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OPINIÃO


Colosso de Pedralva. Cortesia CIAJG.


Vista da exposição Complexo Colosso. © Alexandre Delmar / Cortesia CIAJG.


Vista da exposição Complexo Colosso. © Alexandre Delmar / Cortesia CIAJG.


Vista da exposição Complexo Colosso. © Alexandre Delmar / Cortesia CIAJG.


Vista da exposição Complexo Colosso. © Alexandre Delmar / Cortesia CIAJG.


Vista da exposição Complexo Colosso. © Alexandre Delmar / Cortesia CIAJG.

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IMAGENS DA FOTOGRAFIA

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MARCELO FELIX

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BAS JAN ADER, TRINTA ANOS SOBRE O ÚLTIMO TRAJECTO

JORGE DIAS

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UM PERCURSO POR SEGUIR

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A MOLDURA DO CINEASTA

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BIO-MUSEU: UMA CONDIÇÃO, NO MÍNIMO, TRIPLOMÓRFICA

COLECTIVO*

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VICTOR PALLA (1922 - 2006)

JOÃO SILVÉRIO

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VIENA, 22 a 26 de Março de 2006


A FICÇÃO PARA ALÉM DA HISTÓRIA: O COMPLEXO COLOSSO



LIZ VAHIA

2021-09-30




 


Iniciou-se em Março deste ano um novo programa artístico no Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG), com o título “Nas margens da ficção”, e que marca o começo da curadora Marta Mestre como directora artística do centro. O título remete-nos para Jacques Rancière, para quem o real tem que ser ficcionado para poder ser pensado. Por isso, esta ficção que aqui se propõe não é um dispositivo alienante ou um escape, tem antes um carácter investigativo sem barreiras, uma ferramenta para pensar, que “nos levanta e isso nos leva a qualquer lado”, como afirmou Marta Mestre em conversa.

Está claramente em diálogo com o anterior programa artístico de Nuno Faria, “Para além da história”, onde já havia uma horizontalidade entre arte e artefacto, cenografia e experiência, matérias e ideias. “Nas margens da ficção” pretende convocar diversas vozes nem sempre concordantes, como forma de dar o salto para algo mais adiante, que ainda não se intuía, ao qual não se chegaria só com meros factos. Pretende-se a devolução do dispositivo da narração a um espaço central da contemporaneidade, o museu. A narração convoca essa ligação ao outro e a outras coisas, estranhas, bizarras, dúbias, desconcertantes por vezes, relembra que estamos juntos e que há diversas vozes, diversos autores. Nunca se é o único narrador de uma ficção e a narrativa não é um ponto de chegada, mas um mapa que nos propõe caminhos a seguir. Não é uma resolução, mas uma construção que mostra as suas engrenagens.

A narrativa ficcional proposta não é uma organização de uma desordem, e para provar isso podemos atentar na exposição “Complexo Colosso” que ocupou o piso -1 do CIAJG e cuja segunda parte inaugura já este dia 2 de Outubro, em que começa um novo ciclo de exposições sob o mote "Ficcionar o museu". O curador galego convidado, Ángel Calvo Ulloa, reuniu vários artistas para pensar sobre a insólita estátua colossal conhecida como Colosso de Pedralva e que se encontra um pouco desterrada numa das entradas da cidade de Guimarães. O Colosso de Pedralva é deveras um colosso complexo e um complexo colosso, tal é a quantidade de incertezas, interpretações díspares e materiais que se geraram à sua volta.

Foi em 1876 que o arqueólogo Francisco Martins Sarmento apontou as primeiras notícias sobre uma estátua gigante de um homem de pedra no Monte dos Picos, na freguesia de Pedralva. A sua origem sempre foi incerta, o seu possível significado simbólico também. Desde essas primeiras notícias até hoje, o Colosso de Pedralva gerou investigações e foi alvo de apropriação como figura popular local. O Colosso já não é só uma estátua gigante tosca, do Colosso fazem parte as inúmeras derivações narrativas de que foi origem, que se espalham em diversas camadas, desde a academia ao imaginário popular, desde o urbanismo à arte.

Ángel Calvo Ulloa propunha circundar o Colosso através das obras dos artistas Carla Filipe, Alisa Heil, o colectivo NEG (Nova Escultura Galega), Jorge Barbi, Lola Lasurt, Taxio Ardanaz, Jeremy Deller, Gareth Kennedy, Jorge Satorre, Pedro G. Romero, Andreia Santana e Joaquim Salgado Almeida. Tal como o Colosso gerou uma pluralidade de narrativas à sua volta, aqui os artistas partem desse bloco de pedra para investigar o que é uma escultura, o que é um monumento, como se constrói e reconstrói a História, quem a vive, o que queremos que faça parte da nossa identidade.

Pedro G. Romero oferece-nos uma entrada de dicionário, “Bestiário VII. Colosso Colosal”, onde diz que o Colosso é anacrónico e anacronista simultaneamente, está em dois tempos ao mesmo tempo. Sendo um objecto anacrónico, o Colosso “foi condenado a vagar por uma rotunda”, mas as potencialidades anacronistas do Colosso (a sua capacidade de transcender o tempo) são o que lhe permite ser um objecto que põe “questões”.

É a partir do Colosso que a NEG vai conceber o seu projecto “Os papéis da NEG. Projeto Colosso”, que se apresenta sob a forma de um arquivo, mas que se ordena de modo distinto do tradicional: “O Pojeto Colosso trata de construir um relato a meio caminho entre a história e o desejo. Um desejo real de ordenar os arquivos desde uma configuração que, mais além do visual e do objectual, põe a ênfase no azar do achado e numa estrutura temporal não linear.” Os objectos, papéis e outros items distribuem-se numa instalação que ocupa toda uma secção da sala da exposição, como se entrássemos de facto num arquivo com uma ordem particular, um espaço visualmente entre as reservas de um museu e uma arrecadação doméstica.

As fundações do CIAJG foram ocupadas não pela “escultura” em si, mas pelo que essa pedra criou de narrativas à sua volta, pelas várias vozes que desde o século XIX se vêm acumulando nela.

O programa artístico do CIAJG propõe-nos reconstruir o museu sobre uma pedra incerta, "agigantada, de difícil catalogação". Um colosso que gera um complexo de narrativas e materiais à sua volta e que é complexo de circunscrever com uma interpretação única. É esta escultura esquecida que se apresenta como origem do tipo de ficção que está na base do programa artístico iniciado este ano por Marta Mestre, e que nos permite, “de forma indisciplinada”, imaginar e construir o museu.

O homem de pedra com o seu braço levantado aponta ou segura, não sabemos o quê. Está decepado o braço levantado e só podemos imaginar aquela mão ausente onde pode caber tudo e nada.

 

 

Liz Vahia
Licenciada em antropologia pela Universidade de Coimbra. Doutoranda no programa Filosofia da Ciência, Tecnologia Arte e Sociedade, da Universidade de Lisboa.

 

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[as citações entre parêntesis são excertos de textos de folhas de sala da exposição ou dos artistas/curador]