilapy, tratem dos períodos pré- e pós-guerra, mas não se aventurem sobre o período da guerra civil em si, conformando-se assim, até certo ponto, com o “hiato de 30 anos na história angolana” que Schubert identifica na ideologia do MPLA (Schubert, 2015, p. 12). E, no entanto, a caracterização de Joãozinho como um escroque interesseiro oriundo das camadas mais privilegiadas da sociedade angolana constitui uma crítica velada à corrupção política e ao egoísmo do governo pós-independência. Na sequência final do filme, Joãozinho deve finalmente encarar as suas ações, acabando na prisão, acusado de corrupção. Mas pouco depois, Angola alcança a independência e os prisioneiros são libertados. Joãozinho é ironicamente saudado como um herói político. Assim, o filme deixa o espectador traçar os paralelos possíveis com a situação política atual. Apesar das dificuldades espaciais e geográficas que a memória encara em ambos os contextos, O Grande Kilapy demonstra enfaticamente a persistência de eventos aparentemente ‘esquecidos’ na memória cultural e coletiva. Em primeiro lugar, a deslocação de Luanda para Lisboa é potencialmente destrutiva; no entanto, o poder que o filme possui de contar a sua própria história não se encontra necessariamente perdido. Portugal pode ser o lugar onde as memórias são narradas, mas a voz que emerge é a angolana e ao inscrever a perspectiva angolana sobre a história colonial compartilhada num testemunho português, a história oficial do colonizador pode ser questionada desde o seu centro de poder. Em segundo lugar, os traços de memórias podem e continuam a sobre- viver no seio de um sistema de esquecimento forçado. Para recuperar estas memórias, as ligações entre a memória pessoal e a coletiva tornam-se vitais. Fazer a junção entre a memória pessoal e a memória coletiva - ou “a memória social” (Burke, 1989, p. 100) – não é necessariamente fácil, mas através da transmissão de histórias, as memórias podem ser passadas entre as pessoas de uma determinada comunidade e entre as gerações. Como explica Thomas Butler, “a memória não é apenas o que nós pessoalmente experimentamos, aperfeiçoamos e retemos (o nosso “centro”), mas também o que her- damos de gerações anteriores e passamos para a próxima” (Butler, 1989, p. 13). Isso não quer dizer que as memórias individuais possam ser transmitidas de forma completa e não adulterada de um ser humano para outro, mas através da comunicação direta, inter- pessoal - uma prática que escapa aos arquivos, aos monumentos e às comemorações da história oficial de um Estado - essas memórias são capazes de sobreviver. O Grande Kilapy chama a atenção para este processo de transmissão das memórias na estrutura do filme. Afinal, a narrativa apresenta-se como um desempenho oral, trans- mitido pelo narrador ao seu público, dois jovens nascidos depois de 1975. No entanto, nós, os espectadores, somos também a audiência do narrador e, desta forma, estamos implicados na transmissão – e na tutela – desta memória. Burke fala sobre o papel do historiador em preservar “os registos de um passado que se tornou estranho e constrangedor, um passado que as pessoas, por uma razão ou outra não, preferem ignorar, ainda que fosse melhor para eles não o fazer” (Burke, 1989, p. 110). O Grande Kilapy é tanto um desempenho oral (em termos de diegese), um exemplo de uma memória social efémera, como um registo audiovisual arquivável em termos de material fílmico. Não se trata de sugerir que o filme seja um retrato histórico preciso dos acontecimentos: o filme é uma obra de ficção “baseada em factos reais”, como explicado nos créditos de abertura. No entanto, através do seu uso integrado de materiais de arquivo, a ficção torna-se inseparável dos factos, e a narrativa ficcional funciona como uma espécie de folclore oral, como uma forma de contar histórias em que as memórias se encontram incorporadas. O cinema africano está quase indissociavelmente ligado às tradições orais. A comparação de Manthia Diawara entre os cineastas africanos e os griots (contadores de his- tórias) é bem conhecida (Diawara, 1992), tendo sido determinante para a consideração da dialética entre a tradição oral e o cinema africano. Contudo, devemos tratar esta ideia com certo grau de cautela, uma vez que, como indica Tshishi Bavuala Matanda, a função do griot é de transmitir, não criar (Bavuala Matanda,1984, p. 167). Para além disso, e se as tradições orais têm uma posição proeminente nas comunidades e sociedades através do continente africano, o griot é uma figura específica das sociedades da África ocidental. É, no entanto, uma figura que Gamboa explora aqui eficazmente, combinando a memória histórica e a sátira política através da performance oral, reconhecendo, ao mesmo tempo, as complexidades específicas da sociedade pós-colonial angolana ao utilizar um retornado como narrador. No começo desta seção, evocámos brevemente a ideia de que o cinema constitui em si próprio uma memória cultural, e esta noção é essencial para considerarmos um último limite sobre a memória coletiva. O Grande Kilapy pode cumprir a função de recuperar as memórias marginalizadas angolanas num espaço lusófono compartilhado, mas a fim de transmitir sua narrativa, o filme necessita de ser visto. Parece um ponto óbvio, mas tal como diz Ricoeur: “Há testemunhos que nunca encontram uma audiência capaz de os escutar ou de ouvir o que têm a dizer” (Ricoeur, 2006, p. 166). O mesmo poderia ser dito sobre os filmes, em particular no contexto do cinema africano. A distribuição é um problema perene e a situação d’O Grande Kilapy não é exceção. Embora tenha sido lançado inicialmente em 2012, no momento da escrita deste artigo, quatro anos depois, o filme ainda não obteve um acordo de distribuição e permanece no circuito de festivais internacionais - um caso clássico que Marijke De Valcke descreve como “estar preso na […] rede de festivais” (De Valcke, 2007, p. 105). Em segundo lugar, o circuito de festivais limita geograficamente a recepção do filme. Mais uma vez, este problema não é exclusivo deste filme ou do cinema angolano, caracterizando a produção cinematográfica de todo o continente: em toda a África, os grandes centros urbanos atuais têm poucas salas de cinema. Nas décadas de 1950 e 1960, Luanda tinha dezenas de salas de cinemas, conforme detalhado pelo Goethe Institut (2015), e esta cultura de cinema da era colonial é ricamente refletida em O Grande Kilapy [5]. Hoje, muitos destes cinemas encontram-se abandonados, uma situação também evidente noutras cidades africanas. Isto significa que muitos filmes realizados por realizadores africanos, sobre temas africanos, simplesmente não são vistos pelo público africano. Zeka Laplaine, um cineasta do Congo, onde já não há uma única sala de cinema na capital, Kinshasa, resume assim a situação: “fazer filmes que não se podem mostrar no seu país, viver na esperança de que eles possam ser vistos no estrangeiro é terrível, um pouco como ser um órfão” (McAuliffe, 2015, p.7). Neste sentido, o desenraizamento geográfico de uma película pode ter um impacto semelhante ao do deslocamento espa- cial da memória. O Grande Kilapy foi mostrado em Toronto, Londres e Dubai antes de ser exibido em África e conheceu a sua estreia em Angola muito mais tarde. [6] Este é talvez o maior obstáculo que O Grande Kilapy enfrenta em termos do seu resgate da memória e um exemplo claro dos limites da história oficial dentro do espaço pós-colonial lusófono. Afinal de contas, através da recuperação de material de arquivo e através da comunicação entre narrador e público, filme e espectador, é possível enfrentar a deslocação de Luanda para Lisboa e superar o obrigatório “dever de esquecer “ (Ricoeur, 2006, p. 456). Suprima-se o espectador e a narrativa (juntamente com suas memórias) é silenciada novamente. Sem distribuição tangível, seja ela por meios digitais ou físicos, o filme transforma-se num espectro temporário em festivais de cinema, com uma vida útil relativamente curta, incapaz de realizar o seu próprio potencial arquivístico, ou de dar voz às memórias e às histórias do colonialismo português silenciadas em Angola. Desta forma, o filme encontra-se efetivamente impedido de se tornar parte da memória cultural angolana e lusófona. Voltando à declaração de Nora segundo a qual “a memória moderna […] conta com a materialidade do vestígio” (Nora, 1989, p. 13), parece perfeitamente possível apagar facilmente O Grande Kilapy da memória cultural. Contudo, tal como demonstra este artigo, as memórias podem persistir apesar da deslocação geográfica e das tentativas de apagamento através da amnistia das “políticas do esquecimento” (Ansara, 2012, p. 297), uma vez que tanto a memória coletiva e social são fundadas na comunicação. Ao ser mostrado em festivais de filme, O Grande Kilapy assemelha-se um pouco ao seu narrador, o contador de histórias: esta é uma história para ser vista e escutada, transmitida e incorporada na memória coletiva. O seu vestígio material talvez não seja por isso tão importante. O que é demonstrado através das políticas de poder expressas pelas localizações geográficas e pela distribuição (ou a falta dela) é a urgência de simultaneamente reaver o material arquivístico e de redimir as memórias marginalizadas perante a “obrigação de esquecer” (Ricoeur, 2006, p. 456) de Portugal. O Grande Kilapy é uma obra de memórias de arquivo, de histórias orais transmitidas de uma geração para outra e de ficção imaginativa, que permanece na memória do seu espectador. Em suma, é uma obra prismática da memória, que se recusa a ser apagada.
Katy Stewart
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Filmografia David & Golias (Produtor) & Gamboa, Z. (Realizador). (2012). O Grande Kilapy. Angola/Portugal/Brasil.
Referências bibliográficas Anderson, B. (2006). Imagined communities. London: Verso. Comunicação e Sociedade, vol. 29, 2016, pp. 239 – 254
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[1] Deve ser notado que as expressões ‘o filme africano’ e ‘o cinema africano’ são problemáticas e que Françoise Pfaff (2004) e Olivier Barlet (2000), entre outros, contestam a sua utilização, advogando o uso das expressões ‘os filmes africanos’ e ‘os cinemas africanos’ no plural. Neste artigo, utilizo as expressões no singular, para me referir ao acumular de teorias que tentam estabelecer estruturas distintas para estudar os filmes africanos, bem como às questões de distribuição que afectam o cinema em toda a África. Em diversos pontos, tento também estabelecer como O Grande Kilapy emprega e se distancia de figuras clássicas do ‘cinema africano’. [2] Paolo Cherchi Usai (2001) oferece uma meditação crítica sobre a preservação do cinema e das suas ligações com a memória cultural no livro The Death of Cinema. [3] “Reviewing geographies of memory/forgetting” por Stephen Legg (2007) oferece um resumo abrangente sobre os principais conceitos e estudos teóricos em torno da memória geográfica. [4] Isto não significa que existe um silêncio completo sobre o colonialismo em Portugal; na verdade, há bastantes artistas e escritores, como Isabela Figueiredo e Dulce Maria Cardoso, que têm produzido reflexões críticas e criativas sobre o período colonial, mas que trabalham dentro duma atmosfera de amnésia política generalizada, elemento reconhecido no seu trabalho. [5] O Goethe Institut está atualmente a dirigir um projeto descrito como um ‘arquivo dos cinemas’ no qual as salas de cinema históricas de 15 cidades africanas (até agora) estão a ser registadas. [6] A companhia da produção, David & Golias, tem uma lista completa das projeções festivais dO Grande Kilapy no seu site, atualizado em 2015.
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Este artigo foi anteriormente publicado no portal Buala, a 24 Setembro 2018. |